Descrição e continuidades: al-Andalus e poesia do século XX

 

Luís Carmelo, Universidade Autónoma de Lisboa

 

SIMPÓSIO : LITERATURA E CULTURA NO GHARB AL-ANDALUS

13-15 de ABRIL DE 2000

 

 

A descrição, ou, por outras palavras, a reposição literária das essências da espacialidade, resulta de um princípio de selecção metafórica e expansão metonímica aplicado pela esteticização da linguagem no seu mimetizar da realidade. É possível que o tema específico da descrição da natureza, muito presente e, portanto, também bastante codificado na poesia do Gharb al-Andalus, tenha contribuído para enraizar tradições posteriores, ainda que latentes, ao nível do imaginário descritivo do território ibérico que o fruiu e propagou. Em estudo recente[1], A. Galmés de Fuentes demonstrou que a poesia clássica árabe é, de algum modo, matricial no tema, tendo mesmo decisivamente influenciado a lírica provençal: “...las referencias a la naturaleza suelen ser muy escasas y elementales en las literaturas románicas primitivas. Recuérdese a este respecto que en el Poema del Cid, por ejemplo, sólo encontamos repetida una brevíssima, aunque muy bella, descripción del amanecer, tal como la que siegue: ‘Ya crievan los albores - e viene la mañana/ ixie el sol, - Dios, que fermosa apuntava!” (1996:113).

O espaço da natureza, como todos os lugares, existe enquanto construção e, nessa linha de ideias, num âmbito estritamente literário, ele enuncia-se sobretudo para ser colonizado pelo dizer e evocar poéticos que o contemplam e transfiguram. Assim sendo, passamos a analisar, no presente artigo, alguns sinais da continuidade que a poética do Gharb al-Andalus do século XI e XII terá projectado em alguma poesia contemporânea ibérica. Pelo facto de termos tabalhado, nos últimos três anos, num projecto de tradução de dois poetas da área, Ibn ‘Abdûn de Évora e Ibn Sâra de Santarém (com os Prof. Jose Mohedano e Teresa Garulo, respectivamente[2]), procuraremos encontrar ecos das suas temáticas descritivas particulares na poética hispânica recente, onde incluimos poetas da geração espanhola de 27 e ainda um conjunto menos homogéneo de poetas portugueses. Se a geração de 27 traduz a busca de uma modernidade poética ilesa de narratividade e, ao mesmo tempo, é fiel guadiã de um arquitexto tradicional, torna-se, ela mesma, como é evidente, num campo fértil para o emergir de ecos como os que tentamos ecleticamente situar. Já, no caso português, foi nossa intenção procurar um corpus poético estranho àquelas vanguardas do século XX que, por natureza das suas rupturas singulares, mais se tenham protegido dos ecos involuntários da tradição.

Como disse Ibn Sâra de Santarém, no seu Panegírico de Abú Umayya ibn ‘Isâm, é “sobre a face branca de uma página/ que, ao mesmo tempo, por meio da tinta negra/ das linhas, (se) anuncia/ noite e dia...”; ou seja, é por meio do propagar silencioso da aura poética que, ao mesmo tempo, universos e imaginários remotos admitem partilhar um presente e um passado aparentemente irreconciliáveis. Tal como a nocturnidade e a clareza apolínea partilham idêntico desocultar no seio da cidade poética. Será, pois, a partir da descrição comparada que tentaremos sintetizar e sinalizar as configurações discursivas mais relevantes que justifiquem a pressentida continuidade no arquitexto poético ibérico.

 

1. Uma rede de estilizações

 

Na contemporaneidade, fala-se muito em rede. Rede urbana, rede de significação, rede de conhecimento. Tudo parece furiosamente comunicar e atravessar tudo, num amplo mapa onde as próprias explicações são abertas e, claro, em rede. No tempo e espaço de que nos ocupamos, a rede é ainda a repetição de um traço revelado original que os frescos reproduzem, que a sucessão de sons e ritmos evocam, que a poesia prodigaliza. A fonte desta rede é divina e a sua actualização é, portanto, um longo pasmo de cuidada repetição; Jean-Paul Charnay referiu a este respeito: "comme le fait le dikr, répetition inlassable du nom de Allâh, la contemplation du rythme speciale musulman"(...)"tend à anéantir le sentiment de la durée par abolition de contrastes entre éléments différents"(1983:24). Este contexto empresta à poesia do Gharb al-Andalus a ideia de uma estilização sem fim que, como referiu, há anos, Emilio García Gómez (1943:48), acaba por criar uma rede rítmica de pausados versos, largos, abertos ao olhar demorado do poeta.

O detalhe tem, na cadência desse concerto, tempo para emergir e singrar: “...com seu cantar,/ rumorejava esse pássaro/ que escolheu como morada/ a densa floresta de salgueiros./ E com o seu canto, os pequenos olhos se abriam” (I.‘A.,f.1). O olhar aparece aberto à mínima fragrância, mas também à disputa da totalidade, como diria Pedro Salinas - “Abrir los ojos. Y ver/ sin falta ni sobra, a colmo/ en la luz clara del día/ perfecto el mundo” (Vocación,83) -, e pode sobretudo surgir, através das suas cambiantes diversas e multifacetadas, numa demora que se diria deleitada: “Que noite de Sevilha, a nossa, tão bela,/ nas margens do rio !,/ em marcha/ se havia posto o engenho,/ ao largar-se seu rebanho, o vinho;/ criava lágrimas de salgueiro nocturno,/ olhos e mirones; das águas/ as mais finas e breves correntes” (I.‘A.,f.22).

