Público, Subjectividade e Intersubjectividade
em Gabriel Tarde

Comentário e Análise Crítica de Le public et la foule in L' opinion et la foule (1901)

Marco António Antunes, Universidade da Beira Interior

    

RESUMO

Tarde insiste primariamente na racionalidade crítica dos indivíduos no público (no sentido da invenção racionalmente esclarecida). Mas, secundariamente surge a actividade intermental (1) mediada pela comunicação e sociabilidade. Subjectividade e intersubjectividade enquadram as duas dimensões da teoria do público de Tarde. O pensamento individual independente e primariamente inventivo corresponde à subjectividade. A actividade intermental comunicacional é o momento da intersubjectividade. Em Le public et la foule, Tarde não esclarece se a troca comunicacional que se verifica no decurso da  actividade intermental (ou em termos gerais na intersubjectividade) permite a subsistência do pensamento individual independente.  Esta aparente ambiguidade é, na verdade, resolvida em Les lois de l' imitation, através de uma posição dialéctica que configura a sociedade como um conjunto de leis lógicas e extra-lógicas (sendo as primeiras as que se referem, primordialmente, à inovação e as segundas que dizem respeito, especialmente, à herança cultural). Em ambas as leis da imitação estão dialecticamente presentes a subjectividade e a intersubjectividade.

ADVERTÊNCIA

A presente dissertação é uma tentativa de enquadrar a noção de "público" de Tarde (2) à luz dos conceitos de subjectividade e intersubjectividade.  O modelo de subjectividade, seguido por Tarde, representa a expressão da individualidade através de um racionalismo crítico e da produção de iniciativas criadoras. O problema da intersubjectividade conhece uma longa tradição onde podemos incluir Husserl e Dilthey, entre outros, sendo objecto de uma apreciação muito clara no interaccionismo de Mead e Cooley, na fenomenologia social de Schütz, no pragmatismo de Dewey, na hermenêutica de Heidegger e, após Heidegger, com Gadamer e Ricoeur.  A intersubjectividade é concebida, sobretudo, como uma relação intercompreensiva entre dois ou mais indivíduos (3). Os conceitos de "subjectividade" e "intersubjectividade" servem para enquadrar, respectivamente, o individualismo inventivo e a comunicação intermental, momentos matriciais na unidade dialéctica do público. Contrariamente aos estudos que dão primazia ao pensamento individual independente, como ponto único da teoria do público em Tarde, pretendemos provar que a comunicação recíproca intermental dos indivíduos é o ponto secundário e inevitável do público. Individualismo inventivo e comunicação intermental estão também presentes em Les lois de l' imitation, no âmbito das influências lógicas e extra-lógicas (4).           


INTRODUÇÃO

       O termo "público" nasce na Antiguidade. Deriva do latim publicus, o qual provém, provavelmente, de poplicus ou populus (o povo). Existiam dois sentidos de povo presentes na palavra público. No primeiro sentido,  a noção de público centra-se na ideia de acessibilidade. O público designava o acesso comum de vários indivíduos a um mesmo lugar - o lugar ou espaço público. Assim, na Grécia o espaço público era o lugar do reconhecimento da liberdade e da igualdade, condições que permitiam intervir na vida política da polis. Em Roma, a res publica era uma determinada propriedade geralmente aberta à população. Na Idade Média, o espaço público era o local que proporcionava o acesso, em campo aberto, à fonte e à praça do mercado. No segundo sentido, predomina a ideia de bem comum ou interesse comum. Público referia-se a questões de interesse geral e, concretamente, a matérias relacionadas com a Administração e o Estado. Na Idade Média, senhorial e público eram sinónimos. Publicar significava, sobretudo, requisitar para o senhor. A partir de 1400, a Corte torna-se o espaço público onde os senhores feudais e demais cortesãos adquirem a sua representatividade junto do Soberano. Com o desenvolvimento da burguesia, o Estado assume-se como organizador do mercantilismo. O interesse público é, neste caso, dar a conhecer os produtos e respectivos valores de circulação monetária. No século XVII e mais tarde no século XVIII com o Iluminismo, o termo público significava a existência de um espaço de discussão crítica operado nos salões, cafés, clubes e na imprensa (consequentemente, assiste-se ao surgimento e tematização da opinião pública). Durante o absolutismo, o rei era considerado pessoa pública: um unificador dos diferentes membros da sociedade. Nos séculos XVIII e XIX, o termo público passou a designar o Estado e também uma entidade com existência objectiva, que exerce a sua vigilância sobre a pessoa que governa (Habermas, 1984:13-41, 110-168, 235-236, 274-290), (Price, 1994:20-22), (Rodrigues, 1985), (Correia, 1998:21-26).      

       As primeiras tentativas de configurar um tratamento científico sobre a questão do público, a conduta das multidões e das massas foram desenvolvidas por um grupo de teóricos da vida sócio-psicológica, entre eles Bryce, Tarde, Dewey, James, Baldwin, Le Bon, Park, Cooley e Ortega y Gasset. Estes autores problematizaram e tipificaram os comportamentos colectivos que mais afectavam a vida social dos séculos XIX e XX, nomeadamente as multidões espontâneas, greves, atitudes de massa e distúrbios. Estes fenómenos foram particularmente debatidos pela imprensa que pretendia, de certo modo, regular e orientar o comportamento do público, das multidões e das massas (Price, 1994:39-40), (Noelle-Neumann, 1995:282-283).

       Nos finais do século XIX e inícios dos século XX, as teorias do público assinalavam a existência de um fenómeno supra-individual intrinsecamente colectivo, que todavia se realizava através de agentes críticos empenhados na afirmação da sua racionalidade. Em França, Tarde foi um dos primeiros autores a sistematizar a História do Público e as suas relações com a multidão. Tarde, apesar de formular uma História do Público, está interessado num estudo sincrónico do público, sobretudo, nas formas de interacção entre público e imprensa. "É curioso que nem em latim nem em grego exista uma palavra que corresponda ao que nós entendemos por público" (Tarde, 1986:46). Price (1994:42-47) cita Blumer (1946:189) (5) o qual, clarificando e ampliando as análises de Park (1904) (6), propõe que o "o termo público se utilize para se referir a um grupo de gente que a) estão confrontados por um assunto, b) se encontram divididos na sua ideia de como perspectivar o assunto, e c) abordam a discussão desse assunto".

       O aparecimento da Mass Communication Research, da Public Opinion Research e dos métodos empíricos da  Sociologia da Comunicação (7) foram contributos importantes para a teoria do público. Devido ao desenvolvimento crescente dos mass media, o público passou a designar, simultaneamente, um meio de discussão crítica, mas também e sobretudo um somatório de opiniões individuais mensurável através de inquéritos, sondagens e audiências. Na década de 60, Habermas afirma que no  público paralelamente  a uma publicidade crítica, herdeira da esfera pública burguesa, existe também uma publicidade manipuladora. Segundo as teorias mais recentes, o público discursivo e crítico representa uma pequena fatia do eleitorado moderno, assim se compreende a contínua alienação dos cidadãos face à participação política. (Mattelart, 1996:366-367), (Price, 1994:20-22, 43-45), (AAVV, 1989),

       Na Europa e no âmbito da Sociologia, a influência de Tarde foi, de certo modo, reduzida devido à primazia do método sociológico de Durkheim (8). No entanto, a influência de Tarde manifesta-se em autores tais como: Eugène Dupréel, Jean Stoetzel e indirectamente Jürgen Habermas (9). Nos Estados Unidos, Tarde influenciou, principalmente, a Escola de Chicago, a Escola de Columbia, a Escola do Sul da Califórnia e a Escola de Filadélfia, embora, inicialmente, não tenha despertado muito interesse, ao ponto de constituir um paradigma científico para os sociólogos americanos.

       A obra de Gabriel Tarde L' opinion et la foule, e em particular o texto em estudo, reveste-se de grande importância para a Filosofia, Psicologia, Ciências da Comunicação, Sociologia e Criminologia. Le public et la foule foi pela primeira vez publicado em 1898 nos números de 15 de Julho e 1 de Agosto de La Revue de Paris. Constitui uma análise sobre o público e a multidão enquanto colectividades sociais, cujos líderes de opinião são os publicistas, jornalistas ou simples líderes inspiradores. Tarde explica a História do Público assinalando as semelhanças e diferenças com a multidão.


COMENTÁRIO

       No texto Le public et la foule, Gabriel Tarde pretende analisar as origens, desenvolvimento e variedades do conceito «público»; as relações entre público e multidão, público e corporações, público e Estados, público e dirigentes; os benefícios e malefícios do público e as suas formas de actuar (Tarde, 1986:43).

