A comunicação profética e a codificação das ortodoxias.

o caso da alteridade islamo-cristã

 

 

por Luís Carmelo

 

(1/4/1993)

 

Como T.Todorov referiu, os géneros literários têm origem pura e simplesmente no “discurso humano"(1981:62). Daí que possamos operacionalmente pensar uma noção de género a partir de um conjunto de lesisignos, mais ou menos estáveis, que condicionam a interpretação de formas arquétipas e reconhecíveis de "actos de fala"[1], no seio de uma dada comunidade. Nessa medida, é possível caracterizar o género profético como uma amálgama de registos discursivos, modalizados durante séculos nas suas dominantes expressivas e de conteúdo, e que tematizam, a partir do epicentro cultural euro-semítico, a comunicação entre o homem e determinadas imagens de transcendência com incidência na codificação da experiência e no controlo de uma ideia de futuro e, em certa medida, de um eschatón.

Como vimos em trabalhos anteriores (1995,1999), as próprias circunstâncias histórico-discursivas acabaram por determinar que as permanências do género profético nos universos cristão e islâmico, se manifestassem através de diferenciais profundos. Estes recortes diferenciados na matéria do continuum, quer expressivo, quer sobretudo de conteúdo, conduzem-nos à questão das identidades e das alteridades. Para melhor compreender o mundo fechado das primeiras - e entendamo-lo assim pois trabalharemos com exemplos situados ainda nas semioses pré-modernas - passamos a analisar, no presente ensaio, um quadro possível das alteridades, com ênfase para a narração dos eventos escatológicos, para a enunciação das novas escatológicas e para a própria natureza da(s) image(n)s de Deus. Após essa radiografia, passaremos a sistematizar o modo como as ortodoxias em ambos os mundos, o islâmico e o cristão, codificaram a textualização profética.

 

     1.  Alteridade escatológica islamo-cristã.

 

O lexema escatologia designa a doutrina dos fins últimos, ou seja, o conjunto de crenças relativas ao destino final do homem e do universo. A projecção escatológica engloba, assim, a narração dos últimos dias terrenos, bem como dos estádios derradeiros ou póstumos das almas. A definição escatológica, nas religiões, atribui fundamentalmente uma razão de ser ao todo da existência, complementando um ciclo que se abrira com as cosmogonias. Como refere G. Ricoeur (1971:534), se estes últimos estão voltados para o passado e se exprimem pela narrativa, a escatologia está antes voltada para o futuro e "revela-se na visão da profecia que realiza a transgressão da narrativa".

São fecundas as relações entre o acto profético e a escatologia, sobretudo no período que sucede o Exílio hebraico e, de modo talvez mais abismado, durante o período dos apocalipses judaicos (séc. II a C - séc. II d C). Contudo, a escatologia só entra decisivamente numa dimensão temporal humana, no âmbito das revelações cristã e muçulmana. Na sua génese, a profecia é um acto de premonição do futuro, mas também, e sobretudo, de diálogo entre o homem e a divindade; a escatologia, ao configurar a narração dos fins (ou a transgressão da própria narração) constitui o anúncio, por excelência, da revelação do futuro, ou da configuração de um fim e, ao mesmo tema, constitui-se como um complexo sistema de comunicação e de significação, onde é realçado o papel de um enunciador omnipresente e dodato de saber totalizante

Futuro, por um lado, revelação do plano divino, por outro, eis as traves mestras da escatologia que servem de horizonte referencial à produção profética humana. Como J. Le Goff adiantou (1984:428), "escatologia e profetismo uniram-se muitas vezes, estabelecendo uma relação entre a primeira fase do fim dos tempos e a história presente e imediatamente futura"; nesta linha de ideias os sinais de crise histórica foram muitas vezes motivo de produção literária profética, tendo em vista a antecipação ainda que simulada dos fins últimos, divinamente anunciados . E, inversamente, a interpretação de sinais ou de sintomas, assumidos como anúncio ou prenúncio do divino, foram também amiúde motivo de produção de texto (e de imagens) profético, condicionando os eventos históricos as situações de “cronotopo de limiar” (para utilizar a expressão de M. Bakhtin) ou de crise (na acepção de F. Kermode).

J.Galot escreveu um dia que o Cristianismo "pode ser definido como escatologia tornada história"(1960-IV:1033). Todo o sentido do homem e da História convergem, assim, no escháton ou acontecimento final. Também para o Islão, além da afirmação de um Deus único, omnipotente e inimitável, num esquema oposto a qualquer antropocentrismo, é decisiva a visão da história humana decorrendo "from creation to the eschaton" (Y.Haddad, 1981:5). Ressurreição dos corpos e julgamento final integram, igualmente, o plano escatológico de ambas as religiões. Há, porém, diferenças substantivas de natureza escatológica entre as duas religiões, que acabam por gerar modelos proféticos também diferentes, como referimos. Vamos passar a analisar essa alteridade escatológica, de acordo com uma categorização metodológica triádica, a saber: a narração dos eventos escatológicos, a enunciação da nova escatológica e, finalmente, a natureza de Deus e sua relação com o homem e a salvação.

 

              1.1  A narração escatológica

 

É próprio da organização narrativa atribuir coerência aos elementos que se dispõem em sucessão num dado relato. Essa coerência narrativa manifesta-se, em todos os relatos, através da passagem "d'un état initial à un état final, par une transformation" (G.d'Entrevernes,1977:18). A criação, tal como é descrita nos relatos bíblico e corânico, surge, não com um "single event"(Y.Haddad,1981:8), mas antes espalhada por um período de tempo que remete para a semana mítica. Este mesmo impacto do narrativo (e ainda que, no caso corânico, tal não constitua um atributo por excelência) está de acordo com a natureza da evolução escatológica: "evolution is justified in interpretating creation as God's originating and continuing control of the evolucionary process" (ibid.:8). Sendo o objectivo de uma tal evolução a própria dissolução do mundo, verifica-se que, nesses momentos antípodas da criação, os relatos se voltam a enunciar através de uma cuidada e coerente ordem de sucessão de eventos e de actantes em acção. A este propósito, M.Eliade (1975:331) referiu que "la même fluidité des formes constitue, à l'autre extrémité du temps, l'un des syndromes de l'eschaton, du moment oú l'histoire prendra fin et où le monde entier commencera à vivre dans un temps sacré, dans l'éternité".

Quer o planos narrativo cristão, quer o islâmico têm um ponto de chegada: o momento do fim do mundo terreno. Face a esse instante dramático, a narração suspende o cronotopo, não precisando nunca, de modo literal, a ocorrência: "Si Dieu voulait châtier les hommes de leur preversité, il ne laisserait aucune créature vivante sur la terre; mais il leur accorde un délai jusqu'au terme marqué. Lorsque le terme sera arrivé, ils ne sauront retarder ni l'avancer d'un seul instant" (16,63) ou "La venue de l'heure est comme un clin d'oeil ou peut-être plus proche encore, car Dieu est tout-puissant" (16,80)[2]. No Alcorão são inúmeras as referências a este respeito, tal como na tradição e, nomeadamente, no Sahíh` de Bukhârí[3]. Também os Evangelhos acentuam este mesmo facto de ocultação, particularmente o de Mateus: "Mais ce jour et cette heure, nul ne les connait" (24,36) ou "Car c'est à l'heure que vous ignorez que le Fils de l'Homme va venir" (24,44)[4].

Antes do termo anunciado, registam-se ocorrências comuns em ambas as escatologias: sinais de grande atribulação, cataclismos e desgraças, físicas e morais. Há uma alteração da ordem, prefiguradora do caos. No seio do Islão, estes signos da hora (sâ`a) permitem reconhecer o princípio do derradeiro estádio escatológico; são índices em termos semióticos[5]. Estas alteraçães da ordem física ('alâmât al-sâ'a) surgem repetidadamente no Alcorão (caso da surata 81,1-14 ou 47,20). Um dos signos centrais de iminência da hora é consubstanciado por um actante que parece vir culminar a inversão da ordem e a desintegração das coisas terrenas: Gog e Magog (Júj wa Mâjúj). No Alcorão (18,93 e 21,96) são identificados com o fogo devorador e com a "eau jaillissante". A sua origem remonta a denominações de povos da Ásia central, cujas incursões, segundo as crenças muçulmanas, Alexandre-o-Magno conteve através da construção de uma imensa barreira metálica. Essa barreira, no fim dos tempos, acabará por ser pervertida, e, a partir de uma brecha surgirão, então, o caos e as trevas[6] ("Jusqu'à ce que le passage soit ouvert à Iadjoudj et à Madjoudj; alors ils descenderont rapidement de chaque montagne"- 21,96).

Naquilo que consideraríamos a primeira grande luta final escatológica, ainda no domínio do mundo terreno, Gog e Magog encontrarão, então, pela frente um outro actante restaurador da ordem e da justiça, que tentará implementar um reino espiritual terminal, no planeta. Referimo-nos ao Mahdí cuja intervenção, amiúde, se reitera nas profecias produzidas em meio islâmico. A personificação deste actante purificador não surge, no entanto, explícito no Alcorão. É, como vimos no capítulo II, um corpo vasto de tradições que coloca este actante salvador nos cenários escatológicos islâmicos. Apesar de terem existido algumas confusões[7] entre o seu papel e o de 'Isâ (Jesús), no quadro das lutas finais, "for the most of the muslims the coming of the mahdí and the return of Jesus are seen as two separate events" (Y.Haddad,1981:69). Tal facto é confirmado pela formulaçäo de Ibn Khaldún, na sua Muqaddima (1967-I:661-669[8]), segundo a qual, no fim dos tempos, um homem da família do profeta apareceria "para defender a religião e para fazer triunfar a justiça"; seria chamado, o Mahdí. Os muçulmanos, então, segui-lo-iam e, deste modo, se inauguraria um período de paz, anterior à chegada da hora final, no qual a lei (sharí'a) do profeta prevaleceria. Convirá ainda acrescentar, de acordo com C.Glassé, que, se é possível que este reino (triunfante) do Mahdí possa ser nertevisto como terrestre, "il est loin plus semblable que, lorsqu'il adviendra, à la fin des temps, il sera intérieur" (1991:116).

A esta primeira luta escatológica, vai seguir-se a derradeira, travada num ambiente de expectativa da chegada do messias. Desse facto advém o nome do novo actante, o messias impostor (al-Masíh ad-Dajjâl, também chamado Masíkh, o deformado), ou Anticristo. A vinda deste actante regista-se num momento em que será difícil fazer a distinção entre uma verdadeira e uma falsa espiritualidade. É um ser escatológico simulador do sagrado, de milagres, estabelecendo a ambiguidade e a confusão entre o humano e o sublime; ganhará adeptos graças à sua fáustica capacidade de criar maravilhas. A tradição de Bukharí regista alegoricamente o perfil sinuoso do Ad-Dajjâl: "Lorsque apparaitra l'Antéchrist, il y aura de l'eau et du feu; mais ce que les gens verront comme étant du feu sera de l'eau froide, et ce qu'ils veront comment étant de l'eau sera du feu brulant; que ceux d'entre vous qui atteindront cette époque se jettent dans ce qui semble être du feu, car ce sera une eau agréable et froide" (60-50,1[9]). Esta época de enganos prenuncia, de facto, o fim.

Com efeito, de acordo com a tradição (diversos hadits), Jesús regressará antes do fim dos tempos e, portanto, do julgamento final, para destruir o Anticristo; Cristo marcará, então, o consumar do ciclo adâmico inaugurando um novo ciclo escatológico. O Sahih` de Bukharí regista este itinerário narrativo: "L'Heure ne viendra pas avant que le Fils de Marie ne soit descendu parmi vous, jugeant avec justice. Il brisera alors la croix et tuera le porc, il supprimera la djeziya"[10]. O presença da cruz, referida nesta etapa escatológica decisiva, de acordo com a surata 4,157[11], significa que Jesús não morreu (na cruz) como no livro sagrado muçulmano é referido[12]. Nessa mesma surata, a alusão temporal - "avant sa mort"[13] - é segundo algumas interpretações, relacionada directamente com Jesús, tal como refere A. Kasimirski (1970:103): "...qui doit encore revenir sur la terre pour tuer l'Antéchrist et mourrir. Alors tout l'univers croira en lui" (em Jesús). Esta visão da vitória final de Jesús surge também entre mudéjares e moriscos ibéricos. Quanto aos primeiros, referência para 'Isâ b. Jâbir que, em 1462, escreveu na Suma de los principales mandamientos y devedamientos de la Ley y Çunna[14]: "Y la ora deçenderá Ayçe (Jesús) y matarlo a, y quebrantará la eregía y todas sus ordenes, y sera la tierra en paz debajo de nuestra santa ley". Depois registar-se-á a morte de Jesús e o seu enterro "junto al bienaventurado Muhammad", ao que se seguirá, pouco depois, o fim do mundo, seguido de ressurreição e julgamento final. Em manuscritos aljamiados do século XVI, nomeadamente nos Ms.BNM 9074 e 9654, os moriscos expressam idênticos passos escatológicos. Neste último, refere-se um dado específico do cronotopo: Jesús ficará ainda quarenta anos na terra, numa restauração do illud tempus primordial: "Quarenta años tan feliçes que paçan la obeja con el león, sin detrimento alguno"[15].

A escatologia cristã, que se considera aberta após a ressurreição de Cristo, traz para os primeiros anos da nossa era um fervor de iminência terminal. Os sinais dessa iminência são definidos por Paulo, nas suas Epístolas, como tempos difíceis a advir: "Sache bien ceci: dans les derniers jours surviendront des temps difficiles"[16]. Tal como na narração islâmica, a doxa cristã prevê que certos eventos perturbadores da ordem se manifestem perante a humanidade como verdadeiros índices do fim (com especial ênfase para o carácter humano das atribulações). J.Le-Goff numa referência às duas ressurreições anunciadas pelo Apocalipse de João (20,1-15), sublinha o "carácter dramático dos acontecimentos que devem preceder a primeira ressurreição, o Milénio - drama em cujo centro se destaca o Anticristo - e, por outro lado, a marcar o segunda e derradeira ressurreição, o grandioso juízo final"(1984:441). Por outras palavras, pode dizer-se que há sinais de caos que prefiguram a Parúsia, ou a vinda de Cristo no fim dos tempos, mas, por outro lado, também se pode afirmar que essa expectativa da salvação não é possível sem um último combate contra um actante oponente: o Anticristo. Esta figura escatológica, no contexto cristão, é visto como um ser semanticamente disperso no seu investimento actorial: pode significar a sedução e a mentira[17], a heresia e o pecado (entendido como obstáculo ao plano divino de salvação)[18], ou pode referir-se aos "ímpios" dos últimos tempos, na descrição de Paulo[19]: "que le Seigneur Jésus détruira du souffle de sa bouche et anéantira par l'eclat de sa venue"[20].

Sinais prefiguradores, embate inevitável e triunfo final do bem escatológico são eventos simétricos nas narrativas cristã e islâmica. Há, porém, diferenças no limiar desta primeira fase da narrativa escatológica: A primeira situa-se na não correspondência com a luta entre Gog e Magog e o Mahdí restaurador, numa primeira fase das lutas finais islâmicas (luta que reflecte uma visão da História de acordo com ciclos proféticos de renovação[21]); uma segunda diferença centra-se na doutrina da ressurreição dos corpos: para o Islão, estes sairão das campas e juntar-se-ão às suas almas para comparecer no julgamento final; para o Cristianismo, a ressurreição da humanidade inicia-se em Cristo e desdobrar-se-á numa segunda que merece diversas interpretações. Assim, de acordo com Ap 20,5, a primeira ressurreição constitui um elemento simbólico, "c'est la vie nouvelle que donne le Christ" (ctob,1989:803), como poderá também significar (numa perspectiva literal) o início de um reino dirigido por santos e mártires e que se prolongará, na terra, ao longo de um período de mil anos. A segunda ressurreição, também interpretada como a única fisicamente real e não simbólica (a de todos os mortos), liga-se ainda directamente à vinda final de Cristo, de acordo com 1 TH,15-18.

Antes da sua efectivação, contudo, e ainda segundo Ap. 20-7 e 8, assiste-se a um derradeiro embate inevitável. Satã, que se encontrara preso durante os mil anos que se sucederam à primeira ressurreição, irá seduzir "les nations qui sont aux quatre coins de la terre, Gog et Magog". Surgem aqui aliadas, na última das batalhas, a figura de Satã (não mais a do Anticristo) e as figuras de Gog e Magog (conhecidas, no Antigo Testamento, pela sua hostilidade ao plano divino[22]). É provável que esta diferença, não de actantes, mas do investimento que os semantiza, reflicta uma visão diferente de Satã no Islão e no Cristianismo. Como refere A.Abel: "Le chaytân d'Orient musulman (...) n'est pas, comme le Diable, l'ennemi hideux obsédant du genre humain: c´est par sa douceur insinuante qu'il essaie de conquérir"(1950:30). Aliás, de acordo com a surata 2,35-39, o homem, no Islão, não é afectado pelo pecado original e a sua expulsão do paraíso deve-se sobretudo à imposição do anjo Iblis (2,34).

Antes de passarmos a descrever eventos e actantes escatológicos da segunda fase (para além do termo do mundo terreno), convém salientar que a derrota de Satã, anunciada no plano cristão, é apenas o culminar de uma derrota inicial que teve já lugar aquando da ressurreição de Cristo. O eixo simbólico e o histórico-profético mantêm, sempre, entre si, esta tensão: por um lado um advir narrativo que se coroaria na salvação final; por outro lado, o legado da própria salvação entendida na ordem do ordem de um agora-aqui. Do lado Islâmico, apesar de se considerar que o último reino do Mahdí - ou até o derradeiro reino de Cristo (de quarenta dias) - possam ser espirituais e interiores, o certo é que a dicotomia vida-julgamento parece impor-se com muito mais acuidade, em termos escatológicos[23].

 

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O fim dos tempos terrenos é, na escatologia islâmica, marcado pela destruição total do planeta e de toda a vida que nele se possa supor (suratas 55,26-27 ou 69,13). Esta morte cósmica é precedida pela morte individual de quem habite a terra, nesse momento. Tal hecatombe universal precede e prenuncia a ressurreição. A sintaxe desta segunda fase escatológica abre com o som da trompeta (suratas 23,102-4 ou 39,68-69), seguido da ressurreição dos corpos - qiyâma (e referida no livro sagrado islâmico com insistência, por exemplo nas suratas 37,19 ou 65,3-4) - e do encontro (hashr) desses corpos com as suas almas[24]. Segue-se depois, no quadro narrativo, o ajuste de contas final (hisâb):"La trompette sonnera et toutes les créatures des cieux et de la terre expireront"(...)"la trompette sonnera une seconde fois, et voilà que tous les êtres se dresseront et attendront l'arrêt (39,68)"; o julgamento, talvez o elemento isotópico por excelência da mensagem corânica, sucede a esta breve espera: "les prophètes et les témoins seront appelés, l'arrêt qui, tranchera les différends sera pronnoncé avec équité; nul ne sera traité injustement"(39,69)". O julgamento é administrado por Deus, uno e todo poderoso, sob o signo da balança (simbólica da equidade e justiça divina - 7,7 ou 21,48) e do livro das sentenças (atestando a sabedoria divina - 81,10). Tawhíd , ou unicidade divina, e a consumação do contrato ético, sob a forma de um julgamento final, constituem, assim, formulações chave da mensagem corânica. O retorno de Deus uno aos homens, no termo da própria escatologia, é também o completar do plano divino para o todo da sua criação.

O destino final da humanidade é dicotomicamente apresentado em inúmeros versículos do Alcorão. De um lado o inferno, que é dominado pelo símbolo do fogo[25], da"géhenne"[26], da água a ferver[27] e pela cor negra dos condenados (10,28)[28]. Do outro lado, o paraíso, dominado pela simbólica da vegetação exuberante (os jardins)[29], o elemento água (rios, correntes)[30], as mulheres virgens e jovens[31], as jóias e os tecidos de seda[32], ou seja, tudo o que é codificável como "bonheur ineffable"(44,57). Embora a dicotomia do destino humano seja profunda - ao longo da enunciação corânica - há, na surata sétima (44-46), uma referência a um espaço, que separa o paraíso do inferno, e que é avistado pelos que se encontram, num e noutro dos cenários escatológicos. Assumindo o nome de a`râf (orla, divisão), este espaço corresponde ao limbus (o limbo) dantesco, ou o vestíbulo infernal (M.Palacios,1943:130)[33]. Antes da entrada no paraíso, os crentes que se livraram do fogo infernal terão de atravessar uma ponte (sirât); Bukharí, no seu Sh', explicita a função dessa travessia: "ils (os crentes) seront retenus à un pont reliant le Paradis au Feu. Là, ils obtiendront réparation des injustices commises entre eux en ce bas monde, jusqu'à ce qu'ils soient purifiés et redressés. On leur permettra, alors, d'entrer au Paradis"[34]. Antes da consumação final escatológica não se prescreve qualquer possibilidade de intercessão, senão para  "ceux qui avaient fait une alliance avec le Miséricordieux" (surata 19,90) - embora a tradição admita a recuperação dos condenados que tenham um mínimo de fé[35]. Contudo, e como refere W. Chittick (1987:77), interpretações como a de Ibn al-'Arabí não apontam para um castigo eterno no inferno: "Ibn al-'Arabí does not deny that the sinners (al-mujrimún) will remain in the fire forever, since the text of the Qur`ân reads "Khâlidún fihâ" (S. 2:25, 39, 81, 217, etc). But he points out that the pronoun in fihâ ("in it") is always feminine; in other words, it refers to the feminine "fire" and never to the masculine "chastisement" (al-'adâb). Nothing was revealed in the Qur`ân and the Hadít that would indicate that the fire's chastisement lasts forever".