Por outro lado, a delonga da observação parece querer transfigurar o objecto que se contempla. Vejamos, por exemplo, como Ibn Sâra descreve uma simples beringela e Lorca o seu São Gariel: “Redonda e agradável ao gosto,/ água abundante a alimenta/ em todos os jardins;/ e tal como o pé-de-folha a sustenta,/ mais parece o coração de uma ovelha/ levado pelas garras de uma águia” (A beringela); “Un bello niño de junco,/ anchos hombros, fino talle,/ peil de nocturna manzana,/ boca triste y ojos grandes, nervio de plata caliente...” (San Gabriel,1990:203). Esta atitude cismática, plena e morosa, como que se predestina a “recuperar os olhos de antes de haver idade” (Fernando Echevarría, Sobre os mortos, In memoriam - a Eduardo Luiz,1991:91), porventura no momento de uma ingenuidade onde o traço repetido reescreve, para sempre, o gáudio da primeira criação de toda a natureza.

 

2. Micro e macromundos

 

Esta rede estilizada estende-se ao longo de uma parede quase perpétua, onde a iconicidade, isto é, a capacidade de estabelecer semelhenças, aproxima, a cada momento, o infinitamente grande e pequeno. Ao fim e ao cabo, ao concerto do mundo e à sua permanente criação (os kun sucessivos[3]) assistem a totalidade dos seres e das suas manifestações, sejam gotas da chuva ou desmedidos céus. É, por exemplo, a água do lago e o rosto absorto, perturbado: “Olho sempre a tua face com apreensão:/ eras a água clara onde abundam/ os crododilos” (I.S.,Apreensão); é, também, o sol entre estrelas e o rosto ainda, mas agora velado e iluminado: “Sob a túnica de prata/ cobre-se com um chaile de ébano./ Guardada pelos olhos/ é a sua face/ como o sol/ entre duas estrelas. (I.S.,Um sol entre duas estrelas); ou são, por fim, as estrelas e o elementar orvalho: “Creyó que el mar era el cielo;/ que la noche, la mañana./ Se equivocaba./ Que las estrellas, rocío...” (A ‘Niebla’, mi perro, 339).

Contudo, se atentarmos aos versos de Fernanda de Castro, verificamos a mesma sintaxe de pasmos entre pó de estrelas e a ocasional teia dos insectos: “Imaginem, se podem, pó de estrelas,/ flocos de nuvens, colchas de violetas,/ as pétalas de todos os rosais,/ as asas de milhões de borboletas./ imaginem, no céu, a lua cheia/ tecendo lentamente a sua teia,/ desfolhando-se em pássaros, em flores...” (As dunas onde estão ?, Colóquio Letras/ 100,11-12/1987: 93). Todo o universo surge assim unido num único gesto, entre o imediato e o magno, qual o dos “pájaros que se (...) alzan a su cielo” (Emilio Prados,Ciudad Sitiada,297) e que Fiama Hasse Pais Brandão assim resumiu: “Levantando os olhos/ para o ar imenso vejo/ um loureiro branco...” (Âmago I-Nova arte,s/d:40). Esta arrastada estilização une e chega a colocar ao mesmo nível Córdova, a grande capital do antigo califado, e um qualquer olfacto maravilhado: “Orgulham-se os seus da sua glória,/ quando se ouvem nomeados,/ tal como o olfacto se esvanece/ com a fogosidade das murtas.” (I.S.,Panegírico de ibn Hamdín II)

 

3. Retórica compósita

 

A selecção de metáforas e a correspondete expansão metonímica da poesia do Gharb al-Andalus, ao arrepio de uma codificação muito estreita e cortês, recolhe comparantes da mais diversa origem. Nesta retórica apetecível e larga como o é a sua estilização, as flores mais delicadas da poética clássica árabe, rosas ou nenufares, surgem lado a lado com a beringela, a alcachofra, ou os juncos. Decicidamente, toda esta poética se desoculta, entre cadências reiteradas, como um tapete sem limites, onde o que conta é uma espécie de ritmo perpétuo a unir toda a curvatura da imaginação; onde o que conta é a respiração do absoluto. Os exemplos desta rede compósita equiparam as laranjas à erva pura: “Cuando yo me muera,/ entre los naranjos/ y la herbabuena” (F.García Lorca,Café cantante,1990:189); ou fazem equivaler juncos e rosas “Diante de ti, o meu poema manifesta-se/ como o vento do sul, pródigo em chuvas,/ e que no seu sopro saúda os pequenos juncos e rosas” (I.S., Panegírico de Abú Umayya ibn ‘Isâm).

O próprio ritmo da poesia de Manuel Alegre não parece imune a uma tal arrumação, aparentemente desigual - “O fogo estava dentro das imagens/ Palavras estátuas pontes estádios...” (Manuel Alegre, Chegar aqui,1984:13) -, do mesmo modo que Ibn Sâra, enfatizando por momentos o amor ao fogo, conclui com particular leveza - “florescida de chicórias/ sobre algodão cosido pelas mãos das nuvens,/ ó flores, cujos cálices/ o vento amava;” (I.S.,Castidade).

