Identidades culturais na pós-modernidade.
Um estudo da cultura de massa através do grupo Casaca.

Sérgio Salustiano da Silva1


Índice

Introdução

O objetivo desta pesquisa é estudar a influência da indústria cultural na desconstrução da identidade do homem pós-moderno, pela cultura de massas. Mesmo sendo um assunto complexo conforme argumenta Alain Hesrcovici:

``... não é possível falar, objetivamente, em identidade cultural numa coletividade dividida em classes sociais, seja ela local ou nacional. A cultura não pode ser concebida como um processo social homogeneizador que permitiria abranger a totalidade da coletividade; o jogo de exclusão não permite definir elementos simbólicos comuns à totalidade dos membros da sociedade''. (HESRCOVICI, 2001,14)

Entretanto, apesar de estudiosos como Hesrcovici não aceitarem que se possa ter objetividade quando o assunto é falar da crise de identidade cultural do homem pós-moderno, devido às barreiras sociais existentes em cada nação, deve-se levar em conta que, apesar de qualquer diferença social que possa existir, a indústria cultural trabalha exatamente para derrubá-las, pois ela usa de meios para convencer o homem de que ele pode se tornar um olimpiano2, se conseguir atingir o mesmo ``level''3, que os membros das classes mais abastadas da sociedade.

Nesta reformulação de valores proposta pela indústria cultural, as culturas de massas e os símbolos antes restritos somente aos guetos são reintroduzidos na sociedade com novos apelos para o consumo da massa. Ao transformar esses símbolos, ela oferece aos seus antigos detentores a oportunidade de inserir-se no mundo globalizado.

Mas, apesar da revalorização dos seus símbolos e por conseqüência, de sua cultura, o homem pós-moderno não se reconhece mais nesta atual identidade, que esta sendo oferecida pela sociedade contemporânea, pois ele vive os conflitos de ter sua identidade fragmentada, desde do seu nascimento até sua morte. E para tentar reverter essa situação, ele busca, mesmo inconscientemente seus antigos valores culturais, em uma tentativa de firmar o seu ``EU'' social e satisfazer suas necessidades pessoais.

Esse fato, segundo Edgar Morin, acaba por quebrar as tradições do homem pois, para ele, ``a cultura de massa integra e se integra ao mesmo tempo numa realidade policultural'' (MORIN, 2000, 16), que transforma as antigas identidades homogêneas em híbridos culturais4. E, o homem ao tentar buscar no seu passado símbolos para respaldar sua identidade presente e futura, acaba por criar uma nova cultura sob a bênção da indústria cultural.

Assim, nesta pesquisa pretende-se analisar a forma como a globalização, depois de atingir a identidade cultural de uma nação, passa a influenciar diretamente na identidade particular do homem pós-moderno, pois a cada dia é mais crucial poder entender esse movimento que pode ser analisado de dentro para fora e vice-versa, mas que sempre estará afetando diretamente a construção e o desenvolvimento das identidades locais, pois o indivíduo, partindo do pressuposto por Stuart Hall, sendo um sujeito detentor de uma identidade fragmentada, é capaz de modificar toda a estrutura social tanto do seu espaço local quanto do espaço global.

Embora vários estudiosos da pós-modernidade afirmarem que o homem está lutando para reverter a atual crise pela qual ele está passando, onde ele busca simultaneamente sua identidade local enquanto é obrigado a viver como um homem global. Mas, ainda não descobriu como criar mecanismos para proteger sua cultura local ao mesmo tempo que ele estará sendo oferecida para uma sociedade transnacional.

Dentro deste estudo, que pretende abordar de forma limitadora, pois aborda a crise da identidade do homem pós-moderno, através da ótica de um grupo musical5, pretende-se analisar as influências da sociedade global perante as identidades locais, na sua perda de referencial e aquisição de novos valores.

A banda Casaca, que iniciou sua carreira com fortes apelos da cultura local do Estado do Espírito Santo, conseguiu despertar o interesse não somente dos capixabas, mas também de uma gravadora multinacional, a Sony Music, que através da banda usou os elementos antes restritos as festas religiosas da Barra do Jucu, para transformá-los e inseri-los na sociedade global. Com isso, apesar da banda ter criado um sentimento de reintrodução e revalorização de um símbolo - o congo - que sempre esteve à disposição de todo o Estado, acabou perdendo sua identidade local, que foi transformada pela indústria cultural, para ser reintroduzida na cultura de massa.

Esse fator deve ser analisado não somente devido ao movimento pendular das identidades locais confrontando-se com as globais. E também de forma mais aprofundada, ou seja: de como este movimento poderá estar sendo útil para a introdução da cultura capixaba no mundo globalizado. E para o reconhecimento dos capixabas na sua cultura antes relegada apenas à periferia. Outro ponto importante a salientar é que apesar de aparentar ser apenas um problema regional, estamos tratando de um símbolo de uma cultura, que ao mesmo tempo que está sendo perdido está sendo reintroduzido na indústria cultural.

Adorno previu que na indústria cultural:

``Tudo é percebido do ponto de vista da possibilidade de servir para outra coisa, por mais vaga que seja a percepção dessa coisa. Tudo só tem valor na medida em que se pode trocá-lo, não na medida em que é algo em si mesmo.'' (HORKHEIMER, ADORNO, 1985, 148)

Desta forma, postulamos que, a cultura local somente teria validade para a indústria cultural se, de alguma forma, ela pudesse ser reformulada e reintroduzida na sociedade contemporânea. Assim, para o capixaba, apesar do congo estar sendo apenas mais um produto para o seu consumo, ele passaria a adotá-lo como um símbolo de sua identidade. Esse fato é legitimado pelo fato do sujeito não ter uma identidade fixa e, procurar em símbolos valorizados pela cultura de massa, indícios de suas raízes culturais. Conforme afirma Stuart Hall, a atual crise de identidade acontece devido à estar em estado de constante mutação:

``Uma vez que a identidade muda de acordo com a forma como o sujeito é interpelado ou representado, a identificação não é automática, mas pode ser ganhada ou perdida.'' (HALL, 1998, 21)

Assim, através de dados coletados nos dois principais jornais impressos do Estado, procuramos reunir informações para fundamentar nossa análise. Procuramos verificar como foi a abertura dada à banda entre o período em que ela ainda era um grupo local até chegar ao ápice, que foi ao assinar contrato com uma gravadora multinacional. Essa banda, na nossa concepção tornou-se um olimpiano, atingido as grandes massas globais. Contatamos também, com a análise dos jornais que a própria mídia impressa influenciou na desconstrução dessa identidade local.

Vamos realizar nossa análise, observando os títulos e as fotos que foram publicadas para atrair o grande público para a descoberta desta nova ``boy-band'', tipicamente brasileira e originalmente capixaba. Em um jornal impresso os primeiros apelos são os estéticos, no caso das fotos e títulos pode-se comprovar que na maioria das vezes as reportagens tentavam remeter a um sentimento de pertencimento ao local. Em uma delas6 percebe-se o vocalista da banda aparecendo enrolado na bandeira do Estado em uma nítida alusão ao sentimento de pertencimento à sua territorialidade.

A fundamentação teórica desta pesquisa é baseada na teoria culturológica proposta por Edgar Morin, que analisa as conseqüências sociais da introdução dos símbolos produzidos pela indústria cultural, na atual sociedade de massa, consumidora de bens que supostamente trarão a felicidade ou sua identidade. Nessa teoria constata-se a questão da sociedade contemporânea, que encontra-se com sua identidade em estado de redescobrimento. E para esse descobrimento usa da indústria cultural, via cultura de massa, para adquirir os símbolos que vão legitimar sua atual identidade heterogênea e fragmentada.

Assim, essa teoria poderá oferecer subsídios para comprovar o fato de que o homem pós-moderno busca novas formas de representação para sua identidade, mesmo tendo noção que não conseguirá resgatar os símbolos de sua cultura original.

O fundamento desta teoria é a tentativa de homogeneização de culturas diferenciadas, pois o homem pós-moderno vive a eterna procura da felicidade. Mauro Wolf ao citar Morin, argumenta que, a cultura de massa conceitua esse momento vivido entre estes dois pólos como complementares, apesar de tão diferentes:

``A cultura de massa é uma moderna religião de salvação terrena que contém em si as potencialidades e os limites do seu próprio desenvolvimento: por um lado, aponta o caminho que, necessariamente, toda a sociedade de consumo seguira mas, por outro lado, é vulnerável a todos os movimentos colectivos que são portadores de exigências metaindividuais e espirituais.'' (WOLF, 1997, 93)

Essa vulnerabilidade da sociedade global é o principal problema vivenciado, atualmente, pelo homem pós-moderno, que procura formas de viver em um mundo em constante mutação, ao mesmo tempo em que busca a satisfação na sociedade contemporânea.

Em vista disto, surge, portanto, a necessidade da discussão sobre como a sociedade, apesar de estar em constante mutação e adaptação, principalmente tendo em vista a globalização, aceita a criação de identidades partilhadas. Segundo Wolf, para além das diferenciações (de prestígio, hierarquia, convenções, etc.) delineia-se um campo comum, uma identidade dos valores de consumo, que são essenciais para suprir as necessidades privadas do homem pós-moderno, e desta forma moldá-lo para que aceite as novas identidades globais.

E a indústria cultural trabalha para fortalecer esse sentimento hedonista, em que o homem busca seus prazeres através do consumo, - pois na cultura de massa a sociedade globalizada é definida por Edgar Morin como ``a identidade dos valores de consumo, e são esses valores comuns que veiculam os mass media...'' (MORIN, 2000, 42) -. Os indivíduos que se encerram nesta sociedade acabam por aceitar suas limitações diante da imposição de novas formas de representação de suas tradições. E conforme afirma Adorno, ``mesmo quando o público se rebele contra a Indústria Cultural, essa rebelião é o resultado lógico do desamparo para o qual ela própria o educou.'' (HORKHEIMER, ADORNO, 1985, 135)

Outro ponto determinante para a fundamentação desta pesquisa, é o estudo das identidades do homem pós-moderno, pois como afirma Stuart Hall:

``O próprio conceito (...) ``identidade, é demasiadamente complexo, muito pouco desenvolvido e muito pouco compreendido na ciência social contemporânea para ser definitivamente posto à prova.'' (HALL, 1998, 8)

Mas apesar de haver essa reticência ao se falar na identidade, principalmente por ser ela uma forma subjetiva de expressão de uma cultura. O fato é que por meio da globalização o homem tornou-se um sujeito de identidades provisórias e instáveis, não somente pelo fato de ela buscar a quebra de barreiras nacionais, criando um grande continente global e sem fronteiras, mas porque ela trabalha, segundo analisa Adorno e Horkheimer, com a base de que ``... o indivíduo (...) só é tolerado na medida em que sua identidade incondicional com o universal está fora de questão.'' (HORKHEIMER, ADORNO, 1985, 144).