O fim dos tempos, na escatologia cristã, é marcado pelo soar das trompetas, depois de, em Ap 8,1, o sétimo selo ser aberto. Uma tal simbologia (que passou para o registo corânico) serve de base à destruição física do planeta e ao consumar das derradeiras lutas terrenas. A eliminação de uma primeira criação e a sua substituição por uma segunda é o filão comum a este tipo de narração escatológica. Essa segunda criação pode ser prefigurada através de reinos terminais votados ao espiritual (o milénio espiritual ou o reino do Mahdí), mas é na fase pós-terrena da escatologia que, de facto, ela se consubstancia. Como vimos, no caso cristão, existe sempre uma dimensão dupla das ocorrências, uma simbólica-actual, outra histórico-profética. Retenhamos esta última, na presente descrição. Cristo virá no fim dos tempos (Parúsia) e, à volta dele, as nações reunir-se-ão (Mt 25,31). A ressurreição geral é descrita de acordo com a prévia ressurreição de Jesús: "Dieu, à cause de ce Jésus, à Jésus les (os mortos) réunira" (1 Th 4,14) - "Car lui-même, le Seigneur, au signal donné (...) descendra du ciel: alors les morts en Christ ressusciteront d'abord"(1 TH 4,16-17). O reencontro dos homens com Deus é feito fora da terra: "ensuite nous, les vivants, qui seront restés, nous serons enlevés avec eux (os mortos) sur les nuées, à la rencontre du Seigneur, dans les airs"(1 TH 4,17).

A relação cronológica entre a ressurreição[36] e o julgamento final é algo ambígua, embora, na passagem acima referida (1 TH 4,17), pareça clara a precedência da ressurreição. Em 2 Co 5,10 não é , no entanto, explícito se o julgamento final se realiza após a ressurreição geral ou após a morte individual: "il nous faudra tous comparaitre à découvert devant le tribunal du Christ a fin que chacun recueille le prix de ce qu'il aura fait durant sa vie corporelle, soit en bien, soit en mal"[37]. A ambiguidade, poderá provavelmente ficar a dever-se à própria semantização da expressão - "Dia do Senhor"[38] (própria da escatologia vetero-testamentária), e que é transposta para o Novo Testamento como Dia do Cristo ou Parúsia, significando "à la fois réssurrection et jugement"[39]. Há, portanto, uma implicação muito grande entre ambas as ocorrências, o que dificulta a sua colocação num eixo cronológico-narrativo certo.

Há igualmente um certo leque de interpretações quanto à figura que configurará o actante escatológico de juíz, no julgamento final. Em algumas fontes escriturais, é Cristo quem desempenhará esse papel, o que surge explicitamente em Ac 11,3, em 1 p 4,5, e em 2 Tm 4,1 e 4,8[40]. No entanto, no Evangelho de Mateus (16,27 e 25,31) Cristo julgará acompanhado de anjos a partir do seu "trono de glória" e em 19,28 acompanhado dos doze apóstolos[41], o que é corroborado pelo sinóptico de Lucas, em 22,30. Por outro lado, no Apocalipse de João (20,4), não é clara a figura (ou figuras) que preenche o mesmo actante escatológico de juíz: "Et je vis des trônes. À ceux qui vinrent y siéger, il fut donné d'exercer le jugement" - e, de novo em Lucas (12,8), Jesús surge apenas como testemunha a favor dos fiéis, cabendo o papel de juíz a Deus e aos anjos: "celui qui m'aura renié par devant les hommes sera renié par devant les anges de Dieu".

O destino final da humanidade é, como na revelação corânica, dividido entre as "trevas obscuras"(1 P 2,17) para injustos e infiéis e a promessa de "cieux nouveaux et une terre nouvelle" (2,13) para os que, pelas suas obras e fé, se salvarem. A visão do inferno é dominada pela simbólica do fogo (MT 18,8 e 3,11, Lc 12,49 e Ap 14,10)[42], da "géhenne" (MT 5,22 e 18,9)[43], das portas de"Hadés"(MT 16,18)[44], ou pela imagem dos antros "ténébreux du tartare" (ou do inferno)[45] e, ainda, pela realidade de "segunda morte" (Ap 21,8), metáfora que remete para a exclusão dos ímpios da nova vida. O inferno, por sua vez, é considerado como eterno (embora certos padres da Igreja, como Orígenes, o tenham contrariado[46]). Para Santo Agostinho, baseando-se em Mt 25,41-46 e Ap 20,9-10, a pena dos condenados consiste na perda de vida divina e o fogo chega a  ser mesmo considerado, na sua Cidade de Deus[47], como uma realidade material[48].

A visão do paraíso celebra, por outro lado, a descida do reino dos céus na terra. A escatologia cristã, sobretudo no Ap 21, retoma e aprofunda o paratexto vetero-testamentário (Ez 40 a 48) da cidade-paraíso. Assim, o reencontro de Deus com os homens far-se-á na Jerusalém celeste, que desce à nova terra, após o desaparecimento da terra e do céus anteriores (21,1-2). Nesta nova urbanização, não haverá mais mentira (21,27) nem sofrimento (21,4). A perfeição é simbolizada por medidas, formas e cores[49] herdadas do texto de Ezequiel e a imagem do grande rio, que desce do trono de Deus, bem como a da árvore da vida retomam a descrição de Gn 2,10. Para Santo Agostinho, o céu é o lugar da verdade perfeita e os eleitos beneficiarão da sociedade do verbo encarnado, bem como da sociedade dos santos; a cidade de Deus é a instância escatológica onde a comunicação entre a divindade e os predestinados é imediata. O purgatório é também considerado na tradição escatológica cristã. Santo Agostinho, apoaindo-se em 1 Co 3,11-15[50], considera a existência de um estádio intermédio de penas temporárias purificadoras da alma (o emendatorius ignis), cujo efeito cessará, pelo menos, no momento do julgamento final.

 

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Podemos reter oito conclusões fundamentais, quanto às diferenças de narração escatológica que a alteridade dos códigos islâmico e cristão relectem:

 

- (a) Como se disse, há uma diferença básica no que diz respeito às relações entre o agora e o depois escatológico. Para o Cristianismo a era do agora-vivido e a era do depois-eterno podem ser consanguíneas, pois a ressurreição de Cristo possibilita ao homem viver a sua salvação. Para o Islamismo, o contraste entre ambos os pólos é significativo e a acepção de que o depois é a verdadeira vida é um facto[51].

- (b) Também referimos existirem desfasamentos na natureza semântica dos actantes, bem como na sua intervenção nos eventos escatológicos. O Mahdí islâmico encarna uma tradição que reflecte uma visão da história baseada nos ciclos (proféticos) de purificação. Por isso se converte em figura escatológica consagrada pela tradição (veja-se a posição de Ibn Khaldún[52]), o que não ocorre com as figuras da literatura profética cristã análogas (casos do último imperador ou do Papa angélico). Os papéis de Gog e Magog são semanticamente similares, mas diferem no tempo em que agem e nas relações que estabelecem com actantes segundos (caso da figura de Satã no Apocalipse cristão). A figura do Anticristo corresponde a um semema diferente; mais do que um falso messias, ele é, no cristianismo, o obstáculo ao plano da salvação.

- (c) O evento da ressurreição assume modalidades bem diferenciadas: na tradição cristã requer uma dupla ocorrência (quer no plano da interpretação simbólica, quer no literal-milenarista); no Islão, a ressurreição precede o julgamento final, enquanto que, no Cristianismo, é algo ambíguo esse cronograma (a posição de Santo Agostinho quanto às penas do purgatório e do inferno, são disso exemplo[53]).

- (d) O papel de Juíz, no julgamento final, pertence inequivocamente a Deus único e omnipotente, no Islão. No Cristianismo, as fontes escriturais manifestam ambiguidades, embora Cristo se assuma como a semantização mais certa de um tal actante escatológico[54].

- (e) A escatologia islâmica está referencialmente presa às realidades do mundo terreno, quer por simetria (aspecto que M.Palacios estudou aprofundadamente[55]), quer por natureza contrastante. Quer isto dizer que o povoamento semântico do paraíso islâmico corresponde a muito do que o meio físico e humano - onde a revelação se produziu - não dispunha ou muito carecia.

- (f) Há uma dimensão manifestamente antropomórfica na descrição do paraíso e do inferno islâmicos[56]. Num e noutro são os corpos que ou sofrem ou se deleitam, enquanto as vozes imploram ou dialogam. Na descrição do purgatório, a tensão dramática e a própria teatralização do discurso, envolvendo os três níveis escatológicos, dão corpo à alegoria do sofrimento material humano e do seu merecimento. Aqui o homem é o protagonista da narração. As fontes escriturais cristãs revelam a existência do fogo, da "géhenne", das portas de"Hadés". Fontes posteriores, como as referidas a Santo Agostinho, admitem mesmo a materialidade do fogo. No entanto, não se verifica este fio narrativo hiper-real dos seres nas suas arenas escatológicas próprias.

- (g) A possibilidade de intercessão (shafâ'a), descrita na tradição escatológica islâmica, é longínqua[57]. No Cristianismo, por seu lado, o inferno é descrito como eterno, apesar de algumas questões teológicas que o cristianismo inicial levantou a este respeito[58]. No Islão existem igualmente interpretações no sentido de o fogo do inferno não ser (interpretado como) eterno.

- (h) Finalmente, regista-se uma oposição quanto à estrutura simbólica do paraíso; no Islão a imagem global do paraíso-jardim contrasta com a imagem cristã do paraíso-cidade. J.-L.Goff (1984:441) comenta a este respeito: "Julgo ser uma grande novidade da escatologia judaico-cristã não colocar o paraíso futuro num lugar natural, ilha ou jardim como o paraíso das origens e que a Génese refere. Esta urbanização do além será contestada pela tradição do paraíso-jardim. Trata-se de um debate ideológico ainda não suficientemente estudado".

 

1.2.  A enunciação escatológica.

 

Para evitar qualquer tipo de ambiguidade referencial, convém situar, em primeiro lugar, o espectro semântico das noções a que, na presente secção, recorreremos. Entendemos por discurso - na sua dimensão linguística - todo o trabalho de rearticulação dos elementos (do plano sintáctico e semântico) da língua natural utilizada na mensagem[59]. Por enunciado, entendemos a forma exterior, material e estável criada pelo discurso. Deste modo, se o enunciado é o dito, configurando assim a materialidade de um texto (oral ou escrito), a enunciação será, por outro lado, o próprio acto de dizer[60]. Discurso e enunciado corresponderão, assim, a um processo realizado de selecção e fixação de material linguístico. Para designar o acontecimento (o acto), através do qual o referido material linguístico disponível foi objecto de um discurso e de um enunciado, recorreremos, então, ao lexema enunciação[61]. Enunciar é, nesta ordem de ideias, sinómimo do próprio acto que consiste em actualizar a linguagem[62], numa dada fracção temporal.

Se a enunciação é tida como um acto de dizer gerada no interior dos enunciados, é lógico que a mesma seja indissociável de um locutor, ou sujeito, onde se manifeste. Diferente do emissor (e receptor) físico do enunciado, o sujeito enunciador pode criar os seus próprios destinatários[63]. Por exemplo, é normal que, no âmbito literário-profético, um dado emissor físico produza um enunciado recorrendo (mesmo voluntariamente) a uma segunda voz, a de um sujeito enunciador, que cria os seus próprios destinatários. É neste postulado da enunciação que se baseia a prática profética de vaticinia ex-eventum. O.Ducrot refere, mesmo, que o fenómeno religioso poderia ser explicável, caso "a própria língua não tornasse possível a fala de alguém ser simplesmente a fala de outrém" (1984:387). Por outras palavras, é a própria organização das línguas naturais que permite esta sobreposição de vozes enunciadoras e vozes dos agentes da actividade linguística.

E.Benveniste adianta, no entanto, que a presença do sujeito da enunciação nos enunciados só se torna explícita e legível, se estes forem enunciados performativos[64]. Isto é, enunciados que em si mesmos constituam um acto; por outras palavras, que sejam realizados por predicadores (verbos) aptos a criar uma situação nova e não apenas a constatar algo consumado. Este tipo de enunciados têm a particularidade de serem, ao mesmo tempo, uma manifestaçäo linguística e um facto da realidade. "Pedir", "prometer" ou "ordenar" são predicadores de enunciados performativos; os destinatários que estes criam constituem parte integrante da enunciação, pois é através deles que o pedido, a promessa, ou a ordem se realizam[65]. Os enunciados performativos prolongam-se e completam-se num futuro deixado em aberto; o acto de dizer, nesses enunciados ( a sua enunciação), constrói o que poderíamos designar por um horizonte projectivo[66].

Para E.Benveniste, a subjectividade, ou "a capacidade do locutor se colocar como sujeito" (1976:59), é uma condição essencial da linguagem[67]. Este sujeito, empírico ou enunciador, designa inevitavelmente um tu alucotário, e vice-versa, assim se gerando uma polaridade comunicacional de pessoas. O verbo profético das revelações divinas sujeita-se, no plano do enunciado e da enunciação, a este jogo de sujeitos e respectivos receptores e destinatários - pois, no caso das religiões do Livro, recorre a línguas (ou a outras formas discursivas) humanas, para se fazer compreensível. Nesta medida, e porque o enunciado profético é basicamente performativo (propõe e anuncia um plano escatológico, que requer uma resposta dos destinatários), logo o acto de dizer que o acompanha - a enunciação - se manifesta, nesse mesmo enunciado, de forma explícita e legível (embora este tipo de texto exija modelarmente a cooperação entre o ‘dito’ e o aspecto fundamental de um ‘não-dito’ que é, até certo ponto, o alicerce daquele)..

Assim sendo, podemos constatar que, a par do conteúdo transmitido pelas revelações divinas, também o modo de enunciação dessas revelações assume grande importância, quer no momento e modo da sua transmissão, quer, na sua ritualização posterior (caso da parascese cristã, por exemplo), ou seja, portanto, nos planos da comunicação e da significação. Quer no caso corânico, quer no caso cristão, a enunciação da mensagem tem implicações na maneira como o destino último dos homens é apreendido (descodificado). Interrogaremos de seguida o papel da enunciação na mensagem divina transmitida, em ambas as religiões, com incidência na escatologia. Por outras palavras: tentaremos responder à seguinte questão: Como se enuncia a escatologia no Islamismo e no Cristianismo ?

 

1.2.1  Enunciação: o Livro e o Verbo encarnado.

 

O verbo, podemos dizê-lo, é o paradigma das revelações do mundo semítico. No entanto, é possível verificar a existência de distintos modos de enunciação do verbo divino. O acto de manifestação do verbo eterno e pré-existente tem mesmo implicações quanto à natureza do Deus que se revela. Será essa a fonte da alteridade islamo-cristã. A enunciação adquire, assim, uma pertinência bastante particular, se estudada no interior de enunciados, produzidos por uma instância divina. H.Meschonnic (1970:238) adianta mesmo que "il s'agit aujourd'hui, après Benveniste, d'étudier l' énontiation et le rapport énoncé/ énonciation spécifique à des textes dits sacrés: les définir par là, pour nous-ici-maintenant, construire par là une nouvelle rationalité".

O modo de enunciação, por excelência, da revelação islâmica é consubstanciada pelo termo tanzíl (a descida do Livro eterno, da raíz /NZL/, descer). Não se pode, no entanto, afirmar que o arquétipo de tanzíl (a descida do verbo divino à humanidade) seja exclusivo do Islão, como refere H.Didier (1982:178)[68]. Em Ezequiel (3,1), o profeta ingere um rolo escrito ("mange ce rouleau"), imune aos sentidos e impureza humanos, para, em seguida, receber a ordem de comunicar aquelas mesmas letras "auprès de la maison d'Israel" (3,4). Por seu lado, o Apocalipse canónico do Novo Testamento apresenta-se como o duplo terreno de um Livro celeste, recebido por João através de um anjo intermediário (Ap 5,1)[69]. Esta tradição é retomada pelo Islão, sendo, nesse quadro, sublinhado que não haverá outro Livro celeste após o Alcorão, nem outro profeta após Muhammad. É o selo dos selos, "le Livre contenant la vérité, qui confirme les Ecritures qui l'ont précédé, et qui les met à l'abri de toute altération" (5,52).

Há, contudo, uma ênfase particular atribuída à noção de tanzíl, ao longo do Livro sagrado islâmico. É uma das suas mensagens fundamentais, além das isotopias que formulam a unicidade divina (tawhíd) e a realidade dos fins últimos do homem. Para a comunidade islâmica, o Livro é incriado (incréé), de acordo com a surata 85,21-22[70], apesar de, no século IX, este atributo ter sido objecto da recusa dos Mu'tazilitas[71]. Guardado desde toda a eternidade (enquanto Umm al-Kitâb[72]), enunciado à humanidade como termo de um diálogo entre Deus e vários profetas, o Alcorão é, assim, insuperável e inimitável. Como refere H.Didier, a designação da sua inimitabilidade, i'jâz al-Qurân, poderá também significar o seu carácter miraculoso: "mu'jiza prophétique, Muhammad n'ayant accompli aucun miracle, hormis celui d'être le réceptable de la Révélation" (1982:177). No Islão, a mensagem revelada é, portanto, anunciada por uma enunciação do verbo. É o material linguístico humano, e , que é escolhido para que a mensagem se torne conhecida da humanidade.

O enunciado é verbalmente (re)construído por um intermediário angélico (o anjo Gabriel), que administra o elemento fático da comunicação estabelecida, sendo o seu receptor imediato o próprio profeta Muhammad. A enunciação, porém, é divina e o destinatário é constituído pela humanidade no seu todo. A enunciação verbal (do material linguístico) é dominada pelo diálogo, enquanto modalidade discursiva: "la structure fondamentale de tout l'énoncé est le dialogue" (M.Arkoun,1982:33). Isto quer dizer que o acto de dizer (de revelar) é corporizado através de uma alteridade, propositadamente instituída. Assim sendo, a enunciação é protagonizada por dois actantes em posição bipolar. Por sua vez, os relatos são enunciados no interior dos diálogos (o enunciador de um relato é um narrador, logo um dos actantes presentes narra ocorrências ao seu receptor mais imediato). No quadro desta alteridade, e como refere M.Arkoun (ibid:33), "(...)un Énonciateur omniprésent, magistral intervient explicitement pour transformer radicalement la conscience de l´allocutaire".

A persistência deste modo de enunciação de relatos (de narrações), no quadro dos diálogos, permite a passagem do sentido original e absoluto do Livro (43,3) aos sentidos que o texto humano possa comportar. Para tal mobilizam-se diversos enunciadores secundários[73], ou recorre-se a metalogismos (parábolas[74]), a determinadas funções sintácticas recorrentes[75], a asserções "par l'affirmation et la négation appuyées ou non par un serment" (ibid:34) e ao emprego frequente da frase nominal. Estes processos permitem a enunciação em linguagem humana do Livro original, decerto intraduzível no sua matriz absoluta. Por outro lado, tais processos discursivos contribuem igualmente para instituir um estado de certeza no alocutário.

O discurso criado pela enunciação conduz à categorização de actantes bipartidos, que constroem destinatários também bipartidos: os que se salvarão (os crentes) e os outros, que não cumprirão os preceitos e o contrato ético, os infiéis[76]. É assim que a mensagem escatológica se corporiza e adquire sentido(s). O processo enunciador comporta uma duplicidade dramática: por um lado, o diálogo - com que se institui a comunicação -; por outro lado, a nível da enunciação discursiva, a criação de dois tipos (oponentes) de comportamentos humanos, na sua relação com o plano divino: os que são objecto do Islão (Islão quer dizer ‘submissão’ - 3,79) e os que serão, num estádio final da escatologia, condenados ao inferno. Esta enunciação de actantes oponentes vai prefigurar a natureza mais profunda da escatologia islâmica: o julgamento final[77]. É desta forma que a visão dos fins últimos se vai alicerçando e enunciando, ao longo do Livro sagrado, numa linha de força temática que atravessa os mais diversos relatos. As descrições do julgamento final estão, deste modo, articuladas e são conaturais a este tipo de enunciação.