       Tarde assume-se como o primeiro sociólogo que se ocupa dos conceitos «público» e «opinião pública» enquanto domínios de uma psicologia do público (ou em linhas gerais de uma psicologia social). O público constitui, para Tarde, um modelo de sociabilidade destinado a substituir o modelo de descrição das relações sociais fundado na psicologia das multidões. Logo, o público, apesar de emergir das multidões, pressupõe "uma evolução mental e social muito mais avançada que a formação de uma multidão" (Tarde, 1986:46). A ideia de que o público emerge das multidões é reforçada pelo facto da possibilidade de se poder pertencer a vários públicos num mesmo tempo, sem, contudo, ser possível pertencer a várias multidões num mesmo contexto temporal (Tarde, 1986:50). Tarde propõe uma definição simplificada de público: "uma colectividade puramente espiritual, como uma dispersão de indivíduos fisicamente separados e entre os quais existe uma coesão somente mental" (Tarde, 1986:43) (10). A relação que se estabelece num público consiste, assim, numa relação social e espiritual. Tarde, embora não apresente uma definição definitiva de multidão, afirma que "a  multidão apresenta algo de animal" (Tarde, 1986:43) (11), isto é, enquanto colectividade amorfa e passiva encontra-se dominada por interesses materiais (intolerância, egoísmo, irresponsabilidade, perda do sentimento do bom senso), que impedem a discussão crítica (Tarde, 1986:64).

       Para Tarde, o público, que alimenta a imprensa, está imbuído de um sentido de actualidade - "tudo o que inspira actualmente um interesse geral e inclusivamente ainda que se trate de um facto antigo" (Tarde, 1986:45). Este autor considera como actualidade o caso Dreyfus (12). Por outro lado, para que o público partilhe a actualidade à distância da imprensa é necessário que exista uma sugestão de proximidade, a qual resulta do "hábito da vida social intensa" (Tarde, 1986:45).

       Na tentativa de realizar uma História do público, Tarde salienta que antes do século XVI não se pode falar de público. Na Antiguidade, existiam colectividades que correspondiam aos auditórios dos filósofos ou que participavam nas actividades do Coliseu. Na Idade Média, existiam feiras e peregrinações, nas quais as multidões compartiam diferentes sentimentos. O conceito de público nasceu no século XVI com o aparecimento da tipografia, acontecimento que irá possibilitar, progressivamente, o debate dos mais variados temas, por parte de públicos especializados. Mas, o público surgiu com maior notoriedade nos séculos XVII e XVIII. Inicialmente, o público era restrito, constituído por um pequeno número de eruditos que liam as gazetas e se reuniam em salões, cafés e clubes. Paralelamente a este público, existia uma multidão amorfa de pessoas que se manifestavam nos acontecimentos políticos e socioeconómicos (por exemplo: coroações, revoltas, festas) (Tarde, 1986:46-48).

       No decurso do século XVIII, a especialização dos públicos é um facto: surge um público filosófico, a par de um público científico e literário. Esta situação conduziu, na segunda metade do século XVIII, ao surgimento de um público político que reúne todos os outros públicos. A Revolução de 1789 contribuiu para o progresso do jornalismo, que se especializa na crítica ao novo regime, e dos publicistas que se afirmam como líderes [de público]. É de assinalar que, segundo Tarde, antes da Revolução os públicos eram o efeito dos salões, cafés e clubes, mas após a Revolução deu-se o inverso. Tal facto, compreende-se porque o movimento político e socioeconómico, então gerado, fez eclodir a mudança de temáticas nos espaços de discussão pública (Tarde, 1986:47-48).

       No século XIX e princípios do século XX,  o desenvolvimento da imprensa amplia o universo do publico e dos  publicistas. Todavia, tal seria impossível sem a coexistência de três grandes invenções: a tipografia, o telégrafo e o caminho-de-ferro. Neste contexto, Tarde dirige uma crítica a Le Bon. Segundo Le Bon, assiste-se a uma ascensão imparável e perigosa das multidões. Ora, para Tarde, as multidões são um reflexo do passado constituindo a segunda forma mais antiga de colectividade (13) e estão condenadas a ser substituídas pelos públicos, na medida em que não promovem a discussão crítica. Valoriza-se, assim, o público que se situa num estádio evolutivamente superior em relação à multidão. Deste modo, vive-se na era dos públicos e não na era das multidões como defendia Le Bon (Tarde, 1986:48-49). 

       Tarde afirma que o público se pode tornar, embora  raramente, numa multidão em potência, isto é, de um público tumultuoso derivariam "multidões fanáticas que se passeiam pelas ruas gritando viva ou morra não importa o quê" (Tarde, 1986:50).  Parece existir, neste ponto, uma primeira contradição no pensamento de Tarde, pois se os públicos pressupõem um espaço de discussão crítica, como se explica que se transformem em multidões tumultuosas? Tarde procura resolver esta contradição, quando alude aos crimes do público.

       Uma das diferenças mais significativas entre público e multidão consiste no reconhecimento de que a multidão está mais vulnerável aos elementos físicos e étnicos. Contrariamente, num público não existe uma uniformidade de posições étnicas, nem a influência decisiva dos elementos físicos da natureza, mas a tentativa de uma reflexão, na qual cada indivíduo se apresenta como agente crítico. Assim, num público assistimos à emergência de uma individualidade crítica, enquanto que na multidão a individualidade étnica e as condições físicas existentes no meio  social são condição de pertença (Tarde, 1986:50).

       Para Tarde, "(...) a  influência  que o  publicista  exerce  sobre o público ainda que menos intensa num dado instante, pela sua continuidade, é muitíssimo mais poderosa que a impulsão breve e passageira inculcada  à  multidão  pelo  seu inspirador;" (Tarde, 1986:51). Tarde está consciente das possíveis objecções que lhe possam formular e refere: "Precisamente, porque na composição de uma multidão, os indivíduos entram somente pelas suas semelhanças étnicas, que se sumam e constituem a massa, e não pelas suas diferenças próprias, que se neutralizam e que no movimento de uma multidão os ângulos da individualidade se esbatem mutuamente em benefício do tipo nacional, que dão como síntese. E é assim apesar da acção [subjectiva] individual do manipulador ou dos manipuladores, que se faz sentir sempre, mas sempre contrabalançados pela acção recíproca da multidão" (Tarde, 1986:51). Ou seja, a acção do líder inspirador da multidão está mais dependente da acção [intersubjectiva] comunicacional recíproca do que no caso dos publicistas. Estes últimos, exprimem melhor o seu pensamento individual, porque os membros do público exercem uma influência mais fraca entre si. (14).

       Tarde realiza uma crítica do público ao sublinhar que, apesar da discussão crítica gerada, o público não passa de uma clientela comercial. Parece paradoxal esta ideia de Tarde: como conciliar um público que lê jornais e escuta os publicistas numa atitude crítica não passiva, com a convergência material perante interesses economicistas? Tarde resolve esta aparente contradição referindo que um público pode ser estável [admite a discussão crítica contínua] e flutuante [quando a crítica, por vezes, é minimizada por interesses economicistas] (Tarde, 1986:54).

       A imprensa, apesar de ter modificado a  força das antigas colectividades sociais (nomeadamente a família e a multidão) através de interesses ideológicos, contribuiu para o surgimento de um público crítico, nomeadamente religioso e político. Daí que a imprensa  tenha conduzido à interpenetração e internacionalização dos partidos políticos e das seitas religiosas (Tarde, 1986:57).

       Tarde estabelece uma relação inversa entre público e multidão, isto é, o público da Universidade, dos salões, cafés, da imprensa etc. cresce mais rapidamente à medida que a multidão tumultuosa diminui; esta situação explica-se porque o público, enquanto espaço de discussão crítica, é gerador de apaziguamento nas relações pouco racionais da multidão (Tarde, 1986:59).

       Para Tarde, os públicos e as multidões podem ser classificados em função do sexo, da idade, dos fins e da fé que os anima, e ainda por critérios: étnicos, económicos, culturais, profissionais, políticos, religiosos, estéticos e filosóficos.

       Em relação à classificação por sexo, Tarde assinala uma certa semelhança entre os públicos femininos que lêem novelas, jornais de moda, revistas femininas etc. e as multidões femininas. Tarde refere os exemplos de Jannsen e Taine (15) para confirmar o carácter violento de certas multidões femininas. Quanto à classificação por idade, ela é mais visível na gerontocracia dos públicos senis e na efebocracia das multidões eleitorais. Públicos e multidões não são distintos no que se refere aos fins e fé que os anima. Assim, existem públicos e multidões de crentes, ambiciosos,  convencidos, fanáticos, apaixonados, despóticos. Por critérios étnicos, vemos que a raça é mais importante nas multidões, pois nos públicos, pela natureza [universal] da reflexão crítica, admite-se uma maior heterogeneidade étnica. A nível económico, existem multidões (industriais, operários, agricultores) e públicos [elite crítica que acompanha a economia nacional e internacional]. A nível cultural [cultura como sapiência], existe uma omnipresença do público, pois este afirma-se como espaço de divulgação crítica do saber. A nível profissional, existem públicos e multidões. Tarde dá o exemplo das multidões esfomeadas, conduzidas pelos sindicatos, e das corporações, que se configuram como públicos, na medida em que são grupos sociais organizados. A multidão pode também estar presente na corporação. As multidões estéticas e religiosas, as únicas verdadeiramente crentes, são as mais intolerantes. Existem também públicos religiosos [os crentes que questionam as verdades da fé: as várias seitas/Igrejas] e públicos estéticos [os críticos e as escolas de Arte]. A nível filosófico, Tarde assinala apenas a existência de público. No âmbito restrito do sistema de crença, os públicos e as multidões podem também subdividir-se em  atentos(as) ou expectantes (estão atentos aos eventos) e manifestantes ou actuantes (realizam uma acção contínua: jesuítas, irmãos pontífices etc.). As multidões manifestantes ainda se podem dividir em multidões inclinadas ao ódio, ao amor e à dor (Tarde, 1986:60-69).

