Perspectivas de desenvolvimento para o documentarismo

Manuela Penafria, Universidade da Beira Interior

1999

O filme documentário tem uma história recente. Ao contrário do que o mais das vezes se afirma o documentário não nasceu aquando do cinema. As primeiras experiências com as imagens em movimento tinham apenas por objectivo registar os acontecimentos da vida quotidiana das pessoas e dos animais. Assim, o contributo dos pioneiros do cinema para o filme documentário foi o de mostrar que o material base de trabalho para o documentário são as imagens recolhidas nos locais onde decorrem os acontecimentos. Ou seja, é o registo in loco que encontramos no início do cinema que constitui a raiz ou princípio base em que assenta o documentarismo.
Foi apenas durante os anos 20 que se criaram as condições necessárias para a definição do género documentário, nomeadamente com Robert Flaherty (1884-1951) e Dziga Vertov (1895-1954). Estes dois cineastas abriram caminho para o documentário definindo-lhes um posicionamento. Antes de mais, confirmaram que é absolutamente essencial que as imagens do filme digam respeito ao que tem existência fora do filme, ou seja, o cineasta deve sair para fora do estúdio e registar in loco a vida das pessoas e os acontecimentos do mundo. No entanto, a esta obrigatoriedade o documentarista pode responder de modos diversos. Os dois cineastas mencionados são disso exemplo: se o primeiro pedia às pessoas para se manifestarem para a câmera, para se representarem a si mesmas, o segundo pretendia captar as pessoas na sua vida quotidiana de preferência sem que se apercebessem que estavam a ser filmadas. Para além disso, é a partir destes dois cineastas que se estabelece como absolutamente essencial que esse material (imagens recolhidas in loco) seja submetido a uma reflexão. Este momento assume especial relevo na montagem do filme. O documentário não é um mero "espelho da realidade" não apresenta a "realidade tal qual", ao combinarem-se e interligarem-se as imagens obtidas in loco está-se a construir e a dar significado à realidade, está-se o mais das vezes não a impor significados mas a mostrar que o mundo é feito de muitos significados. Isto conduz-nos àquilo que se pretende que um documentário seja, que se exclua o voyeurismo ou mero sensacionalismo a favor do questionamento e da discussão através da construção de argumentos (em especial, e no meu entender, de modo visual - fazendo uso das imagens).
Resumidamente, Robert Flaherty e Dziga Vertov mostraram que é possível existir um filme onde o registo do mundo e a reflexão desse mundo e/ou a reflexão desse registo ocupam um lugar privilegiado.
Mas, o documentário é um género com uma identidade própria que só conheceu as condições necessárias para a sua afirmação enquanto tal nos anos 30, com o movimento documentarista britânico e, em especial, com a sua figura mais emblemática: John Grierson (1898-1972). Aqui encontramos não só o reconhecimento do filme documentário enquanto género autónomo e distinto dos restante filmes como uma efectiva produção de filmes designados por documentário.
Nos seus escritos, nomeadamente no artigo que data de 1932-34 intitulado "First Principles of Documentary" (in Forsyth Hardy, Grierson on documentary, London, Faber&Faber, 1979) Grierson discute e estabelece para o documentário características que o distinguem da restante produção fílmica. Antes de mais, diz tratar-se de um filme de categoria superior em relação à restante produção que também usa material retirado da realidade. Nos "filmes de factos" ("factual films") impera a mera descrição e exposição de factos. Pelo contrário, no documentário, por ele definido como o "tratamento criativo da realidade", há combinações, re-combinações e formas criativa de trabalhar o material recolhido in loco.
Assim, o documentário trabalha os seus temas de modo criativo revelando algo sobre os fenómenos, no caso, os fenómenos tratados eram os problemas sociais e económicos vividos, na Grã-Bretanha, nos anos 30. As temáticas eram apresentadas segundo um determinado ponto de vista. Grierson fala-nos em "revelar a realidade do objecto tratado", em "criar uma interpretação". Essa revelação e interpretação que poderemos designar por ponto de vista, recai sobre as temáticas abordadas nos filmes e registadas in loco. Grierson entendia que os documentários deviam ter uma função social e pedagógica; deviam, ser, sobretudo, um instrumento de educação pública.