 

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Como refere F.Schuon (1989:148) "(...)Todo o Cristianismo se contém no enunciado da doutrina trinitária", constituindo esta uma doutrina de unidade divina[78] e, ao mesmo tempo, um veículo fundamental do plano de Deus para a salvação da humanidade. Este plano escatológico que, na linguagem paulina, se designa pela ideia de mistério (1 Co 2,7)[79], é, assim, indissociável do modo como a divindade se enuncia aos homens, numa dada fracção histórica. Em vez da corporização da noção de tanzíl islâmico, a revelação cristã enuncia-se através da encarnação de Jesús Cristo, embora a expressão de Paulo "Il (Cristo) s'est vidé lui-même" (Ph 2,7)[80] remeta igualmente para uma ideia de descida (mas não cingida à imagem do Livro celeste). Deus enuncia-se (faz-se enunciar) através de Jesús, uma criatura celeste - "Avant qu'Abraham fut, je suis" (Jn 8,58) - mas que, apesar de gerado de forma não humana[81], se apresenta munido de requisitos humanos normais, nomeadamente, o corpo, a voz e a acção.

D.Masson (1958:263) sintetizou este modo singular de enunciação, próprio da revelação cristã: "...Christ, Verbe incarné, contient seul, en lui-même, toute l'économie de la Révélation"; este acto de dizer (enunciação) à humanidade, por um lado profético, por outro lado assumindo-se como verbo divino, ou "expression éternelle et adéquate de ce qu'est Dieu"(ibid:263), permite concluir que uma noção estrita de Livro "est ici dépassé"[82]. Esta é, porventura, a grande diferença entre a enunciação islâmica e a cristã. Isto é, se a revelação islâmica se centra num enunciado onde o material linguístico é o referente primeiro[83], já a revelação cristã constrói um enunciado complexo de signos, descodificáveis a três níveis: o verbo (a), os actos (b) e o corpo (c).

            Este quadro de diferenças é também aplicável ao nível da enunciação das realidades escatológicas. No quadro do Cristianismo, verifica-se uma articulação entre os três níveis do enunciado revelado, acima referidos. O verbo, ou a palavra original de Cristo, não é - em primeira instância - conhecido de facto. Por outras palavras, o acesso ao verbo divino, enunciado por Cristo, só se torna possível através de uma dupla transposição: (a) Sendo as palavras originais de Cristo proferidas oralmente em Aramaico, elas são posteriormente escritas e traduzidas para Grego; (b) Por outro lado, além deste índice de imprecisão, próprio das línguas naturais humanas, os apóstolos "s'intéressent plus à en faire ressortir le sens qu'à rendre exactement la teneur littéral des paroles de Jésus" (cTOB,1989:37); ou seja, os documentos apostólicos do Novo Testamento constituem, sobretudo, testemunhos de fé em Jesús Cristo. É este postulado doutrinal, baseado na fé, que se transmite nos Evangelhos (sublinhando-se neles aspectos diferentes[84]), nomedamente nas Epístolas, nas Actas e acentuando-se a metáfora escatológica sobretudo no Apocalipse canónico. Os vinte sete livros que integram o Novo Testamento - e que adquirem a natureza de canon apenas no século IV[85] - devem, portanto, ser encarados como uma parte do enunciado criado pela revelação cristã, cuja função primordial é a de sublinhar a função referencial dos actos de Jesús e a importância destes para a constituição de uma fé.

Mas é, precisamente, o legado intertextual ou dialógico, existente entre os quatro registos evangélicos, que nos remete para os actos de Jesús e suas circunstâncias - segundo nível do enunciado considerado. Uma característica da enunciação, que decorre dos actos de Jesús, é a que prescreve o seu carácter amítico e único: "Le mythe se présente comme un modèle susceptible de répétitions indéfinies. A l'opposé, l'Incarnation et la Passion rédemptrices constituent un fait unique et non réitérable" (Y.Bonnefoy,[86]:81). Este carácter único e inimitável institui a transcendência, ou a ruptura definitiva entre Deus (o sagrado) e o Mundo dos homens. O acto da cruxificação de Jesús, por exemplo, "transcends any attempt to state its meaning" (N.Booth,1970:114); além de irrepetível e agente de uma ruptura definitiva, o acto em questão não comporta uma natureza transitiva para o significado. Institui-se pela diferença radical face aos actos humanos e há nele algo de intrínseco que gera uma significação, só susceptível de apreensão na práxis vivida (ou seja, na lenta aprendizagem que uma pragmática da espera escatológica implicará). Os destinatários da enunciação continuam, deste modo, a ser seus enunciadores. Nesta medida, pode dizer-se que estamos perante um enunciado e uma enunciação performativos que se caracterizam pela interiorização do acto divino original, através de um agir que corresponde a esse modelo, sem com isso o (poder sequer) repetir. Digamos que estamos face ao que poderíamos designar por ‘sinsigno semiosfórico’ (ou um agir que corresponde a um sentido íntimo previamente prescrito) na sua relação com um lesisigno baseado no ‘não-dito’.

No quadro desta enunciação divina, há que considerar o corpo humano em que Deus encarna como parte do enunciado revelatório criado. O corpo, enquanto tal, é indissociável dos actos que enuncia e, por isso mesmo, constitui-se semioticamente como um enunciado autónomo, por ser, ao mesmo tempo, veículo e recorte de um continuum expressivo de onde também se enformam os signos que Ele comunica aos outros homens. O que distingue os códigos sociais das outras famílias de códigos (lógicos ou estéticos)[87] é precisamente esta materialidade antropomórfica dos signos; o homem transporta-os e significa-os corporalmente, na sua relação com os outros homens e a comunidade. O corpo que enuncia a mensagem é o de Cristo; é um corpo humano real apesar da oposição de certos movimentos como o Docetismo[88], que nele viram uma pura aparência. A própria ressurreição de Cristo é, igualmente, uma ressurreição do corpo - ainda que des-substancializado -, já que Paulo refere (1 Co 15,44)[89] que não é a alma ou uma essência abstracta do corpo que sai da ressurreição, mas antes um corpo espiritual, o que sugere, em termos escatológicos "que l'immortalité doit comprendre le corps, quoique sous une forme différente comme elle l'a fait pour la réssurrection de Jésus"(N.Frye,1984:61). Para além dos factos da última ceia, onde acto e corpo convergem numa das últimas ocorrências da enunciação divina[90], o corpo de Cristo acaba também por converter-se numa realidade da profecia escatológica[91], isso é, o corpo místico - ou a continuação da missão de Cristo na terra, através da Igreja, "spécialement dans l'hiérarquie, doté de vrais pouvoirs santificateurs" (A.A.F.Cayré,1953-I:31). Em Jn 2,21 o corpo de Cristo é mesmo considerado como o símbolo final do novo Reino: é o próprio Templo novo da era escatológica:"Mais lui (Cristo) parlait du Temple de son corps".

O relato evangélico, enquanto enunciação não literal do verbo divino, é sobretudo um relato "de l'agir human" (G.Entrevernes,1977:211). Há, nesta linha de ideias, entre a palavra e o acto enunciados, uma articulação fundamental que prefigura o ensinamento escatológico na enunciação revelatória cristã. Na análise semiótica do Groupe d'Entrevernes (ibid:172), existe, na enunciação cristã, um "récit primaire" que é definido como um programa narrativo dominante "structuré intérieurement" (...)"dont l'objet principal s'identifierait aux valeurs figurées par la métaphore du royaume de Dieu[92]". Deste modo, a isotopoia dominante, ou o valor temático mais reiterável da mensagem é sempre de natureza escatológica. Para o expressar, há dois processos complementares, respectivamente devedores da palavra e do acto enunciados: as parábolas e os milagres. Segundo a conclusão do G.d'entrevernes (ibid:212), "les paraboles donnent au récit primaire son sens mais elles en reçoivent leur performativité; les miracles donnent au récit primaire son instrumentation mais ils en reçoivent leur signification". Detsa forma, é entre o registo inteligível do verbo e o objecto concreto criado pelo acto (e pelo corpo) que o ensinamento escatológico acaba por ser enunciado pelo discurso revelatório cristão.

 

1.2.2 História e natureza enquanto veículos de enunciação

 

Depois de termos abordado os modos de enunciação das mensagens divinas cristã e islâmica, passamos agora à análise dos veículos dessa mesma enunciação. Quer isto dizer que cada acto enunciador divino determina instâncias particulares, a partir das quais a mensagem pré-existente[93] se torna legível (descodificável) perante a humanidade. Estas instâncias correspondem, no caso cristão e islâmico, respectivamente à História e à natureza. Tal nível de alteridade é sintetizado por A.Hourani (1980:41) do seguinte modo: "In Christianity, the idea of revelation is linked with that of progress", enquanto que o Islão é descrito, neste contexto, enquanto "underlying natural religion, recalled by prophets from time to time".

Para o Islão, Deus é inimitável e não pode ser confundido com o todo da sua criação. O universo e o seu equilíbrio funcionam, assim, como um gigante enunciado cuja actividade é gerada (enunciada) por Deus[94]. Toda a natureza (animada ou não) constitui um mapa complexo de indíces que remetem para a divindade. Como refere N.Booth, "nature is a fabric of symbols, which must be read according to their meaning. The Quran is the counterpart of that text in human words" (1970:115). A natureza é, pois, um discurso: as ocorrências naturais apresentam, assim, uma lógica sintáctica própria e remetem intrinsecamente para a Divindade, sua causa primeira[95]. O texto sagrado revelado é, igualmente, parte deste discurso. Assim sendo, o grande código - ou a instância que permite aos homens significar o(s) sentido(s) do mundo em seu redor - é apreendido a partir da leitura global das manifestações da natureza. No entanto, o Alcorão é a parte desse discurso natural que Deus deliberadamente cria para comunicar com a humanidade. Para tal, recorre à natureza linguística, como suporte fático, por aquela constituir uma das mais privilegiadas do acto comunicacional humano. Mas tal não invalida que a natureza, no seu conjunto -  nela se incluindo o universo, o homem, as suas línguas naturais e os elementos grafemáticos a elas adstritos - não constitua um único horizonte de toda a criação, um mahal, cuja acção decorra, em última instância, de um enunciador surpremo que institui e significa todo este discurso: Deus.

Para a tradição cristã (e judaica), a natureza pode oferecer ao homem exemplos do poder de Deus e até da sua presença, "but it doesn't provide an immediate encounter with him. God is encountered in historical rather than in natural events" (N.Booth,1970:115). Nesta linha de ideias, a História é o veículo privilegiado da revelação cristã; é na sucessão e ordem das ocorrências humanas que a mensagem de Deus se converte em signo legível. Atribuindo importância primeira à sintaxe do tempo, o Cristianismo parte do princípio que os homens, ao longo da História, adquirem as realidades divinas progressivamente, não as podendo reter num momento isolado da sua história, enquanto espécie. Tal ordenação do sentido do tempo (enquanto aprendizagem) conduz, inevitavelmente, a uma teologia de partilha entre o divino e o humano, cuja forma arquétipa é definida pela encarnação - seu modo particular de enunciação, como vimos.

Este sentido de partilha é refutado no seio do Islão: aqui, a natureza e o homem pertencem ao grande horizonte da criação divina e não se confundem com Deus. Os moriscos ibéricos curiosamente fazem eco desta refutação nos seus textos: "Le Morisque refuse de distinguer les plans de temporalité e d'éternité - au contraire du Chrétien -, de même qu'il n'envisage pas l'existence de la nature et de la personne comme deux réalités différentes"  (L.Cardaillac, 1977 : 262)[96]. A História é, assim, para o Islamismo, o que a natureza poderá, de certa forma, ser para o Cristianismo: uma arena, de onde é possível recolher exemplos, sobretudo quando o homem ousa desprender-se do comando divino[97].

Assumindo a natureza como o grande veículo revelatório, o Islão entende que a enunciação factual da sua mensagem não é progressiva e, portanto, histórica: "L'Islam accorde d'avantage à la foi pure et nue en la Parole divine transmise en une fois au Prophète" (D.Masson,1958:284). O surgimento da mensagem divina, através da descida do Livro, cria, na realidade temporal, a divisão entre um antes e um depois, dispostos simetricamente. Esta consciência "d'un avant et d'un après" (M.Arkoun,1982:28) é, porventura, proporcional à oposição espacial e escatológica entre dâr al-islâm e dâr al-harb[98] que, segundo W.Watt (1991:40-41), traduz uma visão "of seeing world-history": "the former was where a Muslim was ruling according to Islamic law, and the latter was where that was not yet the case"[99]. Esta leitura dramática do tempo, porque baseada numa tensão irredutível entre dois pólos, impossibilita a História de se assumir - perante a humanidade - enquanto veículo progressivo da manifestação revelatória"[100]. O tempo converte-se em drama, pelo facto de a História ter sido bruscamente interrompida pela descida da mensagem divina; o rejuvenescimento cíclico do tempo torna-se, assim, na única possibilidade de a História ter um sentido: é por isso que N.Booth refere que "Ibn Khaldún gives us"(...)"a kind of natural history", ou a história entendida ciclicamente à imagem da natureza[101].

Convém, no entanto, notar que ambos os veículos enunciadores, a que o Cristianismo e o Islamismo recorrem, respectivamente a História e a natureza, desempenham uma função idêntica em cada um dos campos. Essa função traduz-se pela necessidade de manutenção ou de preservação da humanidade num determinado caminho, cujo limite é, naturalmente, escatológico (dada a natureza de salvação final de ambas as religiões). Por um lado, pelo facto de a natureza (e também a humana) constituir uma espécie de locus amenus, onde a enunciação das verdades terminais acabará por se tornar possível; por isso, a concepção de vida islâmica varia "d'une vision eschatologique où la vie d'ici-bas ne serait qu'une préparation à la vie de l'au-delà, à une vision plus immanente où l'homme doit accepter la vie comme elle est ou se présente"(J.Waardenburg,1989:160). O homem predispõe-se assim a compatibilizar a prédeterminação e a salvação, alinhando com a natureza no seu próprio encaminhamento, de que Deus é o enunciador surpremo. Por outro lado, a função da revelação através da História "is one way of showing"(...)"the value of abiding patiently in a pattern of religious obedience", pois " World history is on a particular course leading to the ultimate triumph of God, and, by the same token, the triumph of those who have allied themselves to him"(C.Rowland,1982:143). Assim, também a enunciação divina através da História torna possível uma contenção e uma fidelidade, ambas necessárias à consumação do plano escatológico - enunciado pelo Cristianismo.

              

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Podemos, agora, reter algumas conclusões fundamentais quando às diferenças de enunciação de um horizonte escatológico, no Cristianismo e no Islamismo:

 

       - (a) Em ambos os casos considerados, estamos perante enunciados performativos, já que implicam um acto ou um contrato ético por parte dos destinatários, cuja incidência última é escatológica (não se limitando, portanto, a constatar factos e realidades);

       - (b) Na enunciação, há locutores que, inevitavelmente, se assumem como sujeitos. Estes contemplam um enunciador-destinador e um destinatário comum, respectivamente, Deus e a humanidade. Já os sujeitos empíricos e os receptores imediatos do acto comunicacional, estabelecidos pela enunciação, diferem: O anjo Gabriel e o Profeta, no campo muçulmano; Cristo e o corpo de actantes receptores, que com ele contactam, no campo cristão. No primeiro caso reata-se uma tradição profética, no segundo a comunicação com a divindade é directa, prefigurando-se simbolicamente a realidade escatológica;

       - (c) A enunciação divina recorre ao material linguístico, no campo muçulmano, e a uma articulação sígnica do verbo/acto/corpo, no campo cristão. O anúncio escatológico depende, assim, do arquétipo definitivo do Livro celeste (13,39)[102], no campo islâmico, e da vivência transformadora e interpretante[103] dos actos (e do verbo) de Cristo que, por si só, transcendem um dado nível de significação[104];

       - (d) O veículo, ou representamen[105], da enunciação divina é, na sua dominante, a história e a natureza, para o Cristianismo e o Islão, respectivamente. A enunciação revelatória cristã é entendida como um processo lento, evolutivo e marcadamente performativo, enquanto a islâmica é emergente, criando uma roptura no tempo. No primeiro caso há uma partilha entre a divindade e o homem na narração do processo escatológico, no segundo caso há uma demarcação entre Deus e a natureza, na qual o homem se encontra. A narração dos eventos da natureza (e do homem) pertence exclusivamente a Deus. Há, contudo, uma função idêntica nos veículos de ambas as revelações: a de salvaguardar os preceitos, que tornarão o devir escatológico possível.

 

1.3  A natureza de Deus e a salvação.

 

Abordámos, nas duas sub-secções anteriores[106], o quadro estrutural de diferenças existentes entre Cristianismo e Islão, nos planos da narração dos factos escatológicos e da enunciação das mensagens que os anunciam. Vimos que a relação entre um antes e um depois é - no Cristianismo - mais relativada na medida em que a noção de salvação se corporiza no próprio acto enunciador de Cristo. Estamos, neste caso, perante a realidade da metanoia, ou seja, da recolocação do referente num modelo de salvação que privilegia a assunção escatológica no aqui-agora[107]. O plano divino, no seio do Islão, por seu  lado, enquadra preferencialmente a palavra e o discurso linguístico e é a partir da reposição do real (que os sememas incorporam[108]) que a dicta se regista e se torna compreensível. Deste modo, é no Livro sagrado que se anuncia o dia, ou a hora, em que o termo se consumará. Esta relação desigual com o pressuposto escatológico, nas suas implicações com o tempo humano, é manifestada na narração e na enunciação da mensagem. No entanto, e como referimos acima, a questão de fundo que origina essa manifestação de alteridade prende-se com a própria natureza de Deus. É a essa questão que, nesta sub-secção, nos referiremos.

            D.Broadribb (1970:71), no quadro de uma reflexão sobre a natureza de Deus em várias religiões, parte do princípio que o Islão se situa num meio termo, entre o panteísmo hinduísta e o Cristianismo. Assim, a concepção cristã estabelece a existência de um só Deus, enquanto "separate individual, not to be confused with the spirits and beings which he created, and which exist in their own right as individuals"(ibid.:71). No caso islâmico, "the individuality of God is emphasized" (ibid.:71) - constituindo esta a característica de fundo da sua própria diferenciação. É por esta razão que o Islão postula fronteiras rígidas entre o humano e o divino[109], ou sublinha a soberania plenopotenciária de Deus sobre o todo da natureza. A vontade de Deus é, pois, surprema e este facto, enquanto atributo, é indissociável da própria unicidade divina (tawhíd).

A unicidade divina (tawhíd) é a base da natureza islâmica de Deus. O tawhíd preconiza a unidade indissociável da essência, dos actos e dos atributos divinos[110]. Subjacente a esta formulação, está o princípio que estabelece a diferença absoluta entre o eterno e o que está no tempo, o muhdât[111]. O sentido de preservação da unicidade divina constitui de tal forma um princípio dogmático no Islão que, no quadro do Kalâm[112], se fizeram ouvir vozes contra a existência dos próprios atributos divinos. Por exemplo, para os Mu'tazilitas, admitir a existência  dos atributos seria sinónimo de pluralidade divina, já que estes se confundiriam com a própria essência de Deus. Para os Falâsifa[113], defensores de um estrito tawhíd, Deus seria a fonte de todas as inteligências, de onde foi emanado o equilíbrio superior (as esferas, os céus) que governa a alma. Deus, deste modo reduzido a uma abstracção conceptual, configura uma unicidade plena. As escolas tradicionais, como a Hanbalista, e outras ligadas ao Kalâm, nomeadamente a ash'arita e a maturidista, defenderam a unicidade divina, mas nela contemplando os próprios atributos. A expressão de Abú Hanifa "Lâ huwa wa lâ hairuhu" (são, nem idênticos a Deus, nem separados Dele[114]) consubstancia a tese que poderíamos designar como ortodoxa (que obtém o consenso, a ijmâ'). Cabem, portanto, nesta designação, segundo o modelo de Ibn Taymiyya[115], os salaf, os ahl al-sunna wa-l-hadít, os sufis e os ahl al-kalâm que defendem a existência de atributos divinos, nomeadamente, os ahl-itbât ou al-sifâtiyya.

As implicações que, para o Islão, decorrem desta noção dogmática de unicidade são decisivas. Y.Haddad (1981:2) sintetizam este facto, enquandrando a questão chave da escatologia que, naturalmente, se subordina à ideia de um único e magistral narrador do enunciado da criação; a natureza: "Basic  to Islamic theological discussions of the nature of human kind, the structure and order of the universe, and the course of human history as part of the eschatological story of Islam is the primary consideration of whether or not specific formulations are consonant with the Qur`ânic understanding of the essential oneness of the divine". As suratas 19,94 e 19,95 detêm a os princípios que regem esta constatação: por um lado "Tout ce qui existe dans les cieux et sur la terre est serviteur du Miséricordieux, il les a comptés et dénombrés tous"; por outro lado, a consciência islâmica de que a salvação, neste contexto, é individual perante Deus único e todo poderoso: "Tous paraitront devant Lui au jour de la réssurrection, seuls, isolés"[116].