       Em seguida, Tarde constata que o público, apesar de ser um espaço de  discussão  crítica superior à multidão, também possui males. Exemplo disso são os crimes e a intolerância dos públicos. Será esta posição aparentemente ambígua?  Como conciliar uma reflexão crítica racional existente nos salões, clubes, cafés etc. com a irracionalidade do crime? A resposta de Tarde situa-se na consideração de que públicos são colectividades constituídas por indivíduos, os quais também podem tender para o mal. Neste sentido, para Tarde os crimes do público distinguem-se dos crimes das multidões pelos seguintes aspectos: "(...) 1) são menos repulsivos; 2) são menos vingativos e menos interessados; menos vingativos e mais astutos; 3) são durante mais tempo e mais extensamente opressivos, e 4) finalmente, estão mais seguros da impunidade" (Tarde, 1986:71). Logo, os crimes do público são, aparentemente, menos violentos que os crimes das multidões revoltadas.

       Tarde defende que existe uma partilha e cumplicidade de interesses entre o público e os seus representantes ou dirigentes. Esta situação faz com que o público seja responsabilizado pelos erros e crimes cometidos pelos seus líderes: "será que o público eleitoral, que elegeu deputados sectários e fanáticos, não é também responsável das suas prevaricações, dos seus atentados contra as liberdades, contra os bens, contra as vidas dos cidadãos?"   (Tarde, 1986:75) (16).

       Tarde aceita a inevitabilidade da comunicação dos indivíduos no público chegando mesmo a afirmar que a imprensa pode conduzir à união e pacificação finais. Mas, apressa-se a dizer que, em último caso, todas as iniciativas criativas só podem advir de um "pensamento individual, independente e vigoroso" (Tarde, 1986:76).  

       Por último, Tarde teme que as democracias modernas, na sua tentativa de uniformização de direitos, anulem a capacidade crítica dos eruditos devido a uma massificação da cultura. Os intelectuais devem, assim, intervir no intuito de garantir a singularidade criativa dos indivíduos, que conduz invariavelmente à discussão crítica num público (Tarde, 1986:77).  

ANÁLISE CRÍTICA

       Um dos grandes objectivos de Tarde consiste na tentativa de compreender a relação entre o indivíduo e o social no contexto da interpsiquia. Apesar dos males do individualismo, e ainda que a socialização dissolva o carácter interpsíquico das interacções, Tarde refere que o indivíduo deve-se privilegiar em relação ao social. Neste sentido, o público enquanto colectividade social proporciona aos publicistas e jornalistas as maiores facilidades de se imporem e "às opiniões individuais originais as maiores  facilidades  para  se  difundirem" (Tarde,  1986:55),  isto  é,  o público constitui um espaço de afirmação e esclarecimento do  indivíduo  (17).  Mas,  Tarde também refere que o surgimento  do público  explica-se pela crescente necessidade de sociabilidade dos seus agentes críticos,  os quais realizam uma comunicação regular através de informações  e sentimentos comuns:  "A transformação de qualquer classe de grupos em públicos explica-se por uma necessidade crescente de sociabilidade, que torna necessário que os associados se disponham em comunicação regular mediante uma corrente contínua de informações e de excitações [sentimentos] comuns. Esta transformação é, por conseguinte inevitável. (...)" (Tarde, 1986:56) (18).

       Assim, o público assume-se, principalmente, como espaço de emergência da esfera privada. Os indivíduos racionalmente esclarecidos afirmam a sua subjectividade em vários graus no público (19). De facto, publicistas como Marx, Kroptkin, e outros desenvolvem a subjectividade através de um contínuo processo de invenção e inovação. Nestes publicistas, o espírito anarquista e socialista só foi possível porque "(...) a impressão individual do génio do seu promotor [é] mais marcada sobre um público do que o génio da nacionalidade e que o inverso seja verdade para a multidão" (Tarde, 1986:52). A subjectividade dos indivíduos é primária e matricial no público. Hunter (2000:1) cita Clark (1969), o qual comentando Tarde refere: "A última fonte para toda a invenção encontra-se nas associações criativas originadas nas mentes dos indivíduos dotados." Em relação à subjectividade Tarde defende que "(...) em definitivo, toda a iniciativa fecunda só pode emanar de um pensamento individual, independente e vigoroso;" (Tarde, 1986:76). Tarde segue a tese de Lamartine, segundo a qual, devemos afastarmo-nos da multidão e do público. A solução é a prática de uma racionalidade individual e independente, no intuito de impedir uma democracia massificadora.

       Simultaneamente, o público constitui um  espaço  propício  para  a  comunicação regular de informações e sentimentos comuns. Este é o momento da intersubjectividade, que surge secundariamente como resultado das inevitáveis interacções comunicacionais entre os indivíduos. A intersubjectividade só surge depois de estabelecida primeiramente a subjectividade. "(...) Tarde acredita que os grandes indivíduos constituirão inicialmente um público, o qual, uma vez formado, tornar-se-á aberto à mútua comunicação e sociabilidade entre os seus membros" (Hunter, 2000:1). A intersubjectividade do público é, assim, consequência da natureza sócio-comunicativa dos indivíduos. A intersubjectividade surge também na imprensa. Tarde acredita que a acção comunicativa e intersubjectiva  operada na imprensa pode conduzir à união e pacificação finais.  "(...) Apesar de tudo, inclino-me a crer que as profundas transformações de que somos devedores à imprensa foram feitas no sentido da união e da pacificação finais." (Tarde, 1986:76) Atendendo ao conceito de público (Tarde, 1986:43), os indivíduos com a sua subjectividade crítica partilham uma coesão somente mental. Daí a importância da interpsiquia enquanto mediação intersubjectiva realizada através da comunicação e cujo efeito praxiológico é a existência de sociabilidade. Secundariamente, após a subjectividade inventiva, a intersubjectividade é o laço social que une os indivíduos no público. "Este laço é (...) a consciência possuída por cada um deles de que esta ideia ou esta vontade é compartida num mesmo momento por um grande número de homens. (...)" (Tarde, 1986:44). Neste sentido, as correntes de opinião são, para Tarde, comunicações de consciência a consciência (interpsiquia) desligadas do instinto físico.

       Tarde oscila entre um individualismo subjectivo, propício à invenção, sumamente valorizado e a inevitável aceitação da comunicação intersubjectiva regular de informações/sentimentos comuns. Existe, assim, uma aparente ambiguidade. Porque motivo Tarde valoriza o pensamento individual ao ponto de o apelidar de independente, se a transformação dos grupos sociais em públicos implica a comunicação e sociabilidade de cariz inevitável? Será que a partir da troca comunicacional ainda é possível falar de um pensamento individual e independente? Tendo as profundas transformações sociais, motivadas pela imprensa, conduzido à união e pacificação finais, será que o pensamento individual independente corre o risco de ser absorvido pela partilha comunicacional?   Tarde não dá resposta a estas questões em Le public et la foule.

       Na verdade, trata-se apenas de uma aparente ambiguidade. Atendendo ao conjunto da obra de Tarde, o pensamento individual é privilegiado. Mas, a actividade comunicacional intermental, fonte de sociabilidade, imitação e herança cultural, surge secundariamente. A prova desta tese encontra-se em Les lois de l' imitation, estudo fundador do pensamento de Tarde. "(...) Assim, é bem certo que o progresso da civilização tem por efeito tornar a sujeição à imitação cada vez mais pessoal e racional ao mesmo tempo. Nós estamos tão sujeitos como os nossos antepassados aos exemplos ambientais [sociedade], mas apropriámo-los melhor pela escolha lógica e individual que deles fazemos, mais adaptada aos nossos fins e à nossa natureza particular. Isto não impede, contudo, a parte das influências extra-lógicas e prestigiosas de ser muito considerável. (...)" (Tarde, s.d.:109). Mais adiante, Tarde refere: "Para inovar, para descobrir, para acordar um instante do seu sonho familiar ou nacional, o indivíduo deve escapar momentaneamente [num primeiro estádio] à sua sociedade. Ele é supra-social, antes de social, (...)" (Tarde, s.d.:113).

       Para Reynié, comentando Tarde (1989:10), a invenção não é um simples acto individual. A invenção "atravessa o indivíduo, parece extrair-se do mundo social graças à mediação do sujeito que não é, sem ele saber, mais do que um instrumento de um misterioso desígnio". Para Tarde, existe primazia do pensamento individual. Mas as novas iniciativas não são o puro produto de uma razão particular, pois a influência exterior do meio ambiente, da discussão, da tradição e da educação estão também presentes enquanto contágio imitativo. "(...) uma condição sem a qual dois seres não saberiam obrigar-se um para com o outro, é porque eles têm um fundo de ideias e de tradições comuns, uma língua ou um tradutor comum, semelhanças tão estreitas formadas pela educação, uma das formas da transmissão imitativa. (...) (Tarde, s.d.:86).