Esse é o grande ponto pelo qual vários países levantam suas barreiras contra uma tentativa de penetração do global. No Brasil, como em diversas outras nações, a Constituição Federal de 1988 previa no seu artigo 216 que:

``Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedades brasileira...''

Desta forma, o país não buscava apenas proteger a memória dos seus antepassados formadores da cultura brasileira, mas pretendia criar mecanismos que moldassem a forma como a globalização, já prevista naquela época como uma grande de dizimar as culturas, engolisse a identidade brasileira e/ ou regional .

Essa forma de tentar proteger a cultura nacional vai de encontro ao pensamento de Renato Ortiz, que imaginava que a ``globalização evitaria também uma certa ilusão pós-moderna, como se o mundo fosse composto por um conjunto de átomos sociais desconexos'' (ORTIZ, 1996, 56). Sendo que uma das principais características da globalização na sociedade é trabalhar o homem como um ser único, ela despreza o conjunto, que caracterizava a sociedade moderna.

E a indústria cultural trabalha exatamente neste contexto, conforme o próprio Renato Ortiz afirma que:

``...os publicitários e os executivos do marketing global sabem disso perfeitamente. Eles não pretendem vender seus produtos para todas as pessoas do planeta; interessa-lhes conquistar segmentos mundializados de consumo. Tudo é uma questão de grau, uma variável dependente do público-alvo.'' (ORTIZ, 1996, 123)

O que faz com que a indústria cultural trabalhe desta forma é o fato de que o sujeito pós-moderno é um indivíduo que teve sua identidade e referências fragmentadas, e não lhe foram oferecidos novas perspectivas, portanto, ele teve que aceitar as identidades coletivas, mas não abandonando sua individualidade e sua busca pela cultura local.

Essa busca por uma identidade fluída é o que norteia seus passos e o coloca em crise, e o faz não aceitar por completo as identidades globais, pois ele ao mesmo tempo que quer inserir-se no mundo moderno, ele vive preso ao seu passado.

Esse problema da existência e crise das identidades é reforçado nesta pesquisa pelo fato de, ao iniciar o estudo para a realização deste trabalho, poder-se constatar que as transformações ocorridas na sociedade contemporânea estão intrinsecamente ligados ao fortalecimento das identidades nacionais, pois segundo argumenta Hall:

``as identidades nacionais permanecem fortes, especialmente com respeito a coisas como direitos legais e de cidadania, mas as identidades locais, regionais e comunitárias têm se tornado mais importantes.'' (HALL, 1998, 73)

E a questão do quanto a indústria cultural fortalece a crise das identidades locais ao usar de seus símbolos é um dos principais problemas levantados para que se possa chegar ao verdadeiro problema, que é a desconstrução da identidade do homem pós-moderno, que através da cultura de massa busca o seu referencial para poder viver na sociedade. Stuart Hall menciona que ``... ao invés de pensar no global como substituindo o local, seria mais acurado pensar numa nova articulação entre o global e o local.'' (HALL, 1998, 77). Mas para o cientista social Antônio Firmino Costa, o que acontece é que:

"... a medida que os atuais processos de globalização se intensificam com poderosas dinâmicas de interligação do mundo, a manifestação de identidades culturais diferenciadas, em vez de desintegrarem-se, tendem a proliferar-se ou acentuar-se" (Edição eletrônica do JBCC, 2001).

Apesar de ambos terem posições contrárias quanto a globalização, no contexto geral, eles concordam que ela (a globalização) acaba por produzir uma nova interação entre o global e o local. Entretanto quando aceitamos que passará a existir uma nova interação entre ambos, também deveremos aceitar como certa a aniquilação das identidades locais, pois por mais que elas sejam reformuladas, e reinseridas na sociedade, elas passarão a ser uma identidade globalizada, que foi adotada pelo meio local, na qual se inseriu. E o congo, que tinha suas características únicas e exclusivas, se perderá pois a sociedade não terá conhecido o som dos tambores e muito menos saberá suas origens. Esta sociedade conhecerá o que a indústria cultural ensinou e mostrou para ela. O que, através dos mass media, ela viu e ouviu. As tradições que deveriam passar de pai para filho, já não existirão mais, pois esse conhecimento será transmitido pela mídia.

Desta forma quando Hall afirma que: ``Há, juntamente com o impacto do global, um novo interesse pelo local''. (HALL, 1998, 77), e esse interesse é despertado devido à cultura de massa ter transfigurado os símbolos de diversas culturas em mercadorias, ``...essas novas mercadorias são as mais humanas de todas, pois vendem a varejo os ectoplasmas de humanidade...'' (MORIN, 2000, 14). Desta forma não haveria uma transformação do velho em novo, e muito menos uma crise de identidade, pois a cultura de massa continuaria sendo:

``... uma moderna religião de salvação terrena que contém em si as potencialidades e os limites do seu próprio desenvolvimento: por um lado, a ponto o caminho que, necessariamente, toda a sociedade de consumo seguirá mas, por outro lado, é vulnerável a todos os movimentos colectivos que são portadores de exigências metaindividuais e espirituais.'' (WOLF, 1997, 93)

Essa definição da cultura de massa apontado por Mauro Wolf é vista por Adorno e Horkheimer como :

``... técnica da indústria cultural levou apenas à padronização e à produção em série, sacrificando o que fazia a diferença entre a lógica da obra e a do sistema social.'' (HORKHEIMER, ADORNO, 1985, 114)

Os argumentos de ambos os teóricos somente servem para afirmar que a crise de identidade existente na atual sociedade contemporânea globalizada, realmente existe, e o pensamento de ambos se complementam, pois ao mesmo tempo em que ela é uma religião de salvação, segundo Wolf, ela padroniza as identidades locais, conforme afirma Adorno.

Desta forma, a heterogeneidade do homem pós-moderno, leva a acreditar que ainda é impossível prever as conseqüências da influência da cultura de massas na atual sociedade contemporânea, somente pode-se ter a certeza de que as atuais identidades estão em constate mutação e o principal agente motivador dessa transformação é a indústria cultural.

Identidades do homem pós-moderno

O homem, neste início de século, busca uma forma de identificar-se na sociedade em que vive. Os principais problemas para que isso aconteça são as várias transformações que sua identidade cultural sofreu ao longo dos anos. Hoje, o homem é um ser com uma identidade híbrida e vive sob o signo da pós-modernidade.

``O sujeito pós-moderno, conceptualizado não tem uma identidade fixa, essencial ou permanente. A identidade torna-se uma ``celebração móvel'': formada e transformada continuamente em relação às formas pelas quais somos representados ou interpelados nos sistemas culturais que nos rodeiam.'' (HALL, 1998, 12, 13)

Essa problemática da falta de identidade acontece, principalmente, pelo fato do indivíduo não poder viver mais na sociedade como um ser pleno, como na concepção dos iluministas, unificado desde o seu nascimento a até a sua morte, ou como um sujeito sociológico, possuidor de uma essência que o identificaria no mundo, mas que poderia ser modificada quando em contato com o mundo exterior. Atualmente ele vive um novo estágio de identificação, sendo um sujeito pós-moderno, sem identidade fixa, nascido da diversidade de culturas do mundo globalizado, tendo sua identidade construída e reconstruída permanentemente ao longo de sua existência.

``As velhas identidades, que por tanto tempo estabilizaram o mundo social, estão em declínio, fazendo surgir novas identidades e fragmentando o indivíduo moderno. A assim chamada ``crise de identidade'' é vista como parte de um processo mais amplo de mudança, que está deslocando as estruturas e processos centrais das sociedades modernas e abalando os quadros de referência que davam aos indivíduos uma ancoragem estável no mundo social.'' (HALL, 1998, 7)

Nessa nova sociedade o homem não faz mais parte de um organismo uno, ele é projetado de forma fragmentada, transformando-se em um híbrido cultural, e sendo obrigando a assumir várias identidades, dentro de um ambiente que é totalmente provisório e variável, estando sujeito a formações e transformações contínuas em relação às formas em que os sistemas culturais o condicionam.

O principal meio que condiciona essa nova identidade do homem pós-moderno, na nossa avaliação, é a indústria cultural que, por meio da disseminação de símbolos antes restritos a determinadas localidades, os massifica e os transforma em mercadoria de fácil assimilação e absorção pela grande massa.

Assim, a identidade deixa de ser formada pela interação entre o ``eu e a sociedade'', conforme afirma Stuart Hall (HALL, 1998, 11), passando a ser formada pelas ``supostas'' necessidades do homem, influenciado pela indústria cultural. Mas ao mesmo tempo que ele aceita usar destes símbolos da cultura de massa, ele busca a valorização de sua identidade regional, tentado fazer com que ela possa coexistir junto com as várias identidades globais ofertadas pela indústria cultural.

``As culturas nacionais, ao produzir sentidos sobre ``a nação'', sentidos com os quais podemos nos identificar, constróem identidades. Esses sentidos estão contidos nas estórias que são contadas sobre a nação, memórias que conectam seus presente com seu passado e imagens que dela são construídas''. (HALL, 1998, 51)

A nação pode ser considerada outro grande problema de identificação do homem pós-moderno, pois ele não tem em si um conceito formado sobre o que ele representa no seu Estado. O hedonismo provocado pela sociedade contemporânea o faz sentir-se um cidadão global, com necessidades regionais. Ele não cresce mais ouvindo estórias sobre os grandes heróis de seu povo. Cresce ouvindo as grandes aventuras da televisão, que não tem como objetivo centrá-lo na sua região, e sim o de abrir novas portas para que ele queira e possa se integrar à aldeia global.

A integração do homem pós-moderno, sujeito fragmentado que busca referências através dos mídias para formar sua identidade, acaba por acontecer de dentro para fora. Ele - o homem pós-moderno - busca na heteronomia da sociedade global as formas de poder estar se resocializando neste novo mundo.

A Identidade Capixaba

A identidade capixaba teve início com o processo de colonização portuguesa do Brasil, em 15357. Mas, apesar dos portugueses terem sido o os primeiros a começar o processo de identificação, sua influência não conseguiu ser total, pois a cultura portuguesa foi misturada com a indígena, africana, francesa, espanhola, e tantas outras que juntas formaram o que hoje pode-se definir como um identidade cultural capixaba.