Para M.Hagerty, esta espiritualidade, baseada no tawhíd e na subordinação do homem e do mundo a algo impessoal e objectivo (1978:262-266), tem as suas raízes no ambiente desértico, onde o Islão se enunciou: "cuanto más se aleja de la tierra de las quatro estaciones, más necessidad tiene el hombre religioso de comprimir sus experiências en una". A uniformidade da paisagem, o domínio sugerido pelas estrelas (a que recorrem os nómadas para se guiarem) e as próprias adversidades criadas pela imensidão, implicam uma noção de transcendência diferente da produzida pela complexidade das florestas[117]. Hierofanias diferentes a gerarem uma também diferente natureza da divindade e da própria salvação[118].

Neste quadro, é normal que o Islão entrevesse, na doutrina cristã, sinais de pluralidade divina na figura ou mistério da trindade. É esta fórmula, garante do carácter divino de Cristo, que, por fundar-se na hipóstase entre o verbo divino e a natureza humana, se acaba por converter no ponto irredutível entre as duas concepções - ou naturezas - de Deus. Nesta medida, D.Broadribb refere que, Islão e Cristianismo, recorrem a doutrinas virtualmente idênticas, "if we leave aside the exact wording of dogmas on the trinity"(1970:71). É possível que, na génese de tal incompatibilidade, pudesse ter havido uma primeira descodificação do termo "filho" que, por analogia, remetesse para as divindades pré-islâmicas conhecidas como "Filhas de Allâh" (as forças destruidoras e irremediáveis - T.Izutsu, 1964: 126[119]).

Al-Ghazâli, embora contrarie a isotopia corânica da corrupção das Escrituras (tahríf), entende que os Evangelhos requerem uma interpretação metafórica; assim a trindade constituiria, por si, um conjunto de três atributos numa só substância, nomeadamente, o Pai - ou a existência (al-mawjúd) - e os restantes termos, "le connaissant et le connu" (L.Massignon, 1932:523 e sqqs.)[120]. A palavra divina, entendida como atributo e, portanto, indissociável da própria essência divina, é, nesta óptica, alheia à pessoa de Jesús (que o Islão, no entanto, considera como um profeta, mas também como uma figura importante do cronograma escatológico). De salientar, ainda, que certos desvios do Cristianismo dos primeiros séculos, nomeadamente o Modalismo e o Adoptacionismo unitário, detêm certas similaridades com estas posições. A primeira dessas correntes considera Deus como uma só pessoa, sendo os elementos da trindade simples manifestações dos seus diversos atributos; O Adoptacionismo unitário nega mesmo a pluralidade das pessoas divinas, nomeadamente a de Cristo que, assim, teria sido "adoptado" por Deus[121].

O Islão não pode, contudo, conceber uma distinção entre a essência de Deus e a tríade divina, ainda que concebida como imanente ao ser surpremo. A surata 5,77 é explícita a esse respeito: "Infidèle est celui qui dit: Dieu est un troisième de la trinité. Il n'y a point de Dieu si ce n'est le Dieu unique"; e a mesma surata, ilustra as consequências escatológicas que tal irredutibilidade poderá acarretar: "S'ils (os cristãos) ne désavouent ce qu'ils avancent, un chatiment douloureux atteindra les infidèles". Neste ponto, a alteridade está criada a um nível profundo: mais do que nos desígnios da narração e, até certa forma, da própria enunciação escatológica - é ao nível da ideia de transcendência, ou da natureza de Deus, que a roptura se estabelece. O plano divino de salvação irá, igualmente, assumir contornos díspares a partir desta diferença de base

            Com efeito, o Islão estabelece uma conexão entre a ascenção de Cristo e a cruxificação, mas suprime, de facto, o acto da ressurreição e com ele o da redenção - ou o fundamento escatológico do próprio Cristianismo: "...ils ne l'ont pas tué, ils ne l'ont point crucifié; un autre individu qui lui ressemblait lui fut substitué, et ceux qui disputaient à son sujet ont été eux-mêmes dans le doute (...)Ils ne l'ont point tué réellement. Dieu l'a élevé à lui, et Dieu est puissant et sage"(surata 4,156). A mensagem cristã, por seu lado, deposita no acto da ressurreição o argumento enunciador mais fecundo, sobretudo no que respeita à realidade da salvação: "Christ(...)le premier à ressusciter d'entre les morts(...) doit annoncer la lumière (le salut) au Peuple et aux nations paiennes"(Ac 26,23). Mesmo entre os moriscos, como L. Cardaillac demonstrou (1977:225 a 253), esta questão da trindade - directamente ligada à da natureza de Deus e, portanto, ao plano escatológico - foi objecto de polémica. Textos aljamiados que abordam esta "desputa de los Muçlimes kon los K(i)risti(y)anos sobre la Unidad de Allah, kes uno, sin fijo ni terçero" constituiriam, igualmente, motivo de perseguições por parte da inquisição[122].

 

2.  Ortodoxias e limites do acto profético

      

Niccolò Machiavelli refere nos seus Discursos[123]: "no serious misfortune ever befalls a city or a province that has not been predicted either by divination or revelation or by prodiges or by other heavenly signs"(1970:249). Esta posição de profunda desconfiança em relação à prática profética, no seu espectro mais vasto, é partilhada por Ibn Khaldún, dois séculos antes, com incidência na profecia astrológica: "...elle porte les hommes à s'attendre à des signes de crise (qawâti`) touchant les dynasties, ce qui encourage les adversaires et les rivaux de l'État à attaquer celui-ci et à se revolter contre lui" (Ed.1968-II:1191). A posição maquiavélica de Ibn Khaldún, podemo-lo dizer, espelha um dado receio - aparentemente do próprio poder estabelecido - face à prática profética. Porém, subjacente às palavras de Niccolò Machiavelli, manifesta-se uma quase certeza quanto ao carácter funesto da profecia, seja onde for que esta se exerça. Por trás de tais argumentos, de que intencionalmente elidimos o contexto, não se verifica apenas um temor pelo profético. Muito para além disso, o que de facto está aqui em causa é o sentido de uma ortodoxia, ou seja, de uma posição socialmente dominante que prescreve, não apenas um receio pelas consequências do acto profético, mas sobretudo um agir em prol da sua própria ilegitimidade (quando dele não se pode servir).

Entendamos, neste âmbito preciso de análise, o acto profético como facto selectivo que opera a partir de uma amálgama onde coabitam: (a) a acção de predizer o futuro, (b) a acção de invocar ou falar em nome da Divindade, (c) e a acção de presumir uma eventual revelação do plano divino (ou a parte dele). Tal prática é voluntária e produz-se num mundo pré-moderno, em que a semiose é divina, por se basear na fé e não ainda em racionalidades, ainda que (nos campos islâmico ou cristão) a autonomia do acto possa ter sido admitida enquanto causa segunda; como adianta G.Makdisi: "Intellectual freedom in the Middle Ages existed within the framework of a system of faith"(1985:79). Neste contexto de carácter ético - que administra as relações entre o homem e a divindade - cumpre-nos, agora, interrogar o tipo de relação específica, existente entre o acto profético e as ortodoxias dominantes (cujo consenso ou determinação, conforme os casos, dependem do Grande código inicial - a lei revelada - que actualizam em situações concretas).

O Cristianismo, em princípio, parece deixar aberta a possibilidade de legitimar esse tipo de acto. Paulo (1 Co 41,1) aconselha-o mesmo: "Recherchez l'amour; ayez pour ambition les phénomènes spirituels, surtout la prophétie". Como é explícito em Ac 11,28 o acto profético, mais do que premonição, é ilmunição "par l'Esprit"[124] e pode manifestar ou traduzir, desse modo, o sentido da vontade divina nas circunstâncias presentes (cTOB,1989:509). Em Ep 3,5 aclara-se um pouco mais esta legitimação, possível após Cristo: "Ce mystère, Dieu ne l'a fait connaitre aux hommes des générations passées comme il vient de le réléver maintenant par l'Esprit à ses saints apôtres et Prophètes"; em Col 1,26-27, precisam-se os destinatários referidos na Epístola aos cidadãos de Éfeso: são estes os apóstolos, os santos e, notoriamente, "todos os baptizados" (ibid.:600).

A articulação destes dados permitir-nos-ia  concluir que, sob o pano de fundo da nova era histórica - mas também já escatológica - o homem pode realmente profetizar, na medida em que a potência divina o permita (através do Espírito Santo, como se anuncia em Ac 1,8: "vous allez recevoir une puissance, celle du Saint Esprit qui viendra sur vous"). No entanto, os textos do Novo Testamento não deixam, igualmente, de avisar que os falsos profetas surgirão "en foule et égareront beaucoup d'hommes" (Mt 24,11 e 7,15, 1 Jn 4,1). Esse facto que, desde o fim do primeiro século, "a troublé profondément l'église" (cTOB,1989:111)[125], é também referido no Apocalipse canónico, sob a forma da "segunda besta" (Ap 13,11-16)[126]. Os limites e a legitimidade do acto profético ficam, de certa forma, por codificar. Entrevê-se, assim, um debate constante entre a produção profética e os critérios que uma dada ortodoxia edifica, em tempos e lugares diferentes, no sentido de evitar ambiguidades. A importância do acto profético a isso obrigará, como veremos.      

O discurso divino, revelado através do Alcorão, parece ser mais claro e conciso: A surata 33,40 refere explicitamente que "Muhammad n'est le père d'aucun de vous. Il est l'envoyé de Dieu et le sceau des prophètes. Dieu connait tout". Tudo parece estar definitivamente dito à humanidade, numa última descida revelatória. Em 31,34 tal visão é, porventura, acentuada: "l'homme ne sait point ce que lui arrivera demain"(...)"La connaissance de l'heure est auprès Dieu". Não se contempla aqui a possibilidade de revelação progressiva . No entanto, no final da surata 42, é referido o seguinte: "Dieu ne parle jamais à l'homme, si ce n'est par inspiration ou derrière une voile"(50)"Ou bien il envoie un apôtre à qui il révèle ce qu'il veut(...)"(51)"C'est ainsi que par notre volonté l'esprit t'a parlé, à toi..."(52). Significando "espírito", em 42,52, o anjo Gabriel[127], o que aqui se aflora é a modalidade de comunicação existente entre Deus e o profeta, no acto da revelação. Por outro lado, também não deixa de ficar em aberto (em 42,50) a possibilidade de Deus "falar", ou comunicar com os homens, sob certas circunstâncias.

Além deste facto menor, convém, sobretudo, não esquecer que o Islão esteve sempre bastante povoado por movimentos que interpretam a Lei revelada como algo excessivo ou pesado[128]. São seitas ou correntes  que aspiram a um modo mais directo de assunção com Deus. Surgem nesses casos, por razões diferentes, os ghulât[129], entre os shi'itas mais radicais, os Ismaelitas[130], os Druzes[131] e os próprios místicos, nomeadamente os sufis (cuja maioria se encontra dentro do campo sunita[132]). São movimentos referenciados como antinomistas que, pela possibilidade de contacto directo com Deus -  que preconizam -, acabam por deixar a porta aberta à legimitação do próprio acto profético. Como no caso cristão há que definir, aqui, critérios capazes de estabelecer limites e níveis de legitimidade para o acto de profetizar a que, curiosamente, os moriscos irão recorrer.

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J.Schacht (1953:36), num artigo importante para a teorização do Kalâm[133], (teologia dogmática islâmica) equaciona e tenta atribuir um significado ao que designa por "Muhammadan orthodoxy". O autor conclui, no artigo em causa, que ortodoxia deve ser entendida como sinónimo da doutrina "followed by the majority of Muslims". J.Schacht retira, em seguida, a seguinte ilação: "In the fourth century of the hegira this doctrine acquired as a façade, or if one prefers to say as a supersturcture, the two related schools of the Ash'arites and of the Mâturídites". Em dois artigos posteriores (1964 e 1974-I,II e III[134]), G.Makdisi considera que a ortodoxia islâmica representa "What is standard", no sentido  de que "the overwhelming majority in Islam constitutes its membership"(1964:44-5). Assim sendo, o sunismo, ao congregar 90% dos muçulmanos, configuraria a própria ortodoxia.

A diferença que G.Makdisi vai estabelecer decorre da ilação que retira seguidamente: "Sunnite orthodoxy is determined by membership in one of the Sunnite Schools of Law, all of which follow the sunna (tradition) of the prophet" (ibid:45). Deste modo, não são as correntes de teologia dogmática (kalâm) que se constituem como referente da noção de ortodoxia, mas antes as escolas jurídicas sunitas, onde as correntes referidas (do kalâm) têm influência diversa e até concorrente. É por isso que, em 1974, G.Makdisi conclui: "La seule orthodoxie qui ai été attesté en Islam par le consensus de la communauté ou ijmâ', ce fut l'orthodoxie sunnite, représentée, depuis le IIIe siècle, par les quatre écoles de droit sunnites"; a razão é clara:"dans le domain de la religion, tout doit être légitimé par l'intermédiaire des écoles de droit"(ibid.:76), pois o Islão é, antes demais, nomocrático e nomocêntrico.      

A noção de ortodoxia está, assim, intimamente ligada à ideia de consenso (ijmâ`), no quadro do Islão sunita. Não havendo sínodos ou concílios, o Islão centra-se em torno da sua voz comum e interior. A partir do séc.IX, são fundamentalmemte quatro[135], as escolas de direito que dão corpo à ortodoxia: a hanafita[136], a malikita[137], a shafi'ita[138] e a hanbalita[139], recorrendo a diferentes métodos de jurisprudência, mas todas baseando-se nas mesmas fontes principais: o Alcorão e a sunna. O Malikismo e o Hanifismo consideram, além das fontes consideradas, respectivamente, a opinião pessoal e o princípio da analogia (qiyâs) e, só numa última fase, o consenso (exclusivamente dos  doutores de Medina, no primeiro caso, e sem qualquer restrição no segundo). O Shafi'ismo recodifica a noção de consenso, sob a forma de acordo unânime entre os doutores da lei, num dado período e sobre uma questão determinada. Finalmente, a escola hanbalita, mais rigorosa quanto às fontes da lei principais, só em casos de absoluta necessidade poderia admitir o próprio julgamento pessoal.

            O esforço de investigação pessoal que, em cada escola, conduz à interpretação da Lei - ou à descodificação da Sharí'a no quotidiano - é designado por ijtihâd. A capacidade de efectuar esta descodificação é, apenas, reconhecida aos fundadores de cada escola, ou aos seguidores que tenham tido a responsabilidade de passar à prática o método daqueles. A partir daqui, não mais é possível recorrer ao ijtihâd, sem que, com isso, se impeçam os muftis de  assumir as suas responsabilidades, em certos casos sem precedentes factuais. Este sistema, fechado sobre si mesmo, contendo o nível da diferença no seu interior, consubstancia, de facto, o consenso islâmico ou, por outras palavras, a ortodoxia. A centripticidade do Islão é, sob uma outra forma, apresentada por Ibn Taymiyya (1263-1328) na teoria que poderíamos caracterizar como dos círculos concêntricos[140]. Tal concepção estabelece as posições relativas das diversas escolas teológicas (incluindo as do Kalâm) na comunidade, tendo como referente base o Alcorão e a sunna - como acima se viu (cf.1.3). Neste quadro consensual de grande amplitude, apenas os partidários da jammiyya são considerados exteriores à própria ortodoxia[141].

            Na Península Ibérica, bem como em grande parte da África setentrional, a escola de direito tradicionalmente dominante é a maliquita. Isso não significa que a ortodoxia ibérica silenciasse vozes diferentes, como as de Ibn Hazm, dos filósofos ou até das correntes mahdistas, de que os Almóadas são o expoente máximo. No seu tradicionalismo moderado, o Maliquismo constitui-se como escola oficial do al-Andalus duranteo século IV/X (cf.nota 148). Ibn Khaldún (1332-1406) integrou o Islão maliquita e surge já no fim do grande período islâmico; como R.Habachi comentou (1980:85), "la pensée novatrice d'Ibn Khaldoun au XIVe siècle apparait d'autant plus originale que rien ne la laisse prévoir et rien ne la prolonge". De certo modo, dir-se-ia que Ibn Khaldún expressa, numa lucidez final, uma espécie de síntese do pensamento comum, mas dando-lhe um grande refinamento reflexivo.

Embora o autor considere que a especulação pura é necessária para abarcar o real, crê, igualmente, que a razão não pode abranger toda a causalidade do mundo à nossa volta. Por isso, Ibn Khaldún refere que "une voile sépare les hommes de l'inconnu que personne ne connait sauf celui à qui Dieu le révèle dans le sommeil ou par voie de sainteté"[142]. Em relação aos adivinhos, o autor acrescenta: "il s'agit d'une catégorie d'hommes imparfaits par rapport aux prophètes"[143]. No seu combate à adivinhação, nomeadamente a astrológica, refere ainda que "Il n'y a qu'un Agent, c'est Dieu - comme on l'a prouvé par déduction (istidlâl) au chapitre sur l'Unité de Dieu" (al-Muqqadima,ed.1968-II:1188). As realidades futuras convertem-se, assim, num mistério difícil de desvendar. Porque o homem tem, simultaneamente, contacto com os sentidos e com o espírito, é possível que - e só por iniciativa divina - o dom da profecia sobre ele recaia. Quando tal ocorre a história muda, e o movimento assim determinado é, por natureza, cíclico[144]. Porque o ciclo se fechou com Muhammad, Ibn Khaldún conclui que as práticas proféticas, simplesmente humanas, nada têm a ver com o decreto divino, "c'est à dire avec la prédestinaton (al-Qadar)"(ibid:1187); "Telle est la tradition authentique" - remata o autor (ibid.:1189), o mesmo é dizer que tal é o legado da própria ortodoxia islâmica.

De facto, o termo "ortodoxia" implica a existência de uma norma ou autoridade, capaz de distinguir uma doutrina herética da que o não é. Este modo de diferenciar o legítimo e o ilegítimo não existe no Islão (ao contrário do Cristianismo). No entanto, e como reflecte D.Broadribb (1970:71): "the believer knows what is the will of God in each specific situation which he encounters"(...)"in this respect we may note that Muslim religious law is highly detailed and codified". As posições de Ibn Kaldún, num tal contexto, remetem inevitavelmente para a tradição que é selada como a autêntica, não para a que poderá estar falseada. Mas, mais uma vez o círculo se torna a fechar, já que Ibn Khaldún parte do princípio que a melhor maneira de defender a credibilidade das palavras imputadas ao profeta reside na própria igmâ' (cit.in Goldziher, 1952:1971).

Há vários hadít (tradições) que, aliás, argumentam nesse sentido[145] como é o caso da recolhida por  Khatíb al-Bagdâdí: "Quand vous entendez comme venant de moi une information qui plait à vos coeurs et qui rend vos cheveux et votre chair tendres et que vous sentez proche de vous, sachez que nul d'entre vous n'en est plus près que moi-même". A ijmâ', assim, autentifica a tradição; esta, uma vez autentificada, converte-se numa fonte da própria ijmâ'. Independentemente da verificação dos vários garantes do Isnâd (para acautelar o carácter, os fins, e a  certificação dos testemunhos do Râwí - o transmissor) e do facto de a transmissão ser a forma "mais nobre" (ibid.:174) de shahâda[146], a verdade é que muitas tradições (hadít) foram forjadas na história do Islão:"dans ce domaine, on a eut recours au hadít lui-même comme moyen de saper la Tradition"(ibid:166)[147]. Sem querermos aprofundar aqui este aspecto, parece-nos claro que a maleabilidade da ortodoxia, de que a ijmâ' é a substância, parece ser grande; ou seja, no campo estrito da tradição, há de facto espaço para a produção do acto de características proféticas, independentemente da sua ilegitimidade (aliás traçada pelos argumentos do próprio Ibn Khaldún). Como T.Fahd refere, "En Islâm, l'affirmation constante de la tradition se résume dans ce principe: Lâ Kihâna ba'da n-nubuwwa (il n'y a) plus de divination après la prophétie" (1966:64). O parecer de Ibn Khaldún parece, assim, de facto, corroborar o desígnio da ortodoxia.