       Para Tarde, a sociedade é a imitação. E as causas sociais da imitação são lógicas e extra-lógicas (não-lógicas). As leis lógicas da imitação actuam quando uma inovação é considerada por um homem (exercício de subjectividade) mais útil ou verdadeira que as outras. As leis lógicas da imitação propostas por Tarde, segundo Marsden (2000:3), foram as seguintes: "1. A origem de uma invenção envolve a recombinação de imitações existentes, e esta origem será influenciada pelo contexto social [comunicação intermental e intersubjectiva] e pelas capacidades de todos os envolvidos na recombinação" [afirmação da subjectividade] (20). 2. O sucesso de uma imitação em espalhar-se geometricamente a partir do seu ponto de origem será uma função da sua adaptação,  isto é, compatibilidade, com o ambiente de imitações existentes (21) 3. A selecção, isto é, a adopção de uma imitação ocorre ou através de uma 'substituição' envolvendo um 'duelo lógico' e 'luta' entre duas alternativas ou através de 'acumulação', um processo ligado a uma união lógica de imitações" (22).

       Nas leis extra-lógicas, estão presentes descobertas antigas ou recentes, "abstraindo de qualquer prestígio ou de qualquer descrédito relacionado com a pessoa dos seus propagadores" ou com o espaço e tempo oriundos dessas descobertas (Tarde, s.d:168). As leis extra-lógicas da imitação são: "o movimento do interior (disposição do espírito) para o exterior (o comportamento que ele induz), do superior para o inferior (o funcionamento dos modelos ligados à 'acção sugestiva e contagiosa dos indivíduos da elite'), a alteração do costume e da moda" (AAVV, 1996:68).  Por exemplo, na passagem do superior para o inferior a hierarquia dominante afirma a sua subjectividade impondo modelos aos subordinados, mas consequentemente existe um esforço de comunicação intersubjectiva/intermental recíproco (23).

       Na obra de Tarde, podemos encontrar as primeiras tentativas sociológicas de encarar a instrumentalização e manipulação dos mass media. Este aspecto é visível, sobretudo, quando Tarde se refere à inconsciência generalizada que os públicos têm face à influência persuasiva dos jornais (Tarde, 1986:44) e quando analisa o fenómeno dos públicos flutuantes, nos quais se verifica um interesse economicista por parte da indústria jornalística (Tarde, 1986:54). Por outro lado, para Tarde os jornalistas, que necessitam de um enquadramento deontológico e legal, podem ser manipuladores despóticos  e mesmo formadores da opinião: "(...) seguramente a imprensa submete cada vez mais o público subjugado ao despotismo dos grandes jornalistas. Muito mais que os estadistas (inclusivamente os superiores), são os jornalistas aqueles que formam a opinião e dirigem o mundo" (Tarde, 1986:54). Para Katz (2000:1), Tarde acredita que os líderes da opinião,  e especialmente os jornalistas, têm grande influência sobre o público. Após os indivíduos escolherem um dado jornal e após os jornais descobrirem os gostos dos seus leitores, existe uma acomodação mútua, que permite aos jornalistas manipular o seu público de leitores. Neste âmbito, as interacções entre os membros do público são mais fracas do que a acção manipuladora dos jornalistas: "(...) a interacção dentro do público é fraca porque os membros do público são 1) auto-seleccionados e 2) são regularmente influenciados pelo jornal que partilham. Por outras palavras, a deliberação do público simplesmente reforça, mas não muda a posição do jornalista" (Katz, 2000:1). A manipulação dos jornalistas sobre o público é, sem dúvida, um exemplo da importância prioritária da subjectividade. Os jornalistas manipulam o público e outras colectividades sociais desenvolvendo um individualismo inventivo. A 1ª geração da Escola de Frankfurt, nomeadamente Horkheimer e Adorno, analisaria o poder manipulador e instrumentalizador dos mass media enquanto reflexo de uma indústria cultural continuamente crescente.

       Para Baigorri (1994), Tarde é precursor da divisão entre apocalípticos e integrados presente na  obra  de  Umberto Eco. Reformulando a posição de Baigorri, podemos assinalar uma dialéctica entre, por um lado, o carácter apocalíptico da apreciação sobre a subjectividade e, por outro lado, o carácter integrado e optimista da apreciação da intersubjectividade. Em primeiro lugar, a crítica à decadência da singularidade criativa humana, em virtude das democracias massificadoras, e a necessidade de uma valorização da racionalidade subjectivista, como ponto de partida para a inovação inventiva, indicia o carácter apocalíptico. Em segundo lugar, Tarde aproxima-se de uma posição de integrado e optimista sobre a cultura de massas quando afirma que as profundas transformações sociais operadas pela imprensa e mediadas por discussões comunicacionais intersubjectivas levam à união e pacificação finais. Todavia, Tarde refere, em definitivo, que só os indivíduos dotados de um pensamento independente podem aspirar à invenção de iniciativas criativas.

       Para Lubek (1981:375), à excepção de Clark (1969:16-18) e Karpf (1932:93-94) que salientam a interpsiquia como elemento de interacção entre os indivíduos, a maioria dos autores, que comentam o debate entre Tarde e Durkheim, "ignoraram as posições interpsicológicas de Tarde e não viram nos seus escritos mais do que o seu 'psicologismo' e/ou o seu individualismo." No presente estudo procuramos contrariar esta tendência. É evidente que Tarde enfatiza nos seus primeiros escritos, sobretudo, o primado do indivíduo. Mas nos escritos posteriores (por exemplo, em Etudes de Psychologie sociale, La psychologie inter-mentale e L' inter-psychologie) Tarde anuncia já aquilo que seria o propósito central de L' opinion et la foule - analisar a interacção humana nas várias formas de associação. Segundo Lubek (1981:374), Tarde pretende observar directamente "os efeitos da interacção no seio dos grupos, seitas, públicos, multidões e entre as nacionalidades ou os sexos". Neste contexto, o debate entre Tarde e Durkheim conduziu o pensamento de Tarde para a aceitação de uma interpsicologia que parte do indivíduo e procura compreender a lógica social.

       A sociologia de Gabriel Tarde é, acima de tudo, uma psicologia social. Para Tarde, a Sociologia só pode ser compreendida a partir de uma "psicologia intermental", que estude a interacção das consciências individuais, nomeadamente as "acções intermentais" e os "efeitos intercerebrais", complementada por uma lógica social que estude as obras de civilização. Contrariamente às teses correntes na época que encaravam a Sociologia como física social, biologia social ou ideologia social, Tarde prefere a expressão "psicologia social", que ele forjou completamente (Cuin; Gresle, 1995:66), (Lubek, 1981:368) (24). Tarde (1898a:67) escreve: "A verdade é que uma coisa social qualquer, uma palavra de uma língua, um rito de uma religião, um segredo de um ofício, um procedimento de arte, um artigo de lei, uma máxima moral, se transmite e passa, não do grupo social tomado colectivamente ao indivíduo, mas certamente de um indivíduo - parente, mãe, amigo, vizinho, camarada - a um outro indivíduo, e que, na passagem de um espírito num outro espírito ela [a coisa social] se refracte" (25). Ora, esta afirmação pressupõe, em Tarde, a passagem da subjectividade para a intersubjectividade necessárias a uma compreensão mútua entre os vários indivíduos. Primeiro temos o indivíduo e depois há um movimento de comunicação de informações e sentimentos comuns que formam o laço social.

        Em suma, após a análise das teses de Tarde, nomeadamente a ideia do pensamento individual inventivo como fonte de iniciativas fecundas e da sua tese consequente, ou seja, a existência no público de uma comunicação intermental de informações e sentimentos comuns podemos enquadrar a teoria do público de Tarde à luz da subjectividade e da intersubjectividade. Deste modo, a subjectividade  tem a primazia  no público. Mas secundariamente surge a intersubjectividade, através da comunicação intermental numa actividade mediadora inevitável. Logo, fica demonstrada a existência de duas dimensões na teoria do público de Tarde, cujos vectores são: I) pensamento individual crítico e independente (subjectividade); II) actividade intermental comunicacional (intersubjectividade).

       Os trabalhos de Tarde, a par de Simmel (26), no contexto da interpsiquia e das interacções sociais foram decisivos para o estudo da acção social quotidiana, por parte da sociologia americana. Em relação a Tarde, para Lubek (1981:378) citando Hinkle (1960: 268, 273), "à excepção de Giddings e Ross os sociólogos americanos ignoraram o debate que opunha Tarde a Durkheim". Os sociólogos americanos aproveitaram em Tarde, principalmente, a teoria da imitação, enquanto que a interacção interpsíquica quase nunca é referida.

       Na Escola de Chicago, a imitação de Tarde serviu para definir o conceito de atitude, presente nos estudos de Thomas e Znaniecki sobre o camponês polaco nos Estados Unidos (27).  Park, partindo da noção de imitação  de Tarde, das relações entre público, multidão e massa  e dos estudos de Simmel, encara a opinião pública como um espaço de interacção entre os mass media e a vida democrática (Mattelart, 1996:317). Mas, segundo Lubek (1981:380) a obra de Tarde não despertou muita atenção na Escola de Chicago. Todavia, algumas teorias desta Escola foram baseadas em Tarde. Ross, por exemplo segue o pensamento original de Tarde chegando mesmo a fazer uma tradução livre de algumas passagens de Les lois de l' imitation (Lubek, 1981:381).

       Na Escola de Columbia, o primeiro divulgador de Tarde foi Giddings, que elogia a originalidade de Tarde em Les Lois de l' imitation, embora considere que Tarde foi menos original em La logique sociale. Giddings foi, contudo, incapaz de fomentar um paradigma de comunidade científica em torno de Tarde. No entanto, Davis (1906) (28), oriundo da mesma Escola, publica a sua tese de doutoramento sobre Tarde.        

