SEMIÓTICA, A LÓGICA DA COMUNICAÇÃO

António Fidalgo, Universidade da Beira Interior

 

ÍNDICE
Introdução
I – A Origem Lógica da Semiótica Contemporânea
       1 – Bolzano, Frege e Husserl
       2 – Peirce e o Pragmatismo como Lógica da Abdução
II – Linguística e Semiótica
       1 – A Linguística de Saussure e a Ideia de Semiologia
       2 – A Pansemiotização de Barthes
III – A Lógica da Comunicação
       1 – Os Campos da Semiótica: Sintaxe, Semântica e Pragmática
       2 – Os Actos da Fala. A Linguagem como Acção
       3 – A Pragmática Universal de Jürgen Habermas
Bibliografia

 

Introdução

1. Uma ciência recente para uma temática antiga.
A semiótica é uma ciência do século XX, mais precisamente dos meados do século. Saussure afirma no início do século que ainda não existe uma ciência cujo objectivo fosse o estudo da vida dos signos no seio da vida social. Mas reivindica o direito à existência de tal ciência, "que estudaria em que consistem os signos, que leis os regem", e propõe desde logo o nome de semiologia (do grego semeion, "sinal") para a designar1. Em 1956 no ensaio "O Mito, Hoje", incluído em Mitologias, Roland Barthes constata que "a semiologia postulada por Saussure há uns quarenta anos ainda não está constituída2" .
Segundo Georges Mounin3 a concepção saussureana de semiologia – a de uma semiologia da comunicação, contraposta à semiologia da significação de Barthes – só na década de sessenta viria a ganhar corpo com a obra de Buyssens4 e Prieto5. O próprio Buyssens escreve na introdução à sua obra que "a história da semiologia não é longa. Antes de Saussure, encontram-se, sobretudo entre os lógicos, observações gerais referentes aos signos ou aos símbolos. (...) Desde Saussure até à Segunda Guerra Mundial, só houve um ensaio de semiologia que ultrapassasse as banalidades encontráveis em qualquer obra a respeito da linguagem, a saber Le parallélisme logico-gramatical de Charles Serrus6" .
Também Charles Sanders Peirce (1839-1914), para quem a semiótica era, enquanto doutrina formal dos signos, apenas um outro nome da ciência da lógica7, e que a par de Saussure é considerado um dos pais da semiótica contemporânea8, apresenta-se como pioneiro da nova ciência9. Mas apesar dos esforços de Peirce na sistematização da nova ciência, em 1938 Charles Morris declara que apesar de "os signos nunca terem sido estudados tão intensamente, por tantas pessoas de tantos pontos de vista, (...) ainda falta uma estrutura teórica, simples nas suas linhas gerais, mas suficientemente compreensiva para abranger os resultados obtidos de diferentes pontos de vista e uni-los num todo consistente10" . O seu intento é, daí, esboçar a novel ciência, a teoria dos signos ou semiótica; traçar-lhe fragmentariamente os contornos, pois que uma apresentação cabal seria à altura impossível em parte devido ao incipiente desenvolvimento da mesma.
Pode-se então dizer "que existe desde o princípio do século a proposta de uma teoria geral dos signos11" e que essa proposta se vem realizando desde meados do século. Esta realização tornou-se visível não só ao nível das publicações, mas também ao nível das instituições necessárias à identificação de uma ciência. Como escreve Jürgen Trabant "só se pode considerar que uma disciplina12 científica tem existência oficial quando se dota a si mesma de insígnias institucionais como uma associação ou um jornal ou quando existem já institutos científicos com o nome dessa disciplina." Ora segundo este mesmo autor, a semiótica dispõe desde os finais dos anos sessenta dessas instituições: em 1969 foi criada a International Association for Semiotic Studies e iniciou-se a publicação do respectivo órgão científico Semiotica (Haia).
Enfim, para alguém se dar conta de quão recente é a semiótica basta abrir um qualquer dos manuais universitários da disciplina de semiótica. Aí aparece invariavelmente a semiótica como criação científica do século XX.