Um olhar sobre algumas suratas do Livro sagrado confirma-o. Neste quadro, a legitimidade de desvelar algum detalhe do futuro ou do próprio plano divino é, claramente, reservado a Deus: "...n'anticipez point sur les ordres de Dieu et son envoyé" (49,1). Sobre a autenticidade do que é formulado, incluindo naturalmente possíveis enunciações proféticas, a mensagem apela ao cuidado -"...cherchez d'abord à vous assurer de sa véracité"(49,6).  Além disso, várias são as suratas onde é notório o intuito de dissociar a poesia (ou as "histórias frívolas") do conteúdo da revelação[148]. Tal acontece pois, como refere G.E.von Grunebaum, os adversários do profeta "s'efforcèrent (...) de confondre les notions de divination d'une part, de révélation et de production poètique d'autre part" (1955:7). A afirmação de Muhammad como profeta terá, assim, exigido essa demarcação. É por isso que toda a literatura (de foro puramente humano) não é, tradicionalmente, olhada com bons olhos no seio do Islão. Essa é a razão, também, porque "une impulsion aussi élémentaire et aussi forte que la conversion à l'islam n'ait pas provoqué d'échos littéraires importants" (P.Heath,1989:197). A surata 69 põe mesmo em pé de igualdade o adivinho e o poeta, contrapondo-os à  figura do próprio profeta, numa antinomia que separa a verdade da frivolidade: "Ce n'est pas la parole d'un devin. Combien peu réfléchissent!" (69,42), "et n'on pas la parole d'un poète. Combien peu croient à la vérité".

Esta delimitação entre ambos os campos parece, de facto, ser tangível e definitiva. A conclusão poderia ser dada pela fonte sagrada, através da surata 5 (versículo 101): "...ne vous interrogez point au sujet des choses qui, si elles vous étaient dévoilées, pourraient vous nuire". No entanto, é também aqui que, ao evocar a misericórdia divina, se parece atenuar a ilegitimidade radical do próprio acto de profetizar :"Dieu vous pardonnera votre curiosité, parce qu'il est indulgent et miséricordieux". O Alcorão aconselha, deste modo, o crente a não ultrapassar o que lhe está destinado; no entanto, a infidelidade não é imputada ao homem - de forma absoluta - sempre que os limites da sua curiosidade sejam superados. O mesmo tom de limitada condenação, ou na expressão de T.Fahd, de "réticente du Prophète à denier toute valeur intrinsèque au contenu de la divination"(1966:68) é traduzido num hadít da responsabilidade de Wahb b. Munabbih (primeiro transmissor do isnâd relativo a relatos bíblicos[149]): "Dieu révéla à Moise b. Manassa b. Yúsuf de dire à son peuple: je n'ai rien à voir (anâ barí') avec quiconque pratique la magie ou s'adresse à un magicien, avec quiconque pratique la divination"(...)"celui qui s'éloigne de Moi et met sa confiance en un autre, en bon associé, Je lui retourne la prière qu'il m'aurait faite et Je le confie à celui en qui il aurait mis sa confiance; mais, celui que j'aurais confié à un autre, devrait être prêt à l'épreuve et à l'adversité"[150]. Parece-nos assim que as práticas premonitórias, ainda que condenadas pelas fontes da ortodoxia, adquiriram com o tempo, no seio do Islão, uma razoável margem de manobra para se manifestarem. Ibn Khaldún, mais uma vez na sua Muqqadima, parece conclusivamente admitir este aparente paradoxo: "...ces pratiques sont très répandues dans les villes. La loi religieuse les interdit"(ed.1967-I:679). Divórcio entre o real quotidiano e a prescrição da ortodoxia, ou compatibilidade entre o real quotidiano e a ambiguidade da ortodoxia - tal parece ser o eixo duplo de implicações decorrentes da prática premonitória e daquilo que, no Grande código, a legitima.

                                                                 

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Pode dizer-se que a adivinhação e práticas correlativas sempre mereceram, no quadro islâmico, uma credibilidade determinada. A origem do fenómeno remonta a tempos pré-islâmicos e, nos tempos da da revelação, é mesmo normal que a profecia tenha sido enquadrada numa lógica de continuidade, ou seja, numa tradição já anterior. A ausência de um sacerdócio organizado na Arábia dos séculos VI e VII "réduit le personnel du culte aux devins pris aux sens le plus large et dans toutes leurs specialités" (T.Fahd,1966:79). As teorias espalhadas no Islão, segundo as quais a profecia é concebida como um prolongamento da adivinhação e, simultaneamente, seu estado superior (Mas'údí, Ibn Khaldún e, por vias diferentes, alguns filósofos e al-Ghazâlí[151]) terão origem nessa credibilidade do premonitório, do fruto da adivinhação, da oralidade profética popular.

A ambiguidade face à adivinhação, a que anteriormente nos referíamos, tem aqui possivelmente a sua origem. A própria noção de Ortodoxia, não dependendo de um centralismo de autoridade, atribui ao crente a interiorização e até a difusão da fé. Esta fluidez codificada deixará, também, a porta aberta à realidade da prática premonitório-profética e vai ter consequências reais entre os moriscos ibéricos do sec. XVI. Assim, e como refere L.Cardaillac (1977:62), "L'Islam n'ayant pas de clergé, c'est à chaque croyant qu'est dévolu le rôle de la propagation de la foi. Néanmoins, certaines personnalités, du fait de leur science, de la sainteté de leur vie"(...)"assument ce rôle. Il s'agit parfois de quelqu'un qui a la réputation d'être adivino y profeta" e que dá forma à ambiguidade atrás referida, transmitindo ao mesmo tempo "les précèptes coraniques et superstitions populaires".

É desejável conhecer a codificação islâmica específica face à questão do profético puro e do profético premonitório, pois é a partir dela que, entre outros segmentos do mundo islâmico, os moriscos ibéricos entenderam e significaram a sua própria prática. (que não é alheia à produção de aljofores premonitórios). No entanto, além do seu contexto genealógico, há que considerar os moriscos como uma unidade sincrética, rodeada física e culturalmente pelo meio cristão. E, assim sendo, devemos referir que a Península Ibérica cristã, durante todo o século XVI, vive num ambiente cultural que Ottavia Niccoli designou por divinatio popularis (1990:13). Tal significa que a manipulação das ocorrências reais, quer levada a cabo pela "low culture", quer pelas elites (ibid.:13) - caso do próprio papado até 1530[152] - num processo de transferências contínuo, constitui um sistema de signos essencial da identidade época. A sua origem, enquanto tal, é medieval mas "prolonga-se" pela era moderna (Jean-Claude Schmitt,1981:6), segundo O.Niccoli, em Itália, até 1530 e, na Grã-Bretanha e França, até ao início do Sec.XVII - o que é apanágio, igualmente, das terras ibéricas[153].

            Esta cultura, caracterizada pelo divinatio popularis, coexiste com a da produção de valores humanistas e renascentistas, no século XVI[154]. Porém, a debilidade destes últimos na Península Ibérica, no que M.Herrero García considera "la propensíon española al hacer descompasado con relacíon al resto de Occidente" (1966:16), contribui para que as práticas proféticas se constituam como autênticos signos dos tempos em terras hispânicas. Juan de Horozco y Covarrubias (ed.1588-XII:fol.30r)[155] refere que "casos de falsos Mesías, falsos Cristos se han dado repetidas veces"(...)"amenazas de varones santos que han dicho se perdió una vez España por torpezas, y deshonestidades, y se avia de perder otra vez por ellas" e muitos outros "milagros fingidos" e "oráculos falsos" (ibid.:XIII,fol.36r) dominam  estes tempos de "abominación profetizada" (J.C.Baroja,1978:39). Do lado cristão, a inflação profética é tal que a exigência de critérios, capazes de distinguir o premonitório legítimo daquele que o não é, se vai tornar numa das tarefas da próprio poder (no sentido global do que poderíamos designar por ortodoxia). A necessidade de actualizar a lei, de a definir, entrará na ordem do dia como veremos. Antes, no entanto, é importante situar os domínios da própria ortodoxia.

Segundo a tradição medieval, a autoridade sobrenatural pertence não apenas à Igreja, mas igualmente à monarquia nacional. Como N.Cohn refere (1970:233), "o monarca era o representante dos poderes que governam o cosmos, uma encarnação da lei moral e da divina intenção". Esta herança sagrada da monarquia, aliás ligada à figura modalizadora do último imperador (cf.Cap.II), está directamente ligada aos "prophetae com o seu séquito de miseráveis, dispostos a carrear o levantamento até à batalha apocalíptica"(ibid.:233) de que o monarca é o arquétipo vencedor. Este legado medieval tem diversas matizes de continuidade, no século XVI. John Bossy, em A Cristandade no Ocidente(1990[156]), refere-se-lhes. Assim, em França, "quando Francisco I subiu ao trono, em 1515, já era bastante banal falar ao rei de França como um Deus corpóreo". Esta prática é institucionalizada na década de setenta por Jean Bodin (ibid.:181) e, modificada no século seguinte, tornar-se-ia "a teoria política oficial da monarquia francesa até ao século dezoito"(ibid.:183). Em Inglaterra, para os católicos, na tradição de More, a subalternização da Igreja constituia "uma profanação do santuário que contagiava toda a comunidade" (ibid.:185). Este divórcio entre o sagrado e o social adquire "garantia constitucional"(ibid.:180) com Lutero, ao "repudiar a encarnação da santidade".

No caso espanhol - e especificamente referindo-se a Filipe II - o autor considera que, apesar do carácter providencial de que os soberanos se sentem investidos[157], "nenhum dos atributos do sagrado poderia ser reconhecido como fazendo parte dos atributos da monarquia" (ibid.:183). John Bossy conclui: "minando as pretensões dos monarcas ingleses, lançando a dúvida sobre a ortodoxia"(...)"dos franceses, refutando o que consideravam posições luteranas", para a monarquia espanhola, quer os bispos, quer o papa, eram "os inexpugnáveis guardiões do santuário"(ibid.:184). E isto, apesar da "fragrância de santidade" que os reis católicos anteriormente haviam projectado. Como adianta F.Braudel (1984-II:187), a Espanha, enquanto unidade política, só se "pode conceber, no século XVI, com uma unidade religiosa". De um lado o guardião do sagrado, o poder papal, do outro o agente militante da providência de Deus, o imperador, ambos sedimentando uma ortodoxia que se edificará na Contra-Reforma, nas diversas expansões além-mar, nas inquisições e no retomar tardio do espírito de cruzada. É sob este pano de fundo que os critérios de legitimação da inflacionada prática profética vão ser definidos. Vejamos, então, quais as posições da ortodoxia quanto a essa prática.

Convirá, em primeiro lugar, situar algumas manifestações, directa ou indirectamente ligadas ao premonitório-profético, que são combatidas pela ortodoxia. Este termo designará um poder - ou uma autoridade - cujos agentes são diversificados, mas que compartilham a semiose de uma unidade religiosa, de acordo com a noção de F. Braudel (disposições régias, bulas papais, índices da inquisição, escritores oficiais ou oficiosos,etc.). A astrologia, embora com uma tradição específica, surge como um fenómeno susceptível de se associar ao premonitório-profético. Um exemplo paradigmático, do início do século XVI, é o da previsão da conjunção planetária de 1524 (pela primeira vez registada por Johann Stofller em 1499[158]), e que irá originar um intertexto profético denso e variado de cariz catastrófico. Como O.Niccoli demonstrou (1990:Cap.6), a própria Igreja contribuiu e muito para a difusão destas profecias, que prediziam um dilúvio. O significado do mesmo era duplo: castigo de Deus pela corrupção da Igreja ou, noutra interpretação, pela rebelião luterana. O. Niccoli conclui que, passada a fatídica data de 1524, "the figure of the astrologer emerged much diminished by the way popular culture had received the supposed deluge"(ibid.:167).

F.Díaz Jimeno (1987)[159] reflecte sobre a visão da astrologia dos tratadistas hispânicos, até ao século XVI. A questão de fundo, com raízes na tradição cristã, diz respeito à oposição existente entre a astrologia natural (fruto de observações, no sentido da moderna astronomia) e astrologia judiciária (ou divinitória) que, devido ao seu determinismo inerente, contraria o desígnio divino providencial. Para Santo Agostinho, não há causas que possam existir para além da providência divina e, como tal, o livre arbítrio tem razão de ser, devido ao simples facto de estar incluído na ordem de causas e efeitos, "y por ende de la presciencia divina que no está limitada por secuencias temporales"[160]. A tradição providencial é reatada por Santo Isidoro, sobrepondo a astrologia natural à "supersticiosa"(ibid.:17) ou judiciária. S.Tomás de Aquino, ao compatibilizar a causalidade aristotélica com a providência "como regidora del universo"(ibid.:18), não admite a predicção de factos fortuitos "a los practicantes de la astrologia judiciaria" (ibid.:19).

Obras como a Disputationes Adversus Astrologiam de Pico della Mirandola (editada em 1502, em Veneza) e Compendio de la Fortuna de fray Martín de Córdoba (ainda do século XV) retomam a teoria providencialista, adversa ao premonitório astrológico. A obra anónima de 1546, Reprobación (F.D.Jimeno, 1987:110-112) baseia-se nestes dois últimos paratextos e na obra de Girolamo Savonarola, Tractato contra li astrologi[161] (editada em 1497 e reeditada, em Veneza, em 1536), postulando, em três linhas de força, as posições - podemo-lo dizer - da ortodoxia: ataque à astrologia judiciária por pôr em causa a omnipotência divina, por restringir o livre arbítrio humano e, finalmente, por carecer de exactidão lógica e causal. A Bula Papal de 1586, a Constitution[162], condena igualmente essa antiga forma de adivinhação e, em Espanha, o Index expurgatório de 1583 contém igual condenação, embora menos enérgica:" se prohiben todos los libros, tractados, y escritos, en la parte en que tratan y dan reglas, y hazen arte, o sciencia para conocer por las estrellas y sus aspectos, o por las rayas de las manos lo po venir que está en la liberdad del hombre"[163].

            A par da manifestação astrológica que parece merecer condenação da ortodoxia, todas as manifestações que, na época, parecem sair fora do quadro considerado normal não são menos susceptíveis de perseguição oficial. É o caso dos místicos e do próprio Santo Inácio de Loyola. Como J.C.Baroja afirma, "a acusación más fácil, contra la piedad ortodoxa del que reforma, es la de ser alumbrado"(1978:471)[164]. Pedro de Rivadeneira, no seu Tratado de la tribulación (1877:371)[165], refere-se às deambulações, em pleno século XVI, de "apóstolos falsos, forasteros, anduvieron en España predicando por las aldeas y pueblos pequeños y confessando la gente, daban a entender que les habían sido revelados por Dios sus pecados". Casos de mulheres dominadas pelo demónio ou iluminadas subitamente, como Magdalena de la Cruz de Córdova[166] ou Sor Patrocínio, são paradigmáticos neste ambiente de fervor milagroso colectivo e, por outro lado, constituem modelos de "female saintliness centering on charisma, with strong prophetic tendencies" (O.Niccoli, 1990:192).

Num âmbito próximo, o fenómeno da bruxaria encarna, igualmente, uma velha tradição de heresia. J.Bossy (1990:100) refere que, após 1400, surge uma "profunda convicção de que as bruxas não eram simplesmente inimigos particulares de determinado cristão, mas estavam (antes) ligadas a uma conspiração geral que tinha por objectivo derrubar todo o Reino Cristão". Personalidades religiosas extremistas, visionárias ou dissidências entendidas como seita, criando a imagem de algo diferente, pelo menos, do que se poderá designar por senso comum, acabam, portanto, por serem susceptíveis de recair sob o foro da inquisição. Por razões de âmbito mais profundo (cf.Cap.II), a posição da ortodoxia face aos moriscos, e também aos judeus, é a da progressiva (ou imediata) anulação. Cumpre-se a prescrição, segundo a qual, no século XVI, toda a comunidade deve integrar a família do Rei e participar da unidade religiosa, piedosa e militante que este prefigura.

A emergência da reforma vem, por outro lado, criar na igreja católica a necessidade de se cerrarem fileiras contra a propagação de heresias. Muitas das práticas que, até então, eram características da própria vida religiosa são, agora, postas em causa (casos da manipulação profética do papado de Leão X e de Clemente VII[167], além do próprio papel da igreja nas profecias da conjunção de 1524): "a number of phenomena that had been characteristic of religious life in the fifty years between 1480 and 1530 thus either ground to a halt or were suffocated" (O.Niccoli,1990: 193). Esta "imposição da ortodoxia", como J.Elliott a designa (1963:216), traduz-se pela perseguição de humanistas, "illuminists and Erasmians"(ibid.:224), pela reprodução dos autos de fé da inquisição e pela aceitação geral do conceito de limpeza (cf.Cap.III). Os últimos anos do reinado de Carlos V, até ao termo do Concílio de Trento (1563), constituiriam a consumação desta nova política. O percurso, em Portugal, é paralelo: centralização do reino sob D.João II, em finais do século XV, nova política contra as heterodoxias com D.João III, sobretudo a partir dos primeiros anos da década de trinta.

            Um exemplo hispânico de uma obra de profecias, simultaneamente proibida e aplaudida neste ambiente austero, é o das Trovas de Bandarra, sapateiro de Trancoso (a quem Juan de Horozco y Covarrubias, no cap.XX do seu Tratado de la verdera y falsa prophecia, se referirá). As profecias de Gonçalo Annes, o Bandarra (m.1545 ou 1560), são redigidas e trasladadas (não tipograficamente, portanto) durante a década de trinta. A rápida divulgação do texto, composto por três sonhos premonitórios e messiânicos e um intróito sobre "as maldades do mundo e particularmente as de Portugal", leva Bandarra ao segundo auto de fé inquisitorial, realizado em Lisboa, em 1541. Aí, Bandarra é ilibado da suspeição de judaísmo, enquanto é levado a perjurar os seus erros e a obrigar-se "a nunca mais escrever, ler ou divulgar assuntos referentes à Bíblia"(cit in A.Carvalho,1990:21). As Trovas, curiosamente dedicadas ao Bispo da Guarda, serão sucessivamente proibidas pela inquisição (até ao século XVIII) tendo o auto de fé de 1541 sublinhado que "qualquer pessoa que tiver as ditas Torvas as apresente à Santa Inquisição, dentro de três dias que vier a sua notícia e o que puder fazer"(ibid.:22).

O outro lado destas Trovas é o da sua relação com o rumo da própria história de Portugal. Perdida a independência para Espanha, em 1580, após a derrota do rei português, D.Sebastião, em Alcácer Quibir (1578), cria-se no país a lenda segundo a qual o rei não morrera e que, como Frederico II, haveria de regressar numa manhã de nevoeiro. Estas prescrições desvelam-se nas Trovas e os seus defensores, D.João de Castro (neto de um vice-Rei da Índia portuguesa) e, posteriormente, o Padre António Vieira, tornam a leitura da profecia num acto da sua real efectivação. Com efeito, a Restauração portuguesa, em 1640, será associada a esta "self-fullfiling prophecy"e o messianismo português, conhecido como Sebastianismo, será, em muito, devedor da lenta hermenêutica das Trovas. É curioso que, mesmo proibida pela Inquisição, as profecias de Bandarra tivessem sido, igualmente, bastante divulgadas e até pregadas "do alto dos púlpitos"(A.Neves,1990:43). Sujeitas a um intuito colectivo, elas resistem assim à ilegitimidade e o jesuíta Padre Antonio Vieira - que não ficaria ileso à inquisição - concede-lhe, mesmo, a verdade profética em Esperanças de Portugal, quinto império do Mundo[168]: "por nenhuma ciência, nem humana, nem diabólica, nem angélica, podia conjecturar Bandarra a mínima parte do que disse, quanto mais afirmá-lo com tanta certeza"(...)"é certo que só Deus podia dizer e revelar ao Bandarra todos estes futuros e qualquer deles, e com a mesma certeza se deve ter e afirmar que foi Bandarra verdadeiro profeta".

Esta relação entre a persistência de uma prática -  aparentemente condenada - e os pressupostos de ilegitimação, algo fluidos, que sobre a mesma recaem, podia ser exemplificada com outras profecias cristãs. Um traço talvez comum, entre elas, é o da identificação entre a (interpretação da) providência divina e o conteúdo enunciado na premonição. Tal é o critério oficioso - embora não oficial - da leitura do Bandarra, como do poderiam ser exemplo as premonições astrológicas que prefiguram a expulsão dos moriscos (profecia em quinze pontos, F.Dragó, 1979:109-110). Com efeito, os signos celestes "ont été interprétés tout au long du siècle par les astrologues dans un double sens: ils sont des avertissements sur les dangers que représentent les Morisques, en même temps que l'annonce de leur expulsion prochaine, voire même des victoires de la Chrétienté sur l'Islam" (L.Cardaillac,1977:55). E tudo isto, apesar da imposições da ortodoxia a que acima nos referimos. Outro exemplo da ambiguidade entre prática e norma é dado pelo Concílio Laterano e pela bula Supernae Majestatis, da época de Leão X (1513-1521), que "prohibían a los predicadores el anuncio de la venida del anticristo o la del juicio final"(...)"cinquenta años después San Carlos Borromeo, tenía que insistir. Pero los predicadores parece que non estaban dispuestos a dejar de explotar tan rico filón de efectos"(ibid.:8). Se a prática profética convoca o desconhecido e o espectro de heresia em tempos de austeridade ibérica, também não deixa de, em certos casos, constituir uma arma eficaz para o próprio poder. Deste modo, a situação exigia critérios, codificações que definissem com precisão a faceta legítima da actividade profética.