       Elihu Katz é, talvez, o maior divulgador de Gabriel Tarde na actualidade. Elihu Katz, juntamente com alguns licenciados, desenvolveu um projecto de investigação sobre Tarde, primeiramente, na Universidade do Sul da Califórnia e mais, recentemente, na Universidade da Pennsylvania (com a Hyper Tarde Project Homepage - uma fonte de investigação sobre  L' opinion et la conversation).    

       No âmbito da Psicologia, e em particular da Psicanálise, o texto em comentário, permite apurar um estádio de hipnose e sugestão nas multidões: "(...) uma multidão de homens reunidos é muito mais crédula do que cada um deles em separado; porque o facto de ter apenas a sua atenção concentrada sobre um único objecto, numa espécie de monoideísmo (29) colectivo, acerca-os ao estado de sonho ou hipnose, onde o campo da consciência, singularmente reduzido, é invadido por inteiro pela primeira ideia que se lhes ofereça" (Tarde, 1986:73). Tarde situa-se, assim, na esteira de autores como Ribot, Bernheim, Richet, Binet e Onwicz.

       As formulações de Tarde em L' opinion et la foule influenciaram Katz e Lazarsfeld (1955) (30) na teoria do "two step flow of communication". Segundo esta teoria, a comunicação de massa é adaptada às circunstâncias individuais, através dos líderes de opinião. Estes, produzem invenções (novas ideias), que são difundidas mediante um processo de imitação (AAVV, 1972:512).  O conceito de líderes de opinião foi baseado nas teorias de Tarde sobre a acção dos publicistas, das leis da imitação e da interpsiquia.

 

CONCLUSÃO      

       Tendo em conta a temática subjectividade e intersubjectividade, podemos estabelecer uma reflexão sobre as seguintes questões:

-         Será que a emergência do indivíduo no público, sem negar as suas potencialidades criativas, não se constrói no contacto intersubjectivo alimentado por uma discussão crítica comunitária, mas não massificadora, e contínua?

-         Será que alguma vez o pensamento se pode tornar verdadeiramente independente?

-         Será que o  homem é o  resultado  de  uma mundividência historicamente situada na linguagem  enquanto veículo unificador do social?

-         Não será o público um conjunto de indivíduos unidos por uma espiritualidade mental no seu sistema de crenças, ainda que cada um procure cultivar uma razão esclarecida?

       Todas estas questões denotam uma dialéctica entre subjectividade e intersubjectividade, conceitos indissociáveis na práxis comunicacional. Cada individualidade é uma natureza crítica inventiva à luz da razão esclarecida do Iluminismo. Mas, o indivíduo encontra-se inserido no mundo social numa complexa rede de laços sociais mediados por uma comunicação de consciência a consciência (interpsiquia). O texto em análise sugere a ideia de que é possível explicar as interacções sociais, a partir da interpsiquia e da comunicação regular entre os indivíduos. As interacções sociais verificadas no público,  na multidão e noutras formas de associação pertencem  à esfera da comunicação interpsiquíca.

       Finalmente, partindo dos conceitos de público, multidão e massa que relações podemos estabelecer no âmbito da temática: "Comunicação e Sociedade com Símbolo" (31)? O público constitui, simultaneamente,  um espaço de afirmação da individualidade crítica e uma colectividade de representação linguística intersubjectivamente fundada, pressupondo  uma dupla técnica: a afirmação da singularidade racional e a partilha de informações e sentimentos comuns. A multidão consiste numa colectividade amorfa e receptivamente passiva dominada por representações espectacularizadas, através de uma técnica: a instrumentalização exercida por um dado líder. A massa é o momento supremo da alienação do indivíduo, o qual nega o criticismo individual (razão egocêntrica) e colectivo (razão intersubjectivamente fundada), em favor de uma técnica: a adesão às representações linguísticas  dominadas pelo espectáculo mediático. 



NOTAS

(1) - Actividade Intermental ou Interpsiquia  

I- Tarde defende que o mais simples facto social liga-se não à esfera intrapsíquica, mas ao universo intermental. "A interpartilha entre dois indivíduos, onde um imita o outro, é a característica necessária para o modelo social. A sociedade copia e desenvolve-se do mais baixo [nível] para o mais alto através de um processo de imitação." (Enerstvedt, 2000:6). A base da actividade intermental são os desejos e as crenças. Três linhas orientadoras comandam a interpsiquia: imitação, invenção e oposição. A imitação permite as contínuas mutações sociais e a produção de semelhanças na sociedade. A invenção é uma iniciativa de cada indivíduo e depois está sujeita a um processo de comunicação mútua, permitindo uma aproximação às alterações do ambiente. Neste sentido, maior população implica maiores alterações entre os indivíduos e consequentemente maiores invenções. Para a invenção provocar mutação e progresso é necessário que exista, simultaneamente, imitação. Em terceiro lugar, surge a oposição ou conflito. Tarde distingue oposição psicológica (contraste de ideias na mente de um mesmo indivíduo) e oposição social (contraste de ideias entre vários indivíduos que defendem invenções divergentes). Toda a invenção provém, primeiramente, do génio individual e a sociedade advém da difusão da imitação. Na sociedade, a invenção individual é imitada resultando secundariamente da troca comunicacional realizada no meio ambiente. Neste último caso, as relações interpsíquicas surgem secundariamente dependendo da imitação, invenção e oposição existentes entre os indivíduos.

II- Tomado em sentido geral, o sistema da actividade intermental designa as relações comunicacionais [intersubjectivas] de transmissão do pensamento entre pelo menos dois indivíduos.

(2) - Tarde nunca emprega a expressão "espaço público", no sentido corrente nas Ciências Sociais  e  na  Filosofia  consagrada  por  autores  como  Arendt, Habermas e Mills.

(3) - Wagner, partindo da análise dos termos empregues por Schütz (1979:316,313) define subjectividade e intersubjectividade. Quanto à subjectividade "No sentido imediato, o termo se refere exclusivamente a experiências, cogitações, motivos, etc. de um indivíduo concreto. Em termos restritos o significado subjectivo inerente à conduta é sempre o significado que a pessoa que age atribui à sua própria conduta: consiste em seus motivos, isto é, suas razões para agir e seus objectivos, seus planos imediatos ou a longo prazo, sua definição da situação de outras pessoas, sua concepção de seu próprio papel na situação dada etc. A intersubjectividade é uma "categoria que, em geral, se refere (especialmente em termos cognitivos) ao que é comum a vários indivíduos (...) O conjunto das experiências no decorrer da vida de uma pessoa confirma e reforça a convicção de que, em princípio, e em circunstâncias normais, pessoas em contacto umas com as outras, pelo menos na medida em que são capazes de lidar umas com as outras com sucesso [se] 'compreendem' umas às outras."

(4) - Cf. pp. 19-20 e notas 18, 19, 20 e 21. 

(5) - BLUMER, Herbert, 1946, Collective behaviour in LEE, A., New Outlines of the principles of sociology, New York, Barnes and Noble.

(6) - PARK, Robert, 1972, The crowd and the public and others essays, Chicago, University of Chicago Press (texto original editado em 1904).

(7) - A  Mass  Communication  Research  inicia-se  com  a  publicação  de  Lasswell (1927) - Propaganda techniques in the world war. Para Mattelart, a Mass Communication Research assentava em abordagens quantitativas e era sinónimo [nos seus primórdios] de uma "sociologia americana dos media". Entre os autores da Mass Communication Research sobressaem: Lasswell, Lazarsfeld, Katz, Lewin, Berelson e Hovland. Em 1937, funda-se a revista The Public Opinion Quarterly, orgão da American Association for Public Opinion Research. Esta revista procurava congregar os investigadores, o Estado, os publicitários, as relações públicas, a imprensa, a rádio e o cinema nos [múltiplos] processos de comunicação (Mattelart, 1996:366-367). Surge, assim, um importante contributo para a investigação da opinião pública. 

(8) -  Durkheim  procura criar uma ciência objectiva, tal como as outras ciências, e cujo objecto de estudo é o facto social. A Sociologia de Durkheim é o estudo dos factos sociais e a explicação desses factos através do método sociológico. Deste modo, o objecto de estudo da Sociologia é específico - o facto social - e deve ser distinto dos objectos das outras ciências. Consequentemente, o facto social pode ser explicado objectivamente, tal como as outras ciências explicam os seus factos. Durkheim procurava, assim, autonomizar a Sociologia dotando-a de um corpo teórico-metodológico próprio (o facto social e o método sociológico), enquanto Tarde encarava a Sociologia, fundamentalmente, como uma psicologia social intermental. O método sociológico de Durkheim configurou-se como paradigma exemplar fundador  da Sociologia. Contrariamente, poucos são os livros que incluem Tarde como fundador da Sociologia. A influência de Tarde na Sociologia foi reduzida. Segundo Lubek (1981:370-376), apoiado em Clark (1973), Tarde é menos conhecido e menos aceite pela comunidade científica do que Durkheim, porque, ao longo da sua carreira, sempre esteve à margem do sistema universitário. Este motivo explica o facto de Tarde não ter muitos discípulos. Tarde, ensinando fora das cadeiras universitárias clássicas, surge como um autodidacta membro de um grupo de sociólogos isolados em relação ao positivismo, que inundava as ciências sociais, e reunido à volta da Revue internationale de sociologie criada por Worms em 1893.