``Devemos ter em mente esses três conceitos, ressonantes daquilo que constitui uma cultura nacional como uma ``comunidade imaginada'': as memórias do passado; o desejo por viver em conjunto; a perpetuação da herança''. (HALL, 1998, 58)

Em vista disto, o capixaba não tem como dizer que não possuí uma identidade própria, mesmo que no Estado ainda possam existir nichos de povos totalmente autônomos da diversidade cultural do Estado, como é o caso do pomeranos, no Sul do Estado, que iniciaram imigração para o Espírito Santo no início do século XIX, e que até hoje são o único núcleo no mundo que ainda preservam sua identidade.

No Espírito Santo, ainda existe as bandas de congo e a colônia de pomeranos, então seria o que Hall chamou as memórias do passado, uma vez que eles ainda vivem como os seus antepassados, ao mesmo tempo em que continuam passando sua herança cultural para os seus filhos, o mesmo poderia se dizer do congo que foi uma herança, mas devido a mistura de duas raças os negros e os índios talvez fosse impróprio colocar nessa mesma classificação.

``Uma questão a colocar é a possibilidade ou não de existência de uma identidade capixaba ou espírito-santense, ou seja, aquela produzida a partir da nossa contiguidade espacial, independente das afinidades ou diferenças naturais e culturais. Se analisarmos com rigor antropológico, estaríamos fadados a constatar a impossibilidade de encontrar uma cultura capixaba, dada a diversidade de experiências, construções de mundo, memória cultural, tradições. Seriam os índios tupiniquins e guarani capixabas? Seriam os pomeranos capixabas? O que os une sob uma mesma unidade federativa e, certamente, terem documentos de identidade que atestam terem nascido no ES'' (REIS, 2001,195)

Conforme afirmou Ruth Reis, o conceito de identidade é muito ss nações. O que deve-se levar em consideração quando estamos tratando de uma identidade local, são os símbolos pertencentes aquela localidade, que constituem, o conjunto de mitos que serão definidos no final como a alicerces da identidade regional.

Essa fato também é observado por Alain Hesrcovici, ao afirmar que:

``Neste sentido, a identidade só pode ser concebida como uma construção ideológica, e não como um fato objetivo. O papel dos intelectuais consiste justamente, em tentar articular, no sentido de tornar coerentes, as práticas dos diferentes grupos sociais, no seio de uma determinada hierarquia cultural, assim como fornecer uma representação simbólica da sociedade. Certas produções são assim escolhidas como sendo representativas do conjunto da sociedade: a França se resume ao Moulin Rouge, aos vinhos, aos perfumes e a Edith Piaf, O Brasil ao samba, às mulatas e ao futebol, etc. trata-se de uma escolha ideológica e, numa certa medida arbitrária, à medida que esses ``cartões postais'' não são, nem podem ser, representativos de uma realidade muito mais complexa.'' (HESRCOVICI, 2001,15)

Portanto, pode-se afirmar, que apesar do capixaba viver entre duas das principais regiões econômicas, do país, Rio de Janeiro e São Paulo, e de ser considerado o quintal de Minas Gerais, ele traz consigo elementos que vão distingui-lo das demais culturas nacionais, mesmo que esses símbolos sejam subjetivos e estejam somente na mentalidade dos próprios capixabas. Não importando para isso classe social, gênero ou raça, conforme analisa Stuart Hall:

``... não importa quão diferentes seus membros possam ser (...), uma cultura nacional busca unificá-los numa identidade cultural, para representá-los todos como pertencendo à mesma e grande família nacional'' (HALL, 1998, 59)

Embora quando se fale em identidades tenha que se ter em mente que não é o simples conjunto de estereótipos e sim os símbolos subjetivos - herdados através do conhecimento transmitido de geração para geração -, que vão formar a representação cultural de um povo, autores como Ruth Reis preferem afirmar.

``Aos incrédulos em relação a uma possível identidade capixaba, é necessário afirmar que não se trata de confundir identidade com estereótipo, ou seja, com uma visão caricatural de um tipo idealizado que representa um lugar ou uma cultura. Exemplo mais flagrante pode ser a Bahia, que, em geral, é citada como expressão típica de identidade bem marcada e delimitada. A distorção desta concepção poder levar desavisados a se surpreenderem com a possibilidade de encontrar um baiano que não dance axé music, não goste de acarajé e não fale mainha. Da mesma forma que o europeu com um nível de informação médio em relação ao Brasil pode se sentir inconformado ao descobrir que nem toda brasileira é torneada por deus, tingida pelo sol e pela miscigenação racial e sambista sensual. Os estereótipos são caricaturas de culturas que embora surjam a partir de simplórias leituras que desconhecem a complexidade cultural, também funcionam para a constituição das identidades, à medida que atuam na construção de uma imagem coletiva individual.'' (REIS, 2001,196)

Essa forma de definir a identidade por Ruth Reis mostra que as identidade culturais, são mais do que simples gestos ou atitudes, mas conforme já falado anteriormente, são os símbolos culturais existentes em cada nação somente de conhecimento de seus habitantes, na maioria das vezes são traços subjetivos, que criam o sentimento de pertencimento de um sujeito ao seu local de origem.

Essa é a identidade do homem pós-moderno, incluindo o capixaba. Ele sabe quem é, mas o problema é que ele não consegue observar os traços de sua identidade, necessitando a todo momento estar reforçando, o fato de ser ``capixaba''. Por exemplo, é comum quando um turista chega no Espírito Santo, o cidadão local perguntar: ``Já comeu moqueca capixaba? Pois o resto é só peixada!''. Este exemplo, acontece pelo fato deste cidadão necessitar que os outros saibam que ele possui um símbolo somente seu, que o distinguirá dos demais Estados brasileiros.

Desta forma na atual crise de identidade do capixaba que também é observada em várias outras localidades, o homem necessita mais do que apenas traços subjetivos, ele quer ver sua identidade sendo reconhecida, e sendo valorizada em outras culturas.

Crise de identidade na pós-modernidade

Muitos teóricos afirmam que o homem pós-moderno começou a perder as referências de sua identidade cultural ao inserir-se no mercado global, que o fez compartilhar várias culturas tendo a sua própria sido engolida pelas demais, pois a aldeia global, onde as fronteiras transnacionais foram praticamente dissipadas, não permitiriam uma identidade única e sim a coletividade de identidades.

Entretanto, não se tem um referencial de tempo que possa ser usado como marco para o início da pós-modernidade, uma vez que muitos desses teóricos ainda não aceitam que o homem tenha abandonado os ideais modernistas. O que se observa é toda uma ruptura com os laços que o prendiam a uma forma de pensamento moderno. Essa ruptura não tem um marco especifico, mas ela torna-se mais latente com a sociedade pós-guerra, que passou buscar algo mais, através do fortalecimento de sua identidade. Estudiosos deste tema como Jean-François Tétu preferem não usar um tempo em específico para usar como marco para esses estudos:

``a pós-modernidade não é um estilo de época a ser estudado como o romantismo, realismo, simbolismo..., que têm uma listinha de características, não é isso. Há toda uma condição, pós-moderna, que corresponde a uma sociedade pós-iundustrial, que marca um momento pós-utópico, que não tem sentido na projeção de um futuro, da utopia, pois o tempo privilegiado não será o futuro, mas o presente.'' (TETU, 1997, 432)

Neste presente, o homem vai buscar no seu passado suas origens culturais para centrar-se nessa sociedade global, onde as culturas se interagem, e onde as leis darwinianas, de que somente os mais fortes sobrevivem, destruíram sua referência de mundo e de localização. Este ponto é reforçado por Ricardo Ferreira Freitas, ao afirmar que apesar de existir uma possibilidade estética de igualdade entre as pessoas, o homem é conduzido a uma sensação de perda de referências culturais.

Essa perda de referencial se acentua cada vez mais á medida em que esse homem passa a interagir e inserir-se no mundo globalizado, onde é apenas mais uma peça na engrenagem de uma ``nave espacial'' que uma vez que der sua partida, não terá mais volta.

A identidade sendo apenas um fragmento, uma colcha de retalhos, que foi remendada com vários pedaços de culturas homogêneas fez o homem pós-moderno adotar um simulacro do individualismo levando-o a transitar entre dois pólos distintos o seu eu interior, aquele que procura saber quem ele é, e a que sociedade a qual ele pertence, que seria o seu eu exterior, que o faz interagir com o meio no qual ele vive.

Mas, apesar do homem pós-moderno adotar várias identidades como sua, neste hibridismo cultural ele sempre estará buscando a sua identidade no seu regionalismo, pois como o olimpiano concebido por Edgar Morin, o sujeito pós-moderno, necessita de reconhecimento, mesmo que seja somente de sua cultura, ele necessita saber que ela está sendo preservada ou globalizada em outros Estados-nações.

Atualmente, na nossa avaliação não é possível afirmar qual é a identidade fixa de um povo, uma vez que ela está em constante mutação. Mas também não é possível falar que ele não a tenha, pois os símbolos mesmo que inconscientes são reforçados pela indústria cultural, para uma sociedade de massa, que os usa para conseguir conquistar novos consumidores para os seus produtos.

Segundo Adorno e Horkheimer os extremos das identidades podem substituir o local pelo global e vice e versa (HORKHEIMER, ADORNO, 1985, 122). Mas, o que se observa neste inicio de século é que o global necessita do respaldo do local para que seja aceito pela sociedade a qual ele está sendo inserido.

Na atual crise de identidade do homem pós-moderno o grande dilema da sociedade é até onde a sua cultura está sendo engolida pelas identidades heterogêneas oferecidas pela indústria cultural. E até onde ele - o homem desta sociedade - está se sujeitando a outras culturas, mesmo que para a maioria isso possa parecer irrelevante ou inexistente, a pós-modernidade trás consigo todo esse questionamento consigo, comprovando a falência das identidades modernas, Stuart Hall argumenta que:

``... as identidades modernas estão entrando em colapso, o argumento se desenvolve da seguinte forma. Um tipo diferente de mudança estrutural está transformando as sociedades modernas no final do século XX. Isso está fragmentando as paisagens culturais de classe, gênero, sexualidade, etnia, raça e nacionalidade, que, no passado, nos tinham fornecido sólidas localizações como indivíduos sociais. Estas transformações estão também mudando nossas identidades pessoais, abalando a idéia que temos de nós próprios como sujeitos integrados. Esta perda de um ``sentido de si'' estável é chamada, algumas vezes, de deslocamento ou descentração do sujeito. Esse duplo deslocamento - descentração dos indivíduos tanto de seu lugar no mundo social e cultural quanto de si mesmos - constitui uma ``crise de identidade'' para o indivíduo.'' (HALL, 1998, 9)

A crise acontece pelo fato do homem pós-moderno viver em uma sociedade que dissolve a todo momento suas referências culturais ou sociais, criando novas necessidades e valores. O homem pós-moderno produto de uma internacionalização das relações econômicas está inserido em um amplo processo fragmentário, na qual ele não consegue mais sentir-se representado no ambiente no em que ele está inserido. Essa necessidade de representação faz com que ele se volte para si tentando encontrar-se, e quando isso acontece também ocorre a revalorização do local.