 

4. A nudez dos objectos

 

Muitas vezes, a estilização observa o objecto na sua dimensão depurada e até hiperreal. Já não se trata apenas de demora, de delonga, mas antes da coisificação que tenta rever num objecto o concerto total de onde provém o ritmo, o fruto mesmo da estilização. M. Heidegger, em A origem da obra de arte referiu que a tradição ocidental, pelo facto de chamar “às coisas propriamente ditas meras coisas” (um mero cesto, uma mera mesa, um mero candeeiro - 1991:22), se limitou a pensar, “até aqui, no ser do ente”, - e não no ente, ele mesmo (na mera coisa). Para ilustrar este facto óbvio, o autor apresenta o exemplo dos sapatos da camponesa que vivem com ela, que se calçam nela e que estão, nesse acto quotidiano, no ‘aí’ da sua função concreta; ou uso, ou instrumentalidade tácita (ibid.:23-4).

No entanto, se, de repente, esses mesmos sapatos (meras coisas) surgirem evocados numa tela de Van Gogh e, portanto, aparecerem radicalmente suspensos da sua instrumentalidade, uso e função - logo, nesse preciso momento de desnudação, como que se repõe, “no indefinido”, o ser do que eram, até então, esses meros sapatos. A essência, ou “o ser como é” dos sapatos, recoloca-se, emerge e transforma-se, assim, subitamente, naquilo que é. Nesta medida, a representação dos sapatos, no óleo de Van Gogh, “constitui a abertura do que o apetrecho, o par de sapatos da camponesa, na verdade é” (ibid.:27); ou melhor: “na obra, não é da reprodução do ente singular que cada vez está aí presente, que se trata, mas sim da reprodução da essência geral das coisas” (ibid.:28).

Quer isto dizer que o puro despertar da essência das coisas (diga-se, a designação do que uma coisa é como é) traduz a natureza do que faz da ‘mera coisa’ uma ‘coisa de arte’. Neste ordem de ideias, como acrescenta M. Heidegger mais à frente no seu ensaio, a “verdade” que acontece nesse tipo de obra, torna-se “intemporal e supranatural” (ibid.:29). É essa também a natureza da coisificação que faz dos objectos a sua própria pura mudez, na acepção de uma plurisignificação sem limites.

As laranjas, insistentemente pintadas na poesia de Ibn Sâra, inserem-se nesta ordem de rara depuração: “...com a sua beleza/ não permite aos olhos que vejam outra coisa:/ parece-me, às vezes, uma chama ardente/ e, outras vezes, o crepúsculo dourado.” (I.S., A laranja); ou ainda: “As laranjas oferecem as suas faces,/ emulando brasas, ou, talvez, dir-se-ia/ que guardam delas, no peito, o rescaldo/ até arderem como faíscas soltas e sem chama,/ numa fusão onde os desejos se pavoneiam/ sobre um brocado de magníficas carpetes,/ cobertas pelo perfil de folhas de topázio/ e pérolas de orvalho envolvendo o colo.” (I S., A espera e as laranjas).

Esta digressão centrípeta em torno da coisaificação do fruto-fogo, ou da sua verdade revelada e trazida ao ser, também parece ecoar na poesia de Al berto: “...ofereço-te uma laranja/ tenho sempre laranjas escondidas no fundo das algibeiras/ berlindes com olhos assustados de pantera, cordéis encerrados/ bons para estangular/ Lâminas doces para abrir sinais de vida sobre a pele” (Al berto, O medo/Alguns truques de ilusionismo,1991:178)

 

5. Paisagens irrealizadas, transfiguração do visível.

 

A estilização praticada pelos dois poetas do Gharb al-Andalus não escapa, é evidente, a quadros artificiosos, isto é, constituídos, aqui e ali, por esquemas fixos que se distanciam, em princípio, da experiência. Um dos exemplos mais emblemáticos deste tipo previsível e artefactual de construção poética é o que H. Pérès (1953:209) assinalou em torno dos temas do rio e, por outro lado, complementarmente, da cota de malha do guerreiro, quando o vento agita as águas do rio.

No entanto, este processo poderá ter a sua origem na observação das águas paradas, açudes e barragens que a complexa hidráulica islâmica edificava em torno das cidades. O tema tende, pois, por lógica própria e insistente, a extravasar a codificação que lhe é prévia; daí que a tensão entre esse extravasar e a regra imanente garanta o ritmo e a vivacidade dos versos: “A terra revestiu/ a cota de malhas/ com os seus caudalosos rios,/ desembainhando as suas mãos/ a espada/ dos (seus)( regatos;/ todas as cotas de malha/ são como as que dão forma/ ao vento fresco e suave,/ quando faz ondear as águas/ e nelas se vêem afiados sabres,/ que na espuma borbulhante/ conseguem recuperar a cintilação.” (I.‘A.,f.7).