A produção da sua "escola" (instalada nas Film Units subsidiadas pelo governo) dependia do financiamento governamental pelo que era suposto que os filmes efectivamente produzidos justificassem o financiamento recebido. Os problemas sociais e económicos eram apresentados como sendo um mero momento de crise que o país estava a atravessar e que estava a ser solucionado pelo governo. Nos filmes eram apresentadas as soluções governamentais para cada um dos problemas abordados. A estrutura "problem-moment" dos documentários dos anos 30 tinha como principal característica o uso da voz em off ao longo de todo o filme.
Embora Grierson reconhecesse que para cada uma das temáticas que possam ser abordadas é possível organizar o material a ela respeitante de diversas formas e que a cada uma dessas formas correspondem abordagens ou pontos de vista diferentes, sobre um mesmo tema, esse reconhecimento inicial foi imediatamente esquecido pela força com que defendeu para o documentário uma função social.
Para além de defender um filme que tinha a obrigatoriedade de apresentar "uma interpretação" sobre a temática em causa, Grierson confere especial relevo ao papel do documentarista como autor criativo. Estando o documentário afastado da mera reprodução dos acontecimentos, o autor do filme intervém de um modo criativo na concretização do filme, assume-se como artista. No entanto, esta intervenção é controlada pelo próprio Grierson enquanto produtor das Film Units (por exemplo, a EMB-Empire Marketing Board e a GPO-General Post Office) onde desenvolveu o seu trabalho no sentido de garantir o financiamento estatal. Na escola de Grierson a criatividade é pois, confrontada com o patrocínio governamental.
Com Grierson ficou definitivamente clarificado que, para chamarmos documentário a um determinado filme, não basta que o mesmo nos mostre apenas o que os irmãos Lumière nos mostraram: que o mundo pode chegar até nós pelo olhar da câmera. É absolutamente necessário que o autor das imagens exerça o seu ponto de vista sobre essas imagens. É necessário o confronto de um outro olhar: o olhar do documentarista. É, também, necessário que o resultado final, ou seja, o documentário, seja o confronto entre esses dois olhares: o da câmera e o do documentarista. Para além disso, o documentário deve pautar-se pela criatividade quanto à forma como as suas imagens, sons, legendas ou quaisqueres outros elementos, estão organizados.
Concluindo, poderemos dizer que o documentarismo assenta em três princípios: a obrigatoriedade de se fazer um registo in loco da vida das pessoas e dos acontecimentos do mundo, deve apresentar as temáticas a partir de um determinado ponto de vista e, finalmente, cabe ao documentarista tratar com criatividade o material recolhido in loco, podendo, combiná-lo e re-combiná-lo com outro material (por exemplo, legendas, outro tipo de imagens,etc.).
Estes príncipios que têm como suporte o passado histórico do documentário marcam a identidade do filme documentário; trata-se de um filme possuidor de um estilo de produção próprio e distinto da restante produção fílmica. No entanto, as características que a escola de Grierson associou ao documentário e que não lhe eram de todo inerentes marcaram-no profundamente. O documentário ficou conotado como sendo um filme de responsabilidade social onde predomina a voz em off (esta é uma das razões porque o documentário é geralmente confundido com a reportagem) de tom sério, pesado e, consequentemente, vulgarmente entendido como maçador e aborrecido. Ao apresentar-se como tal apenas ganhou nos últimos anos nada mais que uma forte marginalização. Os estereótipos que lhe estão associados (por exemplo, supor-se que as problemáticas sociais são as temáticas mais adequadas para serem tratadas pelo documentário) assentam necessariamente na herança que a escola de Grierson lhe legou.