Entretanto, não quer dizer que está desestruturação da identidade seja um fator planejado ou calculado pelos detentores do poder da sociedade contemporânea, ela ocorre à revelia de todo e qualquer processo, seja de transnacionalização ou da globalização da economia, da sociedade e do consumo. Ela nasce do desejo do homem em conquistar novos horizontes, mas não como na Idade Média, quando o homem buscava desbravar novas nações. Essa atual incursão em busca de novos ``territórios'', está relacionada diretamente com o conhecimento, com a informação e com uma tentativa, mesmo que inconsciente, de proteger-se da globalização, ao mesmo tempo em que tenta dominar esse movimento global.

``O próprio processo de identificação, através do qual nos projetamos em nossas identidades culturais, tornou-se mais provisório, variável e problemático.'' (HALL, 1998, 12)

Esse estado provisório de identificação faz com que ele mesmo conquistando e se inserindo em novas culturas tente fazer a sua aparecer e prevalecer. Um bom exemplo que procuramos elencar nesse trabalho é o sucesso da banda Casaca que abandonou o seu regionalismo para ser transformado em um produto global, entretanto, sob a benção do local, pois ele estaria levando a ``cultura'' capixaba para outras fronteiras

A influência da cultura de massa na formação das identidades

A globalização e a cultura de massa poderiam ser definidas como as duas faces de uma moeda. Adorno e Horkheimer citam que ``os produtos da indústria cultural podem ter a certeza de que até mesmo os distraídos vão consumi-los abertamente'' (HORKHEIMER, ADORNO, 1985, 119), igualmente a globalização que trabalha com as culturas transformando-as para que elas possam ficar mais fáceis de serem consumidas.

Nesta cultura de massa,

``... os média que, em última análise, tornam-se ponte entre as interações entre a cultura mundial e a cultural local, entre o público e o privado como nos diz Touraine quando defende a idéia de que a cultura de massa penetra no espaço privado, ocupa grande parte dele e, como reação reforça a vontade política de defender uma identidade cultural, o que leva à recomunitarização.'' (PICCININ, 2000)

Essa nova reconfiguração do local promovida pela cultura de massa, Por um lado, reforça a idéia do cidadão como indivíduo autônomo, produtor, consumidor e usuário de além fronteiras, o cidadão do ``mercado-mundo'' e suas redes. Mas por outro lado perde força a idéia do cidadão como sujeito, com força de ação política individual ou coletiva na sociedade, e com vínculos territoriais mais duradouros, definidos por uma comunidade e/ou Estado-nação.

``Da mesma forma que as religiões, o consumo constitui um universo de significação capaz de modelar as práticas cotidianas. Nele, os indivíduos se reconhecem uns aos outros e constroem suas identidade, imagens trocadas e reconfirmadas pela interação social. Neste sentido, o mercado é fonte de autoridade, possui legitimidade para definir a validade das ações individuais, orientando-as nesta ou naquela direção.'' (ORTIZ, 1996, 170)

Com essa nova configuração da cultura de massa o popular passa a ser valorizado pela elite, ao mesmo tempo em que os códigos que antes deveriam ser feitos de uma forma mais simples para que a grande massa pudesse entender mudam e, passa a existir uma inversão a cultura deixa de ser de cima para baixo passando a ser das massas para as elites.

Desta forma a cultura de massa consegue fazer uma revalorização da cultura local, e mesmo que inconsciente eles passam, também a perder o que antes era destinado somente a eles, pois, a globalização trabalha no sentido de aprimorar as identidades culturais locais, para que estas possam ser inserida na sociedade global. Assim a globalização cria juntamente com a cultura de massa, um movimento sincrônico das identidades.

Para que isso possa acontecer a indústria cultural dentro de um sistema econômico transnacional incorpora, traços das culturas de periferia revalorizando o local. Forma essa já estudada por HESRCOVICI:

``O poder respectivo de cada espaço local depende de sua capacidade de impor, no seio deste sistema mundial, certos produtos; a dimensão universal do local se define em função da capacidade que possuem seus diferentes produtos para se incorporar neste espaço mundial. Existem várias estratégias possíveis: se aproveitar do exotismo, (...) ou rentabilizar os produtos no mercado nacional para ser competitivo no mercado internacional (...).'' (HESRCOVICI, 2001,17:18)

Assim as culturas passam a integrar-se com traços do regionalismo de nações periféricas. Jean-François Tétu observa que ``esse novo momento é marcado pela globalização e as contradições entre o local e o global'' (TETU, 1997, 432)

As contradições acontecem pelo fato de haver o choque entre duas identidades distintas, e apesar da globalização tentar impor novas formas de representação do local e do global, ela acaba por criar um sentimento de revalorização das identidades nacionais, em detrimento de qualquer fator que possa ser apresentado pelo movimento de globalização.

Esse tipo de representação acontece principalmente pois nesta pós-modernidade as identidades locais estarem experimentando um novo sentimento de revaloriazação, Stuart Hall observar esse sentimento de valorização da seguinte forma:

``As identidades nacionais permanecem fortes, especialmente com respeito a coisas como direitos legais e de cidadania, mas as identidades locais, regionais e comunitárias têm se tornados mais importantes.'' (HALL, 1998. 73)

Esse mesmo ponto é observado por Alain Hesrcovici como o compartilhamento de vários culturas que formam a identidade do homem pós-moderno, sendo que ele não tem uma identidade centrada e sim vários pedaços de uma mesma cultura:

``... qualquer cultura é o produto da colaboração com várias outras culturas, e não é possível isolar os elementos locais. Uma cultura se define, essencialmente, pela maneira como `se utiliza', como se reapropria dos elementos de sistemas culturais mais abrangentes.'' (HESRCOVICI, 2001,14)

Essa fato pode ser constato pelo atual fase da economia global em que, busca atingir novos mercados de consumo8, fazendo com que o contrato de pertencimento, do sujeito com sua nação, não entre em choque quando em contato com o global, pois ele não irá respeitar os diferentes particularismos, regionalismos e localismos, de cada cultura, busca formas não de somente impor a cultura dominante de uma nação, mas a coexistência de ambas, o que da mesma forma estaria acarretando a descaracterização da cultura local.

A cultura de massas

A característica da pós-modernidade é o rompimento do homem moderno com os seus laços de cultura e tradição, sujeito de cunho estritamente consumista ele, para muitos teóricos, foi um marginalizado da era moderna, para tantos outros apenas um desencantado com o movimento modernista. Entretanto a melhor definição de homem pós-moderno é de um sujeito sem referências do seu passado e em busca da construção do seu futuro, mesmo sabendo que ele ainda é inimaginável.

Desta nova forma de representação do homem, podemos definir que o sujeito pós-moderno, apesar de ser influenciado pela indústria cultural conforme analisa Adorno ao afirmar que ``a cultura contemporânea confere a tudo um ar de semelhança'' (Adorno, 1985, 113), ele busca nas origens de suas tradições as marcas que irão nortear o seu futuro.

As culturas de massas observadas tanto por Adorno quanto por Morin, são produtos de uma indústria cultural. E esses produtos são, na concepção dos autores, reformulados, pois na atual indústria, não existe mais a possibilidade de criação de algo novo, uma vez que tudo é somente reformulado e apresentado a sociedade com uma nova roupagem.

Adorno neste ponto faz duras críticas a indústria cultural. Segundo ele a indústria oferece apenas lixo às massas sedentas para consumirem algo que satisfaça seu status:

``... a técnica da indústria cultural levou apenas à padronização e à produção em série, sacrificando o que fazia a diferença entre a lógica da obra e a do sistema social.'' (Adorno, 1985, 114)

Essa padronização imposta pela indústria cultural e aceita pela cultura de massa, é analisada pelo ponto de vista pós-moderno como um momento de ruptura com o passado.

Assim, o sujeito pós-moderno abandona todos os seus referenciais de tradição e cultura somente para estar inserido no mercado global. Embora muitas vezes ele nem saiba desta sua nova opção cultural, assim o faz devido as condições impostas pela sociedade para a sua subsistência como um membro do grupo, apesar de muito se falar da individualização do homem ele necessita estar fazendo parte de um grupo social, ao qual ele se identifique.

Características da cultura de massa

Para explicar a questão da cultura de massa, adotaremos a classificação proposta por Umberto Eco, no livro Apocalípticos e Integrados9. Embora o assunto já tenha sido tratado, avaliamos que a inclusão se torna necessária, na medida em que será a partir deste ponto em que haverá o aprofundamento da influência da cultura de massa na desconstrução das identidades.

Os mass media dirigem-se a um público heterogêneo, e especificam-se segundo ``medias de gosto'' evitando as soluções originais.

Nesse sentido, difundindo por todo o globo uma ``cultura'' de tipo ``homogêneo, destroem as características culturais próprias de cada grupo étnico.

Os mass media dirigem-se a um público incônscio de si mesmo como grupo social caracterizado; o público, portanto, não pode manifestar exigências face à cultura de massa, mas deve sofrer-lhe as propostas se saber que as sofre.

Os mass media tendem a secundar o gosto existente, sem promover renovações da sensibilidade. Ainda quando parecem romper com tradições estilísticas, na verdade se adequam à difusão, agora homologável, de estilemas e formas já de há muito difundidos ao nível da cultura superior e transferidos para nível inferior. Homologando o que já foi assimilado desenvolvem funções meramente conservadoras.

Os mass media tendem a provocar emoções intensas e não mediatas; em outros termos: ao invés de simbolizarem uma emoção, de reresentá-la, provocam-na; ao invés de a sugerirem, entregam-na já confeccionada. Típico, nesse sentido, é o papel da imagem em relação ao conceito, ou então da música como estímulo de sensações mais do que como forma contemplável.