Esta prática pode eventualmente tornar-se mais conceptual e até apressada na sua enunciação: “polido brocado e águas límpidas,/ onde quer que a brisa sopre / e em cuja superfície resplandeça/ o sol dos conceitos, arrebatando os olhares”(I.S., Panegírico do Juíz Abú Umayya ibn ‘Isâm); ou pode ser mais avidamente lírica e lenta: “Contempla o rio/ coberto com o manto/ da cor dourada da tarde/ que uma noiva tingiu;/ mas, quando o zéfiro sopra,/ logo o seu peito treme/ e protege a cintilante armadura/ de um valente guerreiro.” (I.S.,O rio que treme); como pode, por fim, acentuar a própria transfiguração do visível: “Olha para a lua/ e para o seu bruxulear num espelho de água/ de ondas resplandecentes,/ como uma mó de jade verde/ inscrita em ouro vermelho.” (I.S., A lua no espelho de água).

Tudo se passa como tendo origem na antiguidade de um ritmo que transborda, a pouco e pouco, estas imagens codificadas e tranquilas que são sucessivamente convocadas e repetidas; Lorca tê-lo-ia, talvez, dito doutro modo: “Bebe el agua tranquila /de la canción añeja.” (Balada de la Placeta, 1990:182)

 

6. O resgate do paraíso

 

A figuração poética de um paraíso vegetal, composto por jardins verdejantes e luxuriantes, aliás à revelia do paraíso urbano cristão, aparece sistematicamente associado a um vasto corpus de tradições islâmicas peninsulares. Quando os mouriscos de Aragão e Castela (caso dos textos do Mancebo de Arévalo), já no século XVI, quiseram representar a sua finitude pressentida, logo convocaram este riquíssimo intertexto, onde a mitificação e a mistificação da terra ibérica é transposta para a súbita imagem “dos planos” ou “das portas do paraíso”, como pode ler-se na última das quatro profecias[4] do Manuscrito. 774 da Biblioteca Nacional Paris[5].

A representação do paraíso pode surgir, involuntária, através da pura descrição exuberante, o que é visível nos ecos comuns a Ibn ‘Abdûn e a Vicente Aleixandre, ou pode obedecer a estigmas mais definidos e conscientes: “...jardines/ donde flores tropicales elevan sus juveniles palmas gruesas./ Palmas de luz que sobre las cabezas, aladas,/ mecen el brillo de la brisa y suspenden/ por un instante labios celestiales...” (Vicente Aleixandre, Ciudad del paraíso, 1990:245); “árvore colossal/ tem situada a sua copa/ por cima das estrelas mais brilhantes,/ por serem elas as mais afastadas,/ e submerge a raíz dessa árvore/ sob todas as outras mais próximas”. (I.‘A.,f. 49)

 

7. Contrastes fortes

 

Um desses estigmas mais definidos e fortes é-nos dado pela figura dos acentuados contrastes. Quer isto dizer que o mundo ideal paradisíaco acaba por afirmar-se mais categoricamente ao esbater-se face ao longínquo deserto reminiscente, ao camelo e até à personificação da montanha hostil e altiva. As trevas, as penosas viagens nocturnas, as travessias sem oásis contribuem também para criar este coro de obstáculos e dificuldades que contrastam com a água e a verdura de edenística do paraíso. Aliás, a grande frequência de estruturas antitéticas na literatura de língua árabe não se cinge apenas aos puros elementos descritvos; S.Goiten adianta mesmo tratar-se de um traço retórico mais geral : "Arabic characterization aimed at an understanding of men through their contradictions, by pointing out qualities promising success and others leading to doom" (1975:8). Esta “tragedia de contrastes” (F.García Lorca, Impresiones y paisajes, sobre o Albayzín de Granada,1994:146), porventura com origens mais escatológicas, pressiona, de qualquer maneira, a escrita descritiva e, no caso particular da figuração do paraíso, enriquece-a e recoloca-a num universo, ao mesmo tempo sôfrego e desejoso.

Ibn ‘Abdûn refere-se deste modo aos esplendores de uma imaginada idade do ouro paradisíaca: “Vou pisando/ na viagem nocturna,/ a folha das trevas,/ apesar de o rosto / da morte/ ter deixado cair/ o seu véu./ Aparto-me/ dos esplendores/ das antigas gerações,/ tal como os raios/ de sol/ da lua nova/ se apartam” (I.‘A.,f.18); do mesmo modo, engano e ocultação surgem mutuamente a contrastar-se: “Caprichosas, me descrevem/ e enganam/ duas bocas:/ a aurora,/ e o cortante sabre;/ e dois corações me ocultam:/ as trevas,/ e o pó que na viagem se levanta./ A terra me repudiou,/ com renúncia,/ excepto quando era deserto;/ acerca dele me falou o olhar,/ e tudo o que me disse/ era mentira” (I.‘A.,f.23). Salinas e Lorca bem poderiam situar-se no mesmo arco de tonalidades opostas para traduzirem, a um mesmo tempo, a fúria ou a desventura amorosa: “La noche espolea/ sus negros ijares/ clavándose estrellas” (F.García Lorca,Canción de jinete,1990:191); “Y cuando ella me hable/ de un cielo oscuro, de un paisage blanco,/ recordaré/ estrellas que no vi, que ella miraba,/ y nieve que nevaba allá en su cielo” (Pedro Salinas, Poema 9 1990:89).

 

8. Configurações danielísticas

 

Não apenas a retórica profética, mas também a alegórica e a poética, modalizada no mundo islâmico, se tornou, segundo A.Abel (1965:23), devedora dos textos apocalipticistas de Daniel. Os materiais com que a divindade é descrita nesses textos, misto de pedras preciosas, sedas e da persistente simbólica da transparência e dos rios de fogo, terá, segundo o autor, constituído uma base discursiva matricial para um conjunto vasto de “sistemas de representação” da textualidade islâmica.