A temática estudada pela semiótica, porém, não é recente. O estudo dos signos é tão antigo como o próprio pensamento filosó-fico. Efectivamente não é outra a tese a retirar dos estudos de Ernst Cassirer na sua Filosofia das Formas Simbólicas, nomeadamente quando mostra que a questão da linguagem, e concomitantemente a dos signos, é tão antiga como a questão do ser13. Testemunho dessa antiguidade é claramente o diálogo Crátilo de Platão14. A questão sofista da exactidão dos nomes, é retomada a propósito da relação entre nomes e coisas: É essa relação natural, ditada pela natureza do ser e da língua, ou meramente convencional? A posição de Crátilo, a de uma correspondência entre as palavras e os entes, é ironicamente destruída por Sócrates. Mas também a tese defendida pelo opositor de Crátilo, Hermógenes, a de que essa relação é fruto da arbitrariedade, não obtém o assentimento de Sócrates. Pelo contrário, embora não haja uma relação similar directa entre a coisa e nome, há uma relação mediata mais profunda. No processo dialéctico do conhecimento, a palavra constitui como que um veículo para se alcançar o conteúdo significativo dos ideias puras15. Esta concepção do função dialéctica da linguagem é desenvolvida por Platão na Sétima Carta16. Aí apontam-se quatro níveis de conhecimento do objecto: o nome, a definição, a imagem e a ciência. Platão dá o exemplo do círculo. Sobe-se dialecticamente até ao conhecimento da sua essência, primeiro mediante a nomeação, segundo através da definição, isto é, explicando o significado pelo nome ao determiná-lo como a figura que tem as extremidades a uma distância perfeitamente igual do centro, terceiro pela imagem, seja pelo desenho que se traça na areia e que se apaga, seja pela forma que se molda num torno. Nenhuma destas formas de conhecimento alcança o verdadeira essência do círculo, pois que se situam no âmbito do devir e não do ser. Mas só mediante elas se chega ao quarto nível do conhecimento, à ciência17. O verdadeiro saber não é com efeito de natureza simbólica, mas só simbolicamente se acede a esse saber.
Por seu lado, Tzvetan Todorov, ao estudar a origem da semiótica ocidental18, vai ao ponto de chamar a Agostinho de Hipona o primeiro semiótico. Todorov considera que as considerações de Sto Agostinho sobre os signos são os primeiros estudos a obedecer aos dois critérios que em seu ver delimitam a semiótica. Em primeiro lugar, os estudos de Sto Agostinho têm claramente propósitos cognitivos; o objectivo de Sto Agostinho é nesse campo o conhecimento e não a beleza poética ou a pura especulação. Em segundo lugar, Sto Agostinho estuda os signos em geral e não apenas os signos linguísticos. Ora Sto Agostinho, como nota Todorov, não inventou a semiótica, ele fundamentalmente preocupa-se em compilar as teorias já existentes, sobretudo as doutrinas dos estóicos sobre os signos19.
Sto Agostinho fornece à vez duas definições de signo que, na opinião de Todorov20, contemplam o plano semântico e o comunicacional. A primeira definição de signo assenta na sua função designativa ou representativa: "Um signo é o que se mostra a si mesmo ao sentido, e que, para além de si, mostra ainda alguma coisa ao espírito." (De Dialectica). Ao apresentar-se directamente aos sentidos, o signo oferece mais que a sua presença, ele apresenta ao espírito algo que está ausente aos sentidos. O que caracteriza pois o signo é a mediação representativa ou designativa que faz de um terceiro.
A esta dimensão semântica do signo junta Agostinho a dimensão comunicacional. "A palavra é o signo de uma coisa que pode ser compreendida pelo auditor quando é proferida pelo locutor". A introdução da dimensão comunicacional na análise sígnica constitui, segundo Todorov, uma novidade da incursão agostiniana nos domínios semióticos. Essa dimensão não se encontra nem em Aristóteles nem nos estóicos. Mas é justamente a introdução da dimensão comunicacional que leva Agostinho a uma análise sobre o signo diferente e mais complexa que a dos estóicos. Os estóicos dividiam o signo em três elementos: o significado, o significante e o objecto21. Sto Agostinho apura agora quatro elementos constituintes do signo: a palavra (verbum), o exprimível (dicibilis), a expressão (dictio) e a coisa (res). Estabelecendo uma correspondência com a terminologia estóica verifica-se que em Agostinho parece existirem dois termos, verbum e dictio, para designar o significante.