Os mass media, colocados dentro de um circuito comercial, estão sujeitos à ``lei da oferta e da procura'' Dão ao público, portanto, somente o que ele quer, o u, o que é pior, seguindo as leis de uma economia baseada no consumo e sustentada pela ação persuasiva da publicidade, sugerem ao público o que este deve desejar.

Mesmo quando difundem os produtos da cultura superior, difundem-nos nivelados e ``condensados'' a fim de não provocarem nenhum esforço por parte do fruidor; o pensamento é resumido em ``fórmulas''; os produtos da arte são antologizados e comunicados em pequenas doses.

Em todo o caso, também os produtos da cultura superior são propostos numa situação de completo nivelamento com outros produtos de entretenimento; num semanário ilustrado, a reportagem sobre um museu de arte vem equiparada ao mexerico sobre o casamento da estréia.

Por isso, os mass media encorajam uma visão passiva e acrítica do mundo. Desencoraja-se o esforço pessoal pela posse de uma nova experiência.

Os mass media encorajam uma imensa informação sobre o presente (reduzem aos limites de uma crônica atual sobre o presente até mesmo as eventuais reexumações do passado), e assim entorpecem toda consciência história.

Feitos para o entretenimento e o lazer, são estudados para empenharem unicamente o nível superficial da nossa atenção. De saída, viciam a nossa atitude, e por isso, mesmo uma sinfonia, ouvida através de um disco ou do rádio, será fruída do modo mais epidérmico, como indicação de um motivo assobiável, e não como um organismo estético a ser penetrado em profundidade, mediante uma atenção exclusiva e fiel.

Os mass media tendem a impor símbolos e mitos de fácil universalidade, criando ``tipos'' prontamente reconhecíveis e por isso reduzem ao mínimo a individualidade e o caráter concreto não só de nossas experiências como de nossas imagens, através das quais deveríamos realizar experiências.

Para tanto, trabalham sobre opiniões comuns, sobre endoxa, e assim funcionam como uma contínua reafirmação do que já pensamos. Nesse sentido, desenvolvem sempre uma ação socialmente conservadora.

Por isso se desenvolvem, ainda quando aparentam ausência de preconceitos, sob o signo do mais absoluto conformismo no campo dos costumes, dos valores culturais, dos princípios sociais e religiosos, das tendências políticas, Favorecem projeções orientadas para modelos ``oficiais''

Os mass media apresentam-se portanto como o instrumento educativo típico de uma sociedade de fundo paternalista mas, na superfície, individualista e democrática, e substancialmente tendente a produzir modelos humanos heterodigiridos. Vistos em maior profundidade, surgem como uma típica ``superestrutura de regime capitalista'', usada para fins de controle e planificação coata das consciências. Com efeito, aparentemente, eles põem à disposição da cultura superior, mas esvaziados da ideologia e da crítica que os animava. Assumem os modelos exteriores de uma cultura popular mas, ao invés de crescerem espontaneamente de baixo, são impostos de cima (e da cultura genuinamente popular não possuem nem o sal nem o humor, nem a vitalíssima e sã vulgaridade). Como controle das massas desenvolvem uma função que, em certas circunstâncias históricas, tem cabido às ideologias religiosas. Mascaram porém, essa sua função de classe, manifestando-se sob o aspecto positivo da cultura típica de uma sociedade do bem-estar onde todos têm as mesmas oportunidades de acesso a cultura, em condições de perfeita igualdade.

Essas definições foram formuladas por Eco, em sua crítica à cultura de massa.

O mal-estar da cultura de massa

A cultura de massa passa por uma grande crise neste período pós-moderno, onde o homem necessita estar sentindo-se representado. Desta forma ele busca nos produtos oferecidos pela cultura de massa, o fortalecimento de sua identidade, como forma de poder estar representando-a apesar de Adorno analisar que "... a indústria cultural permanece a indústria da diversão" (HORKHEIMER, ADORNO, 1985, 128), Edgar Morin, avalia que:

``O termo cultura de massa não pode ele mesmo designar essa cultura que emerge com fronteiras ainda fluidas, profundamente ligada às técnicas e à indústria, assim como à alma e à vida quotidiana. São os diferentes estratos de nossas sociedade e de nossa civilização que estão em jogo na nova cultura. Somos remetidos diretamente ao complexo global'' (MORIN, 2000,18)

Entretanto, não podemos nos esquecer que a indústria cultural trabalha exatamente no sentido de integrar a cultura de massa a essa nova reformulação das sociedades onde as fronteiras são derrubadas e as nações se integram seja pela moeda ou pela sua cultura. No caso da indústria cultural ela promove essa quebra de barreiras através de bens produzidos para o consumo, quebrando as fronteiras pré existentes, seja de ordem econômica ou social.

A cultura de massa apesar de encontrar resistências para a sua disseminação em várias nações ela consegue transpo-las e integrar suas culturas, pois ela irá buscar nas necessidades individuais do sujeito, forças para conseguir se integrar nas culturas tradicionais, Morin afirma que:

Ela não tende a destrói todo o folclore: substitui os folclores antigos por um novo folclore cosmopolita. (...) Esse novo folclore cosmopolita carrega em si fragmentos de folclore regionais, nacionais ou étnicos: é, num certo sentido, um agregado de folclores que se unem para formar um tronco universalizado...'' (MORIN, 2000,159)

Essa nova integração e reformulação de antigas culturas tradicionais são produzidas, pelo fato da cultura de massa suprir as necessidades do homem de bem estar e de felicidade, que servirão como um entorpecente para que ele possa esquecer as suas verdadeiras necessidades, pois ao mesmo tempo em que são ofertadas novas formas de representação, é retirado dele seus anseios e angustias.

O ópio da sociedade contemporânea, assim poderia ser definida a cultura de massa, pois o vício que ela produz cria anseios que o sujeito não tinha, faz com que ele busque e sinta a necessidade de consumir produtos que não vão estar agregando nenhum valor a não ser a satisfação momentânea, em troca ele entrega sua vida e consciência para ser moldada de acordo com as diretrizes impostas pela indústria cultural.

Adorno define esse entorpecimento da sociedade, promovido pela indústria cultural como uma troca de ambas as partes pois:

"O princípio impõe que todas as necessidade lhe sejam apresentadas como podendo ser satisfeitas pela indústria cultural, mas, por outro lado, que essas necessidades sejam de antemão organizadas de tal sorte que ele se veja nelas unicamente como um eterno consumidor, como objeto da indústria cultural" (HORKHEIMER, ADORNO, 1985, 133)

Isso não significa que o sujeito tenha consciência de ser um objeto manipulado ao bel prazer da indústria cultural, mas também não impõe limites para que isso não aconteça, pois quando ela (a indústria cultural) se sente ameaçada busca novas formas de estar vendendo uma nova necessidade, seja através do sentimento religioso, familiar ou amoroso, "...o poder da indústria cultural provéas pós-modernas, onde os bens de consumo são os novos símbolos de identificação do homem com o seu meio.

Na Casaca, no tambor e na mídia

Na indústria da cultura, o indivíduo é ilusório não apenas por causa da padronização do modo de produção. Ele só é tolerado na medida em que sua identidade incondicional com o universal está fora de questão. (Adorno, 1985, 144)

Se de um lado as novas tecnologias proporcionam a interligação mundial de culturas e identidades, de outro é pura ilusão acreditar que a esse processo estejam associadas idéias como unidade, homogeneidade ou sentido único. Na verdade, estamos diante de um processo de duas vias: um processo que globaliza ao mesmo tempo que fraciona. É um fracionamento articulado, um reordenamento das diferenças e desigualdades.

Essa articulação e possível pois:

``...a cultura de massa apela para as disposições afetivas de um homem imaginário universal, próximo da criança e do arcaico, mas sempre presente no homo faber moderno. De fato, um dos fundamentos do cosmopolitismo da cultura de massa é a universalidade dos processos do ``trono arcaico'', do cérebro humano e a universalidade do homem imaginário.'' (MORIN, 2000,159)

Assim através dessa universalização promovida pela indústria da cultura, o que antes era restrito apenas as culturas populares, além de passar a ser adotado como símbolo das cultura de elite, avança fronteiras se inserindo em nações.

A banda Casaca pode ser considerado um bom exemplo desta inserção de um símbolo do folclore de uma região local no espaço global. Pois, ela percorreu esse caminho, apropriou-se do ritmo da cultura local, conquistou as massas, despertou o interesse de uma multinacional, que transformou todo o seu estilo, principalmente, as fortes batidas do congo, e novamente o inseriu na cultura de massa, mas agora com novos apelos estéticos.

A história da banda Casaca

A banda Casaca surgiu em meados do ano de 2000, da dissidência do grupo ``Kalangocongo'', que tinha o estilo musical voltado para o forró pé de serra, mas que segundo os integrantes do grupo, em entrevista para o site oficial da banda10, não tinha a sonoridade desejada, pois ficava ``meio nordestino''

Então durante uma roda de congo, na Barra do Jucu, os integrantes perceberam que era aquele som que eles buscavam, surgindo daí a banda Casaca, que nasceu com o objetivo de divulgar a cultura capixaba.

Vale ressaltar que a maioria dos participantes da atual formação da banda, já conhecia o ritmo, pois participavam quando crianças de um projeto chamado congo mirim que tem por objetivo a divulgação e a preservação do congo no Estado.

Depois da formação em menos de seis meses lançaram o seu primeiro CD "No tambor, na casaca, na guitarra", que chegou a marca das 35 mil copias vendidas, fato inédito para o mercado fonográfico capixaba, ainda mais sendo o selo deste CD independente. Mesmo assim, ele conseguiu figurar nas listas dos mais vendidos nas lojas do Estado. Esse primeiro CD veio, segundo integrantes da banda, com o intuito de fazer uma ``releitura'' do congo.

O grande sucesso aconteceu devido a divulgação boca-a-boca feita pelos moradores da região, o que levou rapidamente a banda conseguir emplacar duas faixas deste CD ``Sereia'' e ``Ondas do Barrão'' como as mais pedidas de várias FMs do Estado, ambas as músicas falam da cultura do Estado.

Seguindo a linha das famosas bandas nacionais, que criam e/ou patrocinam escolas de músicas, como o Rappa, Titãs, Skank, eles dão aulas em uma Oficina de Congo, para alunos de bairros de periferia do Estado, com o objetivo destas crianças criarem um determinado vínculo com a cultura local da Barra do Jucu, um balneário que ainda preserva o estilo rústico das aldeias de pescadores. Ponto de encontro de surfistas, estando localizando entre os a capital Vitória e o balneário de Guarapari, devido a esse estilo ainda rústico atraí muito turistas.