O documentário deve assumir-se e ser entendido sempre como um ponto de vista, como um filme que apresenta e constrói argumentos sobre o mundo. Trata sempre aprofundadamente os seus temas estando por isso, vocacionado para promover a discussão sobre determinado tema, respeitar as aspirações, expectativas e motivações daqueles que filma (e não colocar-se, como fazia a escola de Grierson, acima dos temas dando apenas "voz" às soluções governamentais para os problemas concretos vividos pelas pessoas comuns). O documentário deverá pois, entrar na era pós-grierson. (Cf. Brian Winston, Claiming the real, BFI Publishing, 1995)
Outra questão importante e que é muitas vezes associada e discutida em documentário é o facto de lhe ser inerente uma certa reivindicação da evidência das suas imagens. Ora, no meu entender esta questão está antes de mais e no essencial, próxima do facto de ser necessário ao documentário reivindicar a obrigatoriedade de usar material recolhido in loco. No filme The Thin Blue Line de Errol Morris (1987) sobre Randall Adams que cumpre uma pena de prisão perpétua por um crime do qual afirma estar inocente, apresenta-se a arma do crime sob um fundo branco, ou seja, de modo quase pictórico. Ao apresentar-se assim, descontextualizada, fica certo que o documentário não nos pode assegurar a autenticidade da evidência da imagem. Podemos então concluir que o documentário para ser considerado enquanto tal não necessita de reclamar uma relação próxima com a realidade. Estamos perante um filme fundamental, um filme que solicita uma constante inovação e experimentação de formas e conteúdos, estes são-nos muito próximos. E, se as temáticas tratadas dizem respeito à vida das pessoas e aos acontecimentos do mundo a sua forma depende directamente da criatividade do documentarista. Embora não seja aqui tratada há uma questão importante a ter em consideração no documentarismo, refiro-me ao facto de ser necessária uma atitude ética, essencialmente dirigida aos intervenientes do filme.
Por oferecer uma reflexão aprofundada sobre determinado tema, o documentário desencadeia um envolvimento crítico sobre esse mesmo tema e contribui, enquanto espaço de formas e conteúdos inesgotáveis, para uma melhor compreensão do mundo em que vivemos. O seu olhar não se reduz ao que é óbvio, antes leva-nos a olhares diferentes sobre o mundo e permite-nos olhar o mundo de modo diferente. Por esta razão há um apelo ao debate de ideias, à reflexão e ao envolvimento crítico confrontados que somos com experiências diversas, sejam elas sociais ou pessoais.
Tendo como ponto de partida o estilo do filme documentário enquanto género, poderemos perspectivar o seu desenvolvimento no sentido de se tornar um produto interactivo. Este será um de entre os possíveis desenvolvimentos para o documentarismo; no caso, trata-se da possibilidade de uma produção renovada e inovadora. As novas tecnologias estão aí, assim como a possibilidade de criação de novos produtos multimédia; para além disso, estamos perante a possibilidade de criação de um produto multimédia que tenha como referência, ou melhor, que embora se possa enquadrar no género documentário tenha como principal característica aquilo que distingue as novas tecnologias dos restantes media: a interactividade.
Após os anos 30, a revolução tecnológica que decorreu nos anos 50/60, e que consistiu na introdução e utilização de câmeras de filmar e som síncrono portáteis, é um dos aspectos mais importantes que se pode destacar na história do documentário. Esta nova tecnologia permitiu, por exemplo, a realização de entrevistas de rua (como é disso exemplo o filme de Jean Rouch intitulado Chronique d'un Été, 1960). Este novo equipamento que substituiu o uso do 35 mm permitiu uma maior e diversificada produção de documentários. Novas estratégias, novos estilos, novas formas ganharam vida. São disso exemplo marcante o "cinema-directo" americano, também denominado "the fly-on-the-wall" e o "cinema-verdade" também denominado "the fly-on-the-soup" inicialmente desenvolvido em França. A diversidade resultante deste equipamento tem apenas como único motor a criatividade do documentarista. Uma criatividade que tem com o novo equipamento a possibilidade de se expandir. No caso, com o aparecimento do equipamento portátil tornou-se possível e oportuno desafiar e apresentar alternativas à omnipotente voz em off tão característica da escola griersonina, apostando, por exemplo, em dar "voz" ao cidadão comum.