Em 1588 surge uma obra fundamental, quanto ao tipo de precisão referida e que, na altura, virá corresponder às exigências do horizonte de expectativas do poder cristão. Trata-se da obra de Horozco y Covarrubias, a que já aludimos, o Tratado de la verdadera y falsa prophecia. O seu prefaciador, o franciscano Fray Juan de Colmenares, refere-se aos intuitos da edição: "desengaño de las invenciones y enredos del demonio en las falsas revelaciones que en diversas partes ha sembrado estos dias..."[169]. O autor enfatiza o objectivo hermenêutico da obra, já que os enganos da época obrigavam a um corpo fixo de regras: "si en todas las naciones antiguas hubo falsas prophecias en varias formas, la luta seguía". Entre os Capítulos XV e XX, Covarrubias estabelece uma série de critérios, tentando, assim, criar uma codificação mais ou menos lógica para a difundida e ambígua prática profética. São os seguintes os parâmetros que se instituem:

 

a)  Constatação do "fruto de la profecía"(XV-fol.43r-44v), ou seja, a observação dos impactos do enunciado no real;

b)  Verificação da verdade da profecia "con respecto a la voz divina"(XVI-fol.44v-45v). Aqui retoma-se um dos aspectos modalizadores do género, mais vincados: o diálogo com a divindade. A interpretação do sentido da providência divina virá a constituir o método de aferição deste segundo parâmetro;

c)   Três outras regras se condensam num terceiro parâmetro, respectivamente "las costumbres del que revela, la respectabilidad y la pertinencia de lo revelado"(XVII-fol.45v-47r). O quadro de legitimação tende aqui a excluir tudo o que seja marginal à comunidade. Entenda-se marginal como nocivo à noção de "unidade religiosa" que F. Braudel (1984-II:187) configura como indissociável da identidade Ibérica da Contra-Reforma. Assim, a tradição, ou os "costumes" (cristãos), idealizam um passado referencial que se actualiza no agora-aqui da enunciação profética, sob a forma de "respeitabilidade" que, por sua vez, surge como responsável pela "pertinência" do conteúdo da profecia em causa. Um último parâmetro diz respeito ao modo e acto de enunciação da profecia;

d)  "...El carácter y el modo de decir"(...)"de suerte que el que tenga algo de alocado, soberbio, o inquieto, no ha de ser seguido"(XVIII-fol.47r-48r). Neste parâmetro, é claro que se põem de parte as premonições vindas de consciências religiosas mais extremadas e visionárias, próprias da massa dos acusados de alumbrados, a que atrás nos referimos.

 

 

 

São estas as regras que acabam por sintetizar a codificação da ortodoxia cristã ibérica, na época em causa. Podemos dizer que são algo maleáveis, susceptíveis de ambivalência interpretativa (porventura intencional). No entanto, Horozco y Covarrubias, insiste "en lo frequentes que son los casos de profetismo en que tiene que intervenir la Inquisición"(XV-fol.42r-42v), como havíamos visto com o caso  exemplar (de ambivalência) das Trovas de Bandarra. A imensa produção profética na Península Ibérica do século XVI, faz-nos, porém, entrever uma situação algo similar à codificada pelo Islão: por um lado, divórcio entre o real quotidiano e a prescrição geral da ortodoxia; por outro lado, a compatibilidade prática entre o mesmo real quotidiano e a ambiguidade (às vezes permissiva) da ortodoxia. Decerto que, retomando o exemplo da minoria morisca sobretudo de Aragão (região particularmente dada à astrologia judiciária), esta ambivalência e estes parâmetros de Covarrubias terão uma única implicação: a falsidade e a heresia total dos seus aljofores[170]. Além de escritos com grafemas proibidos e de serem oriundos de uma casta, não correspondem aos critérios descritos por Covarrubias, para já não referir que os seus conteúdos são corrosivamente contrários aos desígnios da própria ortodoxia cristã.

 

            3. A persistência da prática profética

 

Para além de condicionantes de natureza escatológica e relativas às ortodoxias, concluimos este estudo com a exposição de um conjunto de três motivações que justificam e legitimam o acto profético como um facto persistente, a saber: motivações contingentes (relativas à fracção temporal em que as profecias se produzem), motivações anteriores (codificadas previamente a essa fracção temporal) e motivações inconscientes (se relativas a hierofanias que veículam).

 

                 3.1 Motivações contingentes

 

Este tipo de motivações resultam da ordem do quotidiano e do presente vivido por uma dada comunidade. Como F.Rosenthal refere (1983:79), a irreconciliação de uma comunidade com a dimensão do presente, no fundo, a falta de domínio sobre o próprio curso do tempo, traz consigo "an undercurrent of rebellion against the world order, which may not always have been merely subconscious". A falta de segurança, resultante da vacilação de crenças profundas e de atitudes tradicionais de uma comunidade (é o caso da degenerescência morisca, por exemplo) é, para F.D.Jimeno (1978:47), uma razão fundamental para que as crenças astrológicas e a prática profética seja convocada "con renovada tenacidad, buscando algo que"(...) "proporcione una medida de seguridad ante el futuro y ante ese mundo en transformación en que se encuentra".

Para além da revolta contra a ordem do presente a que F. Rosenthal se refere, existem ainda outras razões de ordem contigente, como as que correspondem a desígnios de propaganda e simples manipulação de situações concretas que se tornaram crescentes após a modalização de Joaquim de Flora, no Ocidente cristão. O. Niccoli (1990) refere-se a estes factos e insere o fenómeno dos monstra, das cartas premonitórias, das adivinhações anónimas ou forjadas em cortes - na transição do século XV para o XVI - como um único sistema de propaganda e guerra política de dimensões pan-europeias (ibid.:59), abrangendo, nomeadamente, a França, a Alemanha, a Espanha e o Norte de Itália. As guerras religiosas, o envolvimento da reforma na criptoprofecia e as profecias anti-luteranas integram, igualmente, este tipo de motivações (D.Cantimori,1975:170 e sqqs.).

Podemos concluir, como acima se referiu, que o século XVI comporta uma cultura do profético, a divinatio popularis a que O.Niccoli se refere (1990:13). Neste contexto, a interpretação de signos, com que a Divindade afecta a natureza ou as visões dos homens, constitui um complexo cultural susceptível se ser apreendido como um todo pela população. E, neste âmbito, a literatura de profecias converte-se em arma de guerra ou numa instituição que disputa convicções, senão o próprio sentido do tempo. As motivações mais contingentes da persistência do profético estão, pois, relacionadas com o impacto imediato existente entre um eu-comunidade e um outro-a História e o tempo adversos. A projecção desse eu actancial num cenário de renovado domínio do tempo cria as condições para a prática do profético. Mas esta não se fica pela perspectiva mais imediata e contingente; o ímpeto de salvação colectiva é, também, um corolário indissociável da época e do presente concreto e disfórico. No fundo, a expansão de dois tipos de esperança diferentes, sob a forma de profecia: uma ligada às coisas imediatas e contingentes do mundo (amal), outra ligada às perspectivas do divino e do além (rajâ`)[171], ambas compatíveis e possíveis na visão, quer das ortodoxias, quer das escatologias.

 

3.2  - Motivações anteriores

    

Como o nosso sub-título indica, reportamo-nos agora a motivações que são, por natureza, anteriores à fracção temporal onde a produção profética se actualiza e manifesta. Retomamos, nessa ordem de ideias, uma questão antes aflorada e que se prende com o contrato ético entre Deus e o homem, no que se entende ser uma correlação chave para religiões como o Cristianismo e o Islão (T.Izutsu,1964:230). Esse contrato estabelece que, sendo Deus criador o Deus da justiça e da misericórdia, actuando em relação ao homem de um modo ético, logo os actos humanos devem, em correspondência, "be of an ethical nature". Da natureza da resposta humana, no quadro deste diálogo, dependerá a própria possibilidade de salvação. A questão que se põe é a da codificação dos actos humanos, de modo que se possam separar os actos conformes com esse contrato, daqueles que o não são. Essa codificação é prescrita nas escrituras, mas será sempre, e inevitavelmente, actualizada pelas ortodoxias, como atrás se viu. A dimensão ética de um tal contrato é, assim, anterior à própria ideia de ortodoxia.

Esta é criada pelos homens, por necessidade de ajustar o curso do tempo com a revelação inicial, aquela é a realidade primordial onde a mensagem revelada se funda (na sua interacção com o homem). Por outro lado, a ortodoxia é normativa e assegura, de modo instável, a transição do profetismo[172] ao legalismo, enquanto o contrato ético é o modelo interiorizado da pureza original, que deve caracterizar as relações entre o homem e a divindade. Estas distinções são, de certa forma, subjacentes à ideia cíclica de história islâmica, a que J.-P.Charnay alude (1964:18) - isto é, a História vista como uma sucessão de rupturas entre dois estados, um de purificação, outro de "impureté" (caso do surgimento de um mahdi). Um tal modelo indicia uma "translation d'un état éthiquement supérieur à un inférieur, ou inversement". No fundo, é a necessidade de fazer reviver a natureza primeira do contrato ético que obriga a mudanças de sentido por parte da própria ortodoxia.

A curiosidade humana perante a natureza misericordiosa e, sobretudo, de justiça própria da divindade é, inevitavelmente, desencadeada no âmbito deste contrato, pois a salvação nele se encontra implicada. As pesquisas em torno da teodiceia, nomeadamente o optimismo mu'tazilita de cariz leibniziano (E.Ormsby,1986:43) ou as correntes que privilegiam a isâbah - a "appositeness"(ibid.:23) - caso de al-Maturídi e al-Ghazâlí (ibid.:97), constituem especulações dogmáticas decorrentes dessa  mesma curiosidade. A curiosidade humana pelo plano divino e pela natureza da justiça proposta por Deus, constitui, assim, uma forma de o homem se acercar o mais possível da realidade do contrato ético; de se aproximar o mais possível da divindade - e dos seus mistérios - no seu diálogo com ela. No quadro da comunicação, suscitada por este contrato ético, o homem tenta ultrapassar-se para desobstruir o irrevelado; tal é a natureza da sua curiosidade. É até curioso, como salienta N.Cohn (1980:233), que, no lado cristão, os prophetae evoluam "ao longo dos tempos", deixando de se proclamarem "como Deuses vivos" (caso de Tancelm e Eon, no séc. XI) para se proclamarem, mais tarde, como imperadores dos últimos dias (caso dos pseudo-Fredericos alemães, sobretudo do séc.XIII) e, finalmente, assumindo o seu posicionamento enquanto homens, "contentando-se com o papel de percursores e profetas do retorno de Cristo" (caso de Tomás Muntzer ou João de Leiden, já do séc. XVI).

Esta curiosidade ou tentativa de o homem se aproximar da divindade pode ser considerada como uma das mães do acto humano de profetizar. A persistência desta curiosidade é tal, que a própria lei revelada islâmica a prevê e perdoa na surata 5 (versículo 101, cf.IV-2). A natureza ética do monoteísmo islâmico e, também, cristão contribui assim para a persistência de um certo tipo de curiosidade humana e, por conseguinte, da sua apetência pelo profético premonitório. De registar que o lexema latino curiositas, no século XVI, retém significados que remontam a fontes patrísticas, quer de Santo Agostinho, quer de João Cassiano[173]: "it did not mean simply transgressing the limits set upon human knowledge nor the study of magic, but a state of the passions that could entail both sensitive and intellective faults" (E.Peters,1985:95). Mesmo a nível da língua se reflectem, assim, semantizações que espelham normas da ortodoxia, neste caso condenatórias da procura excessiva e persistente do homem, de que a prática profética, entre muitas outras, também é modelo. No entanto, Ibn Khaldún reitera:"les hommes sont naturellement portés à désirer connaitre l'avenir"(...)"la curiosité est un sentiment naturel, inné chez l'homme. Aussi, bien des gens souhaitent-ils en apprendre davantage par la voie des rêves. Et l'on connait le succès des voyants (kâhin) auprès du peuple et des rois"(al-Muqqadima,ed.1967-I:678).

                             

3.3  - Motivações relativas a hierofanias

 

Vimos, até aqui, como motivações para a persistência do profético, elementos contingentes e elementos que se prendem com uma ligação anterior do homem à Divindade única. Consideraremos, neste sub-título, as manifestaçöes que participam de reminiscências do sagrado e que têm, directa ou indirectamente, o seu influxo no fenómeno profético. Entendemos, aqui, por sagrado tudo o que, para M.Eliade, integra uma hierofania: rito, mito, cosmogonia ou deus, constituindo as hierofanias manifestações desse mesmo sagrado, "dans l'univers mental de ceux qui l'ont reçu" (1975:23). Por outras palavras, se as religiões instituem uma doxa e um corpo de práticas, é nestas que o sagrado, anterior à própria institucionalização, se manifesta sob forma de hierofania. Para uma religião, como o Islão, em que "it is orthopraxy that matters most of all, not orthodoxy" (C. Van Nieuwenhuijze,s/d:56), é normal que esta ordem de factores adquira uma certa relevância. Esta duplicidade de níveis é salientada, também, por A.Abel: "L'Islam, comme le christianisme de l'Ocident, est avant tout religion du salut, et, au niveau de la pensée commune, magie toute puissante" (1950:30).

Este tipo de pensamento comum, que resiste à doutrina e à doxa, é integrado por B.Wilson (1973:25) no que designa, no quadro da sua taxinomia, por "salvation by thaumaturgy". O autor caracteriza do seguinte modo esta resposta do homem ao mundo que o rodeia: "where doctrine is developed it is often of little importance in the attainment of salvation". Os elementos de salvação compreendem, neste quadro, vida depois da morte, "assuagement of grief, restoration after loss, reassurance, the foresight and avoidance of calamity"(...) "Miracles and oracles, rather than the comprehension of new principles about life, are the instruments of salvation in this case". O autor enquadra, quer o Islão, quer o Cristianismo dentro desta modalidade do profético: "In Christianity disciples for several generations were credited with such thaumaturgical ability, and in the theory of sainthood it may be said to live still in the Catolic Church. In Islam the same power has, unofficially but widely, been credited to persist as a hereditary property"(ibid.:25).

Mais do que a recuperação de símbólicas pré-cristãs e pré-islâmicas, o que está aqui em causa é a forma como o pensamento e a prática comuns tratam o fenómeno religioso, sob a dupla perspectiva do presente e do futuro (incluindo, aqui, o próprio elemento escatológico). A tese de Bryan R.Wilson sublinha a importância do fluxo da prática premonitório-profética nesse âmbito de uma "orthopraxy" comum, em ambos os mundos, o cristão e o islâmico. Quase poderemos concluir que, para além das múltiplas condicionantes que se põem à prática profética, e que neste capítulo tentámos sistematizar, há a registar uma infra-estrutura humana capaz de preservar registos que lhes são ancestrais e que, na circunstância, se prendem com modelos de actos de fala, isto é, com o próprio discurso humano sob a forma (ou a designação) de géneros. A persistência da sua variante profética, para além de fenómenos como as escatologias e as ortodoxias, é, pois, um dado adquirido no tempo e no espaço de que nos ocupamos (e não só), mas é também a permanente actualização de uma matriz discursiva que, secularmente, se modalizou.

Esta nossa conclusão última podia bem ser ilustrada por R.Habachi que, num interessante artigo (1980:75-94), tenta definir as linhas mestras do pensamento e do ser mediterrânico (incluindo-lhe a margem norte e a margem sul e aproximando-as, tanto quanto possível). Diz o autor, a dado passo, que, em ambos os campos coexiste uma noção ambígua de transcendência,  assim caracterizada: " une osmose assez trouble reste établie entre ciel et terre, la toute-puissance du Dieu-Un et les énergies impersonnelles du cosmos" (ibid.:79) "Mythes et superstitions survivent sous les rites et les cultes, cherchant toujours à capter les forces mystérieuses en faveur de desseins temporels"(...)"Le Méditerranéen fait confiance au temps pour changer les situations plus qu'a l'initiative humaine"(ibid.:80). Enquanto o tempo persiste, na sua qualidade de actante, a investir uma "self-fullfiling prophecy" que se acompanha e em que se crê - o homem mediterrânico (e o da sua contígua finisterra ibérica) persiste, para além dos condicionamentos, em desvelar o misterioso. No fundo, o objecto mais ancestral de todo o acto profético.

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[1]-V.M.Aguiar e Silva,1982:363.

[2]-A hora remete, nesta surata, para o dia do julgamento.

[3]-A surata 31,34 expressa-o de forma explícita: "La connaissance de l'heure est auprès Dieu"(...)"L'homme ne sait point ce qui lui arrivera demain; l 'homme ne sait dans quelle plague il mourra. Dieu seul est savant et instruit". Outras suratas, apontando no mesmo sentido de ocultação, por exemplo: 7,53; 18,57; 31,34; 43,85, 78,17 etc. Da tradição de Bukhârí (cap.93, secção 10) recolhemos o seguinte extracto:"Anas ben Mâlek a transmis ceci:"Alors que le Prophète (à lui bénédiction et salut) et nous sortions de la mosquée, voici que nous rencontrâmes un homme près du seuil de sa porte:"O Envoyé de Dieu , à quand l 'Heure dernière ?" Le Très Saint Prophète lui répondit:"Qu'as-tu préparé en vue de cela?" L'homme demeura un moment comme interdit, puis reprit:"O envoyé de Dieu, je n'ai en vue de cela préparé, ni beaucoup de jeunes, ni de prières, ni d'aumônes. Mais j'aime Dieu et son Envoyé. - Tu seras, dit Mohammed, avec ceux que tu as aimés" (cit. in G.Bousquet,1964:95).

[4]-Este mistério do quando indeterminado pode igualmente relacionar-se com a realidade profética da iminência apocalíptica. Vimos isso no caso das Epístolas paulistas e do Apocalipse de S. João (1995), mas igualmente o Alcorão apresenta suratas em que o termo e o dia do julgamento são anunciados muito para breve, por exemplo: "La connaissance de l'heure est chez Dieu; et qui peut te dire si l'heure n'est pas imminente ?"(33,61) ou ainda, 10,55; 21,1; 51,6; 52,7; 54,1; 70,7; 78,40 etc.

[5]-Na semiótica de C. Peirce, os índices são signos da segundidade, isto é, actualizam e designam uma realidade-objecto relacionando-se fisica e contiguamentemente com ela.

[6]-J. Machado,1980:310 e C. Glassé,1991:115.

[7]-Sobre este facto, W.Madelung (E.I., Vol. V, 1983:1230 e sqqs. Leiden)

[8]-Traduçäo, prefácio e notas de V. Monteil (Beyrouth). O autor legitima a figura do Mahdí, enquanto figura escatológica, baseando-se na autoridade do"sound tradition of the Sahih'"(Y.Haddad,1981:69)

[9]-Capítulo 60,Secção 50, Tradiçäo nº1. O ad-Dajjâl tem, no entanto, uma característica física (simbólica) que o diferencia do verdadeiro messias: é o seu único olho.

[10]- Cap.46, Secção 31: A"Djeziya" traduz a capitação a ser paga pelos infiéis, porém, neste momento - (como o indica a tradição nº2, Cap. 92-25 -"L'Heure n'arrivera pas avant que le soleil ne se lève à l'Occident. Quand il se lèvera ainsi et que les gens le verront, ils deviendront tous croyants") - todo o mundo já é muçulmano e, por isso, Jesús, o pode suprimir.

[11]-Comentário de J. Machado, 1980:120. Texto da surata:"Il n'y aura pas un seul homme parmi ceux qui ont eu foi dans les Ecritures qui ne croie en lui avant sa mort. Au jour de la réssurrection, il (Jésus) témoignera contre eux".

[12]-Surata 4,156.

[13] “Il n´y aura pas un seul homme parmi ceux qui ont eu une fois dans les Ecritures Qui ne croie en lui avant as mort. Au jour de la réssurection, il (Jésus) témoignera contre eux”

[14]- Alfaqui e Muftí da aljama de Segóvia, autor de uma traduçäo do Alcorão, patrpcinada por João de Segóvia (1393-1400-1458).

[15]-Cit.in L.Cardaillac,1977:287. Em ambos os manuscritos citados (BNM 9654 e 9074) refere-se, igualmente, a morte de Jesús e o seu enterro junto a Maomé.

[16]-Segunda Epístola a Timóteo - 3,1.

[17]-Primeira Epístola de S.João- 4,4

[18]-idem,- 4,3 (Cf. N.Frye,1984:121).

[19] - No plural em Segunda Epístola a Timóteo-3 e, no singular, individualizado, em Segunda Epístola aos Tessalonicenses-2,8.

[20]-Esta última expressão da Segunda Epístola aos Tessalonicenses (2,8), segundo o comentarista da TOB, pode "preciser qu'il s'agit du premier instant de la Parousie"(NT,1989:627).

[21]-Sobre este assunto, J.-P-Charnay, 1968:17-19.

[22]-Gog é conhecido entre os descendentes de Ruben, no Primeiro Livro das Crónicas (5,4); Magog é, em Gn 10,2, um dos filhos de Japhet. Em Ezequiel (38-39) ambos configuram actantes fustigadores de Israel, acabando por serem semantizados como símbolos de hostilidade face ao plano divino global.