Um dos principais fatores que podem ser levados em consideração para o sucesso da banda nesse balneário é exatamente essa proximidade com a capital e o grande fluxo de turistas que freqüentam o local.

O que é o congo no Espírito Santo

A história do congo no Espírito Santo se confunde muito com a história do Estado, pois ela foi construída pelas miscigenação das várias etnias que aqui aportaram, como: indígenas, negros, europeus, portugueses, italianos, alemães, pomeranos, austríacos e tantos outros que de alguma forma marcaram a cultura deste Estado.

Nesta diversidade cultural o folclore capixaba consegue ser tão heterogêneo quanto a origem do seu povo. Mas, o congo, nasceu ou melhor surgiu no Estado através dos negros que vinham trabalhar nos engenhos, trazendo consigo seus hábitos é costumes, sento até hoje, uma das mais preservadas tradições culturais do folclore capixaba

A primeira referência ao congo no Estado é de 1858, conforme registro feito pelo site Estação Capixaba11, e ocorreu no livro Deux années eu Brásil, do viajante francês François Biard, que relata o seu encontro com indígenas por ocasião da festa de São Benedito. Mas muitos historiadores preferem afirmar que o ritmo nasceu junto com a necessidade dos negros em poderem adorar seus deuses africanos, juntando isso a adoração aos santos da Igreja Católica. Devido a esse sincretismo ele é considerado ainda hoje um ritmo tradicional do folclore capixaba, sendo tocado em festa religiosas típicas como as de São Benedito, São Pedro, São Sebastião e Nossa Senhora da Penha.

O nome de banda de congos surgiu com a alteração de alguns dos instrumentos primitivos então usados nas festas, com isso o nome guarará, designação dada ao tambor passou a ser chamado de congo ou simplesmente tambor, com isso as bandas passaram a ser conhecidas como Banda de Congos, expressão que segundo os negros lembrava a África.

Mas foi somente em 1951, por ocasião dos festejos comemorativos do IV Centenário da fundação de Vitória, que o ritmo entrou oficialmente nos festejos culturais do Estado, nesta data aconteceu a primeira concentração de Bandas de Congos

Atualmente as bandas de congo tocam principalmente em festas religiosas. Os integrantes destas bandas são todos pessoas simples, de bairros de periferias, em sua maioria descendentes diretos dos ex-escravos que permaneceram no Estado após a abolição da escravatura, em 1888.

Os instrumentos são todos feitos a mão, com materiais retirados da natureza como paus, peles de animais ou restos de sucatas como ferro torcido e folha-de-flandres. As músicas são velhas e tradicionais toadas12, cantadas por homens e mulheres, e suas letras carregam referências a escravidão, aos santos do povo e ao mar.

Atualmente no Estado a maioria está concentrada em bairros litorâneos, como os de Nova Almeida, na Serra e Barra do Jucu, em Vila Velha, e uma das mais conhecidas e a banda ``A Amores da Lua'', já tem mais de 50 anos.

A banda Casaca na visão da mídia impressa

Para saber como os dois jornais do Estado, A Gazeta e A Tribuna, tratam o universo do congo foi elaborado um questionário :

Entrevista José Roberto Neves (Jornal A Gazeta)

1 - Existe uma linha editorial que você deve seguir ao escrever sobre
a Banda Casaca?

R: A única linha editorial a ser seguida na cobertura da banda Casaca é a mesma que norteia os padrões do bom jornalismo, ou seja: isenção, informação precisa, ética e apuração correta. Não deve existir, em cadernos culturais, sob hipótese nenhuma, tratamento diferenciado para os artistas que estão em atividade no Espírito Santo, no Brasil ou no exterior. Isto significa que as preferências pessoais de cada repórter devem ser deixadas de lado no momento da redação de uma matéria.

2 - Descreva como você observa a trajetória da Banda?

R: O Casaca teve uma trajetória meteórica, fato que a difere das demais bandas em atividade no Estado. O grupo conta com um fator bem particular a seu favor: sua divulgação surgiu das ruas, ao contrário de outros artistas que se utilizam de influência política para captar apoio de órgãos oficiais - leia-se secretarias de cultura e prefeituras. A imprensa capixaba teve de correr atrás do sucesso do Casaca, e não o contrário. Uma das primeiras matérias de A GAZETA sobre a banda, no segundo semestre de 2000, durante a entrega do Troféu Guananira, já destacava que a sua utilização dos elementos do congo era mais enraizada do que a do próprio Manimal, o detentor do rótulo 'rockongo'. O show de lançamento do primeiro CD do Casaca, realizado em maio de 2001, levou um público de 10 mil pessoas à Barra do Jucu. São números surpreendentes para uma banda que, até então, tinha pouco mais de um ano de estrada.

3 - Você notou alguma diferença na Banda antes e depois do contrato com a Sony?

R:Sim. A gravadora eliminou do CD as músicas que tinham como marca o regionalismo da Barra do Jucu. Também deixou de fora músicas mais pesadas, como 'Camarada' e 'Leva um Picolé'. Abaixou o volume dos tambores de congo, tirou a distorção das guitarras e inseriu programações eletrônicas em duas faixas do CD. Ou seja, descaracterizou o som do Casaca e tirou dele o que havia de mais espontâneo, que era a percussão rudimentar, tosca e primitiva,acompanhada de letras sobre a realidade da Barra do Jucu13''. Ao que tudo indica, a Sony pretende transformar o Casaca numa espécie de Skank capixaba, o que é lamentável, uma vez que o trabalho da banda é original e baseia-se na célula rítmica do congo. Falta-lhe embasamento intelectual sobre o congo, é verdade, mas este deveria vir através de um contato mais estreito com a Comissão Espírito-Santense de Folclore, que, ao invés de criticar a banda, deveria abastecê-la de informações.

A abordagem dada à Banda mudou, depois do contrato com a Sony?

R: Não. Continuamos seguindo os princípios básicos do jornalismo. Basta ler a crítica de A GAZETA sobre o CD, que aponta todas as falhas resultantes da estratégia da Sony de popularização do Casaca em nível nacional. Já o jornal concorrente, preferiu incensar a banda, repetindo um hábito muito comum na imprensa capixaba: o de confundir cobertura com ufanismo. As críticas, quando embasadas, devem obrigatoriamente ser feitas, independentemente das condições políticas e de baixa auto-estima pela qual passam o Estado e o cidadão capixaba.

Como você avaliaria esse novo trabalho, agora lançado por uma gravadora multinacional?

R: As avaliações foram citadas na terceira questão.

Entrevista Rose Frizzera (Jornal A Tribuna)

1 - Existe uma linha editorial que você deve seguir ao escrever sobre a Banda Casaca?

R: A linha editorial é valorizar o que está sendo reconhecido pelo público. Ou seja, não cabe a nós levantar a bola de uma banda ou joga- la no ostracismo. Nós, apenas, repercutimos o que a rua consagra ou releva. Claro que podemos fazer isso com opinião, mostrando sempre os lados envolvidos, as circunstâncias em que isso está ocorrendo. A linha editorial sobre a cobertura do Casaca, especificamente, foi repercutir que pela primeira vez uma banda capixaba, que não tinha contado com o apoio oficial de nenhuma secretaria de cultura (como ocorreu com outras bandas como Manimal, Kátia Rocha) ganhou as ruas, o público, através de seu trabalho, que pode ser questionado ou não: letras fáceis, melodias contagiantes, bem ao gosto do público jovem. A moral disso tudo vem de uma frase de outra banda capixaba, o Pé do Lixo: "Faça você mesmo e pare de chorar". Isso é fato.

2 - Descreva como você observa a trajetória da Banda?

R: Eu escrevo sobre a Banda desde que ela surgiu. Ou seja desde antes dela surgir, quando a maioria de seus integrantes ainda faziam parte do kalangocongo, que não tinha a originalidade nem o punch que o Casaca atingiu. Cubro cultura capixaba desde que estava na Gazeta. Faço jornalismo cultural desde 1995. Acompanhei a ascensão das bandas atuais e fiz uma matéria decisiva que explica tudo que acontece hoje, chamada Radiografia do Rock capixaba, que foi publicada no Caderno Dois de A Gazeta em fevereiro de 97.

3 - Você notou alguma diferença na Banda antes e depois do contrato com a Sony?

R: Sim. Acho que a banda está mais presa ao dar entrevistas, não sei se isso vai repercutir ou não na originalidade do trabalho deles. Ainda é cedo para chegarmos a tais conclusões, embora a gente já sinta um certo nervosismo dos integrantes ao darem entrevista sobre o novo CD. Acho que é compreensível. Até um ano atrás eles estavam lançando um Cd tosco, gravado de forma quase caseira, que ganhou as ruas, o público, a crítica e uma gravadora. É mais do que quase toda a história da música capixaba atingiu.

4 - A abordagem dada à Banda mudou, depois do contrato com a Sony?

R: Claro. Isso é natural. Agora estamos de olho se o Casaca vai ganhar o país, ou seja. a gente volta a tudo que já aconteceu antes com outras bandas: Os símios assinaram com uma gravadora e não houve o investimento que deveria ter sido feito. O Manimal teve o primeiro Cd distribuído por pela DC7 e produzido pelo Carlos Savala e foi uma roubada. Estamos cobrindo o casaca e torcendo por ela, mas não vamos poder deixar de falar sobre o que realmente tiver ocorrendo com a banda. Se ela for um sucesso vamos falar que ela chegou lá e se não for vamos ter que falar que não ocorreu o que a gravadora, a gente esperava. Mas, particularmente, acredito que ela tenha tudo para estourar para o Brasil.

5 - Como você avaliaria esse novo trabalho, agora lançado por uma gravadora multinacional?