Se a viragem tecnológica dos anos 50/60, que consistiu na portabilidade e sincronismo dos equipamentos, teve uma importância primordial na história do documentário, hoje somos testemunhas de uma outra viragem tecnológica, nomeadamente a abolição do suporte analógico a favor do suporte digital, utilizado pelas tecnologias informáticas. Esta viragem não será de todo ignorada pelo documentarismo. Para o documentarista as tecnologias informáticas apresentam-se como mais um suporte apropriado para o "tratamento criativo da realidade".
Antes de mais, é essencial que a utilização das novas tecnologias seja alargada a diferentes áreas, e o documentarismo deverá ser uma delas. Acreditamos que daqui resultarão benefícios para o documentarismo. Este novo equipamento, à semelhança do que aconteceu na década de 60, requer e encontra-se disponível para a intervenção criativa do documentarista. E, embora possa ser demasiado determinista responsabilizar o surgimento de novas práticas com o surgimento de novo equipamento, trata-se sempre de um novo momento em que, pelo menos, se confirma que o documentário é um género potencialmente vocacionado para tratar os mais variados temas dos modos mais diversos. Da evolução dos meios técnicos resulta a evolução do género no sentido de uma maior e diversificada produção. No entanto, o documentário permanece o mesmo pois é-lhe já reconhecida uma identidade e estatuto próprios. Se com a anterior viragem tecnológica o documentário deixou de ser exclusivo do ecrã de cinema (35 mm) para passar para o ecrã da televisão (vídeo) agora com a nova viragem tecnológica o documentário surgirá noutro ecrã: o do computador.
Um documentário digital para cuja produção se utilizam os mesmos meios que para a produção multimédia (como, por exemplo, para os CD-ROM's) será um produto interactivo que tem como base as características do documentário. O suporte digital poderá ser uma promessa ou uma ameaça à expansão do documentarismo. Para abordarmos estas questões tomaremos como referência a produção em CD-ROM.
No momento presente da evolução tecnológica, podemos afirmar que as câmeras digitais colocam a questão do documentário digital no terreno das promessas. Está aberto o caminho à produção de documentários em suporte digital uma vez que se possibilita que os registos feitos in loco sejam usados em aplicações interactivas.
Podemos afirmar que há uma maior mobilidade na recolha de imagens com as câmeras de filmar mais pequenas e manejáveis (por exemplo, com uso de comando à distância) permitem captar um elevado grau de espontaneidade. De igual modo, e ainda como exemplo, também é possível descer mais fundo no mar para registar a vida animal que aí se encontra. Abrem-se, pois, novos mundo ao mundo. A partir deste momento estão criadas as condições para que um documentário digital comece a ganhar consistência.
Quanto à obrigatoriedade de ter de se definir um ponto de vista em relação à temática a tratar, o documentarista terá de considerar dois aspectos: por um lado, o suporte digital tem a interactividade como seu principal atributo; por outro lado, o espectador passa a utilizador, ou seja, tem a possibilidade de interagir com o documentário podendo aceder selectivamente por múltiplas vertentes ao ponto de vista em causa, reforçando-se o carácter interactivo do documentário digital. Poderemos ter como ponto de referência a navegação usada em determinados jogos de computador onde só após passagem por um determinado nível se passa a outro (em geral mais exigente no que respeita ao desempenho do utilizador). No caso do documentário poderíamos utilizar esses diferentes níveis como níveis de diferente aprofundamento das temáticas abordadas, ou melhor, como níveis onde progressivamente o autor vai apresentando diferentes argumentos que, no seu conjunto, conduzem a um único caminho, isto é, à ideia que se pretende transmitir relativamente à temática que está a ser tratada.
No suporte digital a interactividade impede um conhecimento anterior do percurso seguido por quem frui o produto. No entanto, através dessas múltiplas vertentes é possível ao documentarista assegurar este ou aquele ponto de vista. Ou seja, é o documentarista que condiciona a navegação. As escolhas serão então assumidamente condicionadas pelo documentarista. O utilizador vê as suas hipóteses de escolha, ainda que aparentemente muitas, sendo progressivamente condicionadas, seleccionadas e orientadas.
Assim, um documentário em suporte CD-ROM, ao contrário dos actualmente existentes, não é descritivo embora explore as possibilidades enciclopédicas do multimédia. Num produto multimédia encontramos conceitos como os de estrutura e dinâmica. Ora, o documentário está habituado a trabalhar a estrutura. A estrutura diz respeito à organização ou disposição da informação, no caso, em menus e sub-menus. A dinâmica implica que se use um número considerável de opções de modo a tornar-se a navegação atractiva e intuitiva. São este dois conceitos que deverão ser objecto de reflexão e experimentação por parte do documentarista.
Finalmente, a criatividade que se exige do documentarista na produção tradicional deve ser agora desenvolvida quer na criação de um interface atractivo quer na elaboração de um sistema interactivo de navegação. O modo como devem os elementos ser combinados e quais os elementos a combinar são os desafios que se colocam ao documentarista no sentido de se criar uma estrutura coerente para abordar o tema em causa e de modo a ficar patente a abordagem ou ponto de vista sobre esse mesmo tema.
Os modelos de interface e sistema de navegação devem ser capazes de criar um "ambiente" apropriado ao tema que se está a tratar e no qual o utilizador é suposto interagir. Esse "ambiente" deverá reflectir o argumento ou ponto de vista que o documentário digital deve defender ou discutir. A grande inovação que as novas tecnologias permitem é sem dúvida a interactividade que, no caso do documentário deverá ser usada no sentido de reforçar determinado argumento e permitir a eventual passagem para outras perspectivas ou pontos de vista sobre determinado assunto (quando, por exemplo se consultarem aplicações on-line) que utilizarão por ser lado a interactividade para reforçar o seu ponto de vista. Um documentário em suporte digital é suposto ser um espaço onde se defendem e discutem pontos de vista sobre um dado assunto.
Trata-se, resumidamente, de desenvolver esforços no sentido de se conjugarem elementos diversos como sendo as características dos produtos multimédia (em especial a interactividade) com as características do documentário. O produto deverá adequar-se à configuração habitual do multimédia e estar de acordo com as exigências próprias do documentário enquanto género.
Criar ambientes interactivos com conteúdos que têm como principal característica serem um ponto de vista sobre determinado assunto exige que se encontrem modelos de interface e sistemas de navegação apropriados a cada conteúdo, ou seja, não será possível estabelecer formas que serão depois aplicadas a qualquer temática. Num documentário digital caberá ao documentarista definir o modelo de interface, as rotas de navegação permitidas, a informação veiculada e o melhor modo de a veicular (por exemplo, se em texto ou em imagem), como permitir explorar áreas afins às apresentadas, etc.
O documentário é um género cujo maior atributo é ser uma porta aberta para o mundo, para diferentes olhares sobre o mundo, para a reflexão sobre o mundo e é, para quem a eles se dedica, um espaço aberto para a experimentação e exploração criativa. O género documentário reinventa-se cada vez que é produzido um novo documentário. Trata-se de um filme onde a relação conteúdo-forma se encontra em permanente criação e recriação. Por seu lado, o documentário digital constitui-se então como uma evolução do documentarismo, um espaço aberto para a manifestação de conteúdos e formas diversos e um novo espaço para a discussão de pontos de vista. Um documentário digital é um conjunto de experiências e ideias sobre determinado tema e que caminha no sentido da empatia, em especial, por parte dos que interagirem com ele. É, também um exercício de criatividade para o documentarista, dada a possibilidade de conjugar diferentes elementos e de dispô-los de modo interactivo, tendo, é claro, em conta o ponto de vista adoptado. É, finalmente, um produto que vai de encontro à necessidade de renovação do documentarismo para uma fase pós-griersoniana, não só pelo alargamento a temáticas que não se pautem apenas por um grandioso e inquestionável valor social ou histórico, como por novas formas de construir argumentos sobre o mundo, como, ainda, pelo facto de se tornar um produto mais atractivo colocando de lado o habitual estereótipo de género elitista.
O documentário em suporte digital mantém aquilo que de mais importante possui o documentário: é uma porta aberta para um conhecimento aprofundado sobre o nosso mundo e sobre nós próprios.