O equilíbrio simbólico das metáforas da realidade

(Análise do filme Naked Lunch de David Cronenberg)

Paula Cordeiro, Universidade do Algarve

2001


1. As metáforas que pela ficção parecem realidade

“Não podemos conhecer as coisas tal como elas são em si mesmas,
pois  a aparência é o que está ao nosso alcance”
[1]

O mundo moderno está repleto de ficções. Vivemos na expectativa, no seio de uma cultura de ilusão. É a experiência estética que nos faz perder essas ilusões e ganhar capacidade para conhecer e definir as nossas apreciações de gosto “(...) A fruição estética é uma experiência que nos garante consonância ou inadequação com o mundo, pelo que tem uma função reflexiva que não está ao alcance de um grande esforço científico nem pode estabelecer-se como precipitada moralização. Prescindir da experiência estética seria renunciar a um meio de conhecimento insubstituível, o luxo a que não pode dar-se qualquer um, e menos ainda numa época de escassas certezas”[2] . As obras de arte servem para nos atrair, para nos atentar às seduções do real. É a experiência estética que amplia os nossos horizontes, pluraliza ou desilude as expectativas, em torno do beau relatif. “A racionalidade estética - a experiência estética que está presente nas nossas apreciações de gosto – não é uma forma paralela da racionalidade; é antes a urdidura de todas elas, confirmando-as ou reprovando-as. (...) A estética não é um substituto da racionalidade, mas antes a sua expansão e alargamento, uma atenção que amplia os seus horizontes e tempera a sua receptividade.”[3] A arte da experiência aumenta a nossa crença na realidade, cria as ferramentas que necessitamos para classificar o real e entendê-la. A arte assume as mais variadas facetas  e como afirmou o teórico Gilles Deleuze, “o mundo é o cinema”.
O cinema são imagens, imagens às quais a câmara pode dar um significado determinado, um sentido único, torná-las diferentes do que na realidade são. Imagens em movimento, dentro de cada plano e com planos combinados entre si. Comparado com a pintura (especialmente a pintura moderna), o cinema recolhe tudo o que está diante da câmara. Mas se a pintura se detém por aqui, no cinema, tudo depende dos olhos que guiam a câmara: o cinema são as imagens, a inspiração, a montagem e o ritmo. Trata-se da criação de um espaço fílmico, diferente do real, onde se desdobra um enredo e se caracterizam personagens. Reflexos de “uma realidade” – a do autor – que se podem transformar em verdadeiras obras de arte. A realidade deve falar por si mesma, e o filme deve ser um espelho fiel dessa realidade, tal qual existe, não deixando grande margem para interpretações ou personalizações do real. “O que não vemos é o inacreditável – no cinema o que interessa é mostrar isso” [4] . Cabe ao espectador fazer a sua própria interpretação, mediante o que lhe é oferecido.
Wim Wenders afirma que cada qual vê a sua realidade, com os seus próprios olhos. “A «realidade». Não existe praticamente nenhum outro conceito que seja mais oco e inútil em relação ao cinema. Vemos os outros, sobretudo as pessoas que amamos, vemos as coisas à nossa volta, vemos as cidades e as paisagens em que vivemos, vemos também a morte, a condição mortal dos homens e a efemeridade das coisas, vemos e experimentamos o amor, a solidão, a felicidade, a tristeza, o medo; em resumo: cada qual vê, por si mesmo, a vida. “Cada qual sabe por si o que isto quer dizer: percepção da realidade. (...) Tornou-se raro no cinema actual que tais instantes de verdade tenham lugar, que pessoas ou coisas se mostrem tais como são.” [5] Influenciado pela ficção romanesca e figurativa, o filme é como uma impressão da realidade, despertando no espectador estranhas expectativas, sobre as quais Christian Metz se debruçou. Negando a realidade, os filmes de ficção criam uma ilusão referencial pela negação do significante na constituição da figura do sujeito. O psiquismo do cinema não só elabora a percepção do real, como também segrega o imaginário, e seguindo o raciocínio de Edgar Morin, ao mesmo tempo que representa, significa. Parece que objecto e sujeito, não se invertendo ou canibalizando, se tornam aspectos de uma mesma realidade, anulando as contradições. É por isso que o mundo da ficção é mais desafiante que o real, pois nele tudo é intencional. A participação activa do espectador – quando este vê o que acredita estar a ver – transporta-o para um simulacro da realidade, um sentimento de actualidade convicta que se desmonta só no final do filme quando se abandona esta realidade fictícia para se afastar dos acontecimentos e regressar à sala de cinema.
Os efeitos de ficção de que o cinema é capaz  têm em si uma forte aparência de real.
Tal como afirmou Bazin, «o cineasta vai criar um cinema da hipérbole e da realidade».
Uma espécie de reprodução da vida, tal como ela é.
O cinema cria novas realidades, multiplicando, invertendo, distorcendo ou alterando o seu movimento, fazendo nascer mundos mágicos que não conhecem regras: “cria relações simbólicas entre acontecimentos e objectos que não têm qualquer ligação na realidade (Arnheim)” [6] . Os poderes da imagem remetem-nos para um domínio delicado e quase secreto: perfeições técnicas à parte, como explicar que uma imagem nos fascine e outra apenas nos desperte interesse pelo seu contéudo? Essa atracção vem do mistério que cada imagem encerra em si, tal como o mistério dos seres e das coisas. A imagem é sempre uma alteração voluntária ou não, da realidade, e constitui um segundo mundo, com características próprias, pelo que nos coloca sempre perante processos de derivação. São profícuas as realizações em torno da ficção científica, que normalmente transportam o espectador para contextos que dificilmente verá realizados para lá da sétima arte. Invasões de marcianos em “The War of the Worlds” de Byron Haskin, a cidade futurista “Alphaville” de Goddard ou o épico “2001: A Space Odissey” de Stanley Kubrik, são filmes que através da arte da ilusão nos fazem crer que o perigo e a magia existente naquilo que nos parece fisicamente impossível, é nada mais nada menos que pura realidade.
As imagens que vemos no cinema têm um forte sentimento de realidade, pois dela estão muito próximas, muito embora se trate sempre de uma realidade estética pessoal e subjectiva do cineasta, onde o belo e o feio são facilmente misturados num mundo de magia e sonho, criando um casamento entre as verdadeiras formas do universo e aquilo que somos capazes de inventar. Dizia A. Bretton, que a vida é um criptograma que os cineastas decifram à sua maneira. Filmar impõe-se-lhes como uma parte da sua vida, algo de que raramente se conseguem afastar.
A riqueza do cinema está na capacidade de interpretação que fazemos dessa realidade, tanto pelas mãos do cineasta como à posteriori em cada espectador. O mais importante é a forma como o realizador vai traduzir a sua visão do assunto, transmitindo de uma forma concreta aquilo que até aí era apenas domínio da sua imaginação. “Um autor é um indivíduo que possui um mundo particular e uma visão pessoal desse mundo particular” [7] . Não tanto revelador de obsessões pessoais, o trabalho de David Cronenberg tem sido visto como uma crítica irónica dos males que afectam a nossa sociedade. Em alguns casos, explora as imagens até ao limite do possível, transformando-as nos nossos piores pesadelos. Esta é uma das razões para que muitos dos seus perturbantes trabalhos sejam encarados como fruto da insanidade do autor. No entanto, ao longo dos últimos vinte anos, Cronenberg tem-nos presenteado com alguns momentos memoráveis no cinema.
O seu interesse pela cisão entre o corpo e a mente tem dominado os seus trabalhos. Recuemos a 1975, para recordar a história de “Shivers”, um filme sobre um parasita que deveria ocupar o lugar de orgãos incapazes de assegurar o funcionamento do corpo. A disseminação do parasita ultrapassa os limites do corpo da personagem, acabando por se dispersar para outros corpos, mergulhando-os numa orgia repugnante. Outros filmes rodavam histórias directamente ligadas ao controle da mente sobre o corpo e em 1986, Cronenberg realizou “The Fly”, sobre as mutações fisicas e mentais de que um cientista é vitima, depois de uma experiência mal sucedida.
“Naked Lunch” enquadra-se numa trilogia específica, que embora não seja indiferente ao tema do corpo, explora abertamente a questão da capacidade da mente para controlar o nosso comportamento e o nosso destino. A tríade é composta por “Videodrome” em 1982 e “Dead Ringers” em 1988. O primeiro é um dos mais complexos filmes de David Cronenberg, no qual o realizador consegue fazer confluir a fantasia na categoria do real, a ponto do espectador, tal como o protagonista da história, não ser capaz de estabelecer os limites para cada conceito, experimentando violentas alucinações de cariz sexual. “Dead Ringers” é baseado numa história real, a de dois irmãos gémeos cuja consciência pugna por estar dividida em dois corpos. O ano de 91 é marcado por “Naked Lunch”, um filme no qual os livros e a vida de William Burroughs se fundem, para contar a história de um exterminador de insectos que dependente da droga, consegue alucinar a sua existência e a sua produção literária. Reconhecido pela sua capacidade para criar trabalhos que exploram de forma inegável a alucinação e o fantástico, na sua adaptação de “Naked Lunch”, Cronenberg ofereceu-nos uma obra dura, despojada de palavras onde as imagens se fazem valer por si e nos permitem a interpretação. Os planos equilibrados, as movimentações suaves da câmara, a iluminação que projecta sinuosas sombras sobre os rostos das personagens, a decoração de cores pouco reais, a interpretação dos actores quase bressoniana, os elementos fantásticos que interagem com a realidade como se fossem organismos normais dentro dela, e a música de inspiração jazzística encarregam-se de conceder a esta obra toda uma atmosfera kafkiana [8] . Comparáveis a Méliès, os trabalhos de David Cronenberg antecipam as transformações da sociedade, recorrendo às maravilhas da técnica para criar metáforas que habilmente se transformam em realidade. Debruçando-se sobre a imagem do corpo, Cronenberg constrói uma semiótica muito particular à volta deste tema, usando as suas modificações possíveis para representar  os constrangimentos subjacentes às alterações que o Eu tem vindo a sofrer. A dissolução da identidade do Eu, é igualmente um paradigma das consequências da nossa existência, perante uma contemporaneidade individualista e altamente tecnológica. A dualidade mente/corpo, é substituída pela trilogia mente/corpo/droga, que resulta  no entorpecimento da nossa noção de existência, gerando fenómenos de violência, sexualidade, desejos incontroláveis e a própria morte.