Os cristais, os ornamentados altares do firmamento e a doçura dos quartzos e topázios constroem a galeria danielítica, ligando séculos e pulsões poéticas aparentemente longínquas e afastadas. São, por exemplo, as estrelas “resplandecentes,/ que, das altas grandezas,/ o firmamento ornamentam,/ e que, ao arremessar cometas,/ das espadas o defendem.” (I.‘A.,f.7); são os cálices das rosas que “parecem/ melenas de ouro vermelho com turbantes de topázio.”(I.S.,As rosas do jardim); são os segredos “de quartzo para” desvendar “o tempo/ onde contemplamos a fulva doçura das cerejas” (Al berto, O medo/meu único amigo,1991:525); são “...metales en flor, celestes leños/elevan al nivel de las mejillas/ lágrimas de claveles y azahares” (Gerardo Diego, A C.A.Debussy,162).

É, enfim, como disse Lorca do profundo da sua Granada, o “Verde carne, pelo verde,/ com ojos de fria plata” (Romance Sonámbulo,1990:200) ou ainda “...mi corazón de seda,/ de campanas perdidas,/ De lirios y e abejas.” (F.García Lorca,Balada de la Placeta,183)

 

9. Descrição de jardins

 

No quadro do resgate do paraíso, existe uma espécie de sub-género literário, designado por rawdiyyât (de rawd, jardim). Nesta perspectiva genérica, como referiu Henri Pérès (1953:189), é elogiado o trabalho do homem na arrumação do espaço e da paisagem, embora, no seio da tradição de mitificação do Dar al-Islâm, seja o todo de Espanha que a poética islâmica acaba por convocar como um grande e esplenderoso jardim. Nas suas Impresiones y paisajes (1994:157),Lorca dizia que um jardim “es algo superior, es un cúmulo de almas, silencios y colores, que esperan a los corazones místicos para hacerllos llorar”. Jorge Guillén, por seu lado, sublinhou que o “tempo das profundidades”, residia no âmago dos jardins: “Tiempo en profundidad; está en jardines./ Mira cómo se posa. Ya se ahonda./ Ya es tuyo su interior. Qué transparencia/ De muchas tardes, para siempre juntas!/ Sí, tu niñez, ya fábula de fuentes.” (Los jardines,1990: 127).

Essa profundidade fabular, imaginativa e quase mística é transposta, por Ibn Sâra, no atributo retórico das “noivas” desveladas e até aventurosas: “Este jardim é uma jovem noiva,/ cujo manto é a túnica da Primavera/ e suas jóias as flores.” (Diálogo de Poetas); e : “Os jardins são noivas que não velam o rosto/ para guardá-lo dos olhos de quem o olha./ Com eles é livre a primavera,/ quando paga o seu dote/ e não defrauda o tributo das promessas.” (Os jardins). Por fim, é a delícia, o deleite puro, que ainda atinge Luis Cernuda, enquanto, em Ibn ‘Abdûn, é o próprio engenho poético e a inspiração que lhe assiste a ditar a metáfora do jardim: “Escondido en los muros/ Este jardín me brinda/ Sus ramas y sus aguas/ De secreta delicia.” (Luis Cernuda, Poema XXIII ,1990:353); e: “Como as castas donzelas/ que, em minha honra, por jardins/ se cobriram de véus,/ e (de) quantas fragrâncias puras/ se vão enchendo os cumes/ pelos sopros que emanam/ do meu poético engenho” (I.‘A.,f.9)

Os jogos de azar amoroso, convocados pela poética lírica árabe, e cujas “marcas funcionais” A.Gamés de Fuentes assinalou - flores y árboles, praderas, valles y bosques, rios y fuentes, pájaros cantores, en especial el ruiseñor, rocio y lluvia, céfiro y brisa, que ponen de manifiesto la identidad tamática, inexplicable como fruto del azar” (1996:116) - também parecem reluzir, embora de modo mais humilde, no sub-género rawdiyyât que estamos a analisar. Comparemos, pois, a passagem niilista do tempo, originando uma saudade do insondável em Pedro Salinas e, do outro lado, uma nostalgia quase bernardiniana atingindo o seu conterrâneo Ibn ‘Abdûn: “...altísimos ribazos/ sembrados de ventanas, hierba espesa,/ que la noche rebrilla/ com gotas del eléctrico rocío” (Nocturno de los avisos, 99); e “Como, por vezes, me senti/ uma graciosa avezinha/ como se a alegria em alas/ (nela) voasse por cima;/ entre as filas de canteiros,/ que maravilhosos dias !/ nos meus trajes refulgentes/ como que recortava mãos, a brisa.” (I.‘A.,f.9).

            As açucenas surgem nesta poética natural associadas à manhã, à frescura, ao despontar primaveril mais puro, muitas vezes associando-se em autêntica luta com as rosas e outras flores. Estas guerras, ou debate entre flores, constitui um tema determinado da poética islâmica que, segundo Henri Pérès (1953:188), é de origem Indo-europeia. Lorca, aparentemente longe de tais disputas, metaforiza o tema na sua Balada de la Placeta: “Que tienes en tus manos/ de primavera ?/ Yo: - Una rosa de sangre/ y una azucena” (F.García Lorca,1990:181); Rafael Alberti retoma idêntico espírito de claros primórdios em Primer Recuerdo: “Paseaba com un deseo de azucena que piensa,/ casi de pájaro que sabe há de nacer.” (Rafael Alberti,1990:330).