(9) - Habermas, embora enfatize a oposição entre o espaço público e o espaço privado,  segue, em certos aspectos, a História do conceito público proposta por Tarde. Neste sentido, para Katz (1999:1) Tarde é precursor de Habermas: "(...) concordo certamente que Tarde é um precursor de Habermas. Para ambos, a imprensa, a conversação e a opinião (pública) são centrais para a 'esfera pública'. Ambos estão interessados nos locais de conversação: salões, cafés etc." Para Tarde, as  profundas transformações sociais, operadas pela imprensa, conduziram à "união e pacificação finais" (Tarde, 1986:76). Existem semelhanças entre esta posição e a ideia de consenso argumentativamente fundado, como princípio estruturante do Espaço Público e do Agir Comunicacional. Contudo, Habermas (1984) cita Tarde uma só vez. Deste modo, a influência de Tarde sobre Habermas é indirecta e pouco preponderante, embora existam semelhanças, nestes autores, no âmbito da esfera pública e por analogia na acção comunicativa.

(10) - Mills (1956:303-304) contrapondo público a massa (formulação aproximada do conceito de multidão) refere que: "Num público (...) 1) podemos supor que pelo menos tantos indivíduos expressam opiniões quantas os recebem; 2) o sistema da comunicação autoriza uma resposta imediata e efectiva a toda a opinião expressa no seio do público; 3) a opinião que resulta de um processo semelhante de discussão não encontra qualquer dificuldade de esclarecimento sobre a acção concreta, e mesmo - ainda que seja necessário - se esta acção deva  se opor ao poder; 4) (...) as instituições do poder não intervêm no seio do público, que joga assim de uma autonomia relativa.(...)" Na mesma antinomia, Price (1994:48) assinala a seguinte tese: "A concepção sociológica do público contempla este como uma colectividade imprecisamente organizada que surge do decurso da discussão em torno a uma questão. Em contraste com a massa, que se baseia unicamente numa atenção comum face a algum assunto e que está formada por respostas idiossincráticas formadas longe de qualquer debate ou discussão, o público distingue-se por uma resolução de algum problema por meio de argumentos e réplicas. (...)"

(11) - Martin e Campoy (1993:15-16), citados por Baigorri (1994), distinguem público e multidão: "Basicamente diferenciar-se-iam pela extensão da acção deste tipo de associações; pelo regime de pertença geralmente vigente em ambas; pelos factores de motivação; e pela sua homogeneidade e grau de capacidade de acção livre. Atendendo à extensão da acção, a actividade da multidão termina quando o faz a [extensão da acção] dos seus líderes, enquanto que a [extensão da acção] do público cresce indefinidamente. Atendendo ao regime de pertença, pode dizer-se que é exclusivista na multidão (daí a sua intolerância), e não exclusivista no público (cada um pode pertencer a vários públicos). Atendendo à motivação: os factores que motivam a formação das multidões são em certo modo externos e primários (tempo, etnia...), enquanto que os dos públicos são internos (isto é, apoiados num estado de espírito preexistente). Quanto à sua relação com a liberdade de acção, e com a própria homogeneidade, a mútua aceitação entre o emissor e o receptor, que escolhe livremente a sua fonte de informação/opinião, faz do público um grupo mais homogéneo que a multidão,  a qual é alimentada por curiosos e semi-aderentes que, uma vez ganhos e assimilados (e com poucas possibilidades desde então de mudar de descrição) fazem muito difícil uma direcção comum (...)". Park, comentado por Price (1994:43-44), distingue público e multidão: o público encontra-se num estádio de oposição e discurso racional entre agentes críticos sugerindo a capacidade de pensar com os outros; a multidão está imersa na experiência emocional requerendo "a capacidade de sentir e empatizar"; quando o público abandona a discussão crítica desaparece ou transforma-se em multidão.

(12) - Alfred Dreyfus (1859-1935), militar francês de origem judaica. Foi acusado de alta traição e injustamente condenado por espionagem pelo facto de ser judeu. Mais tarde, foi   perdoado e reabilitado, após a revisão do seu processo. O caso Dreyfus foi amplamente debatido pela opinião pública francesa. Os seus adversários estavam centrados na Liga da Pátria Francesa e os seus partidários encontravam-se reunidos na Liga dos Direitos do Homem.

(13) - Para Tarde,  a primeira forma mais antiga de colectividade é a família.

(14) - Na verdade, parece-nos que a relação entre publicista e público é uma relação poderosa no contexto de uma  discussão crítica. Contudo, o poder tem uma outra acepção: existe um maior poder de manipulação e instrumentalização na relação que um dado líder inspirador mantém com a multidão amorfa e receptivamente passiva. De facto, as respostas que os líderes inspiradores recebem contribuem para transformar a multidão, apesar de tumultuosa, numa colectividade espectacularizada e sem racionalidade crítica.

(15) - Cornelius Jannsen, dito Jansénio, nasceu em Acquoy (perto de Amesterdão) no ano de 1585 e morreu em Ypres em 1638. Foi teólogo e bispo de Ypres. Na sua principal obra póstuma - Augustinus - expõe as doutrinas de Santo Agostinho sobre a predestinação, o livre arbítrio e a graça. Esta obra deu origem à corrente conhecida por jansenismo. Hyppolite Taine nasceu, em Vouziers, em 1828 e morreu em Paris em 1893. Foi filósofo, crítico e historiador. As suas principais obras são: Origines de la France contemporaine, Essai sur les fables de La Fontaine e Philosophes français du XIXème siècle. Procurou explicar as obras artísticas e os factos históricos a partir de três factores matriciais: tempo, meio e raça. No âmbito da multidão, Jannsen refere a existência da bruxa e adivinha Hoffmann, que, em 1529, dirigia grupos de camponeses e camponesas insurrectas  pelas pregações luteranas. Na mesma colectividade, Taine descreve o comportamento das mulheres que, durante o período agitado da Revolução Francesa, defendiam a morte da rainha Maria Antonieta.

(16) - Esta questão, põe em causa a moralidade dos públicos políticos que legitimaram os regimes contrários ao espírito democrático. A cumplicidade destes públicos políticos perante líderes sectários e totalitários é mais um exemplo dos crimes do público.

(17) - Esta tese é herdeira da singularidade racional  crítica  do  Iluminismo.  Existe,  assim,  um contraste quer com as posições de Durkheim, o qual concede primazia ao facto social empírico exterior e coercivo sobre o indivíduo, quer com o materialismo histórico e dialéctico que realça a função revolucionária do proletariado reunido na práxis social. No que se refere ao debate entre Tarde e Durkheim, para Durkheim a sociedade é uma unidade colectiva que submete os indivíduos através dos factos sociais. "(...) É facto social toda a maneira de fazer, fixada ou não, susceptível de exercer uma coerção exterior; ou ainda que é geral na extensão de uma sociedade dada, tendo ao mesmo tempo uma existência própria [o todo social], independentemente das suas manifestações individuais" (Durkheim, 1983:14). Logo, não podemos falar de subjectividade nem de intersubjectividade em Durkheim. Para  Tarde, a realidade social advém dos indivíduos [subjectividade] e das relações intermentais entre eles [intersubjectividade]. Tarde situa-se na linha de pensamento de autores como Spencer, Quetelet e Condorcet, os quais salientam a continuidade entre o indivíduo e a sociedade (colectivo). Deste modo, os factos sociais não são coisas exteriores coercivas independentes das manifestações individuais (como Durkheim defendia), mas laços sociais formados entre os indivíduos. A sociedade constituía, assim, um conjunto de relações interpsicológicas, em que cada indivíduo exercia uma acção inventiva, imitativa e de oposição.  Tarde valoriza, num primeiro grau de importância, as invenções do génio individual. Só secundariamente as invenções surgem como resultado do meio ambiente. "T. N. Clark e, mais recentemente, I. Lubek distinguiram bem aquilo que torna as teses de Tarde discordantes em relação àquelas que dominavam na sua época (...). [Tarde] pertence a uma tradição que colocando o acento na subjectividade, credita as condutas individuais de uma real espontaneidade face aos quadros institucionais e relaciona a existência de valores colectivos à iniciativa e à invenção pessoais" (AAVV, 1996:68).

    

(18) - Podemos afirmar que  a comunicação de informações e excitações [sentimentos] comuns, postulada por Tarde no público, é análoga, em Habermas (1987:416), às teorias sociológicas da acção, as quais "admitem a comunicação no meio da linguagem ou em todo o caso a troca de informações. (...) [as teorias sociológicas] divergem (...) quanto à maneira de conceber a coordenação das acções; elas postulam ou bem o acordo, e logo um saber partilhado [numa acção social não manipuladora orientada para a intercompreensão - razão comunicacional], ou bem somente uma influência externa que os actores exercem uns sobre os outros [numa acção social manipuladora orientada para o sucesso - acção estratégica]. Tarde não esclarece, em definitivo, se a comunicação de informações e sentimentos comuns visa, em qualquer circunstância, atingir o acordo, embora a imprensa caminhe "no sentido da união e da pacificação finais" (Tarde, 1986:76). E para Habermas (1987:436), "(...) nem toda a interacção mediatizada pela linguagem representa um caso de actividade intercompreensiva. O acto de fala elementar não pode servir de modelo à formação de um consenso (...) senão numa única condição: é necessário que o uso da linguagem a partir dos fins de intercompreensão possa ser designado como o modo originário de todo o emprego da linguagem (...)". Para Habermas, (1984:46-106) a discussão crítica existente na esfera pública burguesa [salões, cafés, clubes, Assembleias políticas etc.] deve levar a vontade a uma razão "que se produz na concorrência pública dos argumentos privados como consenso sobre o praticamente necessário no interesse geral."  Todavia,  Katz (1999:1) refere que Habermas não esclarece, totalmente, a passagem dos cenários informais dos cafés, clubes e salões  para o campo discursivo estritamente racional e colectivamente orientado da esfera pública burguesa.