A explicação avançada por Todorov22, é que a análise agostiniana faz a distinção entre o sentido do processo de comunicação e o do processo de significação. Um é o sentido vivido, o sentido que o locutor transmite ao ouvinte; esse é o sentido dizível. A dictio, por seu lado, aponta para o mero sentido semântico ou referente23. Todorov sugere, portanto, que dictio não se encontra tanto ao nível do significante como do significado.
Obviamente não se trata de fazer aqui uma exposição detalhada da "semiótica agostiniana", para isso haveria que ir às fontes e não nos quedarmos pela exposição de Todorov; o que importa aqui salientar é, isso sim, a antiguidade da temática semiótica e, simultaneamente, a profundidade de alguns estudos antigos sobre essa matéria. Outros exemplos de investigações semióticas encontram-se também em pensadores medievais, renascentistas e modernos24. Na filosofia portuguesa mereceriam atenção particular as Summulae Logicales de Pedro Hispano, o Tratactus de Signis de João de São Tomás e as Institutiones Dialecticae de Pedro da Fonseca.
Se a temática semiótica é tão antiga como o pensamento filosófico e se ao longo dos séculos ela tem sido investigada por vezes com bastante profundidade, então é com certeza pertinente a questão sobre a justeza da reivindicação, atrás referida, do estabelecimento contemporâneo da semiótica enquanto ciência. Constituem os estudos semióticos no século XX mais do que uma continuação dos estudos efectuados nos séculos passados? Onde e em quê reside a novidade que legitima a fundação da semiótica qua ciência no século XX?
São dois os factores que, a meu ver, demarcam os estudos semióticos contemporâneos face aos antigos e, simultaneamente, instituem a semiótica como ciência. O primeiro factor é a definição do lugar dos estudos semióticos no contexto dos estudos científicos: a semiótica é enquadrada epistemologicamente. Anteriormente as investigações semióticas integravam-se em contextos tão diversos como os da teoria do conhecimento, da lógica, da ontologia, da estética ou da teologia. Não tinham uma autonomia científica. Ora o que caracteriza, por exemplo, a fundação saussureana da semiologia é, antes de mais, o estabelecimento exacto da mesma no conjunto das ciências. A semiologia é a ciência geral dos signos que se integraria na psicologia social e, consequentemente, na psicologia geral; na semiologia integrar-se-ia por sua vez a linguística enquanto ciência específica dos signos linguísticos. A semiologia fica assim delimitada a montante e a jusante na árvore das ciências. O facto de o enquadramento psicológico da semiologia por Saussure não colher, nem tão pouco nas suas próprias investigações linguísticas, não constitui uma objecção à novidade que representa esse enquadramento epistemológico. A mesma preocupação de fixar epistemologicamente a semiótica encontra-se na escola americana. Ao encarar a semiótica como ciência do signos, Peirce concebe-a como a ciência geral que, à maneira da mathesis universalis leibniziana, engloba todas as outras ciências25. A semiótica é uma fisiologia das formas constitutivas de todo o pensamento que procura sobretudo elaborar enquanto gramática especulativa uma teoria fenomenológica dos signos26. Também Morris, ao estabelecer em 1938 os fundamentos de uma teoria dos signos, tem como preocupação primeira, demarcar o lugar da semiótica no conjunto das ciências. Aliás o já referido trabalho de Morris constitui o segundo subsídio para a Enciclopédia da Ciência Unificada27. Morris determina logo nas primeiras páginas o lugar da semiótica: "A semiótica tem uma dupla relação com as ciências: ela é simultaneamente uma ciência entre as ciências e um instrumento das ciências.(...) é uma ciência coordenada com as outras ciências, estudando as coisas ou as propriedades das coisas na sua função de servir se signos e é também o instrumento de todas as ciências, na medida em que cada ciência faz uso e exprime os seus resultados em termos de signos28" . Na esteira de Peirce, Morris apresenta, assim, a semiótica enquanto ciência geral dos signos como organon da meta-ciência (a ciência da ciência) "na medida em que cada ciência faz uso e exprime os seus resultados em termos de signos". Morris serve-se da argu-mentação de Carnap exposta em "Empirismo Científico", que constituíra o 1º volume da Enciclopédia, para fundamentar a reivindicação