Comparemos agora com Ibn Sâra e veremos como a vizinhaça não é apenas ocasional: “A manhã envergonhou-se com as minhas queixas/ e sobre a açucena da sua face exibiu/ uma flor de romã;/ viu-me despojado de bens,/ dispôs-se a derramá-los copiosamente,/ e assim as próprias nuvens me viram/ arrastando a minha penúria/ e se dissolveram a água e o fogo. (Lamento e romã); ou - “  jardim que dá vida às flores,/ onde Novembro, como Abril, veste as colinas/ de rosas e açucenas/ dada a visita das nuvens nocturnas/ que as fazem brilhar...” (Panegírico do EmirAbú Bakr ibn Ibrâhim, quando chegou a Granada como governador, e reuniu um grupo de poetas).

Esta transfiguração, onde, sobretudo no primeiro caso, é evidente a luta entre a flor da romã e a face matinal da açucena não tem, de modo nenhum, as matizes surrealizantes que encontramos em Azucenas en camisa de Gerardo Diego: “Venid a oír de rosas y azucenas/ la alborotada esbelta risa/ Venid a ver las rosas sin cadenas/ las azucenas en camisa...” (1990:153). No entanto, à parte os códigos mais restritivos e datados, a verdade é que a persistência da imagem simbólica - neste caso da açucena - é um facto indesmentível.

 

10. Na rota tradicional árabe cortês e trovadoresca

 

Entre muitos outros, existem dois motivos que, sendo comuns à poesia árabe cortês e à trovadoresca provençal, também encontram eco nos nossos poetas do Gharb al-Andalus. Trata-se do motivo lírico da brisa portadora de novas do(a) amado(a) ou de amor longínquo (A.Galmés de Fuentes,1996:108[6]), por um lado, e, por outro lado, da evocação da Primavera. Comecemos pel primeiro dos casos exemplifiquemo-lo com o poeta eborense, ao evocar epistolarmente uma saudade antiga: “Saudou-me a tua carta,/ devolvendo-me a vida,/ e, por tua graça, a chuva foi caída,/ flor de duplo odor carregada,/ de amanhecer e de brisa.” (I.‘A., f.47); num segundo exemplo, é agora o poeta escalabitano, particularmente enérgico, a tentar metaforizar, não já a evocação amorosa, mas antes a tempestade e os maus augúrios: “ao brilhar o relâmpago muito ao longe,/ era como um etíope negro sorrisse entre lágrimas./ Foi então que, com a espada da firmeza,/ cortei a essas trevas a cabeça/ e do seu sangue recebi/ a túnica da aurora”. (I.S.,Noite obscura).

Lorca, Vicente Aleixandre e Luis Cernura empatizam em absoluto com o tema de génese árabo-provençal: “Grandes estrellas de escarcha,/ vienen com el pez de sombra/ que abre el camino del alba./ La higuera frota su viento/ com la lija de sus ramas...” (F.García Lorca, Romance sonámbulo,1990:198-199); “Bajo el azul naciente,/ entre las luces nuevas, entre los puros céfiros primeros,/ que vencían a fuerza de candor a la noche..”(Vicente Aleixandre, Criaturas en la aurora,1990:243); e, por fim -  “Sí, com el viento al que un alba le revela/ Su tristeza errabunda por la tierra,/ Su tristeza sin Llanto,/ Su fuga sin objeto” (Luis Cernuda,1990:352).

 

11. Evocações primaveris

 

Quanto ao segundo dos motivos referidos, a evocação da Primavera. Guilherme de Aquitânia, contemporâneo dos dois poetas do Gharb al-Andalus que acompanhamos, terá sido o primeiro poeta do Ocidente cristão a evocar “a la primavera de forma semejante a como la evocaba, varios siglos antes, la lírica árabe” (A.Galmés de Funetes,1996:116). É curioso que Ibn ‘Abdûn e Ibn Sâra, recebendo embora as suas fontes directamente da vida cortesa que também praticaram (sobretudo em Badajoz, mas também em Évora, o primeiro; em Sevilha e também em Granada, o segundo), popularizem no Ocidente do al-Andalus este motivo clássico da poesia de língua Árabe.

O reluzir da água na terra e o símbolo forte das papoilas constroem os quadros dos nossos exemplos, respectivamente, de Ibn ‘Abdûn - “Ó fragrância das flores !/ da tua nocturna viagem me chega,/ nestes fôlegos de Maio,/ do teu aroma a pureza./ A terra reluz, revestida,/ por não ser sua água corrente/ quase que lhe atiça fogo/ da aurora, o mais ardente./ E os pássaros cantando/ nas árvores entre folhas/ quase se assemelham/ em gaiolas às cantoras” (I.‘A., f.28); - e de Ibn Sâra: “Abençoa este tempo luminoso,/ já que as papoilas tomaram conta de ti./ Levantam-se em pés de ágata/ sobre os quais labutam cálices de ouro./ Quando nelas sopra a brisa,/ parecem bandeiras vermelhas/ no espaço livre[7] de quem as agita.” (As papoilas).