(19) - Os jornalistas e publicistas têm um maior potencial de afirmação que os simples cidadãos, pois têm um controlo mais efectivo sobre os meios de comunicação social. Actualmente, os novos publicistas e os jornalistas servem-se de novas mediações - as novas tecnologias da comunicação (por exemplo: multimedia, internet e futuramente a rádio e televisão digitais) - para formarem a opinião pública. Desde o século XVII até ao século XX, o desenvolvimento da imprensa conduziu à formação de uma opinião pública crítica. Progressivamente, a mediação da opinião pública é exercida nos jornais, na rádio, na televisão e nas novas tecnologias da comunicação assistindo-se a uma simultaneidade da acção comunicativa (empenhada na discussão crítica) e da acção instrumental (manipulação dos media).  

(20) - Tarde dá o exemplo da linguística. Por um lado, pequenas invenções linguísticas foram sugeridas aos primeiros linguistas "(...) por imitação de si ou de outrem", isto é, por contágio social imitativo (Tarde, s.d:169). Por outro lado, linguistas de renome criaram logicamente, por imitação do latim, palavras que associaram ao prestígio da sua pessoa conseguindo pô-las em circulação (Tarde, s.d:171).

(21) - Neste sentido,  para  Tarde  tudo  aquilo  que  é  imitado  é  sempre uma crença (ideia ou querer) e um desejo (opinião ou desígnio) que se manifesta no espírito de uma língua,  nas orações de uma religião, nos artigos de um código, nos deveres morais, no trabalho  da indústria e nos processos da arte.

(22) - A adopção de uma imitação só é possível porque existe progresso. As revoluções sociais são a causa do progresso. Mas o que é o progresso? "O progresso é então uma espécie de meditação colectiva e sem cérebro próprio, mas tornado possível pela solidariedade (graças à imitação) dos múltiplos cérebros de inventores, de sábios que permutam as suas descobertas sucessivas (...)" (Tarde, s.d:176). Tarde esclarece que o progresso não tem cérebro próprio, isto é, resulta da solidariedade intermental [e intersubjectiva] dos vários inventores que realizam a troca (comunicacional) das suas descobertas ou invenções. O pensamento individual de cada inventor continua a existir, enquanto afirmação da subjectividade. Mas secundariamente surge uma permuta intermental de descobertas através de uma comunicação (solidária) intersubjectiva. Em estádio final, as múltiplas invenções, originariamente individuais, são revistas em função de uma meditação colectiva e necessariamente imitativa. O progresso tem duas vertentes: progresso social e progresso individual. Em ambos, surge ora a substituição através de duelos lógicos, ora a acumulação a partir de uniões lógicas. O duelo lógico aparece quando a nova invenção vem substituir as antigas descobertas provocando: um aumento de fé naqueles que aceitam as novas invenções; uma diminuição de fé naqueles que rejeitam as antigas invenções. Consequentemente, para Tarde a história das sociedades é um conjunto de duelos lógicos. "Não existe instituição pacífica que não tenha a discórdia por mãe. - Uma gramática, um código, uma constituição implícita ou escrita, uma indústria reinante, uma poética soberana, um catecismo: tudo isso, que é o fundo categórico das sociedades, é obra lenta e gradual da dialéctica social. (Neste ponto, Tarde aproxima-se de Marx. Os duelos lógicos de Tarde são, para Marx, a contínua luta de classes). Tarde assinala duelos linguísticos (quando uma língua tenta impor-se sobre um dialecto); duelos religiosos (a luta entre o dogma oficial e o dogma herético); duelos jurídicos (a luta para a aprovação de uma lei ou  a luta no tribunal entre um autor e um demandado); duelos industriais (entre uma invenção já instalada há algum tempo e as novas invenções que tentam espalhar-se); duelos artísticos (uma escola que afirma um género de beleza negado por outra escola). Quanto às uniões lógicas, nas quais há uma acumulação de invenções, Tarde dá o exemplo das línguas, das mais antigas organizações políticas, da religião e da ciência. Em todos estes momentos, a imitação resulta num esforço lógico de unidade [intersubjectiva], que pressupõe uma acumulação de invenções. "As línguas (...) começaram certamente por se formar por uma aquisição sucessiva de palavras, de formas verbais, que exprimindo ainda ideias não expressas, não encontraram qualquer rivalidade a vencer para se estabelecerem; (...)" (Tarde, s.d:202). E noutra passagem: "(...) O ideal seria que cada ciência distintiva fosse redutível, como a astronomia moderna, a uma fórmula única, e que essas fórmulas diferentes tivessem como ligação uma fórmula superior; que numa palavra, não houvesse ciências, mas ciência (...)" (Tarde, s.d:206) (Ora este é o projecto da modernidade, nomeadamente  de Descartes e Leibniz: construir uma ciência que fosse verdadeira materies universalis).

(23) - Deste modo, Tarde afirma: "(...) mesmo no caso em que a acção das leis lógicas não intervém, não é somente o superior que se faz imitar pelo inferior, o patrício pelo plebeu, o nobre pelo vilão, o clérigo pelo leigo, mais tarde o parisiense pelo provinciano, o homem das cidades pelo camponês, etc.: é ainda o inferior que, numa certa medida, bem menor, é verdade, é copiado ou tende a ser copiado pelo superior. Quando dois homens estão em presença e em contacto prolongado, por mais alto que seja um e por mais baixo que seja o outro, eles acabam sempre por se imitar reciprocamente, mas um muito mais e o outro muito menos (...)" (Tarde, s.d:247). (Nesta passagem, é nítida a influência da dialéctica do senhor e do escravo de Hegel no pensamento de Tarde).

(24) - Contudo, para Gurvitch (1977:74-75), não podemos filiar, apesar das possíveis  aparências, a obra de Tarde na escola psicológica. Tarde defende que, para além do aspecto (inter)psicológico, a sociedade é constituída por uma riqueza de obras de civilização: língua, educação, instrução, moral, religião, direito, poder político, indústria, arte, e ainda lutas, assimilações, associações, usos, hábitos e modas (nas quais existem oposições e adaptações). A imitação é o princípio central da sociologia de Tarde. O facto social é, primeiramente, um facto de imitação: "(...) a característica invariável de qualquer facto social qualquer que ele seja, é que ele é imitativo (...) (Tarde, 2000:24). Tarde vai mais longe: "(...) esta relação imitativa não foi, no seu início, tal como é frequentemente no fim, uma conecção  lançando um indivíduo para uma massa confusa de homens, mas meramente uma relação entre dois indivíduos, um dos quais, a criança, está em vias de ser introduzida no processo da vida social, enquanto o outro, um adulto, há muito socializado, serve de modelo social para a criança (Tarde, 2000:25)." A imitação pode estar ligada: 1) ao sonambulismo; 2) a uma influência; 3) a um acto de decisão; 4) à simpatia. E está baseada em hábitos (costumes) imitativos e nas modas imitativas. Chega-se, assim, "a um círculo vicioso que consiste em explicar a imitação pelas obras culturais e as obras culturais pela imitação" (Gurvitch, 1977:75). Durkheim, critica a primazia concedida  por Tarde à imitação. Gurvitch (1977:75) cita a crítica formulada por Durkheim contra Tarde em Le Suicide: "É impossível designar pelo mesmo nome de imitação o processo em virtude do qual, no seio de uma reunião de homens, um sentimento colectivo se elabora, o que nos leva aderir às regras comuns tradicionais de conduta e, finalmente, o que levou os carneiros de Panurgo a deitarem-se à água porque um deles o fez. Uma coisa á sentirmos em comum, outra é inclinarmo-nos perante a autoridade da opinião, outra, ainda é repetirmos automaticamente o que os outros fizeram."  