R: A minha crítica sobre o Cd foi menos incisiva que a do Zé Roberto. Eu gostei do CD. Acho que as letras ficaram mais nítidas, fruto da melhora na gravação. A gente tem que parar também de querer ser bom jornalista sempre sendo muito crítico. Nas ruas de Alegre, durante o festival, só tocava "Noite Fria", deste novo CD e na Feira de Jardim da Penha já tem pilhas e mais pilhas de CDs piratas da banda. Vai perguntar para o ambulante se ele tem Cd pirata de outras bandas capixabas? Eu perguntei e a resposta foi não. Não sou eu quem estou dizendo. Eu ouço as pessoas e reporto. Essa é minha função. É isso que vai me dar uma certa imparcialidade. Se você ler a minha cobertura do Dia D do ano passado, está lá que o casaca reuniu o maior público na frente do palco, de todos os shows. na época, o empresário do Manimal me ligou dizendo que o que tinha atraído o maior público era o Manimal, o empresário do Pé do Lixo também me ligou dizendo o mesmo e eu disse: gente, torço para todos, mas eu estava lá no meio de todos os shows, sentindo o público e estou tranqüila de que não puxei o saco de ninguém, só disse o que realmente ocorreu. E a resposta está aí.

A identidade através da Banda Casaca: Construção ou desconstrução

Construção ou desconstrução?

Analisando pelo ponto de vista da indústria cultural, pode-se constatar que a banda se desenvolveu através das leis que regem o consumo da sociedade capitalista. Consumo sim, pois não podemos aceitar apenas a questão social como fator determinante da inserção da banda em uma cultura globalizada. Pois, ao firmar um contrato com uma multinacional, ela aceitou as regras impostas por esse mundo sem fronteiras, onde o lucro é a palavra de ordem, segundo afirma Edgar Morin, ``todo sistema industrial tende ao crescimento, e toda produção de massa e destinada ao consumo tem sua lógica, que é a de máximo consumo.'' (MORIN, 2000, 35)

Neste ponto foi o que a banda Casaca soube usar, pois uma das táticas usadas é já analisada por Morin para o convencimento das massas:

``... procurando o público universal a cultura de massa se dirige também ao anthropos comum, ao tronco mental universal que é em parte, o homem, arcaico que chama o neo-arcaísmo dos filmes, dos jogos, da música. A essas determinações é preciso acrescentar uma outra: a cultura industrial se dirige também ao homem novo das sociedades evoluídas, mas esse homem do trabalho parcelar e burocratizado, enclausurado no meio técnico, na maquinaria monótona das grandes cidades sente necessidades de evasão, e sua evasão procura tanto a selva, a savana, a floresta virgem quanto os ritmos e as presenças da cultura arcaica.'' (MORIM, 2000, 65)

Desta forma, poderemos afirmar que o sucesso da banda se deu devido ao fato do homem pós-moderno estar procurando voltar à suas origens, o Casaca conseguiu fazer o capixaba ao escutar a música que queria. Ou seja, encontrar as raízes culturais.

O jornalista José Roberto Santos Neves descreveu ao falar do sucesso do Casaca, alerta para o fato de que a banda não começou como outras que, geralmente é de cima para baixo. O Casaca, começou de baixo para cima, saiu da Barra do Jucu, para o mundo.

``Certos temas folclóricos são absorvidos pela cultura de massa e, com ou sem modificações, são universalizados'' (MORIN, 2000, 64), esse pensamento de Morin consegue ser bem sucinto no caso Casaca, pois essa busca pela sua identidade cultural perdida e faz com que o homem se volte para aquele que melhor conseguiu representá-la ou que possa estar oferecendo condições para ele sentir-se representado.

No caso do jornal A Tribuna a repórter Rose Frizzerra salienta que:

``A linha editorial é valorizar o que está sendo reconhecido pelo público. (...) através de seu trabalho, que pode ser questionado ou não: letras fáceis, melodias contagiantes, bem ao gosto do público jovem.`` (FRIZZERA)

Entretanto, ao analisar o estilo adotado pelo jornal pode-se conferir que em nenhum momento ele auxilia essa valorização do local, apesar da jornalista ter afirmado que o jornal prima por destacar o que o público está querendo ler, em suas páginas, as chamadas (representadas pelas fotos e títulos) para as matérias, são vazias deste conteúdo local, que para que o leitor possa se identificar imediatamente com o assunto.

Caso semelhante ocorre com o jornal A Gazeta que na maioria das vezes utiliza fotos do Renato Casanova, vocalista da banda, para ilustrar as matérias, esquecendo ou anulando os demais participantes ou qualquer referencia que possa ser usada para ligar o leitor a banda. Ponto que Renato Ortiz analisa como primordial para o fortalecimento das identidades locais: ``A mídia também contribuiu para a formação das identidades nacionais, divulgando e reforçando entre os indivíduos uma cultura popular similar...$'' $(ORTIZ, 1996, 132)

Assim, pode-se avaliar que além de ser um simples meio de informação a mídia contribuiu para a formação e reforço da identidade cultural de uma nação.

Mas, pode o congo necessariamente servir como exemplo da identidade de um Estado? Alan Hesrcovici analisou que: ``A identidade cultural, notadamente no âmbito de uma sociedade capitalista é, necessariamente, uma construção ideológica, na medida em que se trata de escolher, arbitrariamente, certos elementos culturais, e de apresentá-los como sendo representativos desta unidade fictícia''14 (HESRCOVICI, 1995, 75)

Analise da cobertura da mídia impressa

Os títulos e fotos na mídia impressa são, na nossa concepção, os principais fatores que levam o leitor a se interessar pela notícia. E, apesar da notícia ser um produto de cunho perecível, ela serve para construir identidades. A Gazeta e A Tribuna, são os dois maiores veículos de comunicação do Estado do Espírito Santo. Através deles o leitor é informado sobre o que está acontecendo no país, no Estado e no mundo, isso segundo a relevância social dos veículos. Em contrapartida, os veículos também servem como forma do sujeito estar entrando em contanto com sua cultura, uma vez que os veículos regionais, têm por objetivo oferecer esse serviço ao leitor.

Analisando a cobertura dada à banda Casaca, por esse dois veículos pode-se constatar que, seguindo os passos da cultura de massas, a valorização do produto ``Casaca'', passou a ganhar destaque na mídia, a partir do momento em que ele foi inserido no universo global pela gravadora Sony Music, ficando esse fato mais evidente no jornal A Gazeta, do que no seu concorrente o jornal A Tribuna.

Ambos somente começaram a tratar do "fenômeno" Casaca em agosto de 2001, quando sai a primeira referência no jornal A Gazeta e em setembro de 2001 no jornal A Tribuna. Com discursos similares, os jornais tentavam mostrar ao público o estouro da banda "Casaca", para a população local.

Outro fator que chama a atenção é o fato de somente em uma matéria ter saído a referência que a Banda Casaca seria capixaba, que foi no dia 31/12/2001, em que a notícia principal não era a banda mas, esta foi a única vez que o jornal fez referência a identidade capixaba do grupo com a manchete, ``Casaca, o `filho' da Barra, agita o balneário''.

Nos demais dias em que saíram matérias relacionadas à banda, todas haviam adotado apenas o padrão Casaca, qualquer referência que era uma banda capixaba, não merecia mais destaque, para valorizar o produto. Uma atitude curiosa, se lavarmos em consideração o público, sedento de identificação.

Segundo afirma Ciro Marcondes Filho:

``Notícia é a informação transformada em mercadoria com todos os seus apelos estéticos, emocionais e sensacionais; para isso a informação sofre um tratamento que a adapta Às normas mercadológicas de generalização, padronização, simplificação e negação do subjetivismo...'' (FILHO, 1989, 13)

Assim seria de esperar que os jornais impressos locais afirmassem com mais ênfase , a identidade da Banda, pois como mercadoria o que importa para o consumo local, principalmente seria o fato que ela é uma banda capixaba, que está fazendo sucesso. Mas, apesar de somente uma vez o noticiário ter feito menção a um título que definisse o grupo como capixaba, os jornais em todos os momentos sempre primaram por colocar o sucesso da banda, essa atitude veio metaforizada com as chamadas: ``arrancada do Casaca'', ``o mais aplaudido'', ``fincada de mastro'', ``Casaca faz a festa no Álvares'', ``Casaca joga sua rede'', ``capixabas dominam o palco'', ``... queridinha do público'', entre vários outros adjetivos, dedicados somente as estrelas da música nacional.

Outro fato que pode-se constatar é que mesmo quando as matérias que não falavam explicitamente do Casaca, como na matéria do anexo III, em que o assunto era a produção musical local, a foto e legendas principais davam destaque o possível interesse da multinacional Sony pela banda.

Outro ponto a destacar das coberturas feitas pelo jornais é em relação as fotografias usadas para ilustração das matérias.

No período de 23 de maio de 2001 a 23 de maio de 2002, foram publicadas pelos periódicos 30 matérias, sendo 19 do jornal A Gazeta e 11 do jornal A Tribuna, e somente em uma matéria do jornal A Tribuna, não teve como foto o Casaca, apesar do título da matéria chamar para a banda.

Embora sendo uma banda regional que poderia ter sido priorizada para os dias de maiores circulação, no caso da veiculação de matérias, aconteceu exatamente o inverso. Nos dois jornais, os dias escolhidos para noticiar o Casaca foram alternados. Das trinta matérias, somente dez foram aos sábados e domingos, dias das maiores tiragens dos jornais. Antagonismo que se pode notar no destaque dado à banda que apesar de figurar em dezoito capas e contra capas dos jornais, mereceu somente cinco páginas inteiras. Nas outras ``o Casaca'' aparece dividindo as páginas com outras bandas ou outros assuntos.

Essa abordagem feita pela mídia impressa em relação a banda vão de encontro com os argumentos de Ciro Marcondes Filho, que vê as matérias jornalísticas:

``...são produzidas para um mercado real e encerram em si a dupla dimensão da mercadoria: o valor de uso e o valor de troca. Ao passar por uma banca de jornais, o indivíduo pode ser atraído para a aquisição de um periódico por força das promessas de satisfação de necessidades ou interesses que essa mercadoria contem.'' (FILHO, 1989, 13)

Desta forma pode-se constatar o inverso no trabalho dos dois periódicos, pois, primeiro temeram apostar em um produto genuinamente local, como forma de atrair os seus leitores e, segundo, apesar da temeridade do destaque de uma primeira página para a banda os veículos dispensam à essas bandas os mesmo privilégios editoriais, antes somente restritos as grandes estrelas. Em vista disto o que se pode concluir é que a apesar do ``O local está na moda'' (TETU, 1997, 432), ainda esse modismo não influenciou a imprensa capixaba ao trabalhar com as bandas locais que, estão despontando no cenário musical.

Conclusão

Com este estudo pode-se concluir que as identidade locais estão em declínio. Ao vincular uma banda musical local com a indústria cultural para analisar as transformações e influências que ela produziu na sociedade contemporânea, pode-se concluir que realmente as identidades locais estão sendo descaracterizadas através da Indústria Cultural.