da semiótica a organon da ciência. Carnap argumentara ser possível incluir sem excepção o estudo da ciência no estudo da linguagem da ciência dado o estudo dessa linguagem implicar não só o estudo da sua estrutura formal (sintaxe), mas também a sua relação com os objectos designados (semântica) e com as pessoas que a fazem. Morris acrescenta então que "um estudo da linguagem da ciência tem de usar signos referindo-se a signos e que cabe à semiótica fornecer os signos relevantes e os princípios para levar a cabo esse estudo. A semiótica fornece uma linguagem geral aplicável a qualquer espécie de linguagem ou signo, e, assim, é aplicável à linguagem da ciência e aos signos específicos que são usados na ciência29". É aliás nesta senda da compreensão da semiótica como verdadeira ciência primeira (a prima philosophia cartesiana), que Morris remete muitas das problemáticas filosófico-epistemológicas para a semiótica30. Morris vai mesmo ao ponto de reduzir a lógica, a matemática e a linguística à semiótica. O lugar da semiótica no conjunto das ciências é, assim, claramente o primeiro, no sentido aristotélico ou cartesiano de primeira ciência.
O outro factor importante na instituição contemporânea da semiótica foi indubitavelmente a sua sistematização. Hoje a semiótica como qualquer ciência estabelecida subdivide-se em disciplinas. A divisão mais corrente é justamente a avançada por Morris: sintaxe, semântica e pragmática. Se, por um lado, estas subdisciplinas tendem cada vez mais a autonomizar-se e mesmo a entrar pelos campos das disciplinas vizinhas, mostrando a fluidez das fronteiras científicas, por outro, nunca as relações entre os diferentes campos semióticos foram cientificamente tratadas como acontece hoje. Os séculos passados forneceram excelentes análises sintácticas e semânticas, mas só no século XX as relações entre os campos sintáctico e semântico foram cientificamente tematizadas. Quanto ao campo pragmático, ainda que de certo modo tematizado na retórica clássica, só no nosso tempo viu reconhecida a sua crucial importância para toda a semiótica.
A sistematização da semiótica enquanto acto científico é acompanhada obviamente por uma compendiação escolar da mesma. Os manuais de semiótica, as obras de introdução, multiplicam-se. A semiótica estabeleceu-se definitivamente como disciplina curricular de diversos cursos superiores. Esta é a imagem mais visível da sistematização da semiótica e que, last but not least, a justifica como ciência do século XX, apesar da sua tradição milenar31.

2. Semiótica e semiologia: Dois nomes para duas tradições.
Não raros são os autores que identificam objectivamente semiótica e semiologia32. Oriundos do mesmo étimo grego semeion, os dois termos, o primeiro mais utilizado pelos anglo-saxónicos e o segundo pelos europeus, sobretudo pela escola francesa, designam a ciência dos signos. No entanto, autores há que vislumbram na diferença terminológica diferenças objectivas. As diferenças entre semiologia e semiótica têm sido tematizadas sobretudo no confronto entre os respectivos fundadores contemporâneos: Saussure e Peirce. Prado Coelho33 faz uma síntese dessas diferenças. A primeira reside logo no ponto de partida. "Saussure parte do acto sémico entendido como facto social que estabelece, através do circuito da fala, uma relação entre dois indivíduos. Peirce, por seu lado, parte da ideia da semiosis concebida como uma lógica do funcionamento do signo cuja compreensão apenas exige a intervenção de uma personagem: o intérprete34." Associada à diferença do ponto de partida está a diferença relativamente aos limites das respectivas ciências dos signos. Ao partir do facto social Saussure enquadra a semiologia dentro de uma psicologia social. "Isto significa, em primeiro lugar, que a semiótica saussureana tem limites, e, depois, que existem objectos exteriores à semiótica, isto é, não semiotizáveis. (...) A perspectiva de Peirce é outra: tudo é integrável no espaço ilimitado da semiosis; donde, a semiótica peirceana não tem limites35." A terceira diferença, e talvez a mais importante, reside nas diferentes concepções de signo. "Saussure concebe o signo como uma entidade psíquica com duas faces, em que significante e significado se condicionam mutuamente. Em Peirce, o signo é fundamentalmente um processo de mediação, e abre, portanto, para uma dimensão de infinitude36."