O diálogo com os poetas do século XX parece, de facto, estimulante. Emilio Prados, em Ciudad sitiada, troca o fogo ardente de Ibn ‘Abdûn pelo azul do sangue: “Quando era primavera en España:/ los olivos temblavan/ adormecidos bajo la sangre azul del dia”(1990:299), enquanto David Mourão Ferreira, no poema Romance dos anos quarenta, prefere sublinhar a promessa e o gáudio, semelhantes ao tempo luminoso e ao espaço livre de Ibn Sâra: “...tinham da Primavera/ essa adolescente chama/ que nem sabe o que promete/ que nem sabe o quanto inflama” (Colóquio Letras/100,11-12/1987:103). Por fim, Pedro Salinas parece menos esquecido da estilização emque, soltas, vooragens e miragens se confundem com a grande estação de Maio: “Secretas medidas rigen/ gracias sueltas, abandonos/ fingidos, la nube aquella,/ el pájaro volador,/ la fuente, el tiemblo del chopo./ Está bien, mayo, sazón.” (Vocación,1990:82)

 

12. Antropomorfismos

 

A animização da natureza e a inscrição no seu âmago descritivo de metamorfoses humanas é característica do maravilhoso da poética árabe. Como também o é a transfiguração permanente dos actantes e a sua substancialização metafórica. Esta magia em que o cronotopo quase se anula, para que as figuras naturais sobressaiam nas lutas da alma e na alegórica das lendas, surge igualmente nos nossos poetas, sob o pano de fundo das lágrimas e da chuva; dos relâmpagos e dos sorrisos; das nuvens e gestos.

O mosaico de equivalências fica, aqui, desde já, em aberto. Nele António Ramos Rosa e Al berto truncam o verbo com Ibn ‘Abdûn e Ibn Sâra:  “Aprendeu contigo a nuvem/ costumes que as suas lágrimas/ derrama e verte/ a mesma nuvem,/ por prazer, os relâmpagos/ que são sorrisos.” (I.‘A., f.6); “O olhar desce aos gestos inacabados/ satura-os de jovens lágrimas de resinas” (Al berto, O medo/Regresso às histórias simples, 1996:537); “...os jardins recebem/ os relâmpagos a sorrir,/ qual luz da sua saudação (I.S.,O Zéfiro e a chuva);  “Só no mar o sol é o sorriso do ocidente/ E nele mergulha o azul com a lentidão de um astro” (António Ramos Rosa, Convite ao mar in Atalaia,1995,Vol I,1/2:138). O texto poético construído por este mosaico citacional parece, com efeito, embaraçar-se, ou avolumar-se, na teia das suas correspondências secretas; como se fosse apenas um só texto, afinal.

 

13. A leveza imaginativa do voo

 

Talvez complementando esta tendência antropomórfica da poética árabe, A.Abel, num artigo publicado em 1965, fala-nos de leveza, voo, emaravilhamento de um mundo sempre em suspenso: "les récits, hadít sur l'ascention de Mahomet, récits sur le jugement dernier, voyages imaginaires avec l'aide des génies, qu' invente le monde musulman, se distinguent radicalement des images créees par les auteurs occidentaux, par un sens, frappant de la relativité dans le temps et l'espace, opposé à une vision où l`anthropocentrisme et sens positif ramènent"(...)"l'univers à des mesures strictement humaines" (38). Este desvio, ou prática de arredamento, como método discursivo de uma tradição oriental, traduz-se pelas súbitas deslocações de personagens (investidos por enigmas que logo se aclaram ou reofuscam), havendo nos seus percursos narrativos a inevitável protecção de uma qualquer potência celeste que leva os actantes a espreitarem, ou o além, ou o deslumbre e o encanto, escapando-se assim à medida do puramente terráqueo.

Este mundo discursivo da fascinação e do quase imprevisível é habitado por personagens que a natureza coloca a voar, ágeis e frágeis no seu agir, mas que sabem pairar no ar na companhia de uma donzela (que metaforiza, por exemplo, a brisa crepuscular): “O ar põe a nu a sua face serena/ ao cair da tarde,/ e leva consigo uma grávida donzela/ cuja túnica arrasta a suave aragem,/ ao longo de um rio de águas doces,/ cristalino como um espelho,/ onde o céu se obscurece. (I.S.,Contempla este local, onde estamos !). Outras vezes, o sujeito poético penetra a fugacidade do sentimento - por exemplo, a alegria - e torna-se, ele mesmo, no móbil do voo: “Os meus hortos/ não se alimentam/ no meio de tal céu[8],/ entre estrelas e lua/ onde galopo em corcéis/ que me brindam com vinho/ e com as esporas batem/ nos galhos do campo/ e nas cordas das lápides” (I.‘A., f.48).