Poderíamos destacar também que o sucesso da banda Casaca, talvez estivesse vinculado com uma possível criação de um ``Palinuro''15, onde os jovens capixabas sabem o valor que tem sua cultura, sabem que o sucesso da banda não aconteceu por acaso, e que, neste novo microcosmo, todos podem ser um novo deus. E este seria o verdadeiro motivo deste sucesso pois, ao criar um microcosmo onde existe a possibilidade das existência de vários deuses, a indústria cultural poderia sentir-se atraída em investir no produto capixaba, e esses candidatos a olimpianos conseguiriam chegar ao level de seus ídolos. Adorno analisa esse estado de ápice a proporcionado apenas para alguns mas tão almejado pela cultura de massa como a eterna busca pela felicidade.

"A felicidade não deve chegar para todos, mas para quem tira a sorte, ou melhor, para quem é designado por uma potência superior - na maioria das vezes a própria indústria do prazer, que é incessantemente apresentada como estando em busca dessa pessoa." (HORKHEIMER, ADORNO, 1985, 135: 136)

Mesmo que para atingir esse estagio de felicidade tenha que se abrir mão de sua identidade, conforme Suely Rolnik afirma que:

``Identidades locais fixas desaparecem para dar lugar a identidades globalizadas flexíveis, que mudam ao sabor dos movimentos do mercado e com igual velocidade.'' (ROLNIK, 1997, 20)

Esses movimentos que mudaram a identidade da banda Casaca, que nasceu com o objetivo de divulgar a cultura capixaba, mas que ao inserir-se no mundo globalizado teve que abandonar sua identidade local. São explicados por um dos jornalistas que fez a cobertura da banda ao analisar o antigo CD da banda que foi regravado por uma multinacional:

``A gravadora eliminou do CD as músicas que tinham como marca o regionalismo da Barra do Jucu. Também deixou de fora músicas mais pesadas, como 'Camarada' e 'Leva um Picolé'. Abaixou o volume dos tambores de congo, tirou a distorção das guitarras e inseriu programações eletrônicas em duas faixas do CD. Ou seja, descaracterizou o som do Casaca e tirou dele o que havia de mais espontâneo, que era a percussão rudimentar, tosca e primitiva, acompanhada de letras sobre a realidade da Barra do Jucu''.(José Roberto Neves)

Desta forma descrita por José Roberto a indústria cultural trabalhou com a banda tirando o que de melhor havia dela e padronizando o seu estilo, fazendo com que ela perdesse aquilo que atraiu o grande público que foi a originalidade, o seu bairrismo, para transformá-la em uma banda pasteurizada e com isso a cultura capixaba, representada pelo congo, essa padronização imposta a banda é analisada por Renato Ordicionais para poder inseri-los na cultura de massa, Jesús Matín-Barbero, ao estudar as crises de identidade do homem sob a perspectiva da modernidade chegou a conclusão que:

``As crises dessa modalidade de organização do mundo estão indo causar uma mudança profunda na percepção da escala de tensão entre a tradição e a inovação, entre a arte e culturas cultivadas da cidade e das massas.''17 (BARBERO, 1995, 24)

Finalmente depois desta análise pode-se concluir que existe realmente uma crise de identidade capixaba, soluções para o problema seriam precipitadas, pois o fenômeno Casaca ainda é recente e talvez somente daqui há alguns anos realmente possa ser estudado qual foi o efeito para a cultura capixaba.

A valorização do congo através desta banda é certo que não virá, a identidade capixaba, continuará em crise de reconhecimento, e o capixaba perderá seus sonhos de um dia ser representado por uma banda nacionalmente.

Mesmo que, no final aceite que as identidades segundo Stuart Hall afirma que:

``... a identidade é realmente algo formado, ao longo do tempo, através de processos inconscientes, e não algo inato, existente na consciência no momento do nascimento.'' (HALL, 1998, 38)

Mas, com o desmonte praticado na cultura local, verificado sobretudo através dos jornais, a questão que se levanta é: será que haverá a possibilidade da formação de alguma identidade ao longo da existência de um indivíduo que, estará sendo inserido nesta nova ordem social?

Em suma, querer pensar em uma nova articulação da cultura globalizada onde as culturas locais possam coexistir harmoniosamente com as culturas globais, tornando uma opção para sobrevivência das tradições, é um assunto que mereceria, uma nova pesquisa, e qualquer afirmativa sobre esse assunto seria mera especulação.

Referências Bibliográficas

ECO, Umberto.Apocalípticos e Integrados, São Paulo: Perspectiva, 1993

FREITAS, Ricardo F. Shopping Centers: Ilhas urbanas da pós-modernidade, In: RECTOR, Mônica, NEIVA, Eduardo (org.); Comunicação na era pós-moderna. Petrópolis, RJ: Vozes, 1995

HALL, Stuart.A identidade cultural na pós-modernidade; tradução Tomaz Tadeu da Silva e Guacira Lopes Louro: Rio de Janeiro: DP&A, 1998.

HERSCOVICI, Alain.Identidade capixaba: alguns questionamentos: Escritos de Vitória - Identidade Capixaba; 20, Vitória, 2001

HERSCOVICI, Alain. Economia da Cultura e da Comunicação, Vitória: Fundação Ceciliano Abel de Almeida, 1995

HORKHEIMER, Max, ADORNO, W Theodor Dialética do esclarecimento: fragmentos filosóficos; tradução: Guido Antonio de Almeida: Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1985.

MARCONDES FILHO, Ciro. O capital da notícia. São Paulo: Ática, 1989

MARTÍN-BABERO, Jesús.Modernidade, postmodernidade, modernidades - discursos sobre la crises y la diferencia, Revista Brasileira de Comunicação, São Paulo, Vol. XVIII, n$^{o}$ 2, 1995.

MORIN, Edgar.Cultura de Massas no Século XX: O Espírito do Tempo - I / Neurose; tradução Maura Ribeiro Sardinha: Forense Universitária, 2000.

ORTIZ, Renato. Um Outro Território. Olho D'Água. São Paulo. 1996

PICCININ, Fabiana.Mídias e pós modernidade: Reorganizando as interações sociais tradicionais. Banco de papers do Intercon, Manaus - AM / 2000

PINTO, Virgílio Noya. Comunicação e Cultura Brasileira, São Paulo: Ática, 1999

REIS, Ruth. O jornalismo na produção de uma identidade regional: Escritos de Vitória - Identidade Capixaba; 20, Vitória, 2001

ROLNIK, Suely.``Toxicômanos de Identidade: Subjetividade em Tempo de Globalização'', In: LINS, Daniel S. (org); Cultura e Subjetivada: Saberes Nômades. Campinas, SP, Papinus, 1997.

TÉTU, Jean-François.A informação local: espaço público local e suas mediações. In: MOUILLAUD, Maurice; PORTO, Sérgio D. (org.);

WOLF, Mauro. Teorias da Comunicação. Lisboa, Presença, 1997.

Outras fontes de pesquisa

www.estacaocapixaba.com.br

www.congonaescola.com.br

Jornal Brasileiro de Ciências da Comunicação - Ano 4, N. 152 - 9 de novembro de 2001.

Instituto Nacional do Folclore, Atlas Folclórico do Brasil - Espírito Santo, Rio de Janeiro, FUNARTE, 1982.

Constituição: República Federativa do Brasil. Brasília, 1988.



Notas de rodapé

... Silva1
Faculdades Integradas São Pedro - Faesa
... olimpiano2
Para Edgar Morin, os olimpianos são os sujeitos que dão forma aos anseios da sociedade, eles ``propõem o modelo ideal da vida de lazer, sua suprema aspiração. Vivem segundo a ética da felicidade e do prazer, do jogo e do espetáculo. Essa exaltação simultânea da vida privada, do espetáculo, do jogo é aquela mesma do lazer, e aquela mesma da cultura de massa.'' (MORIN, 2000: 75)

... ``level''3
Ver HORKHEIMER, ADORNO, 1985
... culturais4
Ver também Clancini, Nestor G. Culturas Híbridas. Edusp, 2000

... musical5
Estamos falando do grupo Casaca que deixou de ser conhecido apenas no seu ``gueto'' para assumir símbolos intercontinentais de uma gravadora
... delas6
Ver nos anexos

... 15357
Ver também site Estação Capixaba: http://gazetaonline.globo.com/estacaocapixaba/munic/vitoria/vitoria.html
... consumo8
A influência do consumo global para a manipulação das massas pela indústria cultural será abordada no próximo capítulo.

... Integrados9
Para o autor esses pontos são destacados como formas de enunciar as críticas feitas por teóricos a cultura de massa. Citações extraídas das páginas 40 à 42 (ECO, 1993)
... banda10
Atualmente a banda dispõe de dois sites distintos que se intitulam oficias, em seus shows a banda cita as duas páginas como forma dos seus fãs poderem estar mantendo-se informado sobre assuntos relacionados ao grupo, os endereços são: www.ocasaca.com.br e www.casaca.com.br

... Capixaba11
Ver também www.estacaocapixaba.com.br

... toadas12
Músicas de melodias simples e monótonas marcadas pelo alongamento das vogais finais no fecho dos versos, o que confere um certo ar melancólico entre as batidas de percussão. Fonte: www.congonaescola.com.br

... Jucu13
Grifo Nosso: Com essa entrevista podemos notar que a Indústria Cultural descarcterizou a banda.
...icia''14
O autor afirma não ser possível definir a identidade de uma nação, por isso usa de meios fictícios para fazer a comparação e os estudos ligados a essa área. Para ter acesso a obra completa ver bibliografia

... ``Palinuro''15
Um microcosmo vivido da cultura de massa. Onde habitam dois tipos de olimpianos os ativos e os passivos, sendo que o fosso que separa ambos e menos profundo, pois os contatos entre ambos são fáceis, e os olimpianos são meros mortais. (MORIM, 2000)

... indústria''16
O autor ressalta que existe uma diferença entre padronização e massificação, pois apesar os dois termos parecerem equivalentes os dois tem significados distintos. Para saber mais ver ORTIZ, Renato. Um Outro Território. Olho D'Água. São Paulo. 1996
... massas.''17
``La crises de aquel mode de organización del mundo va a hacer que cambie profundamente la percepción del campo de tensiones entre tradición e innovación, entre arte culto y culturas del pueblo i de las masas'' - MARTÍN-BABERO, Jesús. Modernidade, postmodernidade, modernidades - discursos sobre la crises y la diferencia