Com efeito, é a diferente concepção de signo que, segundo Jeanne Martinet 37, distingue a semiótica americana da semiologia europeia. A semiótica americana tende a ver apenas no signo uma identidade de face única, ao passo que a semiologia estuda os sistemas de unidades de duas faces. Na esteira de Saussure, os semiólogos europeus entendem por signo a entidade significante/significado, em que qualquer significante por mais complexo ou mediato que seja tem sempre como correlato último um significado. Em contrapartida, os semióticos americanos concebem o signo apenas como significante que remete sempre para um outro significante numa cadeia sígnica interminável.
Há inegavelmente diferenças entre a semiologia enquanto tradição da semiótica europeia contemporânea e a semiótica enquanto tradição da semiótica anglo-saxónica contemporânea38. Umberto Eco fala mesmo de teóricos da primeira geração e teóricos da segunda geração . "Os teóricos da primeira geração partem de Saussure e defendem uma linguística da frase e do código. Os teóricos da segunda geração39 partem de Peirce e caracterizam-se pela capacidade de articularem um estudo da língua como sistema estruturado que precede as actualizações discursivas e um estudo dos discursos e dos textos como produtos de uma língua já falada 40 " .
As diferenças objectivas entre semiologia e semiótica assentam em duas tradições diferentes: a tradição linguística e a tradição filosófica. Esta é a posição defendida por Jürgen Trabant 41. Enquanto os trabalhos 'semiológicos' que se inserem na tradição de Saussure consistem numa aplicação analógica dos processos e princípios da Linguística a outros domínios da cultura42, a semiótica filosófica praticada pelos anglo-saxónicos, ao estudar o papel da linguagem no conhecimento – e, em consequência, ao abordar o problema de uma linguagem das ciências –, visa sobretudo elaborar uma teoria geral da linguagem enquanto parte integrante de uma teoria do conhecimento.
Ao carácter empírico da investigação semiológica, opõe-se o formalismo analítico da teoria semiótica.
As tradições diferentes da semiótica não põem todavia em causa a sua unidade. Não existe uma semiologia a par de uma semiótica. Com contributos importantes e decisivos, nomeadamente os provenientes da filosofia de Wittgenstein e da teoria dos actos de fala, a semiótica filosófica influenciou determinantemente a linguística e tem vindo a afirmar-se como o paradigma semiótico. À generalização efectiva do termo semiótica corresponde também a absorção da semiologia linguística pela semiótica filosófica. De qualquer modo, é necessário que a semiótica contemporânea tenha sempre presente a sua dupla origem: a lógico-filosófica e a linguística.
 

 

1 Ferdinand de Saussure, Curso de Linguística Geral, Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1986, p. 44.
2 Roland Barthes, Mitologias, Lisboa: Edições 70, 1988, p. 183.
3 Georges Mounin, Introduction à la Sémiologie, Paris: Éditions de Minuit, 1970, pp. 11-15.
4 Eric Buyssens, Semiologia e Comunicação Linguística, São Paulo: Editora Cultrix, s.d.
5 Luis Prieto, Mensagens e Sinais, São Paulo: Editora Cultrix, 1973 (1966).
6 Ibidem, p. 22-23.
7 Charles Sanders Peirce, Semiótica, São Paulo: Editora Perspectiva, 1977, p. 45, "Em seu sentido geral, a lógica é, como acredito ter mostrado, apenas um outro nome para semiótica, a quase-necessária, ou formal, doutrina dos signos."