 

14. A secar ao mesmo sol, no mesmo Gharb.

 

Esta é uma poesia que exala leveza, mas que, talvez por isso mesmo, abrindo-se ao reverso, pode amiúde exteriorizar uma súbita e inesperada investida de um estado de espírito de fúria: “Ó pomar cuja fragrância/ vai espalhando a brisa,/ estende sobre mim as tuas asas/ que em honra por ti me enfureço;/ apenas a voejar me alcança/ em torno da árvore espessa/ da tua distinta genealogia/ ao procurar a sombra/ de quem ao sol passa o dia,/ e acaba por ser a imagem/ da febril agonia,/ pois do suor toda a água/ a febre a consumia. (I.‘A.,f.11). F.García Lorca parece mais atento ao súbito esvaziar destes céus que eram Aftácidas ou Almorávidas, ao tempo: “Un cielo grande y sin gente/ monta en su globo a los pájaros”(1990:190). Ou, de outro modo, Fernando B.J. Martinho como que a auscultar o vestígio, apenas só já estelar, dessa estilização longínqua mas presente ainda: “Tuas asas mais leves que as de qualquer pássaro/ que nos visite/ para o esquecermos/ Noite sobrevoada com um ramo de paz/ no bico estelar”(Reposta a Rorschach,1970:37).

Enfim, a dois e dois, entre o passado longínquo de terras que ainda não eram lusas e as de hoje, talvez sempre as mesmas, o certo é que a poética parece ter sido cortada por um mesmo e certeiro vento. Por um mesmo zéfiro. Regresse a palavra aos poetas e seja Manuel Altolaguirre a enunciar estas “barcas de dos en dos,/ como sandalias al viento/ puestas a secar al sol” (Playa,382). Até porque há coisas “que o tempo jamais golpeia” (I.S., Panegírico).

 

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                                                                              Bibliografia

 

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[1] El Amor Cortés en la Lírica Árabe y en la Lírica Provenzal,1996,Catedra,Madrid.

[2] Ibn ‘Abdûn (c.1050-1135) Ibn Sâra - com Sad – (m.1123). Prof.Jose Mohedano (Barcelona) e Prof.Teresa Garulo (Univ. Complutense, Madrid). O trabalho de tradução tem sido levado a cabo por  um  projecto sobre o Sudoeste peninsular islãmico, financiado pelo Práxis XXI e implementado pelo Instituto de Investigação Científica e Tropical/Centro de Estudos Africanos e Asiáticos, e dirigido pelo Prof. Adel Sidarus (Univ. Évora). Nas citações dos dois poetas, deixaremos os nomes dos poemas, no caso de Ibn Sâra e o número do fragmento do manuscrito, no caso de Ibn ‘Abdûn.

[3] A ordenação do tempo, concebida como emissão permanente de Kun sucessivos (de acordo com o pré-conhecimento e vontade divinos), adquiridos ou não, de acordo com diversas teorias do acto, conduz a uma visão da História, segundo a qual os factos ocorrem sem relaçöes especiais uns com os outros. Tal visão enquadra-se numa perspectiva atomística da realidade, desenvolvida no Islão. D.MacDonald explicita o fundamento desta sucessão de ocorrências, que encontra na matéria e no homem o seu elemento mediador: "just as space is only in a serie of atoms, time is only in a sucession of untouching moments and leaps across the void from one to the other" (1965:202). Nunca realmente separando causas segundas e primeiras (excepção feita à corrrente filosofófico-escritural Mu'tazilita), a história humana é visionada com uma série ininterrupta de receptáculos (locus) em conexão, também ininterrupta, com cada instante (atomístico) divinamente produzido.

Entre um passado original, caracterizado pela descida (tanzíl) da revelação final - a que sucede uma dramática expansão territorial - e o anúncio do dia final, a vida islâmica e a sua ortopráxis[3] debatem-se, assim, com uma visão do presente bem diferenta da recriada pela"metanoia dos evangelhos" cristãos (N.Frye,1984:191), isto é, a ideia de um aqui-agora onde a salvação poderia encontrar o seu receptáculo terreno. Em contraste, o mundo atomístico perspectivado pelo Islão constrói-se e dissolve-se a cada momento.

[4] Nessa profecia, a isla de Andaluzia nomeia as terras ibéricas (fols.301v, 302v, 306r, 307r e 307v) e define-as como forma quadrangular, detentora de quatro portas, o que melhor ilustra a ideia de centro simbólico atribuído às terras de Espanha (no seu todo): "Alandaluzi(y)a tem quatro das portas do aljannat (paraíso). Uma porta a que chamam Faylonata, e outra porta (designada por) Lorca  e outra porta a que chamam Tortosa e outra porta a que chamam Guadalajara" (fols.302v/303r). O Mancebo de Arévalo, por sinal, na sua Tafçira... (cf.capítulo.III.1) refere, nos fols. 293v/r, - "disseram alguns, falando ignorantemente, que esta isla (Espanha) está debaixo do ajannah (paraíso), devido à grande corrente, digo (-o) porque faziam de Almeria (o) rio de aljannah (paraíso), pelo seu saber, e a Granada diziam (ser) pilar do Islão"

[5]Estudo deste manuscrito em Carmelo, L.,La représentation du réel dans des textes prophétiques de la littérature aljamiado-morisque

1995,Universiteit Utrecht, Utrecht. Texto original fixado por Sánchez Alvarez, Mercedes, El Manuscrito misceláneo 774 de la Biblioteca Nacional de París, Gredos,  Madrid, 1982.

[6] “...la descripción del locus amoenus, como evocación de la primavera, en que renasce la vida y el amor”(...)” sólo de observa de forma regular en la lírica árabe y en la lírica cortés trovadoresca” (1996:116)

[7] Espaço ou local onde se pratica ginástica.

[8] do céu do alheamento face à cheghada da chuva e de Abu Yusúf