(25) - Tarde critica o carácter coercivo, exterior e colectivamente orientado do facto social, pois autores como Durkheim não conseguem explicar como é que o colectivo social pode ser assimilado coercivamente pelos indivíduos sem que existam relações intermentais. "(...) Aqueles escritores imaginam que estão declarando uma verdade com grande peso quando eles afirmam, por exemplo, que as línguas e as religiões são produções colectivas; que as multidões, sem um líder, construíram o Grego, o Sanscrito e o Hebreu, tal como o Budismo e a Cristandade, e que as formações e transformações das sociedades são sempre explicadas pela acção coerciva do grupo sobre os seus membros individuais. (...) este autores falham em perceber que postulando uma força colectiva, a qual implica a conformidade de milhões de homens agindo juntos sob certas relações, eles não prestam atenção a uma grande dificuldade, nomeadamente, o problema de explicar como é que uma tal assimilação geral podia alguma vez ter lugar (...) se estendermos a análise [tal como Tarde faz] para a relação intercerebral de duas mentes, uma reflectindo a outra. Apenas, assim, podemos explicar os acordos parciais, o bater dos corações em uníssono e as comunhões de alma, as quais uma vez ganhas sobre e depois, perpetuadas pela tradição e imitação dos nossos antecessores, exercem no indivíduo uma pressão que é frequentemente tirânica, mas saudável" (Tarde, 2000:25). Tarde também reconhece: "(...) À medida que avançamos na vida, é verdade, que somos frequentemente governados por modelos colectivos e impessoais" (Tarde, 2000:25). A "pressão" sobre o indivíduo não é um fenómeno de coerção exterior. Mas resulta do contágio imitativo intermental perpetuado, por exemplo, pela tradição, influência, educação, costumes e modas. Neste sentido, a invenção, fonte de iniciativas criativas, individuais e independentes, está dependente das leis da imitação efectivadas na actividade intermental.

(26) - Em Simmel, a interpsiquia, tomada em sentido geral como relação intersubjectiva, e as interacções sociais são factores constituintes da unidade social. "A unidade societária é realizada pelos seus elementos [indivíduos] sem mediação adicional, e não necessita de um observador, porque estes elementos estão conscientemente e sinteticamente activos (...) esta conexão societária  como síntese, permanece algo puramente psíquico e sem paralelo com as estruturas de espaço e suas relações" (Simmel, s.d:1). A unidade da sociedade (a que Tarde prefere chamar laço social) configura a intersubjectividade enquanto síntese intercompreensiva das diferenças individuais. "Aqui também os elementos individuais são dados, os quais,  num certo sentido, sempre permanecem na sua descontinuidade, como no caso das percepções sensoriais, e eles [os elementos individuais] submetem as suas sínteses numa unidade da sociedade apenas através de um processo de consciencialização, o qual põe a existência individual dos vários elementos numa relação com os outros [elementos individuais] em formas definidas e de acordo com leis definidas [a que Tarde chama leis da imitação]. Mas a subjectividade também está presente na sociedade. Apesar de existirem relações recíprocas "(...) a difusão social não dissolve completamente a nossa personalidade (...)" (Simmel, s.d:8). Em suma, para Simmel "a sociedade é uma estrutura de diferentes elementos." (Simmel, s.d:9)

(27) - THOMAS, William; ZNANIECKI, Florian, 1918, The polish peasant in Europe and America, Boston, Badger.

(28) - DAVIS, Michael, 1906, Gabriel Tarde: An Essay in sociological theory, Columbia University.

(29) - Estado para o qual, segundo Ribot (psicólogo francês 1839-1916) tende  a actividade intelectual: a consciência  encontra-se concentrada e organizada em torno de uma ideia dominante. Onwicz usa este vocábulo para indicar o estado psicológico no sonho, no sono hipnótico ou no êxtase em que tudo se centra numa ideia ou numa única ordem mental.

(30) - KATZ, Elihu; LAZARSFELD, Paul, 1955, Personal Influence: The Part Played by People in the Flow of Mass Communications, Glencoe, Free Press.

(31) - Temática desenvolvida na disciplina de Sociedade e Comunicação I e cujos vectores são: Subjectividade e Intersubjectividade; Representação; Linguagem; Técnica; Público; Massa; Análise de um mal estar.



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ANEXOS

Principais obras de Gabriel Tarde

TARDE, Gabriel, 1886, La criminalité comparée, Paris, Félix Alcan.

TARDE, Gabriel, 1890, Les lois de l' imitation. Etude sociologique, Paris, Félix Alcan.

TARDE, Gabriel, 1890, La philosophie pénale, Lyon, A. Storck.

TARDE, Gabriel, 1892, Etudes pénales et sociales, Lyon, A. Storck.

TARDE, Gabriel, 1893, Les transformations du droit. Etude sociologique, Paris, Félix Alcan.

TARDE, Gabriel, 1895, Essais et mélanges sociologiques, Lyon, A. Storck.

TARDE, Gabriel, 1895, Les transformations du pouvoir, Paris, Félix Alcan.

TARDE, Gabriel, 1895, La logique sociale, Paris, Félix Alcan.

TARDE, Gabriel, 1896, Fragment d' histoire future in Revue internationale de sociologie.

TARDE, Gabriel, 1897, L' opposition universelle. Essai d' une théorie des contraires, Paris, Félix Alcan.

TARDE, Gabriel, 1898a, Etudes de psychologie sociale, Paris, V. Giard & E. Brière.

TARDE, Gabriel, 1898b, Les lois sociales, esquisse d' une sociologie, Paris, Félix Alcan.

TARDE, Gabriel, 1901, La psychologie inter-mentale in Revue internationale de sociologie, vol. 9.

TARDE, Gabriel, 1901, L' opinion et la foule, Paris, Félix Alcan.  

TARDE, Gabriel, 1902, L' invention considérée comme moteur de l' évolution sociale, Paris, V. Briard & E. Brière.

TARDE, Gabriel, 1902, Psychologie économique, Paris, Félix Alcan.

TARDE, Gabriel, 1903a, L' inter-psychologie in Bulletin de l' Institut général psychologique, vol. 3.

TARDE, Gabriel, 1903b, Inter-psychology: the interplay of human minds in International Quarterly, vol. 7.

TARDE, Gabriel, 1904b, L' interpsychologie in Archives d' anthropologie criminelle, de criminologie et de psychologie normale et pathologique, vol.19.

TARDE, Gabriel, 1909, Gabriel Tarde introduction et pages choisies par ses fils suivies de poèmes inédites, Paris, Louis-Michaud. (Obra Póstuma).

TARDE, Gabriel, 1909b, L' interpsychologie infantile in Archives d'anthropologie criminelle, vol 24. (Obra Póstuma).


Alguns estudos sobre Gabriel Tarde

AAVV, 1973, Gabriel Tarde: Ecrits de psychologie sociale, Toulouse, Privat.

BOUDON, Raymond, 1964, La "statistique psychologique" de Tarde in Annales internationales de criminologie, nº 2, Paris.

BOUGLÉ, C., 1905, Un sociologue individualiste: Gabriel Tarde in Revue de Paris, XII, Paris

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DAVIS, Michael, 1906, Gabriel Tarde: An Essay in sociological theory, Columbia University (tese de doutoramento).

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Outras referências bibliográficas em: http://www.socsci.mcmaster.ca/~econ/ugcm/3ll3/tarde



BIOGRAFIA de Jean-Gabriel de Tarde

       Jean-Gabriel de Tarde, filósofo, sociólogo, psicólogo e criminologista francês nasceu em Sarlat a 12 de Março de 1843 e morreu em Paris a 12 de Maio de 1904. A família de Tarde era de origem nobre e vivia na região de Sarlat, desde a Idade Média. Entre os seus antepassados conta-se Jean Tarde (1561-1636), capelão particular do rei de França Henrique IV, astrónomo e amigo de Galileu. Gabriel Tarde tinha apenas sete anos quando o seu pai morre. A sua mãe confia a educação de Tarde aos jesuítas de Sarlat, onde faz os estudos secundários. Porém, Tarde revolta-se diversas vezes contra o rigor excessivo dos jesuítas tentando a fuga.

       Em 1860, obtém o bacharelato em Letras com a classificação de Muito Bom, seguido do bacharelato em Ciências. Após os estudos secundários, começa a sofrer crises oftalmológicas, que o obrigam a viver longos meses em locais escuros. Entretanto, inscreve-se na Faculdade de Direito de Toulouse, mas depois transfere-se para Paris. Numa tentativa de superar a sua doença, inicia uma devoção mística a Santa Teresa de Ávila, mas o rigor da meditação fá-lo regressar à vida laical. Nesses momentos, escreve poemas, faz longos percursos pedestres e tem as primeiras intuições filosóficas ao ler os filósofos gregos, Hegel, Leibniz e Cournot. Em finais de 1866, termina o curso de Direito. Em 1867, inicia a sua carreira na magistratura: secretário do juiz de Sarlat, juiz suplente e finalmente juiz de instrução. Nessa época, os problemas oftalmológicos tinham desaparecido quase totalmente. 


       Tarde começa a sua carreira de investigação primeiro na Criminologia publicando vários artigos, nos quais entra em polémica com o criminologista italiano César Lombroso. Para além da Criminologia, publica também artigos nas áreas da Sociologia, Filosofia, Psicologia Social e Economia. Em 1894, é nomeado director da secção de estatística criminal do Ministério da Justiça em Paris, cargo que conserva até à morte. Nesta cidade, continua uma vida intensa ligada à investigação nas Ciências Sociais e Humanas: colóquios, congressos, artigos e polémicas (desta vez com Émile Durkheim, ao qual se opõe na definição e metodologia da Sociologia). A partir de 1896, foi regente de disciplinas na École Libre de Sciences Politiques e deu lições no Collège Libre des Sciences Sociales. Em 1900, aceita a regência da cátedra de Filosofia Moderna no Collège de France.


       A vida intensa de Gabriel Tarde chega ao fim na noite de 12 de Maio de 1904. Momentos antes de morrer, reordena as suas notas para o seu próximo trabalho - La conversation et son rôle social - e lê-as a um dos seus filhos. Depois, parte para o reino da morte com a idade de 61 anos.