8 Cf Adriano Duarte Rodrigues, Introdução à Semiótica, Lisboa: Presença, 1991, p. 76.
9 Cf Joseph Brent, Charles Sanders Peirce. A Life, Bloomington : Indiana University Press, pp. 322-326.
10 Charles Morris, Foundations of the Theory of Signs, The University of Chicago Press, 1970 (1938).
11 Pierre Guiraud, A Semiologia, Lisboa: Presença, p. 9.
12 Jürgen Trabant, Elementos de Semiótica, Lisboa: Presença, 1980 (1976), p. 10.
13 Ernst Cassirer, Philosophie der symbolischen Formen, I Vol. Die Sprache, Darmstadt: Wissenschaftliche Buchgesellschaft, 1988 (1923), p. 55. "Die philosophische Frage nach dem Ursprung und dem Wesen der Sprache ist im Grunde so alt, wie die Frage nach dem Wesen und Ursprung des Seins." Sobre esta questão cifrar todo o 1º cap. "Das Sprachproblem in der Geschichte der Philosophie".
14 Platon, Cratyle, Paris: Les Belles Lettres, 1969.
15 Cassirer, ibidem, "Im Aufbau und im Stufengang des dialektischen Wissens behält das Wort einen ihm eigentümlichen Platz und Wert. Die fließenden Grenzen, die jederzeit bloß relative Festigkeit des Wortgehaltes wird für den Dialektiker zum Ansporn, um sich, im Gegensatz und im Kampf mit ihm, zur Forderung der absoluten Festigkeit des Bedeutungsgehalts der reinen Begriffe zu erheben." p. 62
16 Platão, Cartas, Lisboa: Estampa, 1980, pp. 74-79.
17 Cassirer, ibidem, "Das Wissen vom Gegenstand und dieser selbst erscheint demnach ebensowohl als etwas, was diese drei Stufen überschreitet, wie als etwas, was sie in sich befaßt – als deren Transzendenz und deren Synthese." pp .63-64.
18 Tzvetan Todorov, Teorias do Símbolo, Lisboa: Edições 70, 1979 (1977).
19 Todorov, ibidem p.18. Sobre a influência da doutrina sígnica dos estóicos sobre Sto Agostinho veja-se Tilman Borsche, "Zeichentheorie im Übergang von den Stoikern zu Augustin" in Allgemeine Zeitschrift für Philosophie 19/2, 1994, pp. 41-52.
20 Todorov, ibidem, veja-se o capítulo "A síntese augustiniana" pp. 33-54.
21 A exposição mais importante da teoria estóica é a de Sextus Empiricus: " Os estóicos dizem que há três coisas ligadas: o signifi-cado, o significante e o objecto. Destas coisas, o significante é o som, por exemplo 'Dion'; o significado é a própria coisa que é revelada e que nós entendemos como subsistindo em dependência do nosso pensamento, mas que os bárbaros não compreendem, embora sejam capazes de ouvir a palavra pronunciada; enquanto o objecto é o que existe no exterior: por exemplo, Dion em pessoa. Duas destas coisas são corpóreas: o som e o objecto, e a outra é incorpórea, é a entidade que é significada, o dizível, que é verdadeiro ou falso." (Contra os Matemáticos, VIII, 11-12) citado em Todorov, ibidem, p. 18.
22 Todorov, ibidem, p. 35.
23 "Dizível será vivido tanto por aquele que fala como por aquele que ouve. Dictio, pelo contrário, é um sentido que funciona, não entre os interlocutores, mas entre o som e a coisa; é aquilo que a plavra significa, independentemente de quem a usa." Todorov, ibidem.
24 Não faltam obras recentes a reduzir a semiótica contemporânea a simples repetições de teorias simbólicas medievais e renacentistas. Assim, por exemplo, John Deely, Introducing Semiotics, Bloomington: Indiana University Press, 1982, (traduzido em português, Introdução à Semiótica, Fundação Calouste Gulbenkian, 1995) que, no dizer de Helmut Pape, Einleitung in Charles Peirce Semiotische Schriften, Frankfurt: Suhrkamp, 1986, acaba por afirmar que tudo aquilo que a semiótica moderna procura já se encontra no filósofo renascentista John Poinsot (o português João de São Tomás!), desboberto por ele próprio Deely.
25 Veja-se a passagem frequentemente citada de uma carta de Peirce a Lady Welby em que lhe afirma que desde que teve, por volta dos doze ou treze anos, o primeiro contacto com a lógica "nunca mais foi capaz de estudar o quer que fosse – matemática, moral, metafísica, gravitação, termodinâmica, fonética, economia, história das ciências, homens e mulheres, vinho, metrologia – senão como estudo de semiótica". (carta de Dezembro de 1908, Semiotic and Significs. The Correspondence between Charles S.Peirce and Victoria Lady Welby, Bloomington: Indiana University Press, 1977, pp. 85-86.
26 Veja-se o texto de 1903 "Syllabus of Certain Topics of Logic", que constitui o manuscrito mais extenso sobre a temática e cujo primeiro capítulo trata do esboço de uma classificação das ciências. O texto integral encontrava-se até há pouco tempo publicado apenas em alemão, Phänomen und Logik der Zeichen, Frankfurt; Suhrkamp, 1993, pp.39-44.
27 O título completo no original é Foundations of the Unity of Science. Toward an International Encyclopedia of Unified Science, Chicago: The University of Chicago Press.
28ibidem, p.2.
29 ibidem, p.3. É bem patente aqui a concepção da semiótica como mathesis universalis. Significativamente, Morris inicia o seu trabalho com uma citação de Leibniz: "nemo autem vereri debet ne cahracterum contemplatio nos a rebus abducat, imo contra ad intima rerum ducet".
30 "Doutrinas tão veneráveis como a das categorias, a dos trans-cendentais, e a dos predicáveis são incursões primitivas nos domínios semióticos e deveriam ser clarificados pelos desenvol-vi-mentos posteriores. Vale a pena recuperar e interpretar as controvérsias helenísticas sobre os signos de advertência e os indicativos, e as teroias medievais da intenção, imposição e suposição. A história da linguística, retórica, lógica, empirismo, e ciências experimentais fornecem um rico material suplementar." ibidem, p. 55.
31 Esta tradição é reconhecida pelo próprio Morris ao lançar os fundamentos da semiótica enquanto ciência: "A semiótica tem uma longa tradição, e à semelhança de todas as outras ciências deveria manter viva a sua história." ibidem, p. 55
32 Por exemplo, Naves, La Semiologia, Madrid: Editorial Sintesis, 1989, p.7, Guiraud, ibidem, p.9.,
33 Eduardo Prado Coelho, Os Universos da Crítica, Lisboa: Edições 70, 1987, pp. 501-505.
34 ibidem, p. 502.
35 ibidem, p. 503.
36 ibidem, p. 503.
37 Jeanne Martinet, Chaves para a Semiologia, Lisboa: D.Quixote, 1983 (1974), p.159-160.
38 Cf Adriano Duarte Rodrigues, Introdução à Semiótica, Lisboa: Presença, 1991, capítulos 4 e 9.
39 Umberto Eco, Lector in fabula, Lumen: Barcelona, 1981, citado por Prado Coelho, ibidem, p. 502.
40 Prado Coelho, ibidem.
41 "Os trabalhos que consideramos actualmente integrados no campo da Semiótica relevam de duas tradições científicas diferentes. A primeira é a Filosofia: desde os tempos de Platão e Aristóteles, passando pelos estóicos, por Sto Agostinho, pela escolástica, por Locke, Leibniz, Wolff, Lambert, Hegel, Bolzano, e até aos nossos dias, com Frege, Wittgenstein, Husserl, Carnap e Morris – para citar apenas alguns nomes – que a reflexão filosófica incide sobre os signos – e, especialmente sobre os signos linguísticos.
 A outra origem da Semiótica é a Linguística europeia moderna, que, como todas as disciplinas científicas actuais, tem as suas raízes na filosofia, mas se tornou mais ou menos independente da Semiótica filosófica devido à acção do fundador da Linguística europeia moderna; Ferdinand de Saussure, e, com os trabalhos de Jakobson, Trubetzkoy e Hjelmslev, abriu caminho a diversos ramos de investigação semiótica." Jürgen Trabant, ibidem, pp. 13-14.
42 Ver Brent, ibidem, p. 326.