[23]-Cf. Cap. II, noções de akhira e dunyâ e suas implicações na relação entre o agora-aqui desta vida terrena e o além. O espírito isotópico que, neste quadro, perpassa o texto corânico pode ser resumido pelo conteúdo da surata 3,182:"Toute âme goutera la mort. Vous recevrez votre récompense au jour de la réssurrection. Celui qui aura évité le feu et qui entrera dans le paradis, celui-lá sera bienheureux, car la vie d'ici-bas n'est qu úne jouissance trompeuse".

[24]- A surata 39,42 é pertinente a este respeito:"C'est Dieu qui reçoit les âmes lorsque le moment de la mort est venu. Il saisit par le sommeil, image de mort, ceux qui ne sont pas encore destinés à mourrir. Is s'empare sans retour de l 'âme dont il a décidé la mort, renvoie les autres, et leur permet d'y rester jusqu'au temps marqué. Certes, il y a dans ceci des signes pour ceux qui réfléchissent". Sobre a interpretação deste versículo refere Y.Haddad (1981:19-20): "Among attemptes to interpret this verse, i.e., to determine the difference, if any, between the departure of souls at death and during sleep, one frequently finds analyses of distinction between nafs and h as they apply to that aspect of humanity surviving death."(...)"that taken by God during sleep is generally understood to be nafs al-'aql wa'l-tamyíz, the soul possessing the rational faculties of inteligence and discrimination. The h, which in the condition of sleep remains attached to the body, is sometimes refered to as the nafs al-hayât wa'l haraka (the soul possessing life and movement), that by which life is bestowed on the individual. At death the connection of the spirit with the body is severed completely, altough the spirit does not die". Assim, a primeira referida, nafs al-'aql wa'l-tamyíz, extingue-se na morte física individual (com as suas propriedades racionais e outras faculdades criadoras ou mediadoras de acção) enquanto que a segunda, "the life-infusing soul or spirit" (ibid.:20) permanecerá até à hora final, a do julgamento. Isto apesar das complexidades terminológicas entre nafs e rúh, a que, naturalmente, não nos referiremos aprofundadamente neste contexto.

[25]- 2,259; 3,8; 4,59; 9,35; 17,99; 19,72 etc...

[26]- Imagem também presente no Novo Testamento (Mt 18,8 e AP 19,20). A sua origem, mais remota, está relacionada com o Vale de Gêhinnom, situado a sudoeste de Jerusalém, tido como local profanado e sujo devido aos cultos a divindades condenadas (Jr 7,31; 19,56 ou 32,35). Após o exílio (587 A.C.), aí se queimavam cadáveres - o que deve ter contribuído para associar o vale com as representações escatológicas mais sombrias e dantescas. No Alcorão, e a propósito do castigo infernal: 4,120; 7,38; 9,35; 17,8; 17,65; 18,102; 20,76; 45,9, etc...

[27]- Igualmente muito repetido este elemento simbólico, por exemplo nas suratas 10,4; 18,28; 20,20; 37,65; ou 44,46.

[28]-Cf. nota 36.

[29]-2,268; 3,13; 22,14; 22,23; 3,194; 10,9; 29,58, etc...

[30]-7,41; 16,33; 58,22; 61,12; 18,30; 37,44; 47,16, etc...

[31]-37,47; 38,52; 44,54; 55,56, etc...

[32]-76,21; 56,15; 55,54; 44,53; 35,30; 22,23, etc...

[33]- Da surata sétima:"Et lorsque leurs regards tourneront vers les habitants du feu, ils s'écrieront: O notre Seigneur! ne nous place pas avec les pervers"(45) - "...ils diront aux habitants du paradis: La paix soit avec vous! Les réprouvés n'y entreront pas, bien qu'ils le désirent ardemment"(44). Referência às insígnias dos habitantes do paraíso, que são brancas - ao contrário do negro infernal (cf.nota 31).

[34]-Cap.46, Secção 1 (cit.in G.Bousquet,1964:104).

[35]- Diz a tradição 12, da secção 51, do Cap.81 do Sh' de Bukharí: "Lorsque les bienheureux entreront au Paradis et les réprouvés en Enfer, Dieu dira: "S'il en est parmi eux qui aient dans le coeur le poids d'un grain de moutarde de foi, qu'on les fasse sortir." Ils sortiront alors tout brulés et carbonisés; on les jettera dans le fleuve de la vie et ils renaitront alors comme pousse la graine de pourpier dans le limon du torrent" (cit in G.Bousquet, 1964:105).

[36]-Referimo-nos, claro, à ressurreição final e geral de todos os mortos. No quadro da interpretação literal-milenária de Ap 20 estamos perante o que acima se designou por segunda ressurreição. Sobre a cronologia referida cf. nota 51, sobre a relação entre a pena dos condenados e o momento em que esta se começa a fazer sentir.

[37]-"Il n'est pas précisé si ce jugement se situe à la ressurrection générale (...)  ou après la mort individuelle"(comentador TOB-N.T.,1989:529:nota r).

[38]-Cf.Jr 30,7; Ez 30,3; Am 5,18 e Os 1,5.

[39]-Comentário TOB-N.T.,1989:524,nota o. Sublinhado nosso.

[40]-Acrescentemos igualmente RM 2,16 citado no parágrafo acima, a propósito da cronologia relativa do julgamento final e ressurreição geral.

[41]-"Lors du renouvelement de toutes choses, quand le Fils de l'homme siégera sur son trône de gloire, vous qui m'avez suivi, vous siégerez vous aussi sur douze trônes pour juger les douze tribus d'Israel".

[42]-O sofrimento dos ímpios aparecendo ligado à simbólica do fogo: "Les tourments dans le feu et le soufre" (Ap 14,10).

[43]-Cf. nota 29. Aqui como signo de maldição eterna, com paratextos em Jr 7,31 e 19,6.

[44]-Do Hebraico, lugar dos mortos, significando as portas o seu poder; no “Hadés” não se poderão albergar os membros da comunidade messiânica reunida por Jesús.

[45]-Nome grego para designar os infernos.

[46]-A opinião de Orígenes (183-245) espalhou-se no Ocidente sob diversas matizes e foi denunciada por Santo Agostinho no seu Enchiridion (A.Cayré,1953-II:814).

[47]-Livro XXI,Cap.IX,2. "Il n'impose pas sa manière de voir, ce point de la doctrine n'étant pas alors élucidé" (ibid.:814).

[48]-Para Santo Agostinho, o suplício do fogo inicia-se após a morte individual. Não há, portanto, a espera pela ressurreição para que o julgamento possa fazer valer as suas consequências.

[49]-A cidade é cúbica, as paredes de ouro e as pedras preciosas marcam igualmente presença. Cores como o topázio, o ametista, safira, etc, ornam a geometria perfeita, centrada pelo trono de Deus, de onde sai um rio que, entre dois braços, rodeia uma frondosa árvore da vida ( retomando-se, assim, a descrição de Gn 2,10).

[50]-"...lui-même sera sauvé, mais comme on l'est à travers le feu".

[51]-De acordo com o exposto por C.A.O. van Nieuwenhuijze (cf.nota 3), T.Izutsu sublinha, no quadro desta fractura entre o agora e o depois-eterno, que "the pivotal point of all this is the eschatological concept of the Day of the Judgement, with God Himself presiding over everything as the stern, strict and righteous judge, before whom men stand only in silence with bowed heads. The image of this decisive day should be held up constantly before the eyes of men in such a way that it might lead them to absolute earnestness, instead of levity and carelessness, in life. And this is the dominant note of the islamic piety"(1964:234)

[52]-Cf.nota 8

[53]-Ver nota 49

[54]-Cf.nota 55, T.Izutsu,1964:234 (Deus como juíz surpremo e único do julgamento final).

[55]-M.Palacios desenvolveu essa temática profundamente (1943:193 a 261), na relação entre os níveis de castigo e recompensa (224), na correspondência entre o templo da cidade santa ou a Ka'ba e o paraíso (223-226), ou ainda na correspondência entre os sete jardins do paraíso (esquema do Futúhât de Ibn 'Arabí e os sete (233-4) e os sete pisos do inferno (139). O autor (223) refere: "Este prurito de correspondência simétrica es característico de la escatología musulmana: parece como que se concibe el mundo  de ultratumba a imitación del mundo terreno".

[56]-É curioso, neste contexto, salientar a surata 66,6 onde se atribuem aos anjos responsáveis pelo suplício das vítimas, do inferno, atributos notoriamente humanos: a rudeza (galza) e a dureza (shidda). (T.Fahd,1970:66).

[57]-Cf.nota 39. A surata 19,90 só contempla a possibilidade de intercessão para os que, antes, tenham feito uma aliança com Deus. Sobre este assunto D.Masson, Le Coran, notas:1051.

[58]-Cf.nota 49.

[59]- Baseado numa definição em Groupe d'entrevernes (1977:145), no quadro de um estudo semiótico de texto escritural (evangélico).

[60]-Sobre a noção de acto de dizer, enquanto enunciação, E.Benveniste (Problèmes de Linguistique Générale,1966:254 e sqqs.,Paris) considera-a como "l'acte même de produire un énoncé". A enunciação impõe, assim, um quadro específico de estudo, ou seja, o do discurso apresentado como a sua "manifestation"(ibid.:80). A enunciação deve, pois, ser lida no "cadre figuratif d'une accentuation de la relation discursive au partenaire, (...) où deux figures (...) l'une source, l'autre but (...) sont alternativement protagonistes de l'énontiation"(ibid:83-84). Sobre o assunto, P.Dahlet(1991:312).

[61]-Sobre a articulação das noções de type e token (lesisigno e sinsigno peirceanos) com  com a de enunciação ao nível da actualização (token ou sinsigno), O.Ducrot,1984:368-9.

[62]-Linguagem: aqui entendida como um conjunto de estruturas cognitivas e de aptidões potenciais que permitem devedoras de recortes particulares sobre o continuum expressivo e de contéudo.

[63]-Segundo O.Ducrot, a enunciação, enquanto acontecimento, "embora distinto da actividade linguística, é visto como um acto, isto é, como imputável a um sujeito" (1984:387).

[64]-E.Benveniste, 1976:73-76.

[65]- É a mesma diferença que existe entre a segunda pessoa gramatical, que designa o segundo pólo de um dado quadro comunicativo, e o(s) destinatário(s) que podem ultrapassar esse circuito imediato e inevitável, criado pelo eu-tu gramatical e pela circunstância que o circunscreve; (sobre este assunto, E.Benveniste,1976:49 e sqqs., A natureza dos pronomes, Introdução a uma prática literária).

Sobre a natureza projectiva dos enunciados performativos, veja-se esta reflexão sobre as parábolas enquanto enunciado que valem por acontecimento que deixam em aberto um acontecimento futuro: "La prise en considération de la stratégie oblige à tenir compte des procès d'énonciation. Les paraboles sont des actes de paroles. Elles s'énoncent en des contextes divers: enseignement, avertissement, avertissement, persuasion, conflit de pouvoir, promesse, annonce prophétique. Ainsi, les paraboles viennent-elles à l'appui des paroles ou actes performatifs". (G. de Entrevernes,1977:196-7).

[66]-Cf.nota 64.

[67]-"...esta subjectividade, em nosso entender, quer a definamos em fenomenologia, quer em psicologia"(...)"não é senão a emergência no ser de uma propriedade fundamental da linguagem. É "ego" quem diz "ego". Encontramos aqui o fundamento da subjectividade que se determina pelo estauto linguístico da "pessoa""(E.Benveniste,1976:59).

[68]-O autor refere que tal é, igualmente, o caso no Talmud:"Le Talmud enseigne que la Loi de Moise est min ha-shamayim, descendue des Cieux, et donc inimitable, insurpassable"(H.Didier,1982:178).

[69]-"Et je vis, dans la main droite de celui qui siège sur le trône, un livre écrit au-dedans et au-dehors, scellé de sept sceaux"

[70]-"Ce Coran glorieux" (85,21) "Est écrit sur une table gardée avec soin"(85,22).

[71]-No quadro da discussão entre o kalâm tradicional e o mu'tazilita, durante o século IX, estes defenderam que a unicidade divina (tawhíd) era incompatível com atributos, como a palavra divina. Atribuir a palavra divina a Deus seria, nesta linha de ideias, antropomorfizar Deus, pois tal significaria imputar-lhe atributos que são terrenos, do campo da criação e, portanto, exteriores à divindade. Sobre os Mu'tazilitas:A. Nader,Le Système Philosophique des Mu'tazila,1956,Beyrouth.

[72]-Surata 13,39:"La mère du Livre".

[73]-Nomeadamente, enunciadores que são anjos (3,37), o profeta tornado enunciador e criando diversos destinatários (6,12; 8,1 ou 9,84), e ainda outros enunciadores como os infiéis (45,23) e profetas anteriores: Salomão (27,16), Moisés (28,33) ou Abraão (26,83), etc.

[74]-"Le Seigneur parle aux hommes en paraboles, afin qu'ils réfléchissent" (14,30); o papel do alegorizante, cuja ambiguidade significativa se deve à diferença de nível entre o absoluto original divino e o Livro onde essa mensagem se humaniza, para que possa tornar-se compreensível aos homens, é expressa na surata 3,5: "C'est lui qui t'a envoyé. Parmi les versets qui le composent, les uns sont fermement établis et contiennent les préceptes; ils sont la base du livre; les autres sont allégoriques. Ceux qui ont du penchant à l'erreur dans leurs coeurs s'attachent aux allégories par amour du schisme et par le désir de les interpréter; mais Dieu seul en connait l'interprétation. Les hommes consommés dans la science diront: Nous croyons au Livre, tout ce qu'il renferme vient de Dieu. Les hommes sensés réfléchissent"

[75]-Segundo o testemunho autorizado de M.Arkoun, as funçöes sintácticas de que o enunciador se serve para convencer o seu alocutário, no quadro dos diálogos, são a interrogação, a exclamação, a intimação e a acerssão. Destaque para esta última modalidade que "oriente d'une manière évidente tout l'usage cognitif  de la langue: cf. infidèles, incrèdules, injustes, ennemis, coupables qui forment une catégorie disqualifiée par les propos excessifs, insensés, arrogants qui leur sont prétés; inversement les croyants sont ceux qui suivent le prophète". (1982:33-35).

[76]-Esta bipartição é reiterada constantemente no Alcorão. Como exemplo, ficam aqui designadas algumas das muitas suratas onde o contraste entre crentes e infiéis é objecto de descrição e categorização: 2,166 versus 2,173; 2,259,v.2,255; 3,49 v. 3,50; 4,59 v. 4,71; 5,76 v.5,62; 8,37 v. 8,47; 16,29 v. 16,30; 27,92 v.27,91; 39,72 v.39,73; 47,20 v. 47,22; 58,9 v. 58,10 e 66.7 v. 66,8. (Em cada par, a primeira surata citada refere-se aos infiéis e a segunda, por contraste denotativo, aos crentes).

[77]-Cf.notas 3 e 55 a este respeito. Sobre o enraizamento progressivo desta realidade, A.Abel sublinha (1950:7) que todos os homens, "du vulgaire ou savants, vivaient, de même sorte, une même vie, où l'humble conformisme étatit un mérite, une vie, qu'avant tout une grande anxiété habitait, une grande inquiétude issue d'un mythe, le plus important, sans contexte, de tous leurs mythes vitaux, l'attente du Jugement Dernier, d'un jugement dernier objectif, vingt fois décrit et formulé, que le moindre événement, éclipse, parhélies, lueur créspuculaire, aurore boréale (...) ou tremblement de terre, remémorait aussitôt à chacun. Le monde arabe, à mésure que le temps avançait, le mettait davantage au centre de ses préoccupations, en enrichissait, en développait les détails et les thèmes." O autor refere depois as tentativas dos filósofos (como al-Fârâbí) ou dos autores das Ikhwân as-safâ, de a humanidade poder caminhar neste mundo na senda da cidade da harmonia. As frustrações de facto, ligadas a estas tentativas, seriam corporizadas, segundo A.Abel, pelo próprio al-Ghazzâlí que "passait pour avoir codifié, à l'aube du XIIe s., les détails de la Dernière Annonce. Chaque instant de la réssurrection, de ses angoisses, de ses terreurs, avait, dans sa "Perle Précieuse", si souvent reprise et imitée dans les années qui suivirent, été décrit, expliqué, amplifié"(ibid:8). As descrições de Al-Ghazzâlí, ainda segundo A.Abel, povoavam "le vide de l'Au-delá d'une foule tremblante de pêcheurs, attendant, sous la menace qu'ouvrait la gueule horrible de la géhenne, cet enfer qui était un monstre vivant, qu'il plut à Dieu de leur permettre de faire leur paix avec lui."(ibid.:9).

[78]-O mistério da trindade é expresso, de forma explícita em 1 Jn 5,6-7: "C'est lui qui est venu par l'eau et par le sang, Jésus Christ, non avec l'eau seulement, mais avec l'eau et le sang; et c'est l'Esprit qui rend témoignage, parce que l'Esprit est la vérité"(5,6)"C'est qu'ils sont trois à rendre témoignage, L'Esprit, l'eau et le sang, et ces trois convergent dans l'unique témoignage"(5,7). O comentador de TOB (1989:754) refere a este propósito: "Jn veut dire que Dieu à suffisamment acrédité son Fils devant les hommes, dans le grand procès qui l'oppose au monde"(...)"Quant au témoignage intérieur de l'Esprit, il consiste à manisfester au croyant la portée salvifique, la vérité, des faits ici évoqués et à le conduire ainsi à la connaissance de Jésus Christ. L'Esprit est donc la vérité, puisque nous savons que par lui est rendue présente et active (...) la vérité apporté par Jésus".

[79]-"Nous enseignons la sagesse de Dieu, mystérieuse et demeuré cachée, que Dieu, avant les siècles, avait d'avance destinée a notre gloire" ("le mystère au sens paulinien du mot, c.-à.-d., le secret du dessein de salut réalisé en Christ", cTOB,1989:491).

[80]-"Litt. il se vida (ekenôsen). Cette Kénose ou anéantissement n'implique pas que Jésus cesse d'être Égale à Dieu (...) c'est dans son abaissement même qu'il révèle l'être (...) de Dieu. Les cinq verbes suivants décrivent cet abaissement" cTOB,1989:584.

[81]-Cristo é gerado por Deus e concebido em Maria, de acordo com um esquema de maternidade divina. Santo Inácio foi o primeiro teólogo a defender este tipo de concepção virginal, opondo-se  ao docetismo, corrente que definia o corpo de Cristo como pura aparência (A.Cayré,1953-I:44).

[82]-Sublinhado nosso (ibid.:263).

[83]-Independentemente das vastíssimas tradições sobre a vida e actos do Profeta, que acabam por configurar contextos, cuja função última é aclarar o significado desse texto ( que Deus fez descer à humanidade sob a forma de enunciado linguístico).

[84]-Em Lucas a ênfase é dada ao cronotopo narrado; em João são enfatizados os acontecimentos da vida de Cristo, como locus da manifestação de Deus (mais do que a sua pré-existência) e, em Mateus, por exemplo, é a confirmação escritural profética que é situada como objecto dos actos de Cristo. (fonte, TOB,1989:182,288 e 42)

[85]-cTOB,1989:23. Embora, por volta de 170, os quatro evangelhos tenham já adquirido o estatuto de literatura canónica. De referir, ainda, que as tradições orais tiveram um período de formação de cerca de quatro décadas (fonte: ibid.:21 e 35).

[86]-Sublinhado nosso.

[87]-Pierre Guiraud,1973:116:"...o homem é o veículo e a substância do signo, é ao mesmo tempo o significante e o significado (...) o signo social, por outro lado, é em geral um signo de participação". "Sob os termos de códigos lógicos e estéticos consideraram-se até aqui as relações do homem com a natureza"(ibid.:115).

[88]-A.F.Cayré,1953-I:44

[89]-"...semé corps animal, on ressuscite corps spirituel. S'il y a un corps animal il y a aussi un corps spiritual"(1 Co 15,44).

[90]-Na narração apostólica, a ocorrência precede a prisão de Jesús. Na última ceia se encerra a aliança aberta no Antigo Testamento (Ex 24,4-8) através da figura do sangue: "Ceci est mon sang de l'Alliance, versé pour la multitude" ("pour l'ensemble des hommes" - Mc 14,24). Antes  (Mc 14,22), Cristo pronunciara: "Prenez, ceci est mon corps" (igualmente em Mt 26,26-29 e Lc 22,15-20); a relaçäo entre o pão e o corpo é explicada em 1 Co 11,26: "...toutes les fois que vous mangez ce pain et que vous buvez cette coupe, vous annoncez la mort du Seigneur, jusqu'à ce qu'il vienne".