2. “Naked Lunch” a história

“- Bom filme.
- Sim – digo eu. – Bastante estranho.
- Não tão estranho como isso.
- Acho que não era essa a ideia.
- Mas o filme tinha alguma ideia?
- Acho que sim – digo eu. – E só isso já o torna estranho.”

In “Filmes Tristes”, de M. Lindquist

Com a assinatura inigualável de David Cronenberg, “Naked Lunch” é um dos mais bizarros e desconcertantes filmes dos últimos anos. Adaptado ao cinema a partir do romance não menos perturbante de William S. Burroughs, o filme resulta numa obra peculiar, que não encontra paralelo entre o livro e as imagens. O livro é um retrato da Interzone, uma cidade ficcional na qual os homens se transformam em insectos durante o sexo, o destino para onde Burroughs escapou depois de na vida real, acidentalmente, ter morto a sua mulher. "Naked Lunch"  é uma história sem enredo definido, que David Cronenberg  ousou  adaptar, inventando novas formas para o cinema. A liberdade criativa do realizador, baseada num fascínio pela vida e obra de William Burroughs resultaram num filme que ultrapassa as expectativas, ao transpôr para o grande écran a imagética do universo de Burroughs, povoando as imagens da nossa experiência com fragmentos do mundo.
1953. Nova Iorque. "Naked Lunch" é um filme que nos conta a trajectória de Wiliam Lee, um intelectual viciado na droga que se tenta afastar do seu meio, para levar uma vida banal. Trabalha como exterminador de insectos, tentando negar a sua personalidade e capacidade criadora. É esta acção de fuga que vai sustentar a trama do filme e o desenvolvimento da personagem de Lee. Enquanto procura manter-se «limpo», a sua mulher embarca numa rota de dependência do veneno que o marido utiliza no trabalho. Joan Lee utiliza o pó insecticida para se drogar e convida o marido a participar no novo prazer que descobriu. Joan é-nos apresentada num estado alienado, com o aspecto degradado do corpo de um drogado. Em desespero, Bill procura um  especialista,  Dr. Benway, um verdadeiro charlatão que lhe fornece uma droga feita a partir do corpo de uma centopeia brasileira, muito rara. A sensação de desassossego aumenta na perplexidade das alucinações que começam a tomar forma. Lee é detido pela polícia, e na esquadra é confrontado com um surpreendente insecto que fala por uma boca de formato anal. A criatura assume-se como sendo sua chefe e dá-lhe ordens precisas para assassinar a sua mulher, revelando-lhe que Joan é uma espia, uma agente encoberta pelas formas humanas ao serviço da Interzone. Nesse dia, Lee chega a casa e encontra a mulher na cama com um dos seus melhores amigos, enquanto outro lê para os dois amantes uma passagem do livro "Naked Lunch" de William S. Burroughs. Facto no mínimo curioso, e se atentarmos que é o capítulo “The Market”, onde Burroughs descreveu a fauna que existia na Interzone, ficamos coma terrível sensação de que algo nos ultrapassou. Perante o cenário que encontra, Bill Lee acaba por se injectar com a substância que o Dr. Benway lhe havia entregue, e partilha do êxtase comum que se vivia em sua casa. Resolve divertir-se com a sua mulher e tenta acertar num copo que ela colocou em cima da cabeça. Através de um espelho, o espectador pode observar o momento trágico em que a bala disparada atinge a cabeça de Joan, que morre instantaneamente. É então que a rota de devaneio começa, com Lee a entrar numa alucinogética viagem pela Interzone,  num roteiro escapista em que experimenta todo o tipo de alucinações. Em "Naked Lunch" a mente acaba distorcida pelo uso do pó insecticida, levando o protagonista a embarcar numa rota delirante, sob a capa de agente secreto na quimérica Interzone. A dependência atira-o para uma psicótica relação de escravatura, que inclui encontros com figuras resultantes de estranhas metamorfoses, na qual a sua máquina de escrever lhe dá as coordenadas para as suas missões. 
A confusão instala-se: será "Naked Lunch" de David Cronenberg um filme autobiográfico de Burroughs? Cronenberg não se limita a folhear "Naked Lunch", usando para a construção da narrativa fílmica algum material sobre a própria vida de William s. Burroughs. Depois da morte da mulher, Burroughs fugiu para Tânger, e escreveu o romance "Naked Lunch", onde representa todo o processo criativo de um escritor. O poder imaginativo da mente afectada pela droga está presente em quase todas as cenas do filme, criando uma excentricidade relativamente à ficção científica. A viagem pela mente das personagens, como havíamos visto nos filmes  “The Dead Zone“ ou “The Fly”, onde o corpo se assume se assume como protagonista,  confere-lhe uma inquietação pelo exagero dos devaneios resultantes do estado de psicose em que William Lee mergulha. Este alheamento da realidade, transporta-nos para um mundo ficcional com uma estrutura semelhante ao mundo real, mas que no seu âmago se mostra perverso, e numa busca das nossas emoções e prazeres mais caros, explora as capacidades aparentemente ilimitadas de abstracção do ser humano,  criando um universo muito próprio, onde é difícil distinguir a realidade da alucinação. A sua criatividade desperta, em consequência da morte da sua mulher, e vai tentar reparar a tragédia  pelo acto criativo de escrever. A história avança e Lee toma contacto com uma estranha criatura que o introduz na Interzone. O Mugwump, alicia Lee a entrar neste estranho mundo e para escapar às malhas da lei, Lee embarca na «viagem». Troca a sua pistola por uma máquina de escrever e é na loja de penhores que podemos perceber claramante a divisão entre as duas partes do filme. Na montra da loja, o empregado substitui a máquina de escrever por uma estranha escultura: o pé de uma centopeia. Neste momento abandonamos a realidade para entramos no mundo ficcional que Lee vai criando à medida do seu desespero. Este universo não encontra paralelo, confluindo as noções de alucinação e realidade a ponto de sermos incapazes de as difenciar. O conceito de realidade já foi ultrapassado por este universo que só Lee é capaz de reconhecer e desenvolver. A veracidade do mundo que circunda a cidade de Nova Iorque deixou-se ultrapassar pela alucinação de Lee, num potente conjunto de imagens tomadas como percepção, muito embora não tenham objectos que lhes correspondam. Na primeira parte do filme, Cronenberg apresenta-nos as personagens e cria a divisa que irá suportar o enredo. Nesta segunda parte,  desenvolve uma intriga complexa, num universo absurdo e surrealista que só as personagens podem reconhecer como real. Cronenberg não deixa nunca as amarras da realidade, provando em vários momentos as alucinações do herói. Na Interzone,  Lee  trabalha como agente encoberto, para relatar uma série de estranhos acontecimentos. Integra uma organização que não conhece, sendo obrigado a alterar a sua personalidade e orientação sexual.
“I want you to type a few words into me, words that  I’ll dictate to you” [9] . A frase é de Clark-Nova, a máquina de escrever que Lee utiiza, e com quem desenvolve uma relação peculiar. A máquina, com o formato de uma barata, encarna comportamentos demasiado humanizados: pensa, fala e reage,  esbatento as diferenças entre o humano e o inumano, tal como todas as criaturas que têm contacto com Lee e o incitam na tomada de decisões e atitudes. “First sentence is: homosexuality is the best all-around cover an agent ever had” [10] . Esta relação com a sua máquina de escrever está numa subordinação directa com o consumo de droga, da qual Lee vai cada vez depender mais. Os seus braços, negros de tantas picadas, revelam a sua dependência narcótica. Deambula por esta estranha cidade, misteriosa e decadente, em tudo semelhante à cidade de Tânger, onde se cruza com as mais variadas criaturas e personagens. Hans que lhe fornece a droga para alimentar a sua narcose, Ives Cloquet, um suiço refinado e hedonista, atraído pelos jovens e as relações que com eles vai mantendo, o adolescente Kiki, com quem Lee desenvolve o seu lado homossexual e Tom e Joan Frost, um casal de escritores norte-americanos. Fechado no seu quarto de hotel, deixa que a máquina de escrever, oriente a sua escrita e a sua existência ébria.


3.Good Girls go to Heaven, Bad Girls go Everywhere:
a irresistível subliminação narcótica, a entrada na Interzone

 “N’importe où, n’importe où hors du monde” [11]

A conotação de exotismo que se dá a um certo consumo de droga, quando consumida por grupos bastantes restritos, está muito afastada do flagelo da toxicodependência -  sintoma  de crise social que nos atormenta há décadas e tem assumido dimensões muito preocupantes. O homem sempre procurou modificar as suas sensações, o seu humor e as suas percepções, assim como a sua orientação em relação a si mesmo e com relação ao seu meio. Estas «férias para fora da realidade» como A. Huxley referiu, têm feito parte da história da humanidade e seja o alívio das dores, a redução da ansiedade ou a tentativa de obter modificações no modo normal de percepção e de orientação frente ao seu próprio meio, a utilização de substâncias psicotrópicas serve para obter novas intuições, aumentar a sua criatividade e a intensidade das experiências sensoriais e estéticas na produção de um certo estado de narcose. Independentemente da razão, muitos são os que necessitam de um alheamento episódico da realidade. Abstraírem-se do seu mundo numa evasão puramente hedonista. De facto, os efeitos que essas substâncias produzem são uma motivação para a sua utilização, fortalecendo a crença no realismo dos efeitos produzidos por essa substância.

Há certamente uma predisposição psicológica para o desfrute dos efeitos quando estes já são conhecidos. A sensação mais próxima - a excitação pela velocidade - é apenas um dos parâmetros semelhantes ao tentar atingir diversos graus de embriaguês, de atordoamento, de euforia, aquela sensação de estar a voar ou de vertigem, como quando se rodopia até perder o equilíbrio, quando se jejua ou quando se  respira profunda e rapidamente [12] . “Naked Lunch” é um filme que se inspira em factos passados há quarenta anos atrás e num «projecto de escrita», como o próprio Burroughs o define. Estávamos em plena Beat Generation. <
Mais do que um movimento cultural e social, a Beat  assumiu-se como um estilo de vida, uma forma de resistência, de provocação, de valores e contra valores, de onde emerge a escrita crua, friamente realista e sarcástica de Burroughs. Neste contexto, a relação sexual era determinante, especialmente na homossexualidade, numa reivindicação do novo corpo amoroso. O mesmo se passava no que diz respeito ao uso da droga: existiu todo um espectro de experiência de drogas que chegou à autodestruição mais ou menos consciente e ao uso experimental de alucinógenos, na procura de uma mística capaz de produzir o que a lucidez artística era incapaz. A loucura que caracteriza os artistas não é mais do que uma intimidação e desilusão em relação ao mundo e às pessoas, à sociedade em última instância. A procura de novos prazeres acaba por ser um desafio ao perigo que deles advém. Os paraísos artificiais que os constituem esboçam-se na libertação espiritual que a embriaguês manifesta, estados da sensibilidade mais vivos, capazes de uma produtividade sem igual, contra o «politicamente correcto». Esta purga da consciência, obriga a dizer o que se sente, a viver de maneira excêntrica, à margem do que é socialmente aceite.
Em “Naked Lunch” a viagem resulta de um certo entupimento mental com todo o tipo de substâncias, criando uma realidade distorcida, semelhante em alguns casos a uma verdadeira trip psicadélica. Cronenberg relata a sua primeira experiência com LSD como uma grande trip, “uma experiência reveladora, porque eu pensava que aquilo que nós consideramos como realidade é a penas uma construção dos sentidos. Pode mostrar-te que existem tantas realidades quantas consigas viver, e que as podes mudar e controlar” [13] . De facto, só as drogas têm a capacidade de por em causa a identidade do indivíduo, trazendo por vezes à consciência a identidade perdida no subconsciente. E se “as drogas podem ser utilizadas na qualidade de excitantes e estimulantes (...) tanto servem para diminuir como para aumentar a sensibilidade” [14] , resultando num espectáculo de embriaguês, pelas alterações do espírito que a droga proporciona. Certas substâncias “modificam o poder que há em cada um de nós para criar um universo sufocante, no qual a metamorfose física, que não é reflexo da dependência mental, aniquila a liberdade do sujeito” [15] . Na relação de Bill Lee com o mundo, impera o inesperado, num constante efeito narcótico a que, apesar da elevada estimulação dos sentidos,  corresponde uma apatia, observável nas cenas em que Lee se detém a observar, de olhar vago e parado, algo que nunca percebemos de que se trata.
É a angústia criativa do escritor em conexão com o seu mundo.
William S.Burroughs foi testemunha do delírio que as drogas podem provocar, recordando-o através de apontamentos e notas que foi tomando ao longo do tempo e que são um fiel retrato do universo de um junky. “O drogado necessita cada vez de mais junk para manter a forma humana. Junk significa o poço do monopólio e da posse. O drogado fica de parte enquanto as suas próprias pernas o levam directamente à reincidência. Quanto mais junk se utiliza menos se tem e quanto mais se tem mais se usa. Todos os alucinogéneos são considerados sagrados pelos os que os ingerem (...) Junk... o produto ideal, a mercadoria do sétimo céu. Não há necessidade de se saber vender. O próprio comprador rastejará pelo cano de esgoto, implorando a compra... O traficante de junk não vende o produto ao consumidor, mas o consumidor ao produto. Não melhora nem simplifica a mercadoria. Degrada e simplifica o cliente” [16] . Foi este estado de «doença» que Burroughs chama à toxicomania, que lhe permitiu um certo atordoamento dos sentidos, uma deriva da consciência que não conhecia o início ou o fim. O tempo perdeu o seu conceito e o espaço tornou-se um mundo mágico no qual ao autor vagueou, encarnando o seu alter-ego, William Lee.
Em “Naked Lunch”, Burroughs foi escrevendo a sua «viagem», e o livro resultou numa obra ímpar, de estrutura arrojada. A forma como traduziu as imagens da sua consciência resultaram numa prosa discricionária, com transições abruptas e ordem aleatória, reflexo da tormenta alucinogética que criou um novo género literário.
“Naked Lunch”  rompeu com a tradição norte americana e tornou-se uma espécie de livro de culto, emblema de uma geração, que David Cronenberg escolheu para adaptar ao cinema. Filmar o livro de fio a pavio seria incongruente, além de impossível. O filme resulta de uma mistura que Cronenberg foi cozinhando a fogo lento: envolveu elementos deste livro de Burroughs, bem como de outras das suas obras, misturando-os habilmente com a vida real, acrescentando ainda algumas alucinações muito pessoais.
O «herói» do script de David Cronenberg é William Lee, um homem que havia deixado a droga e a produção literária para se tornar um cidadão comum. Abraça a profissão de exterminador de insectos e acaba por descobrir que a mulher Joan tem vindo a consumir o pó insecticida. A frase “It’s a Kafka high. It makes you feel like a bug”, revela-nos o estado de dependência de Joan, que Cronenberg materializa pelas imagens, ao mostrar Joan a respirar para cima de uma barata, que cai morta. Até aqui as semelhanças com a vida de William S. Burroughs ficam-se pelas coincidências, mas são as correspondências entre as duas artes – literatura e cinema –  que deixam perceber no trabalho de Cronenberg a marca indelével do escritor norte americano. Não só em “Naked Lunch”, como noutros filmes, a temática de Cronenberg revela um estilo «Burroughsiano», que neste caso transpira o espírito do livro. Com “Naked Lunch”, ninguém sabia o que esperar, pois a obra em si era tão complexa, que permitiu a Cronenberg uma imensa liberdade criativa, conduzindo a narrativa de uma forma especial, cruzando em variados momentos a realidade e a ficção, impossibilitando o espectador de fazer a destrinça. A história do exterminador deixa-se confundir com os vários níveis de realidade que encontramos no filme: aquela que habitualmente concebemos como verdadeira, aquela que faz parte dos elementos de ficção próprios do cinema, e a que o protagonista cria, o seu mundo pessoal, derivado de potentes alucinações.
A alucinação, estimulada pelo uso da droga, destrói a realidade que aglutina e asfixia Lee – a sua personagem sente-se rodeada de insectos humanos e animais, numa cidade opressora e repressora. É a fuga que dá o mote à narrativa fílmica. Essa fuga, fisicamente impossível, consegue-se pela criação de uma nova realidade, diametralmente oposta à que conhecemos como verdadeira. Tal projecto só pode conseguir-se pelo recursos à estimulação dos sentidos para criar imagens puramente ilusórias. Quando Lee descobre o estado de dependência em que Joan se encontra, começa também a consumir o pó que utilizava no seu trabalho de exterminador. É por esta altura que a riqueza visual começa a tomar conta daquilo que pensamos ser a realidade: Lee é abordado por um agente da autoridade que é um estranho insecto. A partir daqui,  Cronenberg faz dissolver a metáfora que sustenta o denominador comum entre os humanos – a aparência física - indiferenciando neste ser  o humano e o inumano. “Eu quis que o mugwump fosse semelhante ao corpo de um drogado, mais humano do que no livro. Eles (as criaturas) falam, por isso tive de lhes criar bocas. Fui praticamente provocado a criar coisas. Tal como os insectos que são máquinas de escrever – que não estão no livro – mas que Burroughs adora” [17] . O corpo, que Cronenberg tem orientado de acordo com uma suporta divisão do mundo e das suas categorias, manifesta uma marca clara do monstro com o seu outro, na tendência para a diluição do significante a favor do corpo amorfo, esbatendo as diferenças perante o Mesmo, quer seja um hermafrodita ou a representação de uma figura dos dois sexos sob uma aparência que transcende a normalidade e o humano, absorvendo os signos pelo seu contrário, transformando o próprio corpo em signo delirante [18] , que significa alternadamente, tudo e nada. O corpo é um conjunto de lugares onde a ordem se revela como conflitual, e o lugar do encontro ou da coincidência de forças antinómicas. Quando o corpo de um outro, ou um outro corpo intervém, o jogo das diferenças atinge a sua máxima glória. O corpo é de facto, o lugar do duplo ou o lugar do duplo onde a ordem se revela como conflitual, ele é de facto o campo onde se afrontam objectivos tão inconciliáveis como a realização do prazer e a conservação da vida. Inconciliáveis porque o prazer, como efeito de ruptura, não cabe na coerência da ordem orgânica; porém, tudo se passa como se o prazer tendesse para a dissolução da ordem orgânica. A experiência do prazer é um fenómeno de ruptura que irrompe na coerência do sistema: a soma das pequenas diferenças entre a percepção, a recordação e a espera tem como efeito a anulação de uma ordem, efeito esse que se revela como sendo, por natureza, ilimitado [19] .Pode tornar-se alvo de uma excitação de tipo sexual e é, virtualmente uma zona «erógena». E todas estas zonas só têm uma função, a de produzir prazer pelo efeito de ruptura que nelas se manifesta; a soma das «pequenas diferenças» que mostram que não há nada que coincida perfeitamente – a soma dessas diferenças constitui a ruptura onde o prazer se produz. O corpo de Cronenberg é um pólo de comunicação onde tudo é referente de um todo que cabe a nós decifrar. As figuras pelas de náusea parecem querer dizer qualquer coisa, numa expressividade particular que acumula fórmulas humanas e animais, num lugar de metamorfose irremediável. Bill Lee, rodeado de máquinas que são verdadeiros actores – quer pela sua pertinência para a história, quer pela sua participação para o significado do filme – é a imagem do «corpo sem órgãos», um fantasma à procura do seu corpo, figura de um certo horror do orgânico, das funções naturais e da sexualidade que tão bem caracterizam o trabalho de Cronenberg, numa imagética recheada de misoginias, homossexualidade, atracção sexual,  fetichismo e mutilação do corpo e da própria mente. A originalidade de Cronenberg vem da extrema excentricidade na abordagem que faz do corpo humano. É a partir do corpo físico que o autor estrutura o resto, condicionando e afectando as extensões e projecções. Trata-se de aceitar a existência e as regras da vida, pervertendo-as a nosso favor para satisfazer um desejo do devir. Na história, são as transformações físicas decorrentes da dependência que fazem desaparecer os contornos humanos das personagens, enviando-as para um submundo degradante, em que o corpo - seco e desfigurado - é apenas um veículo para a satisfação da necessidade, e a mente um balão flutuante num universo criativo. Parafraseando Baudrillard, podemos dizer que Cronenberg consegue que a linha de demarcação do humano se torne cada vez mais flutuante, à medida que mergulhamos no biológico, à medida que saltamos a barreira da espécie, desregulamentando as regras morais e simbólicas que têm regido o humanismo [20] . Toda esta iconografia em torno das mutações físicas e dos insectos provém directamente da obra de Burroughs, numa proximidade entre a realidade e a fantasia. O panorama da Interzone, repleto de insectos e monstros prova que toda a imaginação do escritor se concretiza perante as formas do mundo real,  desafiando-as no permanente conflito que se desenrola na consciência de William Lee e que dá alento à construção da narrativa de “Naked Lunch”. O contacto com o «estranho» agente da autoridade é a porta de entrada para uma nova forma de encarar a realidade, que impossibilita o espectador de distinguir o real do irreal, por perceber que o protagonista perdeu a razão. Cronenberg acumula índices que nos provam que William Lee está a ser vítima das suas próprias alucinações. Apesar de termos mergulhado num universo único desde o início do filme,  é quando Lee recebe ordens para  matar a sua mulher que a décalage da realidade assume contornos preocupantes. Começa a viagem pela Interzone, uma cidade imaginária onde Lee é confrontado com um universo de pesadelos povoados por insectos, desejos repugnantes e conspirações secretas. Crê que é um agente secreto ao serviço de um insecto. Começa a receber ordens da sua máquina de escrever, uma barata com alguns contornos de humanidade. A desorientação de William Lee é visível no consumo abusivo que faz das drogas, desde um narcótico feito a partir de uma rara centopeia brasileira até ao sémen dos mugwump (uma das estranhas criaturas que habitam a Interzone). Esta desorientação cresce à medida da culpa que invade a personagem, depois da morte – aparentemente acidental – da sua mulher Joan. Quando descobre que jamais se livrará do peso da sua culpa, submerge num estranho universo surrealista. Envolve-se com outro casal da Interzone, Tom e Joan Frost, os dois escritores com quem Lee irá manter uma conturbada relação, especialmente pela obsessão que desenvolve por Joan, uma cópia do semblante da sua falecida mulher. Por esta altura o filme é uma mistura do mundo de Burroughs e de Cronenberg.

“Nothing is true, and everything is permitted”

As obsessões de Cronenberg já estão a nú e a vida e obra de William S. Burroughs são plenamente indistintas, a ponto de não sermos capazes de distinguir onde começa e acaba cada uma delas. Remetendo em muitos momentos para a vida de Burroughs, “Naked Lunch” é um filme que se centra na questão dos mistérios inerentes à criação artística, personificados por Lee, marginal e toxicómano que retornou à literatura em busca da redenção, numa tentativa permanente de exorcizar os fantasmas da grande tragédia que se abateu na sua vida. Bill Lee é a representação da origem de uma «certa vontade de criar», que ocorre depois de balear a sua mulher na cabeça. É isto que o leva “a criar o seu próprio lugar - Interzone - como se de alguma forma essa morte ocorresse uma e outra vez” [21] .
Em “Naked Lunch”, os fragmentos da vida de Burroughs remetem-nos para a sua retirada da realidade pelo uso de drogas. Burroughs vivia perante uma constante ameaça tentando por todos os meios escapar-lhe. Tomou contacto com o próprio invasor, que manobrou os seus pensamentos para uma eterna luta, da qual só podia livrar-se pela escrita [22] . Jünger afirma que “ o pensador ou o artista, se está em forma, conhece tais fases em que uma nova luz o invade. O mundo começa a falar e a responder ao espírito num excesso exuberante. (...) Esta «forma» é independente do bem-estar físico, opondo-se-lhe, às vezes, como se um estado de debilitamento facilitasse o acesso das imagens à consciência“ [23] . Burroughs, perseguido pelos espectros do acidente passado precisava de subtrair o peso da culpa, expiando os seus pensamentos num reduto alucinatório que o deixava esquecer e criar um amplo mundo novo. Esta fuga produzia-se na escrita, que Burroughs operou intensamente, para se expurgar do que o assolava. A escrita, algo que tradicionalmente se representa como vindo de dentro para fora, uma criação do autor que se expõe ao mundo, é pervertida em “Naked Lunch”, para adoptar uma nova perspectiva que a traz para o exterior, numa dissolução das fronteiras entre as coisas. Existe um certo sentimento de esquizofrenia, fomentada pela criação do mundo como um cenário claustrofóbico, pleno de universos interiores que não abandonam nunca  a mente do herói. O herói de Cronenberg vê-se confrontado com o seu imaginário em imagens surrealistas que são a Interzone, a cidade que revela os meandros da sua/nossa consciência. É a morte de Joan que leva Lee até à «sua» Interzone, um ambiente totalmente criado pelo próprio. Quando escreve, o local físico onde Lee se encontra é na realidade Nova Iorque, a cidade de onde nunca saiu e onde decorreram as filmagens. Enquanto personagem da narrativa que ele próprio compõe, Interzone é o espaço ficcional, num oscilar entre vida real e ficção, que Cronenberg consegue tão bem retratar. O filme decorre em dois cenários diferentes: Nova Iorque em 1950, que Cronenberg caracterizou com uma aura de film noir e a Interzone, que com todo o seu misticismo característico se materializa com o aspecto da cidade de Tânger. Sem nunca ter saído da mente de Bill Lee, a Interzone resulta numa extensão dos desígnios da mente, com todas as perversidades e abismos que lhe são próprios.
As criações de Cronenberg, profundamente viradas para o interior do ser humano, conseguem criar universos paralelos. A cidade de Tânger, no seu exotismo, não existe. Cronenberg explica que aquela que construiu, “é mais fiel à cidade, completamente artificial” [24] . Esta versão decadente da cidade, é uma das muitas referências ao género film noir, que encontra reflexo no vestuário, na música, na iluminação e na trama de mistério que articula a narrativa. Nos primeiros trinta minutos, Cronenberg apresenta as personagens, situando-as na cidade de Nova Iorque. Depois, a Interzone é apresentada com uma dimensão própria, envolta numa certa bruma e atmosfera musical. É aqui que o espectador percebe que a existência banal de Lee terminou. A negação da sua identidade e criatividade é-nos mostrada da forma mais desapaixonada possível. Cronenberg não evoca qualquer emoção durante a apresentação das personagens, nem quando levanta o véu da trama que se vai seguir. A manipulação que condicionou a morte da mulher de Lee, acaba por o conduzir ao estado de alucinação capaz de produzir uma nova vida, com todos os elementos que lhe são necessários. O panorama da Interzone, repleto de insectos e monstros, prova que toda a imaginação do escritor se concretiza perante as formas do mundo real,  no permanente conflito que se desenrola na consciência de William Lee e que dá alento à construção da narrativa de “Naked Lunch”, enquanto Lee busca desesperadamente uma forma de recuperar as sua vida.


4. A embriaguez no paraíso artificial da Interzone: a misoginia na ambivalência das relações

A sexualidade faz parte da nossa existência, desempenhando um papel privilegiado na nossa relação com o mundo. Indissoluvelmente ligada à nossa imaginação, a sexualidade é uma representação do homem com o seu mundo, vivida de forma real e imaginária. “Há osmose entre a sexualidade e a existência, ou seja, dizer que a existência se difunde na sexualidade, reciprocamente a sexualidade se difunde na existência, de sorte que é impossível indicar, para uma decisão ou uma acção dada, à parte da motivação sexual e das outras motivações, impossível caracterizar uma decisão ou um acto como sexual ou não sexual” [25] . A sexualidade não é somente física, não é somente genital. Ela é desencadeada pelo desejo e incarna-se no corpo que transporta a existência [26] . A bissexualidade, presente numa sexualidade ambivalente é outro dos temas constantes em David Cronenberg. A perversidade em todas as suas formas está presente, tal procura de extremos, possibilidades e limites, como se um fantasma não deixasse outra alternativa senão a destruição, que os escritores, de expressão vaga no rosto,  reconhecem pelo seu cheiro adocicado. Como um círculo que se fecha sobre si mesmo estes comportamentos que têm na sua génese uma forte motivação escapista, tornam-se “uma cultura de servidão, sem a presença do outro, uma vez que cada um se substitui ao outro no papel de opressor. É o cúmulo da servidão voluntária” [27] . Não se trata de sexualidade, mas de droga perversa que concretiza desejos e fantasias.  Em toda a narrativa, fílmica ou literária,  ficção e realidade misturam-se de forma magnífica. Entre as personagens criam-se relações de ironia e afecto que propiciam toda a lógica sexual que lhes está inerente. A função tradicional do sexo muda, e mudam também os pontos erógenos do corpo humano. O prazer retira-se da exploração das novas formas do corpo, as fantasias eróticas são quase abstractas, mantidas com base numa série de jogos de perversidade. A satisfação que obtêm com estas novas aventuras sexuais vai muito além do simples prazer sexual, funcionando como uma libertação total das suas emoções. A envolvente sexual sucumbe ao alheamento do corpo, num conjunto de alucinações quimicamente estimuladas.
A mutação do corpo humano desencadeia a queda de tabus, vergonhas ou preconceitos, traduz-se numa rejeição das formas mais tradicionais de expressão da sexualidade para experimentar formas desiguais de viver e sentir.  O poder de sedução, da anatomia do corpo em estreita ligação com a produção imagética da narcose, desperta interesses muito característicos no conformismo masculino – feminino. Essa relação é determinante para um crescimento deliberado da perversidade das personagens, que encontram na relação homossexual uma fuga ao modelo padrão, e nos corpos desfiguradamente caracterizados, o potencial erótico do seu prazer sexual. Na narrativa de “Naked Lunch”, Burroughs descreveu a Interzone como o lugar da homossexualidade, num estado de permanente inconsciência. A perversão sexual é exposta, ao mesmo tempo que se questiona as preferências pelo mesmo sexo, como se a Interzone  fosse “uma colmeia de sexo e negócio” [28] .  É também pelo sexo que este filme se afasta dos parâmetros da normalidade e nos perturba. A paranóia que as personagens desenvolvem em torno dos vectores corpo-sexo-droga, numa estranha dependência física que se afasta dos poderes narcóticos de algumas drogas, derruba por completo as nossas fronteiras entre realidade e ficção, libertando o desejo, poluíndo as margens entre o aceitável e o inaceitável, o possível e o impossível. Seguindo o raciocínio de Junger, este efeito da droga age tanto sobre a acção como sobre a contemplação, abrindo portas a paraísos artificiais onde as figuras centrais da trama perdem a sua força interior, descaracterizam-se perante um desejo que não preenchem por completo, fragmentando-se em torno das ligações que desenvolvem. O sujeito transvia-se e busca mais do que pode ter, num desejo que é por natureza descontrolado. O desejo insatisfeito, tão bem protagonizado pelo mito de Narciso, compreende a satisfação/insatisfação que a droga  proporciona. A embriaguez dos sentidos torna-se cada vez mais ardente, imagem de uma espiral labiríntica cujo preço do prazer é atroz e devorador. “O preço exigido pelo prazer não cessa de subir; trata-se então de voltar atrás ou deixar-se arruinar, corpo e bens (...) o puro e simples prazer já não chega” [29] . A inconsciência do ser, perante o constante estado de embriaguez proporciona novas experiências, uma atitude sexual que contorna a censura e não conhece limites ou controle. A história concentra-se  nas respostas estranhas, muitas vezes chocantes de um grupo de pessoas que encaram novas ideias e formas de estar, na redescoberta da sua sexualidade latente e uma nova vitalidade nos seus corpos atrofiados de junkies. A homossexualidade está explícita, muito embora Cronenberg fique longe da escrita implacável de Burroughs. A entrada na Interzone implica uma atitude homossexual que Bill Lee aceita naturalmente, talvez fruto da pressão e influência dos insectos que o rodeiam. Há no filme, uma metáfora para a crise da identidade sexual. A repressão de desejos homossexuais é caracterizada pela bissexualidade ambivalente e pelo extermínio das formas de heterossexualidade, representadas pelo casal Bill e Joan Lee. Embora muito reservado, Bill conviveu durante muito tempo com pensamentos e  profundos desejos homossexuais que sempre tentou reprimir. Joan quase que o força a tolerar esses desejos em função do pó insecticida, sem o qual já não conseguia viver. A mente de Bill entra num verdadeiro turbilhão e a revolta avassaladora conduzem-no a matar a sua mulher, destruindo simbolicamente a sua heterossexualidade. Os contornos da sua atitude são obscuros demais para percebermos os trilhos da sua sexualidade, pois Bill não chega nunca a assumir a sua homossexualidade, refugiando-se sempre na heterossexualidade, desta vez com Joan Frost, uma mulher que conhece na Interzone e que a seus olhos é igual a Joan Lee. A heterossexualidade fundamenta-se na reprodução da espécie, ao passo que a homossexualidade é a sexualidade no seu estado mais puro, que não se justifica senão por ela mesma. Esta ansiedade que as personagens de Cronenberg revelam em relação à homossexualidade poderá espelhar-se nas figuras grotescas com que a mesma é representada. Seguindo a ideia de Burroughs, que associa sempre os insectos a algo de negativo, Cronenberg criou figuras de aspecto repugnante, semi-répteis com formas e atitudes humanas.
Em "Naked Lunch", as figuras masculinas revelam características tipicamente femininas, como a timidez, a fragilidade e a insegurança. A misoginia é um tema recorrente na filmografia de David Cronenberg, um fascínio paralelo à sua preocupação com o corpo, na sua evolução pela simbiose, transformação parasitária e mutação. Esta composição evidencia-se também em “Naked Lunch” , na figura de Joan Lee, pela atitude inatingível que nutre pelo o seu marido. Mais do que as mulheres, Cronenberg critica a heterossexualidade, representando a mulher como o mal latente, numa luta entre a misoginia e a ambivalência sexual. Joan é uma metáfora da figura mítica de Eva, que se deixa tentar, não pela serpente mas pelo pó insecticida. Nesta relação, o pó torna-se mais forte, e Joan converte-se numa viciada, desrespeitando todos os preceitos morais que até aí conduziam a sua vida. A infidelidade toma forma com um dos amigos de Bill (enquanto outro lê para os adúlteros).
A corrupção do homem pela figura masculina atinge o auge quando Joan tenta seduzir o marido para o consumo do pó insecticida, muito embora assuma no final do filme a forma da salvação, pois sem Joan, Bill Lee não consegue escrever uma linha. O paradoxo está presente, se não atentarmos aos dois lados da história: a contradição desvanece-se quando percebemos a ambivalência do ser humano perante o mal que seduz pela repugnância, tornando-se necessário.
Embora resistente, Lee embarca também nas maravilhas do pó de pireto amarelo, alucinando a sua existência. Muitas vezes é difícil perceber a diferença entre o real, a ficção e a alucinação, por isso, quando Lee é induzido a matar a mulher por um insecto que conhece na esquadra, depois de ter sido apanhado na posse de pó insecticida, ainda não se percebem as diferenças entre o mundo real e o mundo de Lee. Depois de matar a mulher, a abordagem por seres estranhos continua, e desta vez Lee é assediado por um mugwump, uma criatura grotesca, que lhe diz para escapar para a Interzone onde deverá escrever um relatório sobre o sucedido.
É através do relatório que a misoginia se começa a desenvolver, num tom pornográfico personalizado pelas máquinas de escrever. Há uma certa ligação entre a violência que vitimou Joan Lee e a pornografia que se segue, na transformação de máquinas de escrever em criaturas hermafroditas, apropriadas de vaginas e elementos fálicos. O ponto chave desta teoria da misoginia decorre de uma revelação da máquina de escrever de Bill, quando afirma que «homens e mulheres são duas espécies diferentes, com propósitos diferentes na Terra» [30] . As máquinas são uma alegoria da guerra dos sexos, representando cada um deles pela voz que assumem. A Clark-Nova de Lee tem uma voz masculina, enquanto a Martinelli de Tom Frost é vocalizada por uma mulher. As máquinas encarnam também as duas espécies de insectos que existem na Interzone – baratas e centopeias, homem e mulher, respectivamente A alegoria vai mais longe e na imaginação de Lee, uma vez que a sua mulher Joan correspondia a uma centopeia, uma agente especial cujo único intuito era matá-lo. A ideia de fazer as mulheres pertencerem a outra espécie é uma forte representação do Outro. Toda a simbologia em torno dos insecot pode funcionar como referente do Outro. Tanto a mulher como o homossexual são a representação do outro, na metáfora da barata e da centopeia. Lee embarca numa procura do seu Eu, mantendo inequivocamente o eu e o outro fora da margem manipulada que existe em "Naked Lunch" – a identificação não se completa nem na barata (o sexo masculino), nem na centomeia (o sexo feminino), muito menos no hibridismo que existe na homossexualidade enquanto representação do outro. Helmuth Plessner, filósofo que se ocupou do papel próprio do corpo na vida humana concluiu que existência física não é nem uma evidência nem uma coisa natural, mas uma relação entre si (eu) e ele (corpo). Tal como todas as relações, é cheia de dificuldades, pois não é só corpo, nem tem só corpo. É uma balanceamento entre ser e ter, entre fora e dentro, enquanto síntese de todas as antíteses até aqui detectadas no modo de conhecimento. Neste panorama, nem as mulheres nem os homossexuais servem para desenvolver uma relação. A mulher pela sua alteridade vigente – a centopeia – e o homossexual pela sua postura de assumida diferença em relação ao sexo e à sexualidade. A atracção pelo mesmo não permite a relação de alteridade, ainda que esta esteja virtualmente presente na desfiguração dos insectos que povoam este universo irreal. O processo de mudança – que deriva da narcose e crise de identidade – deixa o carácter das personagens num limbo flutuante, do qual não conseguem sair nem observar progressos. O desespero é a única forma de escape, que vai lentamente produzindo novas identidades, baseadas numa crença imagética propiciante de novos conceitos e sensibilidades.  A experiência do mundo, conduz-nos quase sempre para fora daquilo que nos rodeia, resultando muitas vezes num movimento sem destino traçado. A questão do outro, que nos é exterior, implica o pensamento da heteronomia numa acção de transcendência sob o signo da interrogação. A liberdade do pensador exprime-se na verdade, por se alienar e ao mesmo tempo conservar a sua natureza e identidade, permanecendo o mesmo, apesar das solicitações que o outro lhe apresenta. Lévinas reduzia o outro ao mesmo, numa fórmula à qual se reduz a liberdade e a autonomia, que equivale à conquista do ser pelo homem através da história. Nietzsche rejeitava qualquer distinção entre este e outro mundo, afirmando que só existe um mundo, rico de cores e movimentos, em perpétua mudança, da qual o homem participa, valorizando o devir em relação à estabilidade e à permanência [31] . Nietzsche distinguia o mundo “verdadeiro” do “aparente”, fundando-se na própria realidade, já que outro tipo de realidade é indemonstrável. Além disso, o “verdadeiro ser” tem características do “não ser” e o mundo real foi construído em contradição com o mundo aparente. Um outro mundo é apenas um conjunto de fantasmagorias sobre uma vida melhor, para estabelecer um contraponto com a vida “real” que levamos.
Na Interzone, outro casal vai corresponder a esta cisão entre o homem e a mulher, numa espécie de horror às relações sexuais normais: Tom e Joan Frost são dois escritores que ajudam a desconcertar a percepção de Bill Lee. Tom está empenhado na morte da sua mulher, que vem preparando há muito tempo, através de bruxaria e de um engenhoso plano para destruir a sua sanidade  mental. Este desejo de morte é estranho, uma vez que Tom e Joan vivem vidas independentes, não existindo à partida razão para esta busca da  sua destruição. O próprio Tom é um verdadeiro paradoxo, por não admitir os factos. Ao desfiar o engenho que criou, acaba por culpar a criada, a quem anteriormente tinha pedido colaboração para os bruxedos. A noção de absurdo não é de todo nova nesta narrativa, uma vez que também Bill Lee não consegue perceber se matou a sua mulher por acidente, ou se realmente tinha intenção de o fazer. Acaba por se convencer da tese de acidente por si criada. O caso de Joan Frost é explorado por Bill Lee da melhor maneira possível, indiciando mais uma vez a sua culpa pelo acidente anterior. É ele que vai acabar por salvar Joan Frost do cerco criado pelo marido, muito embora acabe por ser ele a a matá-la mais tarde. Joan é o elemento essencial da existência de Bill Lee, na representação do passado, no momento de cada cena e nas cenas futuras. Cronenberg não deixa em nenhum momento que dela nos esqueçamos, pela sua constante presença em cada momento criativo de Lee e no imaginário que compõe a Interzone, pela figura de Joan Frost. Quando finalmente consegue começar a reconhecer a perda,  eis que se obriga – imaginando acatar as ordens de um mugwump – a escrever um relatório sobre a morte de Joan, revivendo esse momento constantemente, num sofrimento que alimenta a sua criatividade [32] e o leva numa fuga que retorna sempre ao mesmo ponto. A narrativa construída na primeira pessoa faz mudar toda a realidade e todas as regras em função do ponto de vista da personagem no qual Joan aparece como uma abstracção, um ícone a partir do qual Lee irá tirar energia para eternizar um momento que reproduz incessantemente.


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. SNOWDEN, Lynn, Which is the Fly and Which is the Human? – Interview with William S. Burroughs and David Cronenberg

. BALDASSARRE, Angela, Cronenberg’s Naked Lunch – a Journey Beyond Reality



[1] HUSSERL

[2] INNEARARITY, Daniel, A Filosofia como uma das Belas Artes, Lisboa, Ed. Teorema, 1995, p. 15

[3] Idem

[4] Jean Luc Godard

[5] Wenders, A Lógica das Imagens, p. 45

[6] GEADA, Os Mundos do Cinema, pág. 102 Comentário falado de Wim Wenders sobre o diário de viagem filmado (Tokyo-Ga) rodado em 1983/84 in WENDERS, Wim, A Lógica das Imagens

[7] WEYERGANS, Tu e o Cinema, pág. 156

[8] GONZÁLEZ-FIERRO SANTOS, David Cronenberg: la estética de la carne, p. 187

[9] Quero que me escrevas algumas palavras que te vou ditar

[10] A primeira frase é: a homosseualidade é o melhor disfarce que um agente pode ter

[11] HUXLEY, Moksha, p. 23

[12] NOWLIS, A verdade sobre as drogas, p. 22

[13] SNOWDEN, Which is the Fly and Which is the Human, (revulsion nº 5), in  http://zappa.users.netlink.co.uk/cronen.html

[14] JUNGER,  Drogas, Embriaguez e outros Temas, p.34

[15] ROUYER, Les Faux Semblantes de l’ Interzone, in Positiv, p. 10

[16] BURROUGHS, Alucinações de um Drogado - «Refeição Nua», p. 9

[17] BALDASSARE, Cronenberg’s Naked lunch, a Journey Beyond Reality, in http://zappa.users.netlink.co.uk/cronen.html

[18] Seguindo neste caso, a linha de pensamento de José Gil

GIL in Metamorfoses do Corpo, p. 39 - 41

[19] LECLAIRE, desmascarar o Real, p. 54

[20] BAUDRILLARD, A Ilusão do Fim, p. 144

[21] GONZÁLEZ-FIERRO, David Cronenberg – La estética de la carne, p. 177

[22] “I live with the constant threat of possession, and a constant need to escape from possession, from control. So the death of Joan brought me in contact with the invader, the ugly spirit, and maneuvered me into a lifelong struggle in wich I have had no choice except to write my way out”, David CRONENBERG in RICHARDSON, Cronenberg Does Burroughs, p. 23

[23] JÜNGER, Op. Cit., p.33

[24] CRONENBERG in GRUNBERG, Sur les Terres de Conenberg, in Cahiers, 446, p.37

[25] MERLEAU-PONTY, Op. Cit., p. 197

[26] FONTOURA, O Corpo como Apropriação, p. 49

[27] BAUDRILLARD, A Ilusão do Fim, p.151

[28] BURROUGHS, Op. Cit., p. 189

[29] JÜNGER, Op. Cit., p.29

[30] “That women and men are different species, with «different purposes on Earth»” in SCOTT, David Cronenberg: Emergence of an Auteur, p. 5

[31] NIETZSCHE, Friedrich, Crepúsculo dos Ídolos

[32] ROUYER, Les Faux-semblants de l’Interzone, p.13