[91]-Cf.Cap.II-1. profecia escatológica: "estabelece uma relação entre a primeira fase do fim dos tempos e a história presente e imediatamente futura" (J.Le-Goff,1984:428).

[92]-sublinhado nosso, que enfatiza o propósito escatológico do discurso, criado pela enunciaçäo cristã.

[93]-“Pré-existente”  remete, neste âmbito, para o carácter eterno da mensagem transmitida - anterior, portanto, a toda a existência humana e comunicada (à humanidade) numa dada fracçäo histórica.

[94]-Independentemente das discussões, no seio do Kalâm, acerca da existência ou não de causas segundas e da sua natureza face à potência divina - tida, tradicionalmente, como única e absoluta.

[95]-Para as correntes pan-semióticas, todo o mundo natural se pode constituir como objecto científico de estudo. Greimas e Courtés (1979) distinguem, neste contexto, as semióticas do mundo natural das semióticas das línguas naturais; ambas constituem campos de estudo anteriores ao homem, ou seja, realidades näo construídas por ele (embora, por exemplo, a semiótica do espaço releve uma certa ambiguidade, quanto a esta taxinomia: é o espaço desenhado pela erosão física, ou pelo acto humano secular ?). A definição dada de mundo natural é pertinente, no quadro desta reflexão (ibid.:233): "o mundo natural (...) apresenta-se ao homem como um conjunto de qualidades sensíveis, dotado de certa organização"(...)"é uma estrutura discursiva, pois apresenta-se no eixo de uma relaçäo sujeito/objecto"(...)"O mundo natural é uma linguagem figurativa cujas figuras - que encontramos de novo no plano do conteúdo das línguas naturais - são feitas de qualidades sensíveis do mundo e actuam directamente - sem mediação linguística - sobre o homem". De referir que, separando realidade e a sua representação, o mundo natural não é o mundo real: este último é o que, de facto existe, enquanto o mundo natural é o que decorre da apreensão humana do mundo real. Assim sendo, o mundo natural é um efeito de sentido, uma filtragem da realidade que, no entanto, é significada e codificada pela vivência humana. Se a semiótica considera a matriz dessa codificação a supra-semiótica (noção hjelmsleviana que se refere à pensabilidade do mundo, às heranças míticas e culturais), já, no caso em questão, a referência primeira assiste ao papel de Deus, de facto o grande narrador deste discurso natural.

[96]-Quer no Ms.BNM 4944 (fols. 65v-67r, 72v, 90r-91r), quer no Ms.BNM 9074 (fol. 14v) se expressam estas posições.

[97]-W.Watt refere (1991:37) que, nos tempos pré-islâmicos, existe "little understanding of history or the historical process". A enunciação corânica, por seu lado, näo codifica o elemento diacrónico com continuidade e coerência narrativa: "When the Qur'ân desbribed events in past religious history, it did so in an allusive way, as if its audience already knew something about the events".

[98]-Esfera do Islão e esfera da guerra, respectivamente: Traduzem a ideia de dois espaços oponentes, designando o segundo aquele que não se enquadra dentro da profissão de fé islâmica. A expansão dramática do Islão - nos primeiros dois séculos da sua existência - criou a convicção de que a primeira dessas esferas acabaria, em breve, por englobar o mundo na sua totalidade, possibilitando, assim, a consumação do plano escatológico enunciado à humanidade, através da profecia de Muhammad.

[99]-Sublinhado nosso.

[100]- Vem a propósito referir como a visão cíclica da história, exposta por Ibn Khladún, se compatibiliza com o parco significado que é atribuído ao evento histórico: "Ibn Khaldún's view of history is essentially cyclical; there is change, but only within a certain range of recurring possibilities. The impression one gets from reading Muqaddima is that from an absolute perspective it doesn't matter very much what people do, for a certain pattern will persist, a pattern of constant change without real difference"(N.Booth,1970:19).

[101]-Cf.nota 106.

[102]-"Dieu efface ce qu'il veut ou le mantient. La mère du Livre est entre ses mains". Referência a Umma al-Kitâb.

[103]-Sobre o espectro semântico, aqui atribuído ao lexema "interpretante", cf. nota 3 do Cap.I.

[104]-Como refere, de outra forma L.Massignon (1939:9):"...si la Chrétienité est, fondamentalement, l'acceptation et l'imitation du Christ, avant l'aceptation de la Bible, en revanche l'Islam est l'acceptation du Coran avant l'imitation du prophète"

[105]-Cf.nota 96.

[106]-Nomeadamente 1.1 e 1.2

[107]-Sobre a metanoia dos Evangelhos, N.Frye,1984:191 e 192; M.-M. Davy,1982:74.

[108]-A nível superficial, cada palavra (lexema) integra um semema, entendido como uma polivalência de sentidos disponíveis, capazes de se mobilizarem em cada situação concreta em que a palavra é convocada. Cada semema integra, por sua vez, diversos núcleos semáticos - cada um deles com uma dada amplitude semântica estável. Estes núcleos constituem-se como receptáculos do real que, assim, representam. Cada semema dispõe de um espectro semântico, composto pelos vários núcleos que o integram. A palavra é, pois, um filtro da experiência humana. Esta encontra-se representada de forma paradigmática (nos núcleos), embora a palavra, quando convocada, só possibilite a realização (sintagmática) de uma parte do seu espectro potencial (um núcleo ou alguns, mas nunca todos).

[109]-"The most serious of all sins is the arrogant claim that anyone, human or spirit, is equal to God or identified with him". (ibid.:71).

[110]-Consideram-se atributos como a eternidade, a potência, o conhecimento e a vontade divinos. O takwín é um atributo eterno, ligado à vontade divina, e que pressupõe as accçöes: criando, sabendo; Nada do que é exterior à unicidade divina, tawhíd, se pode confundir com Deus.

[111]-O que é sujeito de hadat, ou, por outras palavras, o que é efémero.

[112]-Filosofia escritural ou teologia dogmática islâmica.

[113]-Designam-se, aqui, os seguidores da filosofia grega (al-Fârâbí, Abu Bakr al-Razi, etc.).

[114]-in E.Edgar Elder,1950,Cap.V do Credo de Najm al-Dín al-Nasafí (comentado por Sa'd al-Dín al Taftâzâní), que expressa e reitera expressões dos credos originais, relacionados com a corrente de Ortodoxia popular (J.Schacht,1953:37-40) da qual  Abú Hanifa foi epónimo. Com raízes nos Murgi`itas (corrente dominante de opinião na era Omáiada - 661-750 - J.Schacht, ibid:39), esta corrente, desde cedo, encontrou como forma de expressão pequenos credos, catecismos e tratados como o Kitâb al-'âlim wa`l-Muta`alim (Schacht,1964:96-117), o Fiqh al Akbar-I J.(Wensinck,1965) e o Fiqh al-Absat (Muhammad Zâhid al-Kautarí,1979,Cairo - que editou igualmente, em conjunto, o Fiqh al-absat, o Kitâb al-'âlim wa`l-Muta`alim e a Risâla 'ila `Utmân al-Battí, este último da autoria real de Abú Hanifa -J.Schacht,EI-1960:123).

[115]Sublinhado nosso.

[116]-Neste âmbito, refere C.Glassé (1991:391): O Tawhíd "est au centre de l'Islam et, de fait, est le fondement du salut".

[117]-Para M.Hagerty "...el Dios único de los hebreos y el de los árabes difiere algo en la modalidad de su presentación, debida, probablemente a la experiencia desértica más intensa de éstos. El hombre no es la parte más elevada de la naturaleza, como suponía el griego; no ha sido hecho para el dominio de todo el creado, como sabía el hebreo; sino que está en el mismo plano de las cosas. El hombre y el mundo son elementos subordinados a algo impersonal y objetivo: Dios, Destino"(ibid.:265:266).

[118]-Noção de M.Eliade (1975:23): "Manifestation du sacré dans l'univers mental de ceux qui l'ont reçu."

[119]-A hipótese de associação entre o termo filho e "filhas de Allâh" é sugerida por D.Broadribb (1969/70:68).

[120]Sublinhado nosso.

[121]Sublinhado nosso.

[122]-"Un Morisque expulsé d'Espagne et réfugié en Tunisie évoque les démêlés de sa communauté avec l'inquisition, et les explique en quelque sorte par leur refus de croire en la Trinité"(ibid.:227).

[123]-Dicorsi sopra la prima deca di Tito Livio.(cit. in The Discourses, trad. de L.Walker,1970:249).

[124]-"L'un d'eux, appelé Agabus, fit alors savoir, éclairé par l'Esprit, qu'une grande famine allait régner dans le monde entier..."

[125]-Por exemplo, as profecias ligadas ao Montanismo e aos Milenarismos nascentes.

[126]-"Elle avait deux cornes comme un agneau, mais elle parlait comme un dragon" - referência metafórica aos falsos profetas que, em Ap 16,13 - são referidos como espíritos impuros e, denotativamente, referidos como "des faux prophètes".

[127]-in J.P.Machado,1980:505 .

[128]-H.Halm refere-se à permanência destes grupos no seio de uma remota ortodoxia até que são, definitivamente, dados como heréticos:"La sharí`a conçue comme un fardeau pesant, son abolition conçue comme un acte de grâce divine, pour un bon musulman de telles idées devaient avoir quelque chose de monstrueux. Cependant, des mouvements ou courants antinomistes de ce genre ne sont pas en Islam aussi rares qu'on pourrait le supposer au premier abbord. Ils n'ont seulement pas pu se maintenir contre les attaques des juristes qui, à partir du IIe/VIIIe siècle, sont sortis vanqueurs de la lutte: les antinomistes furent donc forcés d'abandonner le terrain" (1985:135). Sublinhado nosso.

[129]-São seitas shi'itas que recusam a Lei (a sharí'a) e que deíficam os Imâms. Um dos exemplos é a seita dos Aluítas da Síria. Não têm mesquitas e o seu livro sagrado é o Livro das sombras, onde se pode ler: "Il y a une foule d'hommes sur la terre, auxquels vous parlez et qui vous parlent don Dieu a déjà enlevé les chaines et les liens sans que vous les connaissiez"(cit.in H.Halm,1985:138/9).

[130]-O movimento surge com o cisma, no seio do shi'ismo (após a morte do sexto Imâm, Ja`far Sâdiq, em 765), daí tendo surgido o imamismo "duodécimain"e o ismaelismo "septimanien" (H.Corbin,1986:115 e sqqs.). De certa forma, a Lei é, no caso Ismaelita, o obstáclo à visão directa de Deus; assim a futura abolição da Lei não será senão o restabelecimento da religião primordial. H.Halm (1985:140) considera estarmos perante o "antinomisme latent des ismailiens".

[131]- A seita data do séc.XI e declara o tanzíl e o ta'wíl ultrapassados (ou seja, o Islão sunita e o Ismaelismo), proclamando o surgimentpo do novo e terceiro período, o tawhíd, que pressupunha a abolição da Lei e, portanto, a visão e adoração directa de Deus criador (H.Halm,1985:140-141).

[132]-H.Corbin,1986:265 (Cap.V, sobre o sufismo) - "...à travers les siècles, la très grande majorité des soufis se trouve dans le monde sunnite".

[133]-Trata-se de um artigo, onde o Kitâb al-Tawhíd de al-Maturídi é apresentado, pela primeira vez, à comunidade científica  (New sources for the history of Muhammadan theology in Studia Islamica,1953:23-42, Oxford). De salientar que esse importante documento, hoje publicado (org. e tr. F.Kholeif,1970 - 2. ed. 1982 -,Beyrouth), foi primeiro tornado público por J.Schacht dois anos antes da publicação do referido artigo, nomeadamente em 1951, numa comunicação aprentada em Francês na Universidade de Bruxelas.

[134]-Ash`arí and the Ash`arites in Islamic Religious History,in SI,19,1964:18- e sqqs., e, L'Islam Hanbalisant,in REI,42,1974-I,II:211 e sqqs.,III:45 e sqqs..

[135]- A escola Zahirita näo é aqui mencionada devido à sua existência efémera, como aliás é o método de G.Makdisi (1964 e 1974).. Fundada por Dâwúd Ibn Khalaf al-Isfahâní, o literalista (819-855 ou 910). A esta escola pertenceu Ibn Hazm (1064) e o próprio Ibn `Arabí.

[136]-Formada na Síria com al-Auzâ`í(m.774) e, depois, no Iraque através de uma outra escola, sendo o seu representante mais famoso Abú-Hanífa (m.767). Influencia a escola Maturidista (embora existissem no seu seio, igualmente, influências mu'tazilitas) e, após a vinda progressiva dos Turcos para ocidente, passa a ter crescente implantação, não só na Ásia central, como na Turquia (W.Madelung,1968-71).

[137]- O Maliquismo "(...) bases its doctrine on the Qur`ân, The Sunna and ijmâ'"(...)"For Mâlik, hadít is thus not the most important source, and personal judgement, ra`y, is to be used in parallel, when ijmâ'cannot provide the answer to a question and only if this procedure does not injure the public good (maslaha)" (EI,1991-VI:279). Os Maliquitas apoiados por 'Abd al Rahmãn III, como refere M. Fierro (1991:129), "quienes lo utilizaron como elementos legitimadores de sus pretensiones califales, se constituyen en escuela oficial de al-Andalus durante el s. IV/X".

[138]- M.Khadduri (1961:32-40) sintetiza as ideias fundamentais da Risâla de Shâfi'í (m.820), o fundador da escola de direito em questão, afirmando: "The Qur`ân, Shafi'í points out, is the basis of legal knowledge.". Referindo-se ao segundo capítulo da Risâla, o autor dá atenção à noção de al-bayân: "Shafi'í says is a collective term which includes general principles of law as well detailed rules"(ibid:33). A divisão de al-bayân, feita em cinco categorias, é a seguinte: "The first consists of a specific legal provision in the text of the Qur`ân"(...)"the second includes certain provisions, whose odes of observance are specified by an order of the prophet Muhammad"(..)"the third consists of broad legal provisions which Muhammad particularized. The fourth includes all the legal provisions laid by Muhammad in absence of a specific Quranic text. The fifth and final category is comprised of ijtihâd (personal reasoning) by means of qiyâs (analogy)"(ibid.:34).

                Acrescenta ainda M.Khadduri: "Shafi'í's method of reconciliation, called at-ta`wíl (interpretation), encouraged the acceptance of many a tradition which otherwise would have been in danger of being rejected"(...)"The latter part of the Risâla deals briefly with ijmâ´ (consensus), qiyâs (analogy), ijtihâd (personal reasoning), istihsân (juristic preference) and ikhtilâf (disagreement). Although these are important jurisprudential subjects, Shâfi'í devotes much less space to them thna to the Qur`ân and sunna" (ibid:37).

[139]-Fundada por Ahmad b.Hanbal (m.855), integrada sobretudo por tradicionalistas, defende princípios de não inovação, cingindo-se às fontes da lei mais originais, o Alcorão e a sunna.

[140]-Cf.nota 124.

[141]-Partidários de Jahm Ibn Safwân Abú Muhriz (m.745) e defensores da inexistência de quaisquer atributos divinos, bem como de um determinismo extremo. Para os partidários da jahmiyya não cabia ao homem qualquer comportamento que influisse para a salvação. O seu radicalismo punha-os fora da natureza ética do próprio Islão.

[142]-Muqadimma, cit. in T.Fahd,1966:50.

[143]-ibid:45.

[144]-M.J.Hagerty,1978:42-43.

[145]-Reunida por Khatíb al-Bagdâdí, cit. in Goldziher,1952:171.

[146]-Aqui, no sentido de testemunho (ibid.:174,n.3)

[147]-I.Goldziher refere-se a este facto, do seguinte modo(1952:165-6): "On prenait plaisir à citer les fables monstrueuses dont la tradition ornait aussi bien les légendes bibliques que les embryons d'eschatologie contenus dans le Coran. Pour dénigrer les hadít, on exploita les passages où les légendes et les superstitions populaires (khurâfât) étaient reproduites et incorporées au Credo musulman sous forme d'informations émanant du Prophète. On tourna en ridicule les minutieuses prescriptions de la Tradition touchant les détails les plus intimes de la vie etc."

[148]-Por exemplo 21,5; 26,223; 69,41-42 e 31,5.

[149]-Tradicionalista da primeira geração (m.732), judeu convertido ao Islão, "dépendant de Ka'b al-Ahbâr"(ibid.:67), que é o primeiro "chainon de l'isnâd dans les récits relatifs à l'histoire biblique"

[150]-cit in T.Fahd,1966:67-68.

[151]-Tal é a opinião de Mas'údí (ibid.:63); para Ibn Khaldún há uma implicação simétrica: adivinhação é "imperfection du contraire relativement à son contraire parfait" ( ibid.: 45-a revelação profética divina). Na VI Muqqadima, Ibn Khaldún refere, entre outros, as posiçöes dos filósofos e de al-Ghazâlí. Assim, para Ibn Rushd, premonição e profecia situam-se ao mesmo nível, pois Deus conhece os seres tal como eles são. Por isso, se um profeta ou adivinho conhecem por Deus o futuro, é porque a natureza do ser está conforme o próprio conhecimento eterno. Esta revelação pode ter intermediário angélico ou outros, caso do sonho e até da epilepsia. Para Maimonedes, seu discípulo, a profecia é emanação divina e expande-se através do intelecto activo; é a manifestação mais alta e nobre da espécie humana. O sonho e a prática premonitória, em geral, constituem um fruto abortivo da profecia revelada por Deus aos homens. Para al-Ghazâlí, embora o seu combate aos filósofos seja conhecido, o que é certo é que, meste ponto, parece haver mum acordo formal. Para o autor, tudo tem uma causa e se se conhecerem as causas também se determinarão as consequências. A natureza humana, porém, não pode determinar todas as causas, devido às suas limitações. Assim o acto de adivinhação, para além do da profecia pura, é possível. Ele é possível pois existe uma precognição divina que o permite. É nesta condição que o autor difere dos filósofos.

[152]-"prophetic signs"(...)"used even for political ends - as can be seen repeatedly under Leo X"(ibid.:12).

[153]-A data de limite de 1530, para a época de divinatio popularis, é o próprio objecto do estudo da autora (a bibliografia que comprova as datações referentes às outras áreas em ibid:189:n.1).

[154]-(ibid.:13).

[155]-in Tratado de la Verdadera y falsa prophecia. Hecho por Don Juan de Horozco Y Covarrubias. Arcediano de Cuellar en la Santa Yglesia de Segovia, Segovia. Por Iuan de la Cuesta. Año 1588 (as cit. extraídas de J.C.Baroja,1978,37-42).

[156] O autor chega-nos a falar acercas de “realeza sagrada” (1990:181).

[157]-Sobre este aspecto ver M.Herrero Garcia (1966:Cap.1, sobre o auto-conceito de Espanha) e, para o caso Português, a interessante Monarquia Lusitana (III,Livro 10,Cap.2), onde o carácter predestinado e providencial do primeiro Rei de Portugal é teorizado através do seu diálogo com Deus, na batalha de Ourique contra os mouros. Este é um dos paratextos de um poderoso mito, que se enquadra dentro de um âmbito ibérico de significação.

[158]-Ephemerides, reeeditado em Veneza em 1522 (fonte O.Niccoli,1990:140).

[159] De realçar, nas obras em causa, as ligações entre os textos proféticos, sobretudo entre Itália e Espanha.

[160]-De De Libero Arbitrio, V.9, cit in ibid:16.

[161]-Ediçäo de Florença de 1497.

[162]-Cit. in J.C.Baroja,1978:238.

[163]-Cit. in ibid.:238.

[164]in O.Niccoli, 1990.187

[165]-Sublinhado nosso.

[166]-Sobre Magdalena de la Cruz cf. J.C.Baroja,1978:40,n.84.

[167]“...The classical and Ciceronian culture that flourished at the papal court and in the circles around it during the years  of Leo X's papacy and the early years of Clement VII favored this habit. Interest in the world of classical antiquity brought with it a renewed fascination with the monstra, prodigia and portenta, a fascination that popular divination, for its part, pursued indefatigably"(O.Niccoli,1990;193).

[168] In 1955, Vol.VI.

[169]Cit in J.C.Baroja,1978:37-42.

[170]A obra do Jesuíta Benito Pereira, Adversus astrólogos de Astromantia dirige-se particularmente a Aragão, Valência e Catalunha. onde há imensos cultores da astrologia judiciária (J.C.Baroja,1978:237).

[171]F.Rosenthal, numa das seis conclusões do seu Sweeter than Hope (Leiden,1983:139), foca a compatibilidade entre ambas as noçöes: "amal directed toward those very insignificant and impermanent worldy benefits"(...)"did not conflit with the view of God as the only permissible depository of true rajâ`".

[172]Profetismo, no sentido do selo revelatório anunciado através de Muhammad e do plano divino de redenção, ou boa nova, anunciada por Jesús Cristo.

[173]Nomeadamente o significado de "forbidden intellectual inquiry and the more domestic vices of neglect of self and excessive interest in the affairs of neighbours"(E. Peters